Entrevista de José Nunes Filho (Zé de Cazuza)
Entrevistado por: Jonas Samaúma
Gravação: Marcos Carvalho
Assistência:Yule Neves
Projeto: Conte Sua História/Vidas Em Cordel
Prata, Paraíba- 20/09/2024
Entrevista: PCSH_HV1405
Revisão: Jonas Samaúma
P/1- Mestre, vou começar lendo uma poesia, tá para para o senhor.
Tomei café com dona Duca
Falando de Lourival.
Seu cuscuz sensacional
Arrepia até a nuca.
Nunca que fique caduca
A mente do seu Zé.
Poesia da cabeça ao pé
É único entre os humanos.
Faz 95 anos.
O Mestre ainda é
Cheguei na cidade prata,
Bem no sítio São Francisco.
É Lampião ou corisco
Que com verso nos trata
No momento em que engata
Só para lá, no outro dia.
Parece uma encantaria,
O Mestre Zé de Cazuza
Que nunca desparafusa
E é oo rei da poesia.
R - Obrigado. Verso bom danado
P- Mestre, ia falar para você contar um pouquinho do seu pai, o que que você lembra dele?
R - O que eu lembro de pai era isso aí que você leu.
P- A convivência com ele. assim...
R- Assim, meu pai foi poeta, mas meu pai não viveu disso. Meu pai era agricultor, fez muito açude, também, no lombo de jumento, um homem extraordinário. E como poeta aqui e acolá, quando a ocasião dava ele e fazia um verso, mas não foi propriamente dedicado só à poesia , né?
P- Você nasceu, foi em hospital ou foi dentro de casa?
R- Não. Eu nasci na fazenda Boa Vista, que é dos parentes da gente, ali vivi até 7 anos de idade, mas nasci na mão de parteira na mão de Dona Maria Caju que já morreu há muitos anos.
P- Como é que era a Terra assim, a sua casa na sua infância?
R/- Bom, eu saí aí da fazenda com 3 anos de idade. Fomos tomar conta de uma fazenda de um parente da gente. E vez por outra, eu despertei pra poesia, porque meu pai dado a ser poeta
É porque meu pai, dado a ser poeta, tinha muita amizade com uns cantadores. E vez por outra, era visitado por Pinto, por Lourival Batista, Antônio Marinho...
P - Você lembra como foi que despertou a poesia na sua vida?
R- Foi desse, desse tipo que eu estou lhe dizendo, ouvindo desses mestres...
P - Ouvindo desses mestres...
R - Aí vi que eu tinha alguma coisa também com isso. Era era uma criança. Fui para lá com 3 anos de idade e voltei com 10 pra aqui.
P - 3 anos? .
R- Voltei com 10 para aqui.
P- Hum, e aí, por quê?
R- Lá não era o da gente, aqui é nosso...
P- Você lembra a primeira poesia que você fez?
R- Não, eu não. Não lembro assim não. Porque além de tudo, eu fui também cantador de viola.
Passei 2 anos cantando viola, aí depois dado o avanço da idade, eu achei por bem deixar.
R- Quem que te deu essa primeira viola?
R- Quem deu? Ninguém.. Naquele tempo não existia isso não, era difícil demais. E depois que eu me entendi como gente, comprei a última viola que Pinto usou. E o menino levaram para fazer um trabalho nos trastes que estava muito, muito rente. E roubaram lá da casa que ele tava morando, o dono da casa bebia muito e convivia com muito cabra ruim aí roubaram o violão. Coisa ruim da gota serena...
P1- Era uma viola que pinto usava?
R- Era a última que ele usou.
P- Aí o senhor comprou dele?
R- Não, eu comprei, fez um Batista, um cantador.
P- E o senhor aprendeu sozinho a tocar?
R- Eu não, eu sou muito ruim de tocar viola. Eu acompanhava o Baião da cantoria a pulso, que eu não tinha dom pra tocar não.
P- E como foi que o senhor começou a decorar poesia, gravar na cabeça?
R- É porque eu gostava, né? Gostava… Tinha a facilidade.
P- Sim.
R- Em demasia, né?
P- É, o senhor tinha muita ligação com os pássaros quando era criança?
R- E porque eu sempre preservei . Eu não gosto de matar passarinho, tem até os anos que eu fiz um mote: “ Quem nunca ofendeu a nada/ Vê Deus por merecimento.”. Então eu disse:
Eu nunca fui emboscar
A ave que vem beber
Por não gostar de ofender
Muito menos de matar
Gosto de vê lo voar
Cortando a brisa e o vento.
Buscando o seu aposento,
Seu ninho, sua pousada
Quem nunca ofendeu a nada
Vê Deus por merecimento
Se eu fico impressionado
Vendo um pobre com aleijo
Tenho pena quando vejo
O animal cargueado,
Às vezes até pesado
E sangrando o ferimento.
Nem em lombo de Jumento
Eu boto Carga Pesada.
Quem nunca ofendeu a nada
Vê Deus por merecimento
Se não mato camaleão
Peba, nem Teju-açu,
Nem mocó, nem tatu
Nem juriti, nem Cancão
Canário, nem azulão
Voando no firmamento
Nem mesmo papa vento
Nunca deu uma pedrada.
Quem nunca ofendeu a nada
Vê deus por merecimento
{Zé de Cazuza aponta para uma criança que é seu neto}
Esse menino é um neto meu, filho Felizardo, esse menino é poeta, ele diz que é, e é mesmo.
P- É poeta?
R- Ele é desinibido, vai ser uma fera o menino.
P- Vai ser uma fera? Será que a gente pode chamar ele para falar um verso aqui para a gente?
R- Era bom que eu não sou correto nos versos dele, era bom se o pai dele viesse também.
P- Você sabe, quer falar um verso aqui para a gente indo para a câmera junto com o seu vô? Quer?
R- (Zé de Cazuza) Qual é o verso você faria? Qual que você faria, se não vá lá chamar o seu pai para ativar?
Aqui, ó, senta aqui.
(Criança se aproxima e senta no colo de Zé de Cazuza e recitar)
Nossa noite eu tive um sonho
Foi coisa desconhecida
E 2 outros passando
Em carreira desmedida
É do cavalo do tempo
Atrás da besta da vida.
P -Quer falar mais uma poesia?
Zé de Cazuza- Às vezes fala mais alto um pouco.
Criança-
Atiraram espingarda lazarina
O cachorro acuado por um tatu
Um vaqueiro pegar um boi zebu
Enfrentando os perigos da Campina
Gavião escondido na faxina
Pra pegar pinto novo noitão
Matuto soltando foguetão
A sina de um filho que nasceu.
Só conhece essas coisas quem viveu
O cenário poético do Sertão.
P- Nossa. Você é muito bom, fale mais um para gente.
Zé de Cazuza- Mas fala mais alto um pouquinho.
Criança-
Por isso que eu não confio
Em cabra que tem verruga
Cachorro da boca preta,
terreno que não enxuga
Comida com dor de gente
Em casa que cigano aluga.
P- Ele é muito bom. Você sabe alguma poesia do seu avô?
R- Sabe nada
Criança- Sei do meu pai
P- Do seu pai quer falar?
Criança-
Vaca de bezerro novo,
Faz coisa de admirar
Esconde o filho num canto
que dá trabalho encontrar
Não esquece onde deixou
Nem ele sai do lugar.
(Menino se retira do quadro)
Zé de Cazuza- Graciliano Ramos falou Inácio da Caatingueira trouxe o micróbio da poesia na massa do sangue.
Se você tivesse levados os versos do menino dava uma reportagenzinha adequada.
P- Tá gravado, tá né? Tá gravado. Ele vai dar continuidade a seu legado, né, mestre? Você, quando era criancinha, já falava poesia ?
R- Falava nada. Eu vim falar poesia depois que eu vi os cantadores. Não tinha quem despertasse, não era?
P- Mas seu pai não era poeta?
R- Era. Mas não ligou para isso. Já esse daí atrás é que o pai tem ligação com ele, disse.
Ele que ensina, o pai que ensina, né?
Criança- Na verdade, foi quando eu tinha 10 anos que eu estava andando mais papai aí eu disse se eu deixar de ser vaqueiro vou chorar com saudade da boiada
Aí meu pai pai falou, vou dizer meu primeiro verso:
Um carrinho de brinquedo
Que meu pai fez e me deu
As rodas eram de tábua
Porque não tinha pneu.
O volante era um cordão
E o motorista era eu
P- Fale pra gente olhando pra câmera, seu nome e sua idade…
Criança- Meu nome é Carlito e tenho 6 anos.
P 6 anos? Esse neto de vai ser profissional, mestre qual foi o cantador que mais te impressionou assim na sua Juventude?
R- Vários, de quando eu era menino, Pinto, Heleno, irmão dele, Lourival, o rei dos trocadilhos e Pinto de Monteiro.
P- Pinto do Monteiro. Como foi que o senhor conheceu pinto do Monteiro? Assim, o primeiro dia que viu ele...
R- É muito fácil porque ele lá onde a gente morava.
P- Ele ia lá.?
R- Então ele fazia uma visita 1,2 vezes por ano?
P- Você pode falar um verso dele que você lembra?
Eu sei como que é o verso dele para ver como é, principalmente quando ele já estava no fim, vieram os cantadores de Cajazeiras, entrevista-lo e pediram se não seria possível fazer uns versos de improviso, mesmo sem viola. Vamos ver aí, eles coraram aí o cantador dizendo que era de Cajazeiras, de Cajazeiras... Aí Pinto disse:
Eu conheço Cajazeiras
Respeito o terreno seu
Eu sou pinto de Monteiro
Mas Monteiro não é meu
Dei tanto nome à Monteiro.
Monteiro nada me deu
P- Muito bom, quer falar mais uma dele?
Vamos falar...Monteiro nada me deu, No desafio ele era uma fera também, Ave Maria! ele cantando mais o rei dos trocadilhos, ele findou dizendo: Na cabeça desse pinto eu ainda bato um prego. E Pinto:
Ainda te vejo cego
Sem ter no bolso um vintém
Pedindo esmola num beco
Onde não passa ninguém
Se passar seja outro cego
Pedindo esmola também.
P-Nossa.
R- Doido, não é?
P- Você já viveu alguma história junto com ele? Tem alguma algum episódio que o senhor viveu com Pinto do Monteiro?
R- Já cantei muito mais ele, mas sem ser de verdade, brincando na casa dele.
P- Ah é?
R- Quase todo mês a gente dava uma atropelado de repente.
P- É mesmo? Era como vocês. Era assim no fazendo café ou era fazer um foguinho?
R- Pinto morava numa casinha lá em Monteiro, e a gente visitava lá. Eleve uma vida de passado sorrateiro. Ele tem um irmão que era recursado, seu Mariano, quando ele já estava muito doente, seu Mariano veio visitá lo, ele disse, Mariano, que tinha muitas casas na rua. “Mariano tu tem uma casa desocupada para tu mandar me buscar para eu ir morrer lá? Ele disse: ”Tem, você quer ir quando? “Na hora que você puder e quiser” “ Daqui para amanhã venho buscar,” Daí morreu lá em Monteiro, mas tinha essa casa que ele morou lá, ele cantava muito mais Batista, e Batista findou um verso dizendo:
Não sei porque é que a Pinto só canta aqui nessa esquina.
Ele disse:
Aqui é minha oficina
Onde conserto e remendo
Quando o ferro é grande eu corto
Quando é pequeno eu remendo.
Quando falta ferro eu compro
Quando sobra ferro eu vendo
Era um gênio Pinto
P- Qual foi o dia a história mais marcante dele para o senhor? História de Pinto do Monteiro
Isso é um anos de coisa, né Por exemplo, Mané Galdino de Bandeira, pai de Pedro, foi um cantador extraordinário de fazer medo, um encontro com os outros. Aí tem uns versos que ele faz no livro “cantadores do mundo todo” Tem o que ele disse, por onde andava procurando demonstrar quem era ele. Aí tem um verso que eu gostei muito, que ele disse, foi lá na Terra do pai dele, de Pedro Bandeira, Mané Galdino, de Bandeira.
Aí ele disse:
Eu vi naquela cidade
Um rapaz do Cariri
Que era uns 10 ou 15 dias,
Se encontrava por ali.
Foi dizendo, pinto véi,
que é que andou fazendo aqui?
Eu disse, meu camarada,
Não fale dessa maneira
Que eu estou passando aqui
Por Severino Pereira
Para ver se posso pegar
Mané Galdino Bandeira.
Cabia atrás de Lampião negando o nome do que acha?
P- Muito bom.
R- Que era para ser ele que, mas Pinto não temia ninguém, era uma sumidade rapaz..
Ele já no fim, marcaram pra fazer uns festivais em Recife, vieram atrás dele, disseram: Mestre Pinto, eu estou vendo que o senhor está com dificuldade para se locomover, mas eu queria e consigo lhe levar venho buscar de carro, venho trazer na porta, pago um cachê mais relevante que os cantadores profissionais querem que eu mostre o mito, dos cantadores, aí eu aí escolho logo você um cantador, pra cantar os versos e improvisar mais ele. Pinto disse: Pois não, pode vir buscar e quando terminou, eO Visgo Oliveira, ele tem uma voz danada, ele findou o verso dizendo:.
Você é o rei do verso, eu sou o rei da voz
(Ele pegando a deixa disse:)
Para ficar melhor para nós,
Só se Deus fizesse assim,
Desse mais versos a você
Doasse mais voz a mim,
Nem você cantava pouco
Nem minha voz era ruim.
Depoimento da moléstia
P- Muito bom, nossa, o senhor lembra a primeira vez que foi em São José do Egito?
R- Não, porque naquele tempo São José do Egito era da Alemanha para lá.
P- Era da Alemanha para lá?
R- As viagens daquele tempo era mais a pé e a burro
P- A pé e a burro?
R- Carro não tinha não, tinha e não tinha.
P- E da onde que veio essa coisa de São José ser a Terra da poesia? Como é que foi isso?
Você sabe?
R- Devido.a um tanto de poetas que moravam lá, que residiam lá não era? Mas o primordial, história. A primordial história dos versos do Pajeú é mais de Itapetim. É tanto que morreram os cantadores de São José Já não tem um cantador mais em Itapetim ainda tem um monte de poeta da gota serena. Cêis não vão lá não?
P- Itapetim, quem que o senhor acha que a gente deve visitar ainda?
Quem o senhor recomendaria?
R- Eu acho que Itapetim...Lá você encontra o Zé Adalberto e ele indica o resto… Lá tem um cabra, um cabra que publicou um livro agora há pouco, deixa eu ver se eu lembro o nome do homem.
P- Ah, o bastião, não é?
R-É, você já viu, já?
P-Já ouvi
R- Já ouviu ele é bom? Ele disse:
Juazeiro é uma planta
Que se dá na Terra enxuta.
A fruta não vale nada
A madeira é torta é bruta
Mas a bondade da sombra
Cobre a ruindade da fruta.
Não é um monstro?.
P- Ele é. Ele é bom, né?
A sombra que me acompanha
Não é a que me socorre.
Se eu andar, ela anda
Se eu correr, ela corre.
Mas é mais feliz do que eu
Não adoece e nem morre.
R- É um poeta da gota né. Lá tem um Monte de poeta ainda. São José é que não, mas lá tem um monte.
P- Mas naquela época, como é que era se andava a pé ou de burro?.
R- É, mas depois vai se modernizando, né?
P- É, mas antes de se modernizar, como era?
R- Tinha que ser a pé ou a cavalo.
P- A pé, a cavalo. E os poetas se encontravam aonde?
R- Nessa metrópole mesmo, São José é cantado pelo sítios, Mundo Novo, tem um povoadozinho bem pequenininho que havia muita cantoria lá por conta do dono, vem dizer, o dono do povoado gostava muito, Inácio Jacaré. Que até a Helena chegou mais Pedro Amorim, que era outro monstro para fazer uma cantoria. Aí Inácio muito conversador, disse: Você acha que vai chover ainda, responderam vai nada, esse ano chove mais não.
Foi de noite, já fizeram a cantoria debaixo da chuva. Aí, Pedro, primeiro verso, Pedro findou dizendo: Viemos cantar na casa de Inácio Jacaré. Helena disse:
Inácio é um homem sem fé
Que você não avalia.
Hoje à tarde ele me disse
Que tão cedo não chovia.
O engano foi tão grande
Que choveu no mesmo dia.
Esse Pedro Amorim que eu estou a falando era expoente na cantoria. Pedro Amorim é um direito da gota serena, nunca quebrou um trato, fera.
Só vi Jó com Canhotinho
Cantarem muito ligeiro,
Mas eu no meio do verso
Sempre faço um paradeiro.
Eu só puxo no gatilho,
Olhando a mira primeiro
Pedro era bom, cantava mais Mané Francisco, Mané era desmatelado levou a rapariga para a cantoria e Pedro pegou o combate, aí findou dizendo:
Namoro com quem vier
E quem me quiser é assim
Pedro disse:
O sujeito quando é ruim
Tudo que faz é à toa.
Arranja às vezes amante
Pra fazer raiva à patroa.
Fica chaleirando a ruim
Que é para dar desgosto a boa.
P- Muito bom. O senhor lembra a primeira cantoria que você foi e memorizou e depois falou?
R- Rapaz, para dizer assim especificamente, não é tão fácil. Mas eu sei que é como lhe disse, foi foi ouvindo esses cantadores lá em casa, nesse terreno que pai tomou conta, não é isso?
P- É isso
R-Quando eu vi, ouvi, admirei, gostei, terminei. Aprendendo muita coisa é.
P- Aí, na hora que ele acabava, já falava.
R- Ah, e depois que eu que eu fiquei adulto, eu fosse a uma cantoria os versos que eu gostasse, eu aprendia. Eu fiz, eu fiz uma coisa em verso que eu mesmo não, nem faria mais faço mais... Foi num mote que eu dei para Mané Filó, para a mim e Mané Filó, que é outro gênio..
Depois da morte do dia, um mote numa linha só. Então nós fizemos o improviso, 10 estrofes e eu gravei a minha e as dele. Aí é difícil aí.
P-O senhor lembra ainda?
R-Lembro.
R- Pode falar para gente?
Porque Tadeu, filho mais velho que eu tenho
É um rapaz letrado, mas muito esquisito. Não se pronuncia, não sai de casa.
Mas ele diz que o que papai fez e decorando, fazendo esses essa versos para a fera daquela, com o juizo impregnado, vê se fazia parecido com ele e fez. Não tem macho no mundo do que faça isso, porque você decorar assim ouvindo na cantoria não é tão difícil, mas você só está decorando um lado, mas você fazendo também, avalia aí você que é poeta dá fé nisso ai.
Dá pra chegar aqui e falar: Eu quero que você faça verso pra Zé de Cazuza, e você aprender os dele e os e os seus. Eu hoje mesmo eu não me atrevia mais.
Tanto que Mané Filó tem uma casa parece em Paulo Afonso, eu convivi muito com ele, cantava mais ele lá. Aí ele morou em Recife. Eu convivi em Recife muito com ele, neste tempo eu era cantador de viola. Eu andei muito com Geraldo Amâncio aí nós tinha feito há poucos versos eu disse que tu sabe aqueles versos que nós fizemos no meu mote- Depois da morte do dia, eu disse, está endoidecendo, é? Eu acho que eu sei isso, ele disse: eu não acredito não.
Começou rolar tempo, eu sentei ele deu risada e disse: Ave Maria, eu nunca pensei numa coisa dessa mas vamos ver se me lembro, eu entrei na frente, e disse:
Na água mais afastada,
Apita um barco a vapor
Vai um ponto Pescador
De uma pequena Jangada
Com a voz entrecortada
Faz prece à virgem Maria,
Quando em forte ventania
Perdida a Jangada ronda.
O mar alevanta a onda
Depois da morte do dia.
Ele disse
:
Numa cerca de aveloz,
Depois do Sol amparado,
O Vagalume, assustado,
Fica testando os faróis.
Os pescadores de anzóis
Embocam na Água Fria
Ficam naquela agonia.
Se uma piaba belisca
Termina a roubando a isca.
Depois da morte do dia
Eu digo:
Nesse momento os roceiros
Deixam o serviço suado
Num recanto de roçado
Do milho, sentindo o cheiro
A ema pisa maneiro
No meio da travessia.
Ao longe, o macauã pia
O Tatu foge da toca
A cascavel sai da loca
Depois da morte do dia
Ele disse:
O Mocho no Tabuleiro
A sua garganta tempera
O Bacurau se penera
Procurando companheiro.
A Cascavel no barceiro
A ponta da presa afia
No cacimbão uma gia
Sentindo a terra no lombo
Larga o martelo no bombo
Depois da morte do dia
Eu digo:
Nessa hora o peregrino
Muda a marcha do andar
Baixa um profundo pesar
Na alma do assassino
Na igreja, um velho sino
Saúda a Virgem Maria
Uma mãe na moradia
Beijo uma filha que preza
Num casebre um velho reza,
Depois da morte do dia
Aí ele disse:
Se encontra um doido arranchado
No tronco de um Juazeiro.
Se a gente lhe der dinheiro
Ele recebe abusado.
Bota num bolso furado
Sem olhar nem a quantia
Pois aquela mixaria
Nada lhe significa
E acordado à noite fica
Depois da morte do dia
Aí eu digo:
Do Vagalume a lanterna
Brilha na mata esquisita
Uma coruja crocita
Nos escombros da caverna
Claudicando de uma perna
Vai um velho em Romaria
Para numa travessia
Da noite sentido medo.
Na solidão do Lajedo
Depois da morte do dia
Ele disse:
No oitão de uma cabana
No aceiro de um roçado
Se encontra um velho sentado
No rebolo de um emburana
Cortando os troncos de cana
Para uma porca que cria
Ouvindo a chocalharia
De uma manada de gado
Regressando do roçado
Depois da morte do dia
P- Viva mestre. Muito bom. Nossa, quando foi que o senhor ganhou o apelido de o homem gravador?
R- Já para essas andanças, e o que o povo ouve de mim, não é? Você vê eu tava sentado ali à tardinha, eu tenho um sítio, eu moro fora, em Recife, meus netos, me chamaram e julguei que fosse eles. Alô, alô, aí a repórter disse: Olhe, eu me chamo Helena, sou repórter e a rede Globo vai trabalhar essa semana com um teste de memória e chegam aos nossos ouvidos que o senhor é um excecional memorialista. É verdade. Eu digo, bom, se essa história andou tanto e que já deve ter um pé, você topa para fazer uma reportagem para testar? “Topo”
“Você vem fazer?” Eu disse: Posso não. Eu posso mandar a Beatriz Castro, você conhece? Eu digo: Já fui entrevistado por ela mais de uma vez, “então posso mandar?” Eu disse: “pode mandar” aí é tanto que eu tem lá um bar em Monteiro que eu gosto de tomar cerveja lá.
Lá chegou uma moça e disse, poeta, muito obrigado, você ficou famoso. Eu disse: “Eu já era” “E já era como?” Eu digo: “Se eu não fosse famoso, como a Globo me achava?” Que eu não fui atrás de Globo, não é?
P- É verdade, é verdade.
R- Esclarecendo a você o que é que eu disse da memória n.
P- E aí esse nome pegou? O homem gravador ?
R- O homem gravador. É o homem gravador. Eu fiz também outra reportagem com nessa mesma linha. Chamava “mestre das artes” Essa foi a melhor que eu achei porque veio com 2 salários.
Eu tenho 3 títulos: O homem gravador, Mestre das artes e agora esse doutorado da cantoria.
P- Doutor Honóris causa, né? Massa demais, mestre. Ia falar, Ia perguntar se o senhor tinha contato com a literatura de cordel?
R- Sim, agora para decorar o que já estava registrado eu nunca gostei, não?
P- Não, mas o senhor ouvia, vendedor de cordel na feira assim?
R- Via, mas eu nunca me importei com isso.
P- Não, se não era muito chegado ?
R- Eu imaginava o que já estava pronto para lá, deixe estar. Eu queria ver era o que o vento estava levando.
P- Ao vivo, né?
R- Claro, sim, aí.
P- Você ia para registrar?
R- O meu registro mais importante, que eu acho, é esse.
P- E o os cantadores na hora que estavam lá e viam você lá, ele ele ficava. Como é que ele ficava?
R- Ele ficava satisfeito não era que ele sabia que depois o povo ia ouvi-los outra vez, né?
P- Aonde que acontecia esses encontros de viola, para quem nunca viu?
R- Era difícil uma feira para não ter cantoria de viola. Cantador de Caruaru, de todo canto ia para aí. É tanto que eu estava ouvindo lá na Bodega do Ariano, que era o ponto de cantoria. Aí Pinto começou um verso:
Se essa vida não passasse
Se ninguém envelhecesse
Chegasse nos vinte anos
E nem subisse e nem descesse.
Aí Pedro,um bebo abusador que tinha, caiu por cima da viola e emendou, disse:
Diga o que é que eu faço agora
Com um féla da puta, desse
P- Nossa. O senhor chegou a conhecer Manuel Xudú?
R- Cheguei, mas eu já vim conhecer Mané Xudú, já era muito antigo... Tinha um cantador em Itaperoá que era um monstro, Elísio Félix, Canhotinho.
P- Canhotinho de Itaperoá?
R- Eu devo dizer, porque ele não traz ele para cáse ele vem nada, ele tem onde cantar lá que está sobrando o convite, ele não vem não, eu penei, vamos lá. Eu disse, eu não vou, não, lá não tem, não tenho, eu não tenho que cantar com esse povo de lá. Ele disse: “ Os daqui é que eu acho que eu não tenho que cantar com eles” Esse cabra era um monstro. Bráulio Tavares, depois, era um rapaz de Campina Grande, intelectual, ele hoje mora hoje, não faz 20 anos que ele mora no Rio. Aí, naquele tempo, eles faziam o festivais do lá do dos cantadores e passavam sob julgamento. Você, por exemplo, se fosse um julgador, aquele era outro e Manél Xudú não fazia questão, fazia dupla com o mais ruim que tivesse, não gostava. Eu perguntei: Você tem troféu, ele disse, me deram um mas eu deixei onde recebi. Eu conheço cantador, Sebastião Dias mesmo. precisava, um carro fretado para levar assim mais. aí botaram nessa vez em Campinas, mais João da Silveira. João era muito famoso, mas não era cantador para a competir com Manoel Xudú. Botaram para fora no primeiro arranque, mas saiu ainda cantaram o Mote.
“Uma estrela nascendo sobre o Monte
E o sino tocando Ave Maria” é do autor do festival de Bráulio Tavares, que eu encontrei porque em São José só via no aniversário de louro, mas ele falou: não vim só no aniversário de Louro. Vim lhe ver para ver se você sabe o que Xudú só cantou um verso daquele meu Monte, vê se à à custa do prodígio da sua memória, se você sabe, eu falei vou recitar para você ver, aí ele chorou, copiou: “Uma estrela nascendo sobre o monte/ E o sino tocando ave maria” é um quadro que Xudú pintou. Xudú disse:
A essa hora é divina muito cara
E merece ser bem considerada.
Se levanta uma nuvem carregada
Que começa turvando a tarde clara
Vê se um cego encostado numa vara
Na mochila, guardando uma bacia,
Rebatendo as esmolas com guia
E dando até a mão ao pé da ponte.
Uma Estrela nascendo sobre o Monte
E o sino tocando Ave Maria
Isso é um quadro, não é ?
P- Bonito demais
R- O cego João Galdino, que era um eterno companheiro dele e lhe dava um valor cego, cantando de Caruaru lhe deram um mote. Saiu o Mote só numa linha também disse: “A Lua falta um pedaço” tem grandeza o céu. O cego disse:
Faltam flores nos enterros
Dos operários comuns
Falta sol em Garanhuns
Falta colégio em Bezerros
Falta quem corrija os erros
Dos improvisos que eu faço,
Falta nó no espinhaço.
De quem nunca levou peia
Falta ladrão na cadeia
A lua falta um pedaço
Era um monstro cego não era?
Cego. João Galdino.
P- Cego, João Galdino, nossa, e o senhor conviveu com Canhotinho de Itaperoá?
Muito, era fã dele. Ainda hoje sou.
Num mote sobre os negros rapaz…
Brasil imenso o Brasil
Que os pretos se cativaram
O choro dos filhos brancos
As mães pretas consolaram
O leite dos filhos pretos
Os filhos brancos mamaram
Ele não assina nem o nome...Canhotinho, um monstro...
P- E tinha muitos poetas negros nessa região?
Não, Itaperoá é perto daqui, mas não é tão perto.
P- Não é perto?
R- É não, mas ele vinha cantar mais o Lourival e abrangias essas cidades todas, Tabira, Itapetim, Tuparetama…
Os versos de Manoel Xudú era mais botando para os cantadores darem nele, vai dar como? Sem poder. Ele queria que desse… Mas como vai dar?
P- E você, já acompanhou o Lourival fazendo algum trocadilho ao vivo?
R- Demais, muitas vezes, deixa eu ver se me lembro de algum. Disse o colega: Eu sou o Dragão do Rio Negro falado. Loro disse:
Para ser dragão estás errado.
Mas Lourival te explica
Tira a letra, apaga a letra,
Bota a letra metrifica,
Apaga o D e o R
Bota o C vê como fica
Um sacana cantando mais ele disse.
Você está cantando um ruim como mulher falsa o seu marido, não tem nada a ver, aí ele disse:
Seu verso foi sem sentido.
A rima má colocada
Hoje foi que eu vim da fé
Que você não canta nada
Que mulher falsa não canta
Mulher falsa é cantada
E ainda Pinto já meio bombardeado finda o verso dizendo:
nunca mais, nunca mais tinha enfrentado um colega em cantoria.
Ele disse:
No Prado da poesia
Eu estava sem parelha
Hoje me vejo o ombreado
Para correr na orelha,
Que as ripas quando são certas
Não dão defeito na Telha
Essa filosofia da gota não é? Ele era um monstro! Raimundo das Floresta dá dois versos de Jó que eu considero uma epopeia esses versos, tanto de um lado como de outro, que Loro era um literato, Jó era leitura como a minha mesmo que aprendeu com o povo, mas eram monstro também. Aí teve esses 2 motes: Não tive amores, sonhei-os/ mas possui-los não pude, aí um fez um e outro fez outro. O Lourival foi nesse mote: Não tive amores, sonhei-os/ Mas possui-los não pude. E o de Jó no mesmo tema: Eu quero seus seios puros/ Nas Conchas das minhas mãos.
Aí Lourival disse:
Entre profundos abalos
E pesadelos medonhos
Sonhos, sonhos e mais sonhos
Sem poder realizá-los
Sentindo na fronte os alos
Nas auras da Juventude
Mas nunca tive a virtude
De dormir entre dois seios,
Não tive amores, sonhei-os
Mas possuí-los não pude
Jó disse:
Esses teus seios pulados
Nossos olhos insultando.
São dois carvões faiscando
No fogão dos meus pecados
São 2 punhais aguçados
Ameaçando os cristãos
Para meus lábios pagãos
São 2 sapotis de maduros.
Eu quero seus seios puros
Nas conchas das minhas mãos
É uma grandeza danada, né?
P-Você chegou a ouvir falar do Zé Limeira?
R- Eu conheci.
P- O senhor conheceu o Zé Limeira é mesmo?
R- Ainda decorei um verso da doidice dele, foi em são josé. Ele disse:
Na viola ou no repente
O que eu fizer ninguém faz.
Meu Padin Ciço dá a vez
Manda expulsar a Satanás,
O que eu já sei não pergunto
Quatro é pouco, cinco é muito,
Seis não dá, sete é demais
Esse tranquado ele lia com a gota serena, era um papel pobre, negro, velho.
Esses pano mais desprezíveis que o povo usava de fazer colchão com palha de bananeira, era roupa dele rapaz.
P- É mesmo?
R- A Aliança aprisionada com a voltinha de ouro. Mas era um panteão negro. Agora Orlando Tejo fez muita ficção ali, como todo escritor faz, não é? Que Zé Limeira não disse tudo aquilo que disse, pelo menos aquilo de pornografia que tudo que ele fala não é que comeu a mulher não tem? você não viu? Ele não fazia aquilo não.
P- Mas ele viajava a pé mesmo, os lugares todos assim, com a viola nas costas?
R- Eu acho que sim porque até os que o que tinham mais recurso viajavam aqui e acolá, quanto mais ele não é?
P- Fazia chover mesmo? Que ele fazia é chover tocando viola, isso era verdade?
R- É nada. Não é o que eu digo, é ficção do escritor.
P- Mas o senhor conheceu ele aonde?
R- Campina Grande.
P- Campina Grande?
R- Vi mais de 100 vezes.
P- Mais de 100 vezes?
R-- Eu digo assim é uma força de expressão, mas eu vi principalmente através do escritor Orlando Tejo e de Canhoto que era doido por ele.
P- O Senhor lembra mais algum verso dele?
R- É não dele, eu me lembro dele, mas já dito por outros. Eu sou inimigo de mentir. Se eu lhe contar uma mentira, pode saber que contaram para mim? Eu não minto, não, para mim o carao é mentiroso não é gente não, não vale um juá podre. Você concorda?
P- Concordo.
R- O cabra andar mentindo para quê? Bem, é verdade. Quer dizer as coisa aqui, chegaram a fazer esse, essa enormidade de coisa que eu lhe dei, se aparece um féla da puta dizendo que é mentira. Você pode dizer sem medo que é mentira sua, porque Zé de Cazuza não mente não.
É mentira sua de já te casou no momento, não é? É verdade. Eu não sou de mentira, não.
P- o senhor tem algum verso sobre a mentira?
Não, mas espera aí, to vendo se me lembrava de outro verso de Zé Limeira:
Canta canta Limeirinha,
Limeirinha do Tauá
(que é onde ele nasceu, nascente do Pajeú)
Tanto faz daqui pra ali
Como daqui pra acolá
(A nega velha chegou com a sexta para comprar os troços da feira) Aí ele disse,
Bela vem chegando aqui,
Mãe de Deus, acuda cá.
Canhoto e Elísio Félix estavam glosando com Palmeira Guimarães, que era outro monstro glosando em Campina Grande. Canhoto chegou, glosando tanto faz sim como não. Aí um cabra disse como tá canhoto? Aí um bosta, estava ouvindo, disse: Ah, o canhoto não sabe ler
Palmeira disse: “isso é conversa rapaz, cabra vai identificar um monstro como Canhoto por saber ou não saber ler? Bora Canhoto, tanto faz sim como não.
Aí ele retratou esse passado principalmente desse PT, desse bando de ladrão. Sim, ele disse:
Com sim ou não se retrata
Da pátria triste de abandono
O sim quer dizer mamata
O não carece de dono
Sim quer dizer carestia
O não a hipocrisia
Desse país de ladrão.
É um xangô de agua ardente
Nem vai pra trás nem pra frente
Tanto faz o sim como não
Deve fazer 70 ou 80 anos que foi feito esse verso da que parece foi hoje né, um adivinhão
P- Você ia muito à Campina Grande?
R- Ia muito, e depois ainda fiquei indo...Por um eterno vereador que havia lá, que era meu amigo do peito, ele e família, Lula Cabral.
P- Lula Cabral...
Fiz até uma homenagem que não era de de ter feito não, que abrange um desconhecimento de Portugal, que eu acho que eu nunca li Portugal. Você quer ouvir?
P- Sim.
R- Aí, Lula, o Lula era muito sem vergonha isso maneira de dizer, intimidade demais comigo, amigo demais de Zé de Cazuza, onde ele passava, era a esteira da luz, que ele mexeu muito com o handebol, mexeu a Europa todinha onde ele passava o povo ouvia o resto da vida. Aí ele disse: Trouxe a delegação portuguesa. Jorge Bento era o comandante, um escritor de ar, Jorge Bento, vereador no Porto, de onde ele era nativo, e Lula, vereador de Campina, onde ele era nativo.
Aí me pediu esse, eu tenho uma preguiça mental danada e não confio bem no que eu sou, não. Aí eu disse, eu queria. Eu digo, eu não faço não, louro, porque eu lá fazer essa merda, sei lá, fazer isso, sou bruto da muléstia faço não.
Mas ele tinha lá um trabalho até meio-dia. Ele passava ao compadre meio-dia em tanta gente, ia almoçar e beber farrear, aí eu fiquei sozinho, matutei e fiz a homenagem, digo a homenagem está boa... Aí eu disse que fiz a homenagem.. “Mas disseste que não sabia e eu não sei se eu sabia, aí recitei Ave Maria está ótima, eu achei quem mais ajudou eu ganhar os 2000 contos da aposentadoria, 2000 contos não, é mais, é 2 salários que eu lhe falei, né? É do.Mestre das artes, pois é vou recitar para vocês, eu já esclareci que o Jorge Bento era de Porto, vereador em Porto, louro de Campina, vereador em Campina. Então eu disse:
O escritor Jorge Bento
Dotado da natureza
Decantou com seu talento,
Colina, rio, represa
Sua obra, um monumento
Só mesmo no cano Bento
Pode haver tanta grandeza.
É ele um dos mais fluentes
Pela caneta de ouro
Inspirado nas enchentes
Do Tejo e do Rio Douro
Do seu Portugal lendário.
Eu me inspirei no Canário
E na casaca de couro
Disse uma musa altaneira
Ninguém mede as dimensões
Conterrâneo de Vieira
Sacrador de Simões,
Que abrilhantaram Lisboa
Como Fernando Pessoa
Guerra, Junqueira e Camões
Seu Portugal lindo e franco
Perdendo sentiu-se a sós
Camilo Castelo Branco,
Bocage, Eça de Queiroz
De falar não se omitiam
Se vivo e se calariam
Para escutar a sua voz
Na prosa com a poesia
Jorge Bento é um aborto.
Se eu pudesse ia pedir
Venda no seu Horto
Por tudo quanto tem ganho,
Talvez um do seu tamanho
não mais aporte em seu porto
Vereadores de agora,
São Jorge, Bento e Cabral,
Lula da Terra dias fora
Jorge dianteiro, quintal.
O da gleba Nordestina
Brilha na grande Campina
Bento brilha em Portugal.
Eu fiquei com vergonha do povo que assistiu essa a reportagem, porque ele não tinha um que soubesse, fazê la, eu pensava que não sabia e botei pra lascar não foi?
P- Foi! Botou pra lascar mesmo...O sogro de de louro o senhor conheceu? António Marinho?
R- Eu conheci e não conheci porque quando eu conheci a trabalha, ele não podia mais cantar.
Ele teve tuberculose, laringe, sim, mas eu sei uns versos dele, ele foi fazer uma cantoria, adjacente à São José, e lá a tosse aperreou e não tava deixando ele cantar , aí o dono da casa, com muita vontade que acontecesse que era cumpadi dele, disse Marinho: “faz um aí com semente de emburana de cheiro, Cumaru e Emburana de cheiro, você conhece? Ele gargarejava, e fazendo esse gargarejo ele fazia a cantoria Aí ele começou o bulir uma viola pra ver se fazia e disse:
Essa Emburana de cheiro
Para a pessoa que masca
Se acaso estiver pigarro
Na garganta desenrasca
Fazem santo do miolo
Eu melhorei com a casca.
Deixa eu ver se me lembro mais um verso dele. Ele disse:
Vim a essa Paraíba
Pra fazer uma cantiga.
Mas amanhã voltarei
Para a minha Terra amiga
A minha saudade é tanta
( Aí a tosse pegou ele, quando passou o sufoco da tosse, ele disse)
Que a tosse não quer que eu diga
Ele cantando em Caruaru, mandaram a elogiar José tatu, tocador de fole. Ele disse,
Mandaram que eu convidasse
O senhor José tatu,
Que é o melhor tocador
Aqui de Caruaru
Existem 3 verdadeiros
Deus, o senhor e enxu
Era um monstro o Antônio Marinho, Pinto fez uma cantoria mas essa eu não sei não, na Prata em 26 mais ele foi a cantoria da gota Serena que ele disse, tem uns versos que ele disse:
Peguei Antônio Marinho
Lá na Prata de Monteiro,
Bom Baião, boa toada
Um verso certo e ligeiro.
Mas nessa noite ele achou
Tampa pro seu tabaqueiro.
Mas depois vai no das dez linhas, Marinheiro tem fama nas dez linhas, Antônio Marinho disse:
De pinto eu não deixo raça,
Galinha morre de engodo,
Vou no ninho boto fogo,
Pinto some na fumaça
O gato morisco passa
Frangos e frangas carrega
O Gavião desagrega
As unhas nos pintos novos
Tejo assoberba os ovos
O galo a raposa pega
Eu acho que eu já estou abusando docêis, já tem coisa que só a gota...
P- Senhor quer parar? Que por nós...
R- Acho que já está bom, já tem coisa que só a gota serena...
P- Eu ia perguntar se o senhor conheceu o Luiz Gonzaga?
R- Conheci, sou muito fã dele, mas nessa linha eu sou fraco, tem uns sujeitos que são...
P- Não, eu digo se o senhor teve algum encontro com ele mesmo?
R- Não, eu não tive nenhum encontro... Eu cheguei a ouvi lo mesmo ao vivo, mas com outras pessoas. Ele veio para Sumé...Ainda não conhecia Zé Marcolino... Zé Marcolino doido para entrar nesse campo e tinha razão porque era um monstro. Aí Victor leite, fã de Zé Marcolino e fã do que Zé Marcolino sabia, ele chegou isso mesmo, pronto é a vez.
Digo assim, aí ele foi ontem de Vitor, do prefeito, chegou lá, ele não deu atenção não é por aí, tem muitos parecendo muitos, muitos cantadores, muitos cantores. Está bom, calou-se...
Aí Victor, Victor era bom, era bruto, que chama Guto. Aí Victor disse, foi lá no homem, eu disse, fui que achou, disse não deu atenção, ele falou é o que homem, pegou o papel, disse: “ Luís Gonzaga, venha ao hotel Independência entrevistar Zé Marcolino e o prefeito de Sumé que sou eu, Victor Leite Rafael
Aí quando ele chegou ali.Vítor apontou os caminho e ele dando verso e carregou logo ele. Daí andaram logo com o para o Rio de Janeiro, para aquele meio do mundo. Zé Marcolino era um gênio, músico de assombrar.
Ave Maria é porque eu não sou músico...
P- Zé, você já sonhou com alguma poesia assim? Dormindo de sonhar mesmo algum verso dormindo?
R- Eu já sonhei, ó rapaz, eu tenho, eu tenho. Pelo menos não é se eu tenho em mente desse desse sonho…
Essa noite eu sonhei
Com a minha Mocidade
Namorei uma morena
Bela igualmente à saudade.
Naquele amor passageiro,
Acordei sentindo cheiro
Dos 18 anos de idade,
só me lembro desse.
P- Pra gente fechar, mestre, eu ia perguntar se o senhor quer contar alguma história que aconteceu na sua vida, alguma coisa que aconteceu com você? E aí você fez uma poesia sobre isso?
R- É meio danado, eu não sei se eu sei disso não.
P- Assim.Teve alguma, algum, algum dia, alguma, alguma coisa que o senhor viveu aí? O senhor fez alguma poesia sobre?
R- Já depois da da minha maturidade, teve a cantoria de viola, que eu nunca pensei em ser cantador. Aí o Jansen Feliz que você vê a reportagem veio ao nordeste a mando da Secretaria de cultura de São Paulo, Paulo, doutor Paulo Pestana nesse tempo era o comandante, aí eu estava em São José de manhã. Eu vi um cara devagarinho. Eu digo mas parece que eu conheço esse cabra, achei que era ele, Jansen era doidinho, mas ave Maria foi Deus que o mandou para aqui, que eu ando trás de uns cantadores. Só conheço Lourival.
Mas rapaz, aí você vai andar comigo. Vou lhe levar para declamar em São Paulo.
Eu digo, eu acho que eu não vou, não, João, eu tenho medo de avião, isso é conversa besta, eu puxei conversa, você vai, mas só tinha vaga para 6 cantadores e ele foi lá 2 a 15 dias eu estou de volta. Aí disse, só tem vaga para 6 e você vai como cantador, não vou nada já se eu nunca cantei na minha vida eu tenho feito festas de boca glosando, mas cantando não, eu disse mas vai, se não é poeta? eu digo, você canta viola ? Não ..E você não é poeta não? Sou, e eu digo, e aí?
Mas eu me saí, Lourival, chegou a dizer o outro cantador que foi iniciado em São Paulo, foi Zé de Cazuza, o cabra anda mais Pinto, Lourival, Pedro Amorim, João severo, tudo fera, mas eu me saí bem como diabo. E Rosa Costa, que era colega dele, era da secretaria, era uma poetisa extraordinária, gente boa.
Acho que essa mulher já morreu desse tempo? Foi, em 70 lá, ela tinha 40 anos. E eu também, como ainda estou vivo, ela eu não sei não….
Aí eu dizendo à Sebastião Dias que ela tinha dito, eu sou mais de fazer minorias os versos, porque pra imortalizar um valor basta uma sextilha, uma trova... Sebastião Dias nos jornais de São Paulo e quando eu li o autor era Rosa Costa. Ela disse:
Nas brancas casas caiadas
Da Terra do sono infindo
As portas vivem fechadas
Os donos todos dormindo.
Agora, uma coisa que ela disse lá, quando nós saímos da apresentação no Paço das Artes que a gente foi à apresentação legítima mesmo era no Guarujá. Você conhece aquilo?
R- Guarujá, sim.
P- Sempre 3 dias lá fazendo, fazendo Apresentações.
Não era o título, era inauguração, “ Inauguração do Cinema Brasileiro em Guarujá” Eu nunca vi uma poetisa ter uma franqueza daquela, o que eu acho uma doidice? Nós saímos do Paço das Artes… Ela abraçada comigo. Ela disse os 2 poetas, mais os 2 poetas mais puros que trouxeram do nordeste, foi Zé de Cazuza e Manel Filó. Na cara dos outros é mesmo, na cara de pinto e Lourival. Gostei não. Mas não fui eu que disse né.
R- O senhor chegou a ver mulher na cantoria, mulher cantadora?
Ouvi um bocado, mas tomei nota. Só tomei nota de uma mocinha, mocinha, até se aprendi algum resto dela que ela disse.
A furíba disse o: se você quer viver bem, se encoste no meu abrigo, ela disse:
Quem se acompanha contigo
Sempre finda vida à toa
Ainda sendo rainha,
Finda perdendo a coroa.
Que mulher passando fome
Não é bonita nem boa
E o outro cabra desafiando ela, disse que ela era só cachaceira e rapariga...
Aí ele disse:
Você disse que eu sou puto
A sua avó foi rapariga
Sua mãe também é puta
Do contrário não me diga.
Se sua neta ganhar feira
Vendendo pé da barriga
Nossa, e se já também estão bater se o universo tudinho, não achar quem souber.
P- O Zé, você começou a acompanhar a cantoria, foi porque anos 30, anos 40 que você começou a ir em cantoria de viola? Anos 30 ou anos 40?
R- Era que era já tinha 10, 12 anos, não era?
P- 12 anos, então 40, não é?
P- De lá para cá, o que que você sentiu que mudou no mundo da cantoria?
R- Não mudou por conta da evolução. Apareceram mais cantadores apareceram.
João Paraibano, Sebastião Dias. É tudo cantador novato para vista do dos que eu abordei primeiro, né?
P- E os novatos são bons como os primeiros?
R- São nada oxe,, cantoria vai se acabar é, né. Eu não quero, porque se eu disser isso gravando , se souber que fui eu que disse, aí pronto É não, melhor não.
R- Mas eu conheço Afonso , Afonso pequeno e Lazo pessoa do dos de hoje. São uma pareia muito boa e tem poucos. Pois tem Zé Cardoso, Cardoso andam doente.
Diabete, morreu como o diabo. Ô pai, morreu, morreu ultimamente, morreu.
Na região potiguar Onésimo Maia, ele disse:
Quando falta verso em mim
Falta força em elefante
Caatinga em tambor de pemba
Sebo em faca de marchante
Visita em casa de corno
Entojo em mulher gestante
Era monstro ou não era? Morreu com 40 anos de idade.
Outro encostado em Recife era Zé Galdino Essa transverso dele, que eu acho que faz me lembrar o nome Zé Galdino cantava bom e bonito que só a gota, câncer matou também
Então ele disse, ele disse, ele sai do Mote. Ele disse
Não há nada do mundo que consiga
Me fazer esquecer mamãe cantando.
Com o filho no colo amamentando
E com outro gerado na barriga
Consolando o do colo com cantiga
Ajeitando o do ventre com cuidado
O do colo aguardando o batizado
O do ventre esperando para nascer.
Não há nada que faça para esquecer
Do lugar que nasci e fui criado
.Era um monstro, Zé Galdino.
P- O Senhor conheceu O Mestre Bule Bule?
Conheci muito, uma figura folclórica não é daquele não é um cantador de viola legítimo Quem vai dizer? Eu mesmo não sei verso dele
P- E o Ariano Suassuna o Ariano Suassuna chegou a te conhecer?
R- Demais. Mas Ariano era poeta, era escritor, né?
P- Escritor mas ele te visitou assim? Ele chegou a tomar conhecimento dessa pessoa?
R- Tomou porque ele era muito amigo dos batistas e Dimas morou em Recife e ia na casa dele direto. Tem até uma passagem engraçada que ele foi chamado mais uma vez para fazer uma entrevista no Palácio do governo. Ele nasceu no Palácio que o pai dele foi, foi governador e a mãe dele descansou lá no Palácio. Aí ele chegou. Não gostava de gravata. Aí o funcionário do Palácio disse, não pode entrar aqui sem gravata não, doutor Ariano. Aí ele disse, foi danado.Primeira vez que eu entrei nesse Palácio foi nu, hoje não posso entrar sem gravata.
Aí disseram : Bota Ariano para dentro era grande Ariano.
Não que massa.
P Quem me recomendou vim aqui te conhecer foi o Lirinha. Você lembra como o Lirinha chegou aqui? Como foi que?
R- Aquele sacana eu conheço de menino aquilo ele é um gênio, mas me abandonou. Aquele sacana, até eu tava doido para ver, para ver se ele era um negócio antigo, mas eu queria, vou te contar quando eu tava com o Paiol de livro do lado livrinha vendeu muito livro meu. Aí 11 sujeito que é casado com a prima dele, comprou me.13 livros, fiado a 50 conto enganou, ele pode pagar até em 2 lojas. Eu estava conversando com um coronel da polícia, que é meu primo, meu amigo e 11 juiz de direito, que é amigo, e o doutor Fernando de tabira. Ele disseram, você cobra esse esse dinheiro, mas já faz mais de 10 anos.Se esse cabra não quiser pagar, eu vou mandar uma ordem para ele pagar. Eu quero ver porque ele não paga, mas eu disse.
Eu queria receber, não vendi, uma nora minha, comprou um livro dess, por 300 conto, acaba disso. Eu tenho 2, já comprei terceiros, estou lhe vendendo esse por 300, outro só vendo por 500. Eu vendia 50 BRL e ele me enganou e levou13 livros...
P- O livro seu mesmo?
R-Sim. Quando eu ver Lirinha, eu vou ver se ele dá uma intenção para esse cabra pagar esse livro a 100 conto e ainda é dado.
P- O que você achou de contar essa história?
R- Achei bom,mas vocês devem ter achado melhor, porque essa entrevista que eu dei não, não se encontra em nenhum canto.
P- Com certeza ! Mestre quer falar uma poesia sua para para finalizar, mas sua mesmo sua, sua, uma ou quantas o senhor quiser, para a gente deixar para a eternidade.
R- Aqui no Pajeú teve muita mulher bonita.
Essa minha velha é de lá também, ficou feia porque ela tem 90 anos. Aí eu fiz uns versos, com uma das bonitas, que é lá que eu namorei com ela. Eu disse, lá na Capela de António Gomes, eu vinha no ônibus velho cantando de repente para mim mesmo.
Quando eu avistei a Capela, fiz o verso:
Eu já namorei com Dida
No oitão dessa Capela
Quando foi inaugurada
Mostrando a Santa Bela
Mas qual era mais bonita,
Se era Santa ou se era ela
Vou ser bem. Aí fiz Dida dizendo uma vez:
Fui Bela só não fui alta
Agora chorando a falta
Que a Mocidade me fez
Vestido liso xadrez
Não me faz andar decente
Deixei até de usar pente
Na cabeleira tingida
Devia ser devolvida
A Mocidade da gente
Meu corpo desidratado
Não hidrata nem com soro
Essa história de namoro
É figura do passado,
Quando o meu rosto engomado
Como pano em ferro quente
Meu passado e meu presente,
Um agrada outro intimida
Devia ser devolvida
A Mocidade da gente
De muitas festas fui fã
Cada uma um namorado.
Com o meu rosto corado
Como casca de romã
Ou às tintas da manhã
No janelão do nascente.
Hoje sou o Sol do poente.
Com a luz enfraquecida,
Devia ser devolvida.
A mocidade da gente,
Essa linda criatura
Que teve beleza imensa.
Nem Rosário de Florença
Teve tanta formosura
A mais linda dentadura
que eu já vi num vivente
falta jaspe em cada dente
quase tudo enfraquecida.
Devia ser devolvida
A mocidade da gente
Feito o seu pedido.
Obrigado, mestre.
O senhor autoriza?
Essa história a ser é exibida e divulgada no museu da pessoa.
Pode porque não? Que a maioria já estão no livro, né? Sim, o mundo já viu, né?
Já viu agora A Entrevista todinha pode ir para o museu da pessoa, né? Pode.
Pode.
Muito obrigado, viu?
Recolher