Memória Vale do Rio Doce
Depoimento de Luiz Antonio de Godoy
Entrevistado por José Carlos Vilardaga, Rosana Miziara e Ana Paula Bastos
Código: CVRD_HV049
Rio de Janeiro, 14/06/2000 (parte 1) 20/07/2000 (parte 2)
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Jeane Gonçalves e Elaine de Souza Zanolo
Revisado por Leonardo Sousa e Joice Yumi Matsunaga
P1 – Vou começar perguntando seu nome, local e data de nascimento.
R – Luiz com “Z”, Antonio sem acento, de Godoy com “Y”, Alves. Nascimento: 29 de março de 1945, uma quinta-feira santa, nascido na rua da Lapa e, em seguida, fui morar na Urca.
P1 – Seus pais são do Rio de Janeiro também?
R – Papai era carioca. Papai nasceu no Rio e mamãe nasceu, na verdade, na cidade de divisa no Espírito Santo com dois dias e foi morar em Carangola, onde morou até os vinte e um anos. Mamãe casou-se a primeira vez e ficou viúva e, quando o meu avô morreu, a família toda veio para o Rio de Janeiro, porque a minha tia mais velha trouxe a minha avó e mais dois, três, quatro, cinco filhos para viver no Rio de Janeiro.
P2 – A origem da família...
R – A minha? Você quer saber do quê? De pai, de mãe, avô?
P2 – Isso.
R – Bom, a origem é a seguinte: a origem do nosso Godoy, o nome Godoy é um nome materno, mas exatamente para ser um nome forte, foi um nome que pegou. Se alguém me chamar de Luiz Antonio, eu vou achar ou que é gente da minha casa ou um sujeito que não me conhece, porque a vida toda eu fui conhecido como Godoy, no colégio, na escola, na faculdade, na Vale, nos lugares onde eu trabalhei, sempre foi Godoy. Godoy é de origem espanhola. Quanto à história, aliás, ontem eu estava pedindo para um jornalista do Espírito Santo, Vladmir Godoy, ele tem um estudo da genealogia da família e, então, vai me mandar. Mas, basicamente, eu soube o seguinte: nós somos descendentes de Ponce de Leão e havia..., tem duas versões, uma dizia que era um general espanhol e o outro dizia...
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Depoimento de Luiz Antonio de Godoy
Entrevistado por José Carlos Vilardaga, Rosana Miziara e Ana Paula Bastos
Código: CVRD_HV049
Rio de Janeiro, 14/06/2000 (parte 1) 20/07/2000 (parte 2)
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Jeane Gonçalves e Elaine de Souza Zanolo
Revisado por Leonardo Sousa e Joice Yumi Matsunaga
P1 – Vou começar perguntando seu nome, local e data de nascimento.
R – Luiz com “Z”, Antonio sem acento, de Godoy com “Y”, Alves. Nascimento: 29 de março de 1945, uma quinta-feira santa, nascido na rua da Lapa e, em seguida, fui morar na Urca.
P1 – Seus pais são do Rio de Janeiro também?
R – Papai era carioca. Papai nasceu no Rio e mamãe nasceu, na verdade, na cidade de divisa no Espírito Santo com dois dias e foi morar em Carangola, onde morou até os vinte e um anos. Mamãe casou-se a primeira vez e ficou viúva e, quando o meu avô morreu, a família toda veio para o Rio de Janeiro, porque a minha tia mais velha trouxe a minha avó e mais dois, três, quatro, cinco filhos para viver no Rio de Janeiro.
P2 – A origem da família...
R – A minha? Você quer saber do quê? De pai, de mãe, avô?
P2 – Isso.
R – Bom, a origem é a seguinte: a origem do nosso Godoy, o nome Godoy é um nome materno, mas exatamente para ser um nome forte, foi um nome que pegou. Se alguém me chamar de Luiz Antonio, eu vou achar ou que é gente da minha casa ou um sujeito que não me conhece, porque a vida toda eu fui conhecido como Godoy, no colégio, na escola, na faculdade, na Vale, nos lugares onde eu trabalhei, sempre foi Godoy. Godoy é de origem espanhola. Quanto à história, aliás, ontem eu estava pedindo para um jornalista do Espírito Santo, Vladmir Godoy, ele tem um estudo da genealogia da família e, então, vai me mandar. Mas, basicamente, eu soube o seguinte: nós somos descendentes de Ponce de Leão e havia..., tem duas versões, uma dizia que era um general espanhol e o outro dizia que era um príncipe espanhol – eu acho que isso já deve ser fantasia de algum ramo da família mais vaidoso. Aliás, Godoy é um ramo vaidoso, eu não conheço um Godoy que não seja vaidoso. Eu comecei a constar essa falha de comportamento depois de quatro anos de análise. Hoje, eu trabalho legal essa questão de vaidade que, na verdade, eu acho que é um grande mal do ser humano. Ele é muito pior do que a inveja, ele é muito pior do que os outros defeitos e vícios ou pecados entre aspas. Porque a vaidade, é ela que mobiliza e movimenta tudo de negativo para o ser humano. Vocês viram o filme Advogado do Diabo, tá aí, é quilo, o diabo, o capeta, aliás, vocês sabem qual a diferença entre o diabo e o capeta?
P1 – Não.
R – Isso aí foi uma frase que um dia eu tinha tomado uns dois rápido e estava brilhante naquele dia: “Capeta é o diabo que deu certo”, entenderam? Então, o diabo tem sempre esse lado negativo e o capeta não. O capeta... é um capeta, garotinho esperto, alegre, brincalhão. Agora, não, “o cara é um diabo”, o cara é ruim. (risos) O capeta é um diabo que deu certo. Mas a gente estava falando isso por causa do quê?
P2 – Da vaidade...
R – Tá certo, por causa da vaidade, muito bem. Resgatando: era um espanhol, na verdade, a origem no Brasil era três espanhóis, três irmãos, tanto que dizem que a família Godoy era só um, Godoy com ‘Y’, porque tem Godoi com ‘I’ e acento no ‘O’. Um dos Godoy, ele foi para Pernambuco e seguiu até o Amazonas, em Manaus, tanto que existe um grande números de Godoy’s em Recife e Manaus. O outro Godoy foi para Porto Alegre e veio até São Paulo – você encontra muito Godoy aqui em São Paulo e em Porto Alegre. O Outro ramo do qual eu sou descendente é o ramo que foi para Minas Gerais. Ele foi naquela rota de Espírito Santo e Rio de Janeiro, que é o ramo ao qual eu pertenço. Eu conheço a história a partir do meu bisavô que chamava Antonio Justiniano Monteiro de Godoy. Esse homem foi impossível, esse homem foi impossível...
P2 – Qual era a profissão dele?
R – Eu não sei, acho que ele era marqueteiro, ele era comerciante, ele era fazendeiro. Para você ter uma ideia, eu já abri vários livros, escrituras da Vale do Rio Doce com ele, “Senhor Antonio Justiniano Monteiro de Godoy...”, vendendo e comprando terras para Vale do Rio Doce. Enfim, ele era um homem muito rico, muito rico e ele teve várias mulheres, por isso que tem muito Godoy ali no Estado do Rio, no Espírito Santo e Minas Gerais.
P2 – Um em cada cidade.
R – É. E a minha bisavó foi com quem ele ficou a grande parte da vida dele. Não sei nem se casaram de papel passado, a minha tia dizia que sim, mas uma outra dizia que não. (risos)
P2 – História mal resolvida.
R – Mal resolvida, mal resolvida. Tanto que outro dia eu encontrei um Godoy, aí ele disse assim: “Ah, você também é Godoy?”. Eu falei: “Sou”. “Você é de onde?” “A minha família é de Minas.” Eu falei: “A minha também. Mas será que a gente é parente? Como era o nome do seu bisavô?”. (risos) Para você identificar se é meu parente ou não, perguntar o nome do bisavô, se for Antonio Justiniano, parentão. (risos) Mas, então, o Antonio Justiniano que é uma figuraça, mas foi muito rico, para você ter uma ideia, eu vi um inventário, quando ele morreu, deixou tudo para minha bisavó, lá em Carangola e eu vi o inventário, a lista de bens é uma coisa de maluco. E anos depois da morte dele foi descoberto um novo imóvel dele e a gente foi verificar, então, abrimos sobre a partilha – que é um procedimento judicial para você partilhar os bens que você não teria partilhado no inventário inicial –, era um benzinho último que foi achado, eram dezenove mil alqueires de terra na cidade de Aimorés, ou seja, a cidade de Aimorés, era todo o município, era dele, era chamado Fazenda do Capim. A gente sempre brincava lá em casa: “Pô, ainda vou pastar nesse capim”. Mas até hoje nada, porque é uma ação que rola há quinhentos anos, é uma ação porque tem muito posseiro, você vai lá, Banco do Brasil, o terreno do Banco do Brasil, posseiro, invasor, tem tudo.
P2 – O município está em cima.
R – É, o município todo de Aimorés era, dezenove mil alqueires, é terra que não acaba mais. Mas enfim, esse é o lado engraçado da minha origem por parte de mãe, começa com o meu bisavô, depois teve o meu avô. O meu avô, ele era – como era o nome dessa profissão? – não era mateiro, ele era tropeiro, ele era tropeiro e ganhou muito dinheiro com isso também e depois foi fazendeiro de café e perdeu tudo na crise grande, acho que de 1929, né. Ele perdeu tudo e morreu em seguida. Deixou alguns bens lá em Carangola, mas depois vovó...
P1 – Ele morreu por conta da crise?
R – Ah foi, foi. Então, depois que ele morreu, vieram todos aqui para o Rio de Janeiro. Por parte do pai também tem umas figuras engraçadíssimas, porque o meu avô era português – vô Albano. E o meu avô tinha uma característica fantástica – parece até brincadeira – ele era português e era inventor, é!!! (risos) Português inventor, é uma piada: “Porra, o cara era português e ainda era inventor”. (risos) E, na verdade, ele inventou uma plataforma para submarinos na guerra e ofereceu essa invenção inclusive no Ministério da Marinha, e esta invenção foi roubada dele e utilizada pelos alemães na Segunda Guerra. Eu tenho todas as plantas ainda, então é um negócio fantástico, né, meu avô era um português muito bom, meu avô era um cara que eu lembro dele assim com um carinho, sabe? Era uma figura, era um português elegante, ele tinha uma barba, tinha uma bengala bonita, era um cara bonito. Ele gostava muito de mim, ia sempre almoçar lá em casa aos domingos. Mas vovô era assim muito carinhoso, aliás, era a grande característica dos meus ascendentes paternos, o carinho. E o vovô era tão bom que faliu umas três vezes, porque ele vendia fiado, como todo bom português, ele tinha armazém, né? Ele faliu três vezes porque ele vendia fiado. Isso é uma realidade: português que vende fiado, fale. (risos) Mas o vovô era tão engraçado, porque o vovô era um intelectual e um anarquista, vovô era anarquista. Pra você ter uma ideia, ele não era maluco não, mas ele ia para Praça da Bandeira, ele andava muito alinhado, mas quando ele resolvia fazer discurso em praça pública – ele ia para fazer discurso em praça pública, contra os políticos, contra os safados e tal –, ia para praça pública de fraque, não fraque aquele comprido, um meio fraque, alinhadíssimo para..., não, mas sabe o que ele dizia? Que isso era respeito ao povo, “Para se falar com o povo tem que se estar muito bem vestido porque é necessário respeito ao povo em tudo e com tudo”. Então, é uma coisa importante que eu guardei dele, essa questão do respeito e a forma de se vestir, a elegância do meu avô, meu avô era realmente...
P1 – Mas ele ia na praça e começava a falar, ele ia na praça e começava a fazer discurso?
R – Por exemplo, aconteceu ontem aquela tragédia, anteontem no Rio de Janeiro, quer dizer, aquele momento teria dele um discurso em praça pública contra as autoridades, a forma incompetente da ação, enfim, todo o relaxamento das autoridades na questão da segurança, no país como um todo, a partir do Presidente da República, vem falar que é inaceitável, está aí há seis anos! O que que ele fez?, né. Bom, então o meu avô tinha essa grande característica, um homem bom, inteligente... Ah! Vovô tinha um negócio fantástico! Sabe qual é a grande coluna do jornal que ele lia? Só a área internacional, porque ele dizia para mim também o seguinte: "Meu filhos, nada que acontece vem daqui, vem tudo de fora". E é verdade, a gente sabe que as repercussões no país são todas elas de fatos básicos que são gerados lá fora. Minha avó não, minha avó, essa avó paterna, mulher do avô Albano, chama-se vovó Laurinda. Vovó Laurinda era de uma família muito rica, era da família Abrunhosa, eram portugueses muito ricos, tinha até uma casa, uma sapataria no Rio de Janeiro, uma sapataria famosa, antiga, hoje eu nem sei que fim levou. Mas vovó era uma pessoa muito simples, muito tranquila, muito caladinha, mas também muito carinhosa. Então, a marca dos meus pais, da origem da família paterna era o carinho e a profunda inteligência do meu avô e do meu pai. Toda vez que eu lembro do velho, eu estava falando hoje para você, às vezes eu me emociono. Papai foi o cara mais brilhante que eu conheci na minha vida, acho que para agora e para baixo a curva vai ser descendente, porque é impressionante a capacidade, o brilho, eu tiro assim a percepção dele, tudo o que eu fiz na vida e o que eu escrevi, quando ele botava o dedo ali, melhor parte do discurso foi obra dele. Era impressionante, dava assim um toque, sabe, uma palavra, uma vírgula, era impressionante! Papai não ligava muito para a aparência, o homem era a imagem da simplicidade, eu achava até às vezes uma esculhambação, falava: "Orra, pai você está muito esculhambado, cara se toca". (risos) Já mamãe não. Mamãe, eu diria o seguinte: papai era assim, era a faixa, o lado da descontração, da simplicidade, da inteligência brilhante, da cultura, um homem culto; mamãe: era o lado da praticidade. Papai era profundamente pouco prático, ou seja, era uma dificuldade para ele tomar qualquer decisão ou fazer qualquer coisa que necessitasse de ação.
P1 – Uma atividade maior.
R – É, de ação. A atividade dele era intelectual. Já a mamãe não. A mamãe era prática, ativa, safa, pique, resolvia tudo. Mamãe em termos de negócio era o homem da casa. Papai nunca comprou nada, papai só elocubrava: "Orra, vou comprar uns terrenos na Barra. Essa Barra ainda vai ser um negócio do capeta". Pergunta se comprou algum, nunca. "Brasília, olha, esses terrenos aí do lado desse lago vão dar um bom resultado." Pergunta se comprou, zero. (risos) A única coisa que ele comprou foi um terreno em Itaipuaçú ruim, que foi uma dificuldade que me sobrou de herança, porque eu tive uma dificuldade para vender aquela desgraça. (risos) Olha, você quer ver, papai era tão engraçado, tão desligado nas coisas, tão desligado. Quando ele morreu – era muito engraçado, o papai – quando ele morreu, ele sempre fez seguro de vida, porque ele sempre: "Porque, quando eu morrer, eu vou deixar para você uma fortuna e tal...". Ele morreu, aí tinha o seguro dele, aí eu fui ver o seguro, na época, era o quê? Mil reais, quê mil reais, era cem ou duzentos em termos de dinheiro, porque ele esqueceu de pagar a seguradora. Eu falava, eu convidei a minha mulher para jantar e eu falei assim: "vamos queimar mais uma herança". (risos) Porque durante a vida eu recebi muitas heranças: mamãe morreu, deixou alguma coisa; minha avó morreu, deixou; minha tia morreu, deixou; a minha outra tia morreu... todas eram solteironas e eu era o sobrinho querido, então ia levando tudo. E já queimei elas todas. (risos) Porque dinheiro, dinheiro para mim é uma coisa muito legal para você usar e sem muita complicação. Lá em casa, inclusive, era uma frase que a minha mãe usava, era assim: "Meu filho, não se preocupe" – porque papai era muito preocupado, sabe? "Mas, henriqueta, como é que nós vamos fazer isso, nós não temos dinheiro." Mamãe falava: "Paulo, não se preocupe, dinheiro aparece". E sempre apareceu. Era um salário extra que ele ganhava, era uma ação que ele tinha, era uma gratificação que a mamãe ganhava, era um parente que morria, uma herança que pintava, enfim, sempre apareceu. Mas a gente nunca teve preocupação com dinheiro. Eu estou falando muito, né.
P1 – Não, está ótimo. Como é que eles se conheceram, seu pai e a sua mãe?
R – Papai e mamãe, eu te falei, né, a mamãe ficou viúva e veio para o Rio de Janeiro morar. Quando ela veio morar no Rio de Janeiro, ela conseguiu um emprego no IBGE e papai já era do IBGE, então eles se conheceram no IBGE e namoraram, casaram em seguida. Eles casaram em 1944, eu nasci logo em 1945.
P1 – Você morou, em que bairro era a sua casa de infância?
R – Urca.
P1 – Você lembra da Urca desse período?
R – Ah... Eu sou Urca. Eu sou Urca, eu sou Vale, eu sou as coisas que me marcaram, eu sou Zaccaria. Agora, a Urca, a Urca eu me lembro um garoto correndo na Urca jogando futebol de praia, pescando siri, mergulhando, assustando macaca. Sabe o que é assustar a macaca? Antigamente as empregadas, normalmente as empregadas eram pretas, então a gente chamava de pegar a macaca, pegar a crioula, empregada. Porque naquela época era uma dificuldade, não era essa moleza que vocês têm não, de todo mundo transa pra lá, transa pra cá. Pra você pegar uma mulherzinha era um negócio complicado, meu amigo. Então a gente trabalhava o negócio na base das empregadas. (risos) Bom, isso são os detalhes sórdidos. Mas a Urca era um negócio tão fantástico, tão bonita sabe. Eu chamo, eu chamava, depois que eu saí da Urca, eu saí da Urca eu tinha trinta, casei com vinte e quatro, não, saí da Urca com vinte e oito anos, mas eu vivi toda a minha vida, minha infância, a minha juventude, depois de casado, a minha primeira filha ainda nasceu na Urca.
P1 – Mas sempre na mesma casa você esteve?
R – Não. Eu morei primeiro num apartamento e depois eu morei numa casa, foram os dois lugares que eu morei, mas sempre na Urca. A Urca me traz lembranças fantásticas de coisas boas. Sabe, eu não lembro de coisas ruins na Urca. A única coisa ruim foi que a minha mãe ficou doente, começou a ficar doente na Urca, então isso realmente me incomodou, tanto que a gente se mudou desse apartamento porque ela sofreu muito. Ela começou a ficar doente quando eu tinha dezoito anos e ela morreu quando eu tinha vinte e dois, então foi um tempo muito difícil para mim, e foi o tempo que eu mais valorizei o meu pai, pelo companheiro que ele foi. Duvido que um homem tivesse a grandeza, o respeito que eu tenho pelo meu pai, em tudo, por tudo, mas nesse tratamento que ele teve com a minha mãe, orra, ele foi incansável, realmente uma prova de amor. Mas eu estava falando... é que eu viajo, eu viajo nisso aí.
P1/2 – Está ótimo. Na Urca.
R – É isso mesmo. Da Urca, se eu for falar da Urca a gente não sai daqui hoje. Mas a Urca tem tudo a ver comigo. Você já escalou morro, você já teve casa no morro, em cima de árvore? Eu tinha, a minha patota, a minha turma, a gente tinha casa no morro, então a gente escalava aquele morro ali e a gente fazia casa nas árvores, brincava de Tarzan, né. A gente tinha mania de ser poderoso. E era muito engraçado, porque a gente escalava e eu ficava pensando, já depois de casado com filho pequeno, eu dizia: "Meu Deus, quanta caca eu fiz, imagina se o meu pai soubesse de um negócio desse, escalando um morro, rapaz" – aquilo ali para você descer e morrer é mole, e a gente subia e descia daquele morro como se transitasse numa rua; a gente jogava futebol de praia, a gente pegava jacaré – porque na nossa época não tinha esse negócio de prancha, era no peito mesmo. Aliás, esse negócio de jacaré, eu me lembro de uma queda, que eu acho que isso foi Deus, sabe: estava uma temporada de ressaca e a praia do Forte, porque o pessoal lá da Urca, a gente frequentava a praia da Urca na semana e nos finais de semana, como vinha a Saquaremada toda para Urca, a gente ia para praia do Forte e lá só entrava gente que tinha carteirinha e tal, basicamente gente da Urca e os milicos. Nesse dia estava uma ressaca muito forte, nessa praia de fora, o mar era realmente muito forte lá, chamava-se Praia Forte, e eu peguei uma onda de mal jeito e a onda fez assim comigo, me jogou e eu pá, eu bati chapado de costas na areia, fui lançado, eu parei: “Deixa eu ver se está tudo bem”. Eu estava intacto, perfeito. É porque eu bati assim (batida da palma da mão) direitinho, certinho, ajustadinho, alguém me segurou ali né. E foi um negócio engraçado que nesse dia eu perdi a primeira medalha de Santo Antônio que a minha madrinha tinha me dado. Mamãe era muito devota de Santo Antônio, tanto que eu sou um cara consagrado a Santo Antônio, não é brincadeira não, eu sou consagrado, quer dizer, Tonico é meu padrinho, quer dizer, tem um lance de intimidade aí que pouca gente tem com ele que eu tenho e mamãe me consagrou a Santo Antônio, foi um padre lá em casa, o padre me abençoou, me falou algumas coisas aí. Eu sei que eu sou um cara que sempre teve muita sorte na vida, só tenho a agradecer a vida que eu tenho, eu acho que eu sou privilegiado e um abençoado em tudo, sabe? Por ser como eu sou, pela família que tenho, pelos amigos que tenho, pelas coisas que faço. E agora, por exemplo, você sabe que uma das coisas que me deixou muito feliz foi estar fazendo isso aqui hoje, porque eu acho que o maior reconhecimento que eu tive na Vale do Rio Doce. Eu, inclusive, iria agradecer ao Jorio, liguei pra Karen para agradecer a ela e tem maiores detalhes, depois eu recebi a carta do Jorio. Eu vou agradecer a ele também, porque afinal de contas eu sei que foi um grupo muito restrito para fazer isso. Eu acho que sinceramente eu tenho uma história na Vale, acho que eu tenho uma história e uma história bonita, inclusive, com fatos e marcas de toda a natureza, seja como advogado, seja como...
P1 – Teve uma trajetória bem diversa...
R – É, uma trajetória interessante, é diferenciada. Uma vez, quando eu falei para pessoa, o cara disse: “Porra, ou você é muito complicado ou é muito bom”. Eu falei: “Pode ter certeza que eu sou muito bom”. (risos) Aliás, com esse negócio de muito bom, aconteceu um negócio engraçado outro dia: o embaixador, foi agora recente, o embaixador me chamou com um ar severo e falou assim: “Godoy, você está com uma grande responsabilidade”. Eu falei: “Pô, por que grande responsabilidade? Qual que é?” Aí ele falou… é o Felipe, Felipe só fala comigo assim “ qual que é?”.
P1 – Aí você já virou para o embaixador: “Qual que é?” (risos)
R – É. “Qual que é”. Aí ele falou assim: “Você foi o único, dos onze mil empregados da Vale do Rio Doce que tirou nota dez na avaliação de desempenho”. Eu falei: “Legal, gostei”. (risos) Aí ele, deu a segunda: “Pois é, isso aqui fica entre nós, eu fui chamado até por algumas pessoas para saber se era isso. Eu disse: “Não, é isso mesmo”. Ele: “Eu acho ele dez naquilo que ele faz e não só ele não, outras pessoas acham isso também.” Eu virei para ele, eu falei: “Fernando, você vê que coisa engraçada, né. Eu acho que eu fui muito bem avaliado, claro que eu devo ter as minhas deficiências, mas pela ótica que você está colocando, eu acho que para a Fundação Vale do Rio Doce eu tenho sido dez mesmo. Mas você não fique preocupado não”. Ele disse: “Por quê?”. “Eu sou dez há muito tempo.” (risos) Ele falou: “ Porra Godoy!”. “Não, eu vou até te mostrar uma coisa interessante, porque Deus não faz as coisas assim de graça não. Quando eu entrei pra Vale ele já fez uma coisa pensando nesse dia de hoje.” Ele falou: “O que é que foi?”. “Quando eu entrei, Fernando, o sujeito que fez a minha avaliação, ele também me deu dez, ele botou assim: ‘O candidato pelos conhecimentos demonstrados e pela sua – não sei o que mais que ele escreveu, foi um elogio qualquer – merece certamente a nota 10’”. Aí eu peguei aquele documento: “Está vendo Fernando? Eu sou dez desde que eu entrei aqui. Só que as pessoas não tinham prestado muita atenção”. (risos)
P1 – Você tem esse documento? Isso é legal.
R – Claro que tenho. Eu achei esse documento, sabe que esse documento inclusive me deu tempo de serviço que eu estava requerendo no INSS e não conseguia. Sabe que documento é esse? A minha proposta de emprego na Vale do Rio Doce. Eu estava querendo um tempo de estágio nesse escritório do Cantidiano e outros escritórios e eu não tinha como comprovar, porque os escritórios já tinham fechado, desapareceram tal, aí eu fui ver na minha proposta de emprego, a minha declaração. Porra, eu não iria inventar, em 1970, que eu tinha trabalhado num escritório para fazer prova no INSS. Aí os caras, porra, viram aquele negócio, me deram três anos que eu estava precisando de tempo de estágio graças a esse documento.
P2 – Graças a esse documento. Esse documento é legal.
P1 – Eu anotei para cobrar.
R – Eu ainda comentei com o Fernando: “Fernando, não fica preocupado, desde garotinho é que eu sou assim. Eu sou especial mesmo”. Ele falou assim: “Porra, Godoy!”. Aí eu falei da Urca, me lembrei da Urca. Na Urca, uma vez, no colégio que era o Colégio Cristo Redentor – esse colégio era o colégio de elite, não só da Urca, mas da região toda. Todo o aluno desse colégio passava em qualquer concurso de admissão, não teve um aluno desse colégio que não passasse direto: Zaccaria, Santo Inácio, Anglo-Americano. Saia dali direto pulando ano, porque o ensino era porreta mesmo.
P2 – Existe ainda?
R – Fechou. Fechou agora, fiquei com muita pena. Eram duas irmãs do Espírito Santo, Braga Furtado, Dona Ivone e Dona Iolanda. Eles administravam, eram realmente educadores, não eram simples professores, eram educadores. Eu entendo que a escola é exatamente a continuação da casa da gente com educadores, coisa que a gente não tem mais. Isso que é a grande perda da educação como um todo. Mas, eu me lembro que num Dia da Mães eu cheguei todo orgulhoso em casa, porque eu fui o único aluno no colégio que tinha tirado a medalha especial do Dia das Mães. Então, foi um negócio que me marcou. Eu, inclusive, quando me casei, não, quando eu comecei a namorar a minha mulher, eu tinha essa medalha – essa medalha ainda deve existir – eu peguei essa medalha e dei para minha mulher, dizia assim: “Pela brava resistência demonstrada. Pela bravura demonstrada em me aguentar durante tanto tempo”. Isso a gente tinha um ano, imagina hoje! Hoje, eu tinha que mandar um troféu. (risos)
P2 – Haja medalha!
R – Mandar uma sala de troféu. (risos) Então, eu brinquei com o embaixador: “Não te preocupa não, tenho esse negócio desde garotinho. Agora, se você quiser saber bem, desde que eu entrei aqui, eu sou nota dez”. Ele riu muito, mas eu mostrei o documento para ele. E foi uma coincidência legal, legal. E tudo isso tem acontecido nesse ano, esse ano tem sido um ano muito bom para mim, é o ano do reconhecimento. Desses anos todos, confesso que eu fui muito sacaneado nas decisões finais, ou seja, quando eu iria assumir um posto de comando, não me botaram. Eu falei: “Porra, alguma coisa de errado está acontecendo comigo, porque que eu não posso ser o comandante do processo”. Diz a minha mulher, isso aí eu acho que pode até ter um lado desse, mas eu acho que não, eu acho que isso aí foi de repente a trajetória que não foi feliz do tamanho que eu gostaria que tivesse sido, em termos de vaidade. Porque, hoje, eu já não estou mais preocupado com isso, porque, a coisa que eu mais queria, eu estou encontrando nesse reconhecimento, que é o reconhecimento de eu estar fazendo esse tipo de trabalho aqui. Mas a minha mulher dizia o seguinte: “Você é muito independente e as pessoas...”. A questão da inveja realmente existe. Eu sou uma pessoa descontraída, eu sei que onde eu vou, as ações que eu trabalhei, nos trabalhos que eu fiz na Vale eu sempre fui bem sucedido, eu sempre fiz sucesso, na verdade, e as pessoas não gostam muito disso não. Sucesso é bom pra caramba, mas incomoda muito quem não está tendo. Enfim, mas isso é um lado assim, eu acho até que meio egoísta, acho que pode passar alguma coisa assim, eu acho é que não deu é sorte. Hoje, com a minha análise feita, análise psicanalítica, eu acho que não foi legal, é alguma coisa, eu pisei na bola e não foi o momento, eu acho que ainda não foi o momento certo, quem sabe até ainda não acontece ou não. Isso já não me preocupa mais como me preocupava antes, sabe. Hoje, se eu sair da Vale, eu saio com a certeza, não é aquela certeza do dever cumprido babaca não, é o dever cumprido com grandeza, sabe. Acho que eu contribuí muito, muito para muita gente. A coisa que mais me gratifica é encontrar as pessoas: “Pô, Godoy obrigado por aquilo que você fez”. Eu não estou nem lembrando, não estou nem aí, nem sabendo o que que é... Porque a coisa que mais me gratifica e sempre foi essa, é fazer o bem para os outros. E não faço isso porque é bom fazer para os outros não, porque isso é bom para mim, eu me sinto bem, porque é uma coisa... Se você me impedir de fazer o bem para os outros eu vou morrer porque não é legal, está me faltando uma coisa importante, ou seja uma coisa fundamental. Isso para mim é que é bom.
P1 – Deixa eu fazer uma pergunta, agora vou voltar lá, fala um pouquinho do seu período de colégio, sobre a escolha profissional, se tinha alguma expectativa para que você seguisse alguma carreira... Se a profissão do seu pai tinha...
R – Bom, papai era jornalista, foi professor e advogado, mas papai exerceu pouco a advocacia. Papai foi mais, no IBGE ele foi funcionário, chegou a procurador do IBGE, mas já mais tarde. Papai foi um homem com brilho impressionante, inclusive no seu tempo de estudante. Ele foi um estudante pobre, porque vovô faliu e ele, os parentes ricos dele, exatamente o Zé Abrunhosa, uma vez papai queria ser médico e ele foi pedir dinheiro ao tio dele rico para ele fazer a faculdade de Medicina e esse tio virou para ele e disse assim: “Não, pobre não pode ser doutor não”. E papai foi à luta e foi o único dos primos de toda família que se formou em Direito. E papai nos dois últimos anos da faculdade, papai foi da primeira turma de Direito da faculdade do Estado do Rio de Janeiro, ele foi presidente do diretório acadêmico e papai é que – papai foi do PC bom antigo, antigo partido comunista, aqueles PCBas antigos que não se fazem mais...
P1 – Falava muito em política?
R – Falava, falava muito e eu gostava muito.
P1 – O avô era anarquista e o pai comunista?
R – É, é. E falava muito e eu via papai muito, e papai era muito radical em certas coisas, por exemplo, papai trabalhava no IBGE e ele foi convidado para trabalhar nos Estados Unidos, ele não foi por uma questão de ideologia: “Não vou. Como é que eu vou trabalhar para esses bandidos?”. (risos) E não foi. Hoje, pensando nisso, é um absurdo total, quer dizer, não foi por ideologia. E uma característica tanto de pai quanto mãe, isso é uma herança não só genética, mas social e que nós conseguimos passar, tanto eu quanto Sônia, para os nossos filhos todos foi a questão da honestidade. Papai sempre foi muito íntegro, mamãe também, então isso foi uma coisa legal. Quer dizer, a questão da integridade é fundamental e isso é uma marca que nós temos, tanto pela família dela, como pela minha. Mas voltando, você tinha me perguntado do colégio?
P1 – Da escolha profissional...
R – Ah sim, da escolha. O papai não era meu ídolo como profissional não, nunca foi. O meu ídolo, em termos assim de desempenho operacional de atividade era a minha mãe. Minha mãe, eu ficava impressionado com a capacidade dela. O que eu achava brilhante no meu pai era a inteligência dele, a forma dele falar, dele se explicar e o carinho dele, era carinhoso pra caramba. Bom, mas eu, volto àquela questão da vaidade lá atrás, eu queria mesmo era ser oficial da Marinha, eu achava aquela farda o máximo! Eu tinha um primo meu que era da Marinha, um primo mais velho que eu, o Durval, era um cara bonitão, sabe, chegava lá em casa, e muito meu amigo, gostava muito de mim, eu era o sobrinho querido da galera e ele chegava lá em casa com aquela farda, e eu falava: “Pô, Durval, eu acho que eu vou ser é da Marinha mesmo, porque é muito bonita essa farda”. Enfim, achei que eu iria ser da Marinha, aí quando eu fui me inscrever no curso Tamandaré, eu cheguei lá no curso Tamandaré e eu usava o cabelo muito grande, devia ter o quê, uns catorze, quinze anos algum negócio desse, e o sujeito fez assim: “Vai cortar este cabelo!” (imitação de voz) Eu disse: “Ué, eu nem entrei o sujeito já está me dando ordens. Tô fora”. (risos) E caí fora, caí fora e fui buscar outro rumo na vida. Advocacia sempre me interessou, eu gostava muito de ler, inclusive a página policial, eu dizia: “Pô, esses bandidos aqui, esses caras tem que ser...”. Eu achava bonito a questão do Direito Criminal e sem a menor vocação para as Ciências Exatas, sempre fui ruim de conta. Eu falei: “Bom, a minha chance aqui: Direito, Filosofia, Psicologia, ser professor, não. Acho que eu vou para Direito mesmo, porque Direito é uma boa, eu gosto, é uma coisa interessante e aí segui Direito. Não teve assim nenhuma..., claro, papai era advogado, então, tinha muitos amigos advogados, com os pais advogados e aí também uma possibilidade de continuar junto com esse pessoal, aí fui fazer Direito.
P2 – Seu pai era jornalista também, ele...?
R – Foi jornalista. Papai foi jornalista, papai montou uma revista, chamava-se Revista do Congresso – outro dia eu vi até alguma coisa parecida, era uma revista bonita – era ele e um outro jornalista da Urca - como é que chamava ele... Magalhães, não, eu esqueço o nome – chamava-se Revista do Parlamento. O que fazia essa revista? Ela pegava todos os discursos e comentava os discursos dos políticos e fazia crítica e tal, e ele era o diretor de redação; tinha o dono que era o editor chefe e papai o diretor de redação, mas enfim... o que que foi? Ah, na faculdade. Eu fiz o curso, o Hélio Alonso e fiz concurso para duas faculdades só. Fiz para nacional, Direito e pra Direito do estado, a faculdade do Catete e fiz porque eu não achava justo que papai pagasse mais os meus estudos, nem fiz concurso pra PUC. E passei na Nacional, passei em sétimo lugar na Nacional e passei em décimo sétimo na Catete. Então, eu acho que isso foi um prêmio, que eu queria dar um prêmio, um prêmio não, uma retribuição, um reconhecimento para o meu pai e para a minha tia também, porque foi ela quem pagou o meu curso – mamãe já estava muito doente nessa época, eu estava muito chateado. Mas enfim, passei por essas duas faculdades, optei pela Nacional em Direito, porque a Nacional tinha mais nome. A Nacional em Direito sempre teve mais nome, a Federal, dava mais nomes, os professores – você quando sai de uma faculdade, se você é formado na escolinha ali da esquina e você é formado na PUC, aqui em São Paulo, USP, você tem um outro curriculum, dá curriculum, aí eu fui para Nacional em Direito. E comecei a trabalhar desde o primeiro ano da faculdade com esse professor meu que ensinou que não existe mulher prendas do lar ou do lar, existe mãe de família e isso foi um grande aprendizado com esse meu ex-professor. Cursei até a terceira série indo todos os dias à aula, no quarto e o quinto anos eu só fui lá para me inscrever no time de futebol da faculdade. Porque tinha um amigo meu, o Frederico, foi o primeiro lugar do vestibular, meu irmão até hoje, meu compadre, ele assinava por mim a presença, toda a minha presença do quarto, quinto anos foram assinadas por ele, pelo Frederico. Tanto que, quando eu recebi o diploma, eu disse: “Toma Fred!” (risos) Porque ele copiava as matérias para mim, aí eu botei duas mulheres para trabalhar para mim, a irmã dele e minha mulher, elas copiavam todas as minhas matérias e na época de prova eu ia lá, eu tinha boa memória nessa época, e decorava tudo e ia para prova e só tirava 10, 9, 8 e aí foi isso. Mas o aprendizado que eu tenho de Direito foi exatamente pela necessidade da prática que eu tinha, eu tinha que estudar muito, então, eu estudava muito e gostava, e realmente eu aprendi a gostar de Direito e a gostar de estudar no escritório e depois no exercício da profissão.
P2 – Faculdade...
R – Não, isso não funciona. Eu comecei a estudar mesmo, foi tendo a questão prática nas mãos para resolver. Aliás, uma coisa que em Direito, não sei se foi esse professor ou se foi outro que me falou uma vez assim: “Está tudo nas páginas, basta saber procurar”. E é verdade. Quando você acha: “Ih, isso não tem solução, a lei está assim, está…”. Não, você constrói uma tese através de uma interpretação sistemática ou o tipo de interpretação que você quiser, lendo e buscando, porque, pode ter certeza, vai ter sempre uma decisão ou uma corrente doutrinária que vai dar apoio à sua tese, não esquenta. Por isso que diziam muito, não para mim, porque eu sempre tive muita opinião nas minhas coisas, mas eu me lembro muito que tinha uma história lá na Vale que pediam para o cara o seguinte: “Você pode me dar um parecer sobre esse assunto?”. Aí o cara falava: “Contra ou a favor?” (risos)
P2 – Para pessoa escolher...
R – E é uma realidade, é uma realidade, está tudo nas páginas, você escreve o que você quiser.
P2 – E como é que era o relacionamento com as pessoas, amigos, você conheceu a sua esposa na faculdade?
R – Não. Eu sempre tive poucos e bons amigos, mas sempre fui um sujeito muito popular. Mas como amigos, amigos mesmo eu tinha, eu sempre fui muito... seleto, não, eu sempre fui muito seletivo. Tinha assim meia dúzia de amigos, mas bons amigos, sempre tive. Minha mulher não, minha mulher eu estava matando aula, estava na praia. (risos) Conheci ela na praia, na praia do Forte, porque a minha mulher é filha de milico e por acaso conheci na Urca também, conheci a Sônia em 1967. Engraçado, eu comecei a namorar com ela, com uma semana eu falei: “Eu vou casar com essa mulher”. Coisa impressionante rapaz, ou troço assim meio maluco, porque eu era muito mulherengo, eu era um guri mesmo...
P1 – Você se lembra da sua primeira namorada?
R – Primeira namorada... lembro, lembro e não posso esquecer dela, mas sabe porque que eu não posso esquecer dela? Por causa do telefone dela. Chamava-se Angela, morava em Vassouras, aqui no Estado do Rio e o telefone dela era 1234... (risos) Então, porra, nunca mais eu vou esquecer o telefone dessa mulher. O pai dela era médico, eu achava muito engraçado, o pai dela era médico e morava numa casa assim grande e tinha uma rampa, eu subia a cavalo, imagina!
P2 – Isso em Vassouras?
R – Isso em Vassouras.
P1 – Você subia a cavalo?
R – Subia a cavalo. (risos) Era uma festa, dez anos, dez anos, onze anos.
P2 – Como era a juventude no Rio, quer dizer, o que se fazia?
R – A gente jogava, a gente tinha várias turmas na rua, tinha a turma do murinho, turma do Jacson, que era um pessoal mais velho, tinha a turma do paredão e eu era a turma do murinho. A turma do murinho, era um murinho que tinha lá numa determinada rua, que a galera ficava lá de noite sentada batendo papo, perturbando, paquerando. A gente tinha uma vida muito saudável, sabe. Nunca vi droga, nunca vi droga, nunca vi maconha, isso nunca pintou lá na Urca nessa minha geração, a gente jogava era muito futebol, nadava-se muito, pescava-se muito, namorava-se muito, dançava-se muito, era uma vida muito legal. O Rio de Janeiro nos anos 1950, 1960 é o que o Chile, por exemplo, Santiago é hoje. O Rio de Janeiro, nessa época, não sei bem a população, Santiago tem hoje quatro milhões de habitantes, mas é uma delícia de cidade e o Rio de Janeiro, nessa minha época, era fabulosa, fabulosa, você andava na rua. Eu voltava de festinha aos catorze, quinze anos de Ipanema, Copacabana andando de noite, parava nos botequins da vida, daqueles de... Tinha um ali no Leme, eu esqueço agora o nome dele, vou lembrar depois o nome, depois vou passar o nome para vocês, a gente ia comer lá um rango no final da noite, porque já tinha feito tudo e a gente voltava a pé, voltava a pé, caminhando pela rua. Tinha aquela zorra de cinema, a gente ia ao cinema de patota para perturbar, ninguém ia assistir filme, ia fazer bagunça mesmo. No tempo do Zaccaria tinha uns caras muito malucos, no Zacarias eu tive uns colegas de turma muito doidos, doidos mesmo. Mas havia um negócio chamado pré-estreia no São Luiz e alguns cinemas; no sábado, isso já no tempo do Zaccaria, porque a missa era obrigatória, a galera já “P” da vida para missa, era obrigatório, pô. Se você não estivesse na mesa com o carimbo lá, você não fazia prova, era suspenso, era um saco. Tanto que, quando eu estava no primeiro científico, tive uma redação para prova de religião – porque a gente fazia prova de religião – estava lá: “Por que sou católico?”. Eu comecei a falar: “Por tradição”. E mandei o cacete. Bom, claro, zero, suspenso, e, porra, quase tomei pau, porque o padre começou a me perseguir. Essas coisas acontecem.
P2 – Quase foi excomungado.
R – Quase fui excomungado. É, é isso.
P2 – O Zaccaria é uma escola tradicional do Rio?
R – É, é um colégio de padre, barnabitas, você tinha o Santo Inácio... Nessa época, os bons colégios do Rio de Janeiro eram os colégios de padre ou de freiras e alguns poucos colégios particulares, tipo o Andrews e o Anglo-Americano já era meio fuleiro, mas os bons colégios eram os colégios de padre: era o Santo Inácio, São José, Zaccaria, São Bento, Santo Agostinho talvez – uns cinco colégios; e de mulher, era o Sacré-Coeur de Marie, São Paulo, esses santos por aí. E o Zaccaria foi uma aprendizado na minha vida. Mas em todos os colégios a gente encontrou educadores realmente e a ética, eu acho que os colégios ensinavam também – por isso que eu digo, é o prosseguimento da casa – porque eles ensinavam a gente a ser honesto, a gente ser ético, a gente ser correto, a gente a ter postura, a gente assumir faltas, a gente não dedar por dedar, né, mas a gente a tomar decisões. Eu aprendi isso muito no colégio, em todos os colégios que eu estudei, especialmente esses dois que marcaram muito a minha vida, porque um marca a infância e o outro a adolescência. O Anglo-Americano, porque eu tomei pau no Zaccaria – aliás esse pau foi merecidíssimo, primeiro científico, acho que foi a época de maior vagabundagem. Papai é que dizia: “Vagabundagem franciscana”, porque era o dia inteiro na rua, moleque mesmo. Eu estava fazendo científico que era para agradar o papai, eu queria fazer clássico, eu falava: “Porra pai, eu não vou para..., eu não quero ser engenheiro, eu não quero ser médico, não quero ser dentista, eu vou fazer Direito, então pô, eu tenho que ir para o clássico”. Eu achava o clássico mais mole também, não tinha Química, não tinha Física, não tinha Descritiva, porque isso é um saco. (risos) Bom, aí eu fiquei em segunda época em Química e Descritiva, mas não fui só eu não, em Química a nossa turma tinha cinquenta alunos. Coitado dos padres, como sofreram com essa turma, essa turma era mortal. Tinha cinquenta alunos, cinquenta e dois, só dois passaram e os dois que passaram, um era o Alexandre, eu me lembro o nome desse cara, um cearense que tinha uma cabeça desse tamanho, Alexandre (Olimpievi?), é cientista da NASA, hoje está lá, tinha porque passar; o outro para mim foi uma grande surpresa, chama-se Ronald (Carretero?), esse cara era dono, o pai dele era dono da empresa de barca de Niterói para o Rio, da Cantareira, o sujeito era inteligente pra capeta e jogava uma bola, para mim foi uma grande surpresa, foram os dois caras que passaram, o resto da turma toda foi para segunda época. Quando eu falei para o papai que estava em segunda época: “Não, você vai repetir o ano para ter base”. Eu fiz assim: “Mas eu vou ter base no clássico, né pai”. Ele falou: “ É, está certo e tal”. Aí uma semana antes da segunda época, ele falou: “Meu filho, eu pensei bem, quem sabe você faz a segunda época”. Eu falei: “Pai, porra, é agora. Agora eu já estou com viagem marcada lá para Porto Alegre e tal, o que que é isso”. “Não, mas eu acho bom porque afinal de contas você vai perder um ano da sua vida, tal.” “Tá bom pai, eu vou.” Eu ainda passei, acho que foi em Química, mas Descritiva não deu, aquele negócio era muito...
P2 – Descritiva, que matéria que era essa?
R – É geometria Descritiva. Muito chato rapaz, muito chato. Essa foi difícil, esse não deu, não deu mesmo, Química ainda deu para enrolar, mas Descritiva não deu. Aí tomei pau, fui para Anglo-Americano fazer o clássico e foi muito legal a experiência no Anglo-Americano. O Anglo-Americano era muito mais de Mauricinho sabe, muito chatinho, o Anglo-Americano não marcou a minha vida não, não foi uma coisa que: Oh, o colégio, não. O Zaccaria não, o Zaccaria marcou com tudo e com tudo, os amigos que eu tenho. Do Anglo-Americano, para você ter uma ideia, tenho hoje um amigo que não era nem para ter sido do Anglo-Americano, porque é meu amigo da Urca, que é um advogado Técio Lins e Silva. O Técio foi muito meu amigo, meu irmão desde Urca, desde garoto e depois eu encontrei ele no Anglo-Americano, mas eu não tenho uma história de amizade com o pessoal do Anglo-Americano, acho que não sobrou nenhum. Já do Zaccaria, até hoje a gente faz um almoço no Natal, vai lá uma meia dúzia de quinze e chega: “Porra, você está gordo pra cacete”, “Ih, rapaz, tu tá velho hein!” “Pô, você está assim, você está assado”. E aquela conversa, mas é legal, a gente troca assim uma experiência, a gente procura até ajudar alguns amigos nossos que estão meio caídos, com problemas e tal, então é um negócio bom, agradável. Então, quer dizer, o Zaccaria me marcou, na faculdade a gente continua fazendo isso, agora, o Anglo-Americano não está com nada não, passou, cumpriu a sua tarefa de me dar o diploma do segundo grau e não foi um marco, eu não tenho uma imagem boa, é... inócua, é indiferente, é indiferente.
P1 – O seu primeiro emprego foi nesse escritório?
R – Não. O meu primeiro emprego, eu tinha dezesseis anos de idade, eis que eu queria fazer uma viagem para ver uma namorada que eu tinha lá...
P2 – É essa viagem que...?
R – Essa, essa, essa mesmo. Aliás, foi a grande paixão da minha vida... Bom, mas aí eu ia para Porto Alegre e papai falou assim: “Pô, mais vem cá, não dá não, é muito caro”. E era caro realmente e bom... Aí eu abri o jornal e vi assim: Sears, sabe o que que é Sears? Roebuck – faliu já – “Sears, precisa-se de vendedor”. Eu falei: “É comigo”. Fui lá, não esqueço o nome dessa mulher, porque é o mesmo nome da mulher do Eliezer, Jutta, Dona Jutta, era uma gringa gorda, grandona, muito engraçada, engraçada não, muito zangada – como é que chama isso?
P2 – Sisuda.
R – Sisuda, brava, brava, brava. Eu cheguei lá e fui ser entrevistado pela Dona Jutta, falei: “Dona Jutta, o negócio é o seguinte, eu estou querendo trabalhar, estou precisando trabalhar, estou precisando fazer uma viagem importante e estou precisando ganhar algum aqui nesse Natal”. Ela falou: “Mas quantos anos você tem?”. Eu falei: “Tenho dezesseis”. “Ah, mas não pode.” Porque, na época, o menor de dezoito anos não podia trabalhar. “Ah, você não pode trabalhar.” Eu disse: “Não, espere aí, meu pai me autoriza, não tenho esse problema não”. “Se o seu pai lhe autorizar, então...” Ela ligou para o meu pai: “Pai, eu estou aqui na Sears e é o seguinte, fala aqui com a Dona Jutta, que é a diretora da Sears, porque eu quero trabalhar aqui e você precisa dar autorização. Você dá né?”. “Não, dou claro.” Então eu fui trabalhar de balconista na Sears no Natal de, sei lá, eu tinha dezesseis anos, 1961, 2, é uma coisa dessa, eu nasci em 1945... é 1961. Olha! Vendi paca, ganhei uma grana pretíssima! Acabei não viajando não, a mamãe pegou meu dinheiro para abrir uma caderneta de poupança da Caixa Econômica Federal. (risos) Eu falei: “Pô, mãe eu quero é ir viajar, eu quero é ir passear, pô”. E ela foi abrir uma caderneta de poupança, pode um negócio desse?! Eu acho que eu ganhei mais naquele mês do que papai no emprego dele, ganhei muito, mas ganhei muito. Foi um negócio muito engraçado, que eu fui para uma sessão, que era a sessão de papelaria e a papelaria vendia tudo, desde papel e lápis até máquina fotográfica e eu nunca entendi chongas de máquina fotográfica, negócio de fotômetro, telêmetro, e eu estava olhando lá os caras vendendo a máquina e eu cheguei: “Porra, o que que é fotômetro?”. “Ah, fotômetro...” “Não, não, só quero saber onde é que é o bicho?” Então, tá. Mas o que eu vendia! Eu chegava para as pessoas: “Essa máquina é boa”. “Essa máquina? Essa máquina é última novidade, ela tem fotômetro, ela tem...” (risos) Eu só repetia, eu não sabia de chongas, mas olha, vendi uma barbaridade. E eu, nessa época, eu era nadador, então era o dobro do corpo que eu tenho hoje, eu era forte, muito forte e era garotão de praia, bonitinho tal, então a circulação de mulher ali na tal sessão de papelaria era muito boa, então eu vendia muito. E teve um problema legal lá, porque foi mais uma das coisas que me marcou, mas marcou da minha natureza, não só de contestador, mas de pessoa que se indigna com as coisas erradas: eu tinha um chefe que era o senhor Pandelo, que era um espanhol, franquista o filho da puta, não, o cara era um bandido. Tinha lá, coitado, você imagina vendedor de loja é classe média baixa, o sujeito está trabalhando porque precisa, ninguém vai querer ficar lá oito horas lá ralando, em pé, se não precisar. Ele atendeu, um dos vendedores atendeu uma cliente, uma cliente mal criada, chegou lá, porra soltando os cachorros em cima e eu vi o lance e vi que ele não tinha culpa de nada e fui defendê-lo, eu falei: "Minha senhora, a senhora está muito enganada, eu acho que não é assim que a senhora deve tratar, a senhora deve tratar ele como uma pessoa, deve respeitar, porque ele está lhe respeitando, a senhora está errada e tal". E o espanhol veio dar um esporro no vendedor e eu fui defender o vendedor também, porque a Sears tem um lema: Sua satisfação garantida ou o seu dinheiro de volta – aquela história de qualidade, quando a gente começou a estudar qualidade nos anos 1970, 1980, que dizia o seguinte, o cliente é o rei, a Sears já tinha essa visão, isso lá em 1961, muito claramente colocado, que o cliente é o rei, não interessa o que ele fizesse, porque você não podia perder o cliente. Eu achava isso um absurdo, o cliente é um rei desde que ele respeite também o empregado que estava ali – eu sei que o caso foi para diretora, Dona Iuta, mas nessa época a Dona Jutta já era apaixonada por mim, porque eu era o primeiro empregado menor da Sears, estava vendendo uma barbaridade e ela gostava de mim, ela gostou de mim. Ih rapaz, o senhor Pandelo se deu mal, se deu mal e ainda tomou um esporro lá da Dona Jutta. (risos) Bom, eu sei que acabou o Natal, acabou o negócio, eu vipt (som com a boca), vou para as férias. Quando chegou em janeiro, eles chamaram para voltar a trabalhar lá, eu falei: "Não, não, meu caso é só dezembro, o ano que vem vocês me chamam em dezembro". Então, esse foi o meu primeiro emprego. Depois disso, não, depois disso o meu primeiro emprego foi no escritório do doutor Renato Cantidiano, que foi meu professor, eu fiquei lá durante três anos e saí de lá, eu saí de lá brigado com ele, porque uma vez eu fiz uma petição, ele falou: "Faz essa petição aqui". Eu fiz mais do que fazer uma petição, eu pesquisei, elaborei o negócio, todo empolgado com o negócio, ele chegou e me deu um esporro: "Essa petição está uma merda". Eu falei: "Pô, eu me esforço aqui, eu não sou incompetente". Vim pensando, pensando, estava legal, estava muito legal, eu fiquei, achei aquilo tão baixo dele, eu cheguei em casa conversei com papai, falei: "Pai aconteceu isso e tal". Ele disse: "Deixa eu ver a petição". Papai viu: "Que absurdo isso". Eu voltei no dia seguinte: "Doutor Renato, eu estou pedindo demissão". "Mas, por quê? Eu estava até querendo até dar sociedade." Eu falei: "O senhor é até pior que o português da esquina. E olha, o meu avô era português, mas não era ruim como o senhor não". E fui embora, uma merda, porque o cara era professor da faculdade, assistente do Hermes Lima e saí e fui para outros escritórios.
P2 – Escritório do quê, esse escritório?
R – Direito Comercial. A gente era advogado da Lufthansa, Mercedes Benz, Willys Overland do Brasil na época, empresas de carvão em Santa Catarina, e tinha uma outra série..., ele era muito ligado também, porque a mulher dele era da família Aranha, Monteiro Aranha, então ele era muito ligado também a embaixador, diplomatas, Osvaldo Aranha, Pio… esqueci o nome do cara agora – uma série de diplomatas dos quais nós éramos advogados.
P2 – Você já tinha feito alguma escolha na faculdade em relação ao Direito?
R – Não, não. Eu transitei por todas as áreas. Porque nesse escritório eu trabalhei muito a questão do Direito Comercial, depois fui para um outro do Heitor Cassiano, onde eu trabalhei muito a questão do processo civil, estagiei durante dois anos na Vara criminal – aliás tem umas petições ótimas, era muito engraçado, eu vou até mostrar uma que foi muito engraçado: ‘tinha uma das petições que era um negão que tinha sido assaltado na Lapa, um outro estava defendendo, eu era quem fazia as petições e aí eu absolvi o cara e depois o juiz veio falar com o defensor para dizer: “Orra, esse teu estagiário é porreta, mas ele é muito engraçado, eu tive que absolver o negão, porque não dava para não absolver, porque a tese dele estava correta”. Qual era a tese? O negão estava lá embaixo a quarenta metros e uma testemunha que tinha visto o negão assaltar e assaltou mesmo, porque ele me falou: “Aquele branquelo tinha que tomar umas porradas.” – era muito engraçado. Eu falei: “Mas vem cá, você estava a que a distância lá?”. “Eu estava a quarenta metros lá” – a testemunha dizendo que estava a quarenta metros e que tinha visto o negão. E eu na minha defesa enumerei uma série de coisa e disse assim: “Como é que a testemunha poderia assegurar ter visto o acusado a quarenta metros à luz de um cansado e boêmio lampião da Lapa?” (risos) É, é isso mesmo, aquela luzinha muquirana. E absolveu legal. Tem umas outras muito engraçadas. Fiz também Direito Criminal. Bom, quando eu me formei, eu fui trabalhar na Copeg – Copeg é Companhia e Progresso do Estado da Guanabara, que acabou, foi o Banerj Imobiliária que sucedeu – eu fui advogado, entrei como estagiário, passei a advogado, depois fui assessor da diretoria do Banco de Desenvolvimento. A pessoa que tinha me levado para lá saiu por uma questão política e eu não quis ficar, o resto do pessoal me convidou para ficar, mas eu falei: “Ah, não quero não”. Eu soube que uns amigos meus da Urca estavam trabalhando na Vale e aí eu perguntei para eles: “Escuta, como é que é esta empresa aí? É legal?”. “Olha, lá é legal, muito bom sim e tal.” Eu cheguei em casa e falei: “Sonia, eu acho que eu vou trabalhar na Vale”. “Ih, você não sabe, eu tenho um tio que é diretor da Vale”. Um tio dela, primo do meu sogro era realmente diretor da Vale, João Carlos Linhares. Ele foi entrevistado?
P2 – Foi, foi.
R – Ele está doente, né?
P2 – Está meio idoso, mas está sereno e tal.
R – É, está caidinho, né. Eu fui lá conversar com o João Carlos, ele falou: “Olha, você vai ter que fazer uma prova, vai ter que fazer um teste”. Foi o tal teste que eu fui fazer lá com o superintendente jurídico. Depois que eu fui aprovado, o João Carlos Linhares chegou para mim e falou assim: “Bom, você conhece Itabira?”. Eu falei: “Conheço”. “Você vai para lá.” “ Está bom.” “Quando é que você pode ir?”
P1 – Você já conhecia Itabira?
R – Calma, deixa eu contar essa história, que essa história é muito engraçada. Ele falou: “Você vai pra lá”. Eu falei: “Tá bom”. “Quando é que você pode ir pra lá?” “Amanhã.” “O quê, um cara que topa ir para Itabira e ainda pode ir amanhã! Não, você está a fim de trabalhar, você fica no Rio.” E foi assim que eu arrumei a minha vaga no Rio de Janeiro na Vale do Rio Doce. (risos)
P2 – Se você não tivesse demonstrado tanta vontade, você iria para Itabira.
R – Orra, Itabira era o cão, o cão. Era o fim da picada, o fim mesmo. Queria botar o cara de castigo, mandava para Itabira. (risos)
P2 – Mas você tinha alguma notícia já da Vale, você tinha alguma imagem anterior da empresa?
R – Não, não tinha nenhuma imagem. Sabia que era uma estatal que mexia com minério de ferro, mas não... A Vale não tinha a projeção e o charme que ela tem hoje.
P1 – Que ano que foi isso?
R – 1970. A Vale começou a ser poderosa e ser estrela a partir dos anos 1970, o final dos anos 1969, 1970 aí houve uma diversificação muito grande das suas atividades, porque antes era só minério de ferro, aí começou a haver floresta, a DoceNave – o que mais que tinha? – tinha a Vale Fértil, Valep, a Cenibra, Vale Sul, essas coisas todas foram criadas dos anos 1970 pra cá. Eu participei da criação praticamente da Albrás, Alunorte, isso tudo foi em 1972... A Albrás, por exemplo, eu que fiz o registro e o primeiro estatuto da Albrás; o primeiro lugar em Barcarena foi num campo de futebol, isso em 1972. Mas a Vale não tinha essa...
P2 – Barcarena ainda não tinha nada disso?
R – Nada, nada. Tinha um campo de futebol com duas vacas. (risos)
P2 – Uma de cada lado...
R – Eu aterrissei dentro do gol. (risos)
P 2 – Quando você entrou foi na Graça Aranha já ou não?
R – Foi, já era na Graça Aranha.
P1 – Para fazer qual tipo de função?
R – Eu fui contratado como advogado, eu fui contratado por quatro meses por experiência e fui contratado como advogado, depois desses quatro meses de experiência, o meu superintendente chegou pra mim e falou assim: “Você vai ser o chefe do setor jurídico do Rio de Janeiro”. Eu falei: “Porra, esse cara é louco”.Um garoto de vinte e quatro anos para ser o chefe do setor jurídico da Vale do Rio Doce no Rio de Janeiro. Eu falei: “Pai, esse cara é maluco”. Quer dizer, eu mesmo me senti inseguro, eu tinha tanta segurança, mas de repente o cara te coloca como chefe do setor jurídico. Aquilo já criou uma ciumeira brava: “Ah não, você é sobrinho do diretor e tal”. Não era, tanto que eu em cinco anos eu subi na carreira, eu cheguei ao máximo da minha carreira em cinco anos de Vale do Rio Doce, na jurídica da Vale, eu fui o segundo homem da jurídica com cinco anos de Vale do Rio Doce, já cheguei no top com cinco anos, quer dizer, com vinte e nove anos eu já era o segundo da jurídica da Vale. Mas lá era tudo política, quer dizer, o superintendente jurídico só entrava politicamente. Aí veio o Fernando Reis, depois veio o, eu acho que o Eliezer de novo, 1978, né? O Rennó ficou um ano, foi depois que o Fernando Reis, o Rennó ficou só um ano...
P2 – Eliezer em 1979.
R – O Eliezer em 1979, é isso mesmo, o Eliezer chegou em 1979. Depois da jurídica, eu fiquei na jurídica dezesseis anos, em 1983 eu fui presidente, eu estava na jurídica ainda e o meu superintendente era muito meu amigo, João Carlos Dantas Campos, que era filho do governador Milton Campos de Minas Gerais, e o João Cláudio era um amigão, um cara brilhante, gente finíssima, meu amigo, mas nesse ano foi a primeira onda de privatização na Vale e eu era um ferrenho defensor da estatização da Vale do Rio Doce, sempre defendi a Vale como estatal, porque eu achava um absurdo aquilo. Uma visão ainda um pouco diferente da realidade que a gente vivia hoje. Eu até escrevi, tem um documento que eu fui responder, responder não, fui convidado para prestar um depoimento na Comissão, CPI, Comissão Parlamentar de Inquérito da estatização, da privatização da Vale do Rio Doce.
P2 – Datado de 1985.
R – É. Você chegou a ler?
P2 – Não, eu vi só sobre a CPI, não...
R – É, eu acho que a Karen leu. Vou ver se eu tenho esse documento. E foi um documento muito forte, porque ele retratava não só a minha visão da coisa, mas retratava a visão de muita gente, inclusive a do povo. Eu fiz muitas pesquisas, até em botequim, no Vilarino, por exemplo, pesquisava muito lá, aquela pinguçada toda, que ali você tinha de tudo, você tinha de médico, advogado, jornalista, piranha, tinha o diabo, pintava tudo ali e todo mundo deu os depoimentos, então foi um negócio legal, não foi só a minha opinião, mas um consenso das pessoas e evidentemente um pensamento... Bom, nessa época quando eu terminei essa passagem lá na Aval, porque a Aval foi construída justamente para defender a Vale do Rio Doce da privatização. Nós éramos só gerentes que montaram essa..., fizemos uma diretoria provisória, um dia eu cheguei na reunião e falei: “Esse negócio está sem comando meu amigo, não se pode fazer nada sem comando. Vamos indicar aqui um comandante desse processo porque o negócio não está bom não”. Enfim, aconteceram algumas entrevistas e nós fomos, eu e o Luciano Taus, nós éramos os comandantes desse processo, e depois aconteceram duas assembleias e eu me sobressaí e o pessoal me indicou, eu recebi setenta e cinco por cento dos votos, então eu estava bem com a galera. Trabalhei dois anos nessa associação, me dediquei muito, trabalhei muito, muito mesmo e tomei muito cassete por causa dela também. Todo o meu desdobramento profissional depois foi muito marcado pela minha presença na Aval, com isso o cara acaba rotulado: “Orra, esse cara é o agitador, esse cara é complicador”. Não, não era nada disso, nunca fui agitador ou complicador, eu queria aquilo que eu achava que era certo. Agora, os caras queriam que eu fosse presidente de uma associação de empregados e comungasse com a posição da diretoria da Vale, não dava porra! Era aquele negócio absolutamente de confronto: capital e trabalho. Naquela época era pão e vinho, pão e vinho não, preto e branco.
P2 /P1 – Vinagre. Vinagre e óleo.
R – Água e óleo, não dava para misturar.
P2 – Período da redemocratização também.
R – Houve. Teve um lance, por exemplo com Eliezer muito engraçado: tentaram me cooptar de qualquer maneira, porque os sindicatos eram muito fracos, não tinham uma liderança forte e os caras eram muito ruins de rodas, e o doutor Eliezer viu que eu tinha uma ascendência e falou: “Vamos pegar esse cara aqui pra ficar do nosso lado, senão vai ficar feio pra nós”. Tentaram me cooptar de tudo quanto é jeito, me ofereceram o diabo. Uma vez um sujeito chegou pra mim e falou assim: “Você aceitaria ser o superintendente jurídico?”. Eu falei: “Olha, agora eu acho que não porque já passou a época, eu já estou há três anos, eu cheguei no segundo com cinco anos e já tem dez, não quero mais não”. Fui ter uma entrevista com o Eliezer e ele falou assim pra mim: “Godoy, o que você gostaria de ser hoje na Vale?”. Eu olhei pra ele: “O senhor quer saber mesmo doutor Eliezer?”. “Quero.” “Presidente da Vale.” Aí ele riu, quer dizer, nunca mais esse tipo de cooptação aconteceu comigo. Nessa época, inclusive, eu fui indicado para ser presidente da Vale do Rio Doce, uns políticos do Maranhão, um amigo meu que me telefonou: “Godoy, você está sendo indicado – porque era tudo indicação política mesmo – você está sendo indicado para ser presidente da Vale”. Eu falei: “Rapaz, você está maluco? Eu não tenho conhecimento e nem estrutura profissional para ser presidente da Vale, pelo menos agora, pelo menos agora”. E disse para os caras: “Olha, eu acho que não passa por aí, eu acho que o processo não passa por aí, escolham pessoas mais maduras, mais experientes, que tenham uma vivência maior para ser agora, mais tarde a gente pode até pensar nisso, mas, nesse momento, não”. Quer dizer, você vê as maluquices, as indicações eram tão políticas que até uma coisa dessas passava pela cabeça das pessoas. Depois, quando terminou o meu mandato na Aval, a galera queria que eu me reelegesse, eu falei: “Não, não quero ser candidato”. Foi muito sofrida a administração, foi um sucesso no final, mas, porra, cansou. Eu queria sair da Vale nesse momento, tive um convite inclusive para ir para um grande escritório, para ir para a Lobo e Ibeas – é um escritório de advocacia do Rio, esse meu compadre, o Frederico, esse primeiro lugar do vestibular, ele trabalha nesse escritório e o dono do escritório me conheceu na Vale como advogado e me convidou para trabalhar lá. Eu iria sair, mas, quando eu iria sair, o doutor Eliezer pediu ao Mascarenhas para me colocar como diretor da Fundação, da Vale. Eu antes já havia sido convidado para ser diretor da Fundação e eu falei: “Ah, não quero não”. Eu achava que a Fundação não estava com nada, é porque eu queria ser o superintendente jurídico da Vale, encasquetei aquilo, e vi que eu não tinha politicamente, eu não tinha passagem, a galera da Vale não gostava do perfil do Godoy e era um cargo político, então, não tinha jeito. Era ultra-elogiado como advogado, como profissional, como ____, como executivo, mas politicamente não era da corriola, aliás nunca fui de corriola. Eu sempre fui muito independente, eu sempre tive muitos amigos, mas não era desse negócio de cozinha de corriola e me aproveitar desses negócios não. Bom, aí eu iria sair da Vale, acabei indo para Fundação, da Fundação antiga, que era a Fundação Habitacional.
P2 – Financiava casas, construía casas?
R – É, construía casas. Nessa Fundação, a Fundação era uma esculhambação, mas era... No dia que eu cheguei lá, eu falei: “O que é isso gente?” E a Fundação era assim um lugar onde todo mundo que não servia pra coisa nenhuma ia pra lá, empregado, não era diretoria não, mas os empregados, só ia rebotalho pra lá, então você imagina o time que era. Era sinistro, pra você ter uma ideia, quando você atendia ao telefone, a secretária atendia ao telefone: “Oi, o que que há?”. Era assim um negócio, eu falava: “O que é isso rapaz, o que é isso?”. Eu cheguei, botei ordem naquela zorra realmente, realmente a Fundação depois de um ano estava com outra cara. Eu tive uma passagem muito interessante nesse primeiro ou segundo ano, eu não me lembro bem, eu montei uma gerência de desenvolvimento social que era porreta. eram três pessoas, foi a única vez que a Vale do Rio Doce fez uma pesquisa de demanda habitacional, essa galera era uma equipe de quatro pessoas tão competentes. Eles fizeram uma pesquisa de trinta e seis mil empregados que, na época, o grupo tinha, o grupo todo: Vale, Cenibra, Albrás, Alunorte, DoceNave... – foi um trabalho brilhante, belíssimo. E, nessa época, a Fundação era muito questionada e a Vale era muito questionada, aí eu criei lá na Fundação o Ombudsman, foi o primeiro e único Ombudsman da Vale do Rio Doce criado lá por mim, e eu levei essa minha ideia para o Eliezer, eu falei: “Doutor Eliezer, eu estou querendo criar um ouvidor, um Ombudsman lá na Fundação, o que que o senhor acha?” “Você está sempre inventando, mas eu acho porreta a ideia”. Deu a maior força e foi muito legal o Ombudsman, tanto que depois a Vale queria botar o Ombudsman, mas como a ideia tinha partido de mim, aí: “Não, isso é ideia do Godoy, tira fora”. O assunto morreu, porque, o Ombudsman, só tem sentido ele existir enquanto você tem uma coisa mal arrumada, com muita reclamação, se está tudo funcionando legal, acabou, não faz sentido. Depois de dois anos, as reclamações contra a Fundação acabaram todas, eu falei, pô, não tem mais sentido, pronto acabou-se o Ombudsman também. Mas isso foi em 1986, eu me lembro que – 1986,1987 – eu só vi alguém criar Ombudsman, no Rio de Janeiro, pelo menos, nos anos 1990 e pouco; antes disso, eu não vi em nenhuma empresa essa figura do Ombudsman e é uma figura muito legal viu, é uma figura muito legal, eu gostaria de ser um Ombudsman.
P2 – Quais eram as principais queixas?
R – Da Fundação? Ah, tinha de tudo. Queixa era de atendimento, cara que reclamava de obra, reclamava que a tua prestação subia, não tinha nem razão, era falta de informação. Tudo na vida em termos de reclamação é fruto de dois pontos fundamentais: tratamento ou informação. Você tratando as pessoas com respeito, com dignidade, com seriedade, e dando a elas a informação certa e exata, não tem problema, acabam-se os problemas. Porque ninguém está no mundo só querendo pensar e levar vantagem ou ter a informação que o beneficie, o cara quer ter é a informação certa, pô, para tomar a sua atitude, isso é do cidadão normal, o que for ao contrário, pode ter certeza que é exceção, não é regra não. Eu estou falando assim aos pouquinhos porque tem muita coisa, mas eu acho que vocês ficam com muito tempo.
P1/P2 – Não. A gente não tem problema de horário.
P2 – Você está com algum problema de horário?
P1 – Quer fazer um intervalo?
R – Não, não. Isso por vocês aí. Na Fundação, coisas marcantes que eu me lembro da Fundação, basicamente isso: a esculhambação que era e a revolução que gente fez lá, a figura do Ombudsman, essa pesquisa de demanda e os critérios que a gente criou para o atendimento, porque não tinha critério, o atendimento era: você é minha amiga, toma, vem cá, toma aqui um financiamento. Nós celebramos o maior contrato de financiamento com a Caixa Econômica Federal, foi um contrato com setenta milhões de dólares, que eu montei lá em Brasília, lá com a diretoria da Caixa, foi o maior sucesso. A Vale do Rio Doce babava. Mas a Caixa era muito incompetente, para liberar dinheiro era um sufoco. No finalzinho, quando eu estava na Fundação, finalzinho, uns quatro anos, 1989, 1990, eu montei um seminário sobre habitação no Rio de Janeiro, no Hotel Mereciam, o seminário foi um senhor sucesso: governador, prefeito, secretário do Estado, ministro, pessoal da direita, da esquerda do Rio, São Paulo, dos focos fundamentais; e peguei vários exemplos de empresas que trabalhavam a questão da habitação para o seus empregados, então, o seminário foi um senhor sucesso. Nisso, o diretor da Fundação, o diretor superintendente, o Luciano saiu e o Mozart, que na época era diretor e era o diretor responsável pela Fundação, me chamou para assumir a superintendência; mas nessa época tinha um diretor que era o Wander, ele foi vice-presidente inclusive da Vale e foi da gestão do Wilson Brumer, nessa minha ida para a Fundação eu estava na gestão do Wilson Bruner, e esse cara não gostava de mim e não gostava por um lance pessoal mesmo – a irmã dele se dizia biruta e ela pegou uma licença, ela era empregada da Fundação e estava licenciada pela Fundação no INSS, mas estava todos os dias na praia, saía de noite e tal e eu vi e falei: “Pô, isso é uma grande sacanagem”. E mandei o recado pra ela e falei: “Olha, ou volta a trabalhar ou está na rua, porque negativo”. Porra, era um exemplo do capeta, eu como diretor administrativo vendo aquilo e não fazer nada, e aí ela voltou pra Valia, foi ser empregada da Valia, porque o irmão era diretor da Vale, vice-presidente e a Valia era responsabilidade dele. Como o meu nome foi lá para o Wilson, o Wilson estava favorável, o Mozart, o Murilo e o Wander falou: “Mas o Godoy eu não quero”. Aí o Murilo, que é muito meu amigo, hoje está na Bahia Sul, disse: “Mas vem cá, você não quer por quê?” “Não, o Godoy não serve para ser empregado da Vale não”. “Vem cá, ele é desonesto?” “Não, não”. “Ele é incompetente?” “Não, longe disso.” “Então, qual é o problema?” Aí o cara veio falar que era o problema por causa da Val. O Murilo depois me contou: “Não, tal...”. Aí o Wilson, que era muito amigo do Wander, não queria me botar, porque eu era desafeto do amigo dele, aí foi a Shirley pra lá e eu fiquei muito puto também, falei: “Porra, sacanagem, construo essa Fundação aqui, boto ela nos cascos, a Fundação estava um brinco, com nome nacional e internacional, quer dizer, participando de projetos, com outra postura. O Wilson... Veio a Shirley, primeira semana, eu bati de frente com ela, ela virou-se pra mim e ainda falou assim: “Essa Fundação é muito pequena para duas lideranças”. Eu falei: “Então você vai ter que sair, porque você como líder é um...”. Ela ficou uma arara e foi fazer queixa para o Wander, o Wander me chamou, o Wilson me chamou e falou: “Godoy, a Shirley não gostaria de ficar lá trabalhando com você”. “Não tem problema não. Você quer que eu fique aonde?” “Nós gostaríamos que você fosse o gerente da reserva da Zona do Rio Doce.” Essas reservas, RDRI, é. Eu falei: “Tá legal, tá legal, vou pra lá”. Cheguei lá, nessa reserva, gerente geral da reserva e tal, menina, o esquema era de um clientelismo, de um... olha, um esquema. Eram sete empregados, cada um pior, parecia um exército de Brancaleone, eu falei: “Porra, que sacanagem que fizeram comigo. Não tem nada não, vamos mexer nesse negócio”. Tinha um cara que era um sujeito que trabalhava na superintendência de desenvolvimento da Vale do Rio Doce, Sude, que era o banco dos cobras, o Luciano, por exemplo, era da Sudes, esse cara, como o Luciano também, o Luciano era mal visto na Sudes, porque era um cara criativo, brilhante e tal, engenharada não gosta muito não. Brilhou muito, é inteligente, é esperto, opa, encosta! O Luciano estava encostado quando ele veio para Fundação agora na minha gestão, ele estava encostado, eu é que perguntei: “O cara é bom?”. “O cara é bom pra cassete!” E é ótimo. E tinha um maluco, esse era maluco mesmo, esqueço o nome dele, ele era economista, mas o cara era bom pra caramba, inteligente, brilhante. Eu chamei o cara, falei: “Escuta, eu quero que esta reserva do Rio Doce passe a ser o maior instrumento de ação social do Vale do Rio Doce, mas eu quero botar, coisa que eu sempre tive muito cuidado, eu quero critério nisso aqui”. Porque quando os políticos vierem me pedir as coisas eu vou ter que dar uma resposta para eles, mas baseado em alguma coisa e a única coisa que você pode se basear nisso é critério, pode ser até ruim mas você tem que ter, e o esquema que a Vale sempre se queixava e tinha problema é porque os políticos vinham pedir, todos pediam, e você não tinha critério, então ela acabava sempre ficando bem com uns poucos e mal com muitos. Eu montei pra esse cara, eu fiz, inclusive, um primeiro trabalho manuscrito, o sujeito mexeu nas coisas, mas nós montamos critérios, que foram os critérios que depois a RDRI tinha lá e foram… tudo. Quer dizer, foi legal porque eu fiquei ali só seis meses – eu vou dizer porque eu fiquei só seis meses – e os critérios foram mantidos, porque, quando eu saí de lá, eu deixei já a coisa com critério e já no computador, porque eu queria que apertasse um pleito, apertei um pleito e viesse a análise do pleito e já pontuado, em termos de pontuação. Coisa que eu fiz também, por exemplo, nos critérios de atendimento da Fundação, todo o empregado tinha a sua pontuação, a pontuação no grupo e na sua empresa definida, então quer dizer, era um negócio que não tinha erro, um troço transparente pra caramba.
P1 – Quais era esses critérios?
R – Onde, na Fundação?
P1 – É.
R – Na Fundação era tempo de casa, era se tinha filho, se não tinha filho, se pagava ou não pagava aluguel, eram critérios objetivos. Claro, tem sempre o cara que reclamava, tinha um cara, por exemplo, que era boiola e naturalmente solteiro, então ele falava assim: “Eu, eu jamais serei abençoado pela Fundação, imagina, eu sou das minorias e além de ser das minorias, eu ainda sou solteiro”.“É rapaz, tu tá fudido mesmo.”(risos) Enfim, mas tinha critério. (risos)... Depois o que é que teve...
P2 – No fundo de reserva qual era o critério?
R – Não tinha critério. Porra. Não tinha critério, não tinha critério. Ah, os critérios da reserva? Ah, tinham vários pô, tinham vários: os municípios, população do município.
P1 – Mas eles já existiam quando...?
R – Claro, os municípios já existiam, mas não tinham critérios.
P1 – Vocês é que foram montando tudo?
R – Claro, claro, montamos critério: distância da linha, se a estrada passava dentro da cidade ou não, se tinha população muito carente, o número de população, o número de empregados da Vale no município, enfim critérios objetivos, claro, voltados para o interesse da Vale do Rio Doce. Botei aquele negócio, pontuei tudo direitinho e tal, e o Cleison que está lá hoje, fui eu quem contratei o Cleison. Engraçado que depois queriam mandar o Cleison embora e eu já na Docegeo eu é que segurei o Cleison lá, bom a gente já chega lá. Nessa gerência eu fiquei lá seis meses e ao longo desses seis meses eu fui fazendo um trabalho que o Wilson e a diretoria da Vale estavam encantados, o próprio Wander que era o meu desafeto, ele falou para o Costa e Silva – Costa e Silva é hoje o presidente da Pós Vale e foi superintendente de finanças e era muito amigo do Wander e do coisa – e ele falou assim: “Godoy, o Wilson e o Wander sempre me falaram que você foi o reformulador – deu alguma expressão assim – o transformador da Reserva”. Reserva era uma “coisa” e ficou e ficou uma coisa glamurosa até, luminosa, como gosta de falar a Viviane Sena – a Viviane Senna fala assim: “Godoy, esse assunto é luminoso”. “Orra, luminoso foi teu irmão.” (risos) Ela é uma figuraça, eu adora ela, ficou a minha amiga mesmo. Ao longo desses seis meses e tal eu – sabe aquele seminário que eu te falei, que veio aqui para o Rio de Janeiro e tal – eu fui convidado pelo secretário nacional de habitação para ser o diretor de planejamento de política habitacional do país, eu fiquei, poxa, estava posto em sossego, eu falei: “Mas vem cá, você já falou isso com o presidente da Vale?”. “Já, já falei com ele.” “E ele?” “Ele não está querendo deixar você ir não.” Eu falei: “Mas por quê?” “Ah, não sei, eu gostaria que você conversasse com ele.” Eu fui conversar com o Wilson, eu falei: “Wilson?”. “Eu já sei, já sei que você foi convidado pra ir pra Brasília e tal”. “Olha, eu acho que eu fui convidado e eu quero que você me permita, porque eu acho que é uma chance, uma chance que eu vou ter na minha vida profissional e mais, pra Vale é interessante”. Eu estava recém saído da Fundação, eu tinha uma Fundação Habitacional funcionava, eu como coordenador de política habitacional do governo eu teria como apoiar as ações, tanto que apoiei. Mas, nesse lance, tanto que a minha ida lá pra Brasília, eu tive que ir, porque eu falei: “Wilson, eu quero ir, eu quero ir como superintendente da Vale, eu não quero ir como gerente não, eu quero ir à função de superintendente”. “Mas...” Eu falei: “Eu acho que é mais do que justo Wilson, eu já fui sacaneado e você sabe muito bem que era pra eu ser superintendente já há muito tempo e na sua gestão eu acho que está no momento de você resgatar isso aqui”. Ele foi muito correto comigo, ele me colocou, o Wander não queria, tentou me sacanear o tempo todo, o tempo todo, não queria que eu fosse como superintendente, quando eu fui, ele não queria me pagar a ajuda de custo, me sacaneou mesmo. Mas eu sou um cara fino, dei uma de pelica nele porreta, porque eu fiz um convênio da Vale com o Governo Federal para construir habitação, belíssimo, no convênio que o Wilson foi a Brasília assinar isso com a ministra e tal, quer dizer, e ele, Wander era o diretor responsável pela Fundação, que levou a minha desafeto, botei todo mundo ali, assinei o convênio, numa boa e tal. Quer dizer, eu não sou de guardar rancor, eu registro a sacanagem, mas não sou de ficar guardando rancor, agora registro, registro para efeito histórico. (risos) Onde eu estava?
P2/P1 – Você estava indo para Brasília.
R – Eu fui para Brasília, porque eu fui com o salário duplicado, duplicado e ainda iria ganhar lá como DAS 4 que era um DAS alto, tinha apartamento funcional, enfim, a minha qualidade de vida em termos de salário e condição de trabalho realmente subiu um salto de qualidade fantástico. Nessa época não queriam que eu saísse da Vale de jeito nenhum, mas aí o Wander não queria porque não queria que eu subisse, o Wilson não, o Wilson queria que eu ficasse e o João Manuel, queriam que eu ficasse porque eles sabiam que tinha um trabalho legal ali e bem feito, e o trabalho estava bonito, eu confesso para vocês que a vaidade me mordeu ali, ali foi uma mordida de vaidade sim, porque eu falei: “Vou mostrar pra esses putos aí que eu não preciso deles não, eu tenho estrela própria. Mas eu fui também porque era o dobro do salário, eu ganhava quatro e fui ganhando oito e mais dois que eu ganhava lá, então eu ganhava dez, naquela época nunca vi tanto dinheiro na minha vida. Enfim, fiquei lá...
P2 – Você foi como superintendente mesmo?
R – Fui, nível de superintendente, não era superintendente de nada, fui como nível e salário de superintendente, referência salarial. Fui pra lá, fiquei lá um ano e meio, quase dois, eu fui no governo Collor e depois o Collor caiu, eu ainda fiquei lá com o Itamar. Quando o Itamar assumiu, eu fui convidado pelo Luciano Mendes que era presidente da CNBB, eu fiz uma relação de amizade muito grande com o Dom Luciano, e ele viu o meu trabalho, ele viu o trabalho que a gente foi construindo lá, porque, a secretaria, você imagina, os pleitos e pedidos também o mesmo esquema de clientelismo e eu não tolero clientelismo. Eu acho que você ter que dar dez por cento para os administradores, para os presidentes, uma parte para eles fazerem o clientelismo, porque faz parte da política, dez por cento ali, agora, os noventa por cento tem que ter critério, clareza, transparência; e lá na Secretaria era uma zorra e era uma corrupção do capeta. Para você ver como a questão da honestidade é fundamental, de todos as autoridades que trabalharam lá nesse governo Collor, lá na Secretaria, todos, todos, sem exceção estão respondendo a processos na Polícia Federal, o doutor Godoy não. Por quê? É integridade meu amigo, isso é um negócio que eu tenho o maior orgulho e faço questão mesmo de mostrar, porque não é só importante você ser, você precisa mostrar que é. Eu acho que isso foi a maior prova de integridade, o maior atestado, não só isso como a indicação do Dom Luciano Mendes que me indicou pessoalmente para ser o Secretário Nacional da Habitação. Eu me lembro que, quando eu saí da Secretaria, o Dom Luciano chegou pra mim e falou assim..., eu fui apresentar o meu sucessor a ele, eu falei: “Dom Luciano eu gostaria também que o senhor ajudasse muito a ele”. Ele me chamou de lado e falou assim: “Doutor Godoy, a minha relação nessa Secretaria é com o senhor, mais ninguém”. É um troço legal, ele ficou meu amigo mesmo, é meu amigo até hoje, às vezes a gente se fala pelo telefone e tal, é um homem de uma sabedoria, político mesmo, muito político. O Dom Luciano, quando eu... Eu não emplaquei como secretário de Habitação, porque o Itamar esperou o Dom Luciano viajar e fez a indicação de um compincha do Tasso Jereissati que, aliás a indicação dele era um cara do setor, da área e muito bom, era Adolfo Marinho, era um cara competente. O Dom Luciano, quando eu fui falar com ele que tinha sido indicado um outro, ele falou assim: “O senhor quer que eu vá ao presidente para reverter esse processo”. Eu falei: “Absolutamente, eu não quero lhe causar esse constrangimento e nem aceitaria isso”. Claro, é uma questão de dignidade e mais, de não complicar a vida do presidente da CNBB, porque se ele estava oferecendo, ele estava oferecendo, ele estava oferecendo pode ser até para me testar e eu acho até que foi, mas seu eu falasse “quero sim”, ele iria ter que ir, um senhor constrangimento, o decreto publicado, olha o rolo que eu iria arrumar, eu falei: “Absolutamente, não faz sentido”. Como eu já estava querendo voltar mesmo para o Rio de Janeiro, sentia muita saudade.
P1 – Quando você chegou lá, você tinha uma coisa assim: nossa, eu estou na presidência, estou trabalhando na Presidência da República, tinha uma coisa assim pelo fato de estar exercendo aquele cargo?
R – Tinha, tinha uma coisa muito importante que eu falei: “Porra, vou poder ajudar coisa pra cassete aqui, nossa, eu vou ter um poder incrível”. E não é esse poder que você pensa que você vai ter, quando você chega lá, primeiro que o negócio já está todo dividido e o que você pode fazer é muito pouco se você não tiver o poder total, ou seja, se você não for o Secretário, você não consegue fazer as coisas, porque o resto já está loteado pelo curriola e aí você não caminha, eu consegui caminhar porque eu consegui argumentar equipe de gente da mais alta..., competente, arquitetos, inclusive com pós-graduação em Londres, ganhando quinhentas pratas, encostados, todos os bons que não interessavam por serem pessoas corretas, íntegras, dedicadas, competentes, estavam encostados; eu peguei esse time de encostados, olha, fizemos uma revolução naquele negócio, fizemos projetos assim porretíssimos, porretíssimos.
P1 – Você lembra de algum projeto?
R – Banco de Terras, por exemplo, esse Banco de Terras que todo mundo fala, isso começou lá com a gente – eu tinha até isso escrito, sabe que eu não achei essa relação, deixa eu te dizer mais o quê? Ah, eu tenho a história aí, isso é histórico, vocês não me batam, nem briguem comigo: o déficit habitacional do país era muito grande na questão de... falava-se muito em dez milhões de habitações, hoje fala-se em cinco milhões e seiscentos. Enfim, eu e um deputado, Humberto, Luiz Humberto, vou lembrar o nome dele, era deputado federal de Uberlândia, ficou muito meu chapa, ele aparecia lá e tal, a gente gostava de trocar ideia, um cara muito simpático e tal, aí eu falei: “Humberto, eu estou querendo montar um esquema para tirar dinheiro do rico e fazer casa para o pobre, como é que a gente pode fazer um negócio desse, como é esse negócio desse projeto do cheque desse cara lá de Natal?”. “Ah, não, ele quer fazer o imposto único.” “Hum, então vamos fazer isso.” Fiz uma proposta que era de contribuição social, não é essa fatídica CPMF, o criador dela é o Degas, a gente montou todo um trabalho junto ao Banco do Brasil para saber quanto de cheque você tinha na compensação que era controlado no Banco do Brasil, e a gente fez uma conta no baratinho, que se a gente montasse um projetinho sem muita pressão, a gente iria conseguir os recursos de um outro fundo de garantia que seria da questão habitacional, que seriam da ordem de cinco bilhões de dólares, era muito dinheiro cinco bilhões de dólares, de dólares, é isso mesmo, então a gente montou o projeto. Esse projeto é, a nossa ideia era que o sujeito de zero a três salários mínimos ninguém descontava CPMF dele e a partir de três a dez tinha uma faixa, dez a vinte outra e acima de vinte tinha outras, era zero, um; zero, dois; zero, três e para cada cheque você pagava, na época – qual era a moeda? Um real, um cruzeiro – pagava dez centavos, uma merreca. Na CPMF você tinha duas contribuições, uma contribuição – era cruzeiro...
P2 – Era cruzeiro, cruzeiro novo...
R – Não sei, acho que era cruzeiro mesmo. Então, você tinha dez centavos por cada cheque e tinha mais a contribuição percentual de acordo com a sua faixa de renda, esse projeto foi para..., inclusive, foi um negócio engraçado porque ele surgiu como imposto, mas a gente queria fazer como contribuição social, porque tinha um prazo definido, mas aquele Nelson Jobim, que era na época deputado federal e era o guru jurídico do Congresso disse para o Humberto que não poderia ser contribuição social, tinha que ser imposto, eu falei: “Isso é burrice, isso não é imposto, isso é contribuição social mesmo”. Bom, mas saiu como imposto, o secretário levou para o Collor, o Collor gostou da ideia e mandou para o Marcílio, Marcílio Marques Moreira, o Marcílio gostou tanto que ficou com tudo. Era, inclusive, o famoso Cheque Habitação, que era o nome do projeto, era o Cheque Habitação, era o Cheque Robin Hood que eu estava querendo tocar. Deu certo a minha ideia, mas só que foi mal utilizada, porque era para ser utilizada na habitação e terminar o déficit habitacional do país em coisa de oito ou nove anos, quer dizer já estaria terminado o déficit, esse foi um projeto. Outra coisa foi locação social, é um projeto muito usado na França, o que um pessoal aqui de São Paulo começou a trabalhar e eu estava implementando, fizemos alguma experiência naquela cidade de São Paulo, Santos, do lado...
P1 – São Vicente, Praia Grande, Guarujá...
R – Não, aquela poluição.
P1/P2 – Cubatão.
R – Cubatão. Começamos a montar um projeto de locação social com a prefeita de Santos, a Telma, que na época era Telma, o pessoal de Cubatão, montamos também um esquema de polo tecnológico… habitação lá em Campina Grande, com o pessoal aqui de São Paulo... O que mais? Locação social… Não me lembro mais agora, mas tinha mais coisas. Uma das coisas que eu tenho certeza que foi legal, porque toda vez que eu voltava a Brasília, eu frequentava em Brasília um botequim que é a cara do Rio de Janeiro, é o Carpe Diem, é a cara do Rio – você conhece?
P1 – Eu conheço.
R – É a cara do Rio, animado, agitado, tal, a galera toda entra, é a cara do Rio o Carpe Diem, e eu ia sempre lá no Carpe Diem, e quando eu volto a Brasília de vez em quando eu passo lá eu encontro a galera, e outro dia, foi um negócio pra mim também muito de reconhecimento, esse reconhecimento eu sempre tive das pessoas que trabalharam comigo em todos os lugares, sempre eu tive esse reconhecimento e foi a coisa que mais me gratificou sempre, uma vez eu encontrei com o pessoal dessa equipe e ele falou assim: “Poxa, o único cara que fez alguma coisa naquele Ministério foi você”. Quer dizer, legal, quer dizer a equipe que estava lá e que viu as coisas acontecerem. Eu voltei para o Rio, eu iria ser o diretor presidente, já tinha acertado até com o Wilson, eu iria ser diretor presidente de uma mineração de manganês, essa mineração de manganês que está hoje no Metamat... Não é Metamat, é a mineração Urucum Mineração, eu iria ser o presidente dessa, porque, quando eu voltei, eu falei para o Wilson que eu iria voltar, aí o Wander que ainda estava... O Wander: “Ah, não, vou de botar como gerente geral”. Eu falei: “Ah, ah, negativo rapaz, negativo. Eu vou ser o superintendente ou o presidente de alguma mineração aí e tal”. Ele conversou com o Wilson e me propôs para ser presidente da Mineração Urucum, eu falei: “Legal, estamos nessa”. Nisso, o Wilson sai da Vale, o Itamar não se definia e veio o Schettino, que já tinha sido o diretor da Vale e era muito amigo do Paulino Cícero, e o Paulino Cícero iria ser o ministro, o Schettino emplacou como presidente. O Schettino, até me dava bem com ele, na época, o Schettino falou assim: “O que que você quer ser na Vale?”. Chegou pra mim: “O que que você quer ser na Vale?”. “Oh Schettino, você conhece as minhas características você, vê o que você gostaria.”
P2 – Você estava comentando desse retorno para o Rio.
R – Pois é, eu estava negociando a minha situação. E foi muito engraçado porque eu estava em Angra de férias, quando o Wilson saiu e chegou o Schettino, eu falei: “Pô, eu tenho que ir lá pra ver esse negócio, porque eu tinha acertado uma coisa”. Eu vim pra posse do Schettino, na posse ele me viu e falou assim: “Tenho mil projetos pra você”. Eu falei: “Legal”. “Preciso muito falar com você.” “Que bom, que bom.” Eu realmente tinha uma relação com ele muito boa, eu não sei porque o negócio azedou depois. Enfim, quando eu cheguei, ele falou pra mim: “O que que você quer?”. Eu falei: “Você é que sabe, eu tenho perfil, sou advogado, já trabalhei na reserva, então eu posso ser presidente da Fundação, posso ser presidente da Valia, posso ser superintendente jurídico, posso ser gerente da própria Reserva, que iria ser uma nova superintendência, enfim, vê aí o que você acha. O que eu tinha acertado com o Wilson era eu ser diretor presidente da Urucum”. “Urucum não, Urucum é lá, nós vamos transferir lá pra Campo Grande, não quero você lá, quero você aqui.” Quer dizer, até essa preocupação, eu falei: “Tá bom Schettino, fica a seu critério”. Aliás, eu tenho até um correio, isso é até um negócio legal, porque é um correio que eu fiz pro Schettino sobre essa questão toda, sabe, eu dizendo pra ele o que eu poderia ser, dizendo as vantagens de uma e de outra e tal. Enfim, nada disso aconteceu e ele me convidou pra ser diretor da Docegeo. Eu: “Pô, vou ser diretor da Docegeo, o que que eu vou fazer na Docegeo? Geólogo é um bicho complicado, enrolado, esse troço não vai dar certo. Esse troço não vai dar certo. Falei lá para o Anastácio: “Pô, Anastácio, vem cá, Docegeo o que que é isso?”. Ele falou: “Pois é, o Schettino pediu pra ser isso aqui agora, depois a gente vê um outro lugar e tal”. Eu falei: “Tá bom”. Eu fui para a Docegeo e o presidente era o Breno, o Schettino foi consultar o Breno o que que ele achava de eu ir, pô, o Breno fez os maiores elogios, o Breno gosta muito de mim, sempre gostou muito de mim e me recebeu lá na Docegeo. Eu fui para lá. Ah, a Docegeo, eu iria ser presidente da Docegeo também, porque o Wilson queria me botar como presidente da Docegeo, ou Urucum ou Docegeo, e o Breno foi ser presidente da Docegeo com o Schettino. Eu fui lá na Docegeo, comecei, cheguei lá e vi também – coisa engraçada, todo lugar que eu vou, eu não sei se eu tenho um dom ou uma característica de dona de casa, porque onde eu vou, eu sou um cara que sou muito cuidadoso com as coisas, eu gosto de organizar as coisas e, normalmente, eu chego nesses lugares em que eu trabalhei, todos eles, a maior zorra, sabe, física e estruturalmente muito esculhambada, muito desorganizada, eu fico: “Caraca, o que que é isso?. Então, começamos a conversar e o geólogo é muito conservador, nas suas atitudes, seja no horário, é um povo muito sério, mas é muito metódico, é metódico demais, qualquer coisa que mude a estrutura é um horror, e a Docegeo tinha dois problemas: o problema físico, de situação mesmo, de móveis, esse negócio todo. As instalações dela ficaram ótimas, ficaram excelentes, o Fabinho que era o diretor que eu estava substituindo já havia feito uma reforma lá, mas a gente começou a montar as pessoas, a ter uma outra postura, quer dizer, aí o Breno é muito sensível a essas questões e lá na Docegeo, eu falei: “Se eu vou ser diretor aqui, eu tenho que contribuir com alguma coisa pra cá.” – essas coisas depois a gente vai tentar falar mais definidamente. Mas, qual foi a minha grande contribuição nessa questão da Docegeo? Eu falei: “Eu gostaria que a Docegeo tivesse recursos próprios e não ficasse dependendo sempre da Vale, pra Vale dar um orçamento ou não; então eu comecei bolar uma forma da gente captar recursos no exterior, através de uma coisa que eu tinha visto de uma literatura que eu tinha lido sobre fundos minerais, fundos de incentivo à mineração, fundos minerais no Canadá, em Vancouver, eu soube que as pessoas lá investiam, pessoa física, ela investe num alvo – Breno deve ter explicado isso pra vocês –, as pessoas investem no alvo e se o alvo der resultado, você passa a ser sócio do produto daquele alvo e eu quis montar aqui um fundo de investimento mineral, chamei um consultor, chamei, estava tudo transadinho, porra, iria estourar, aí aquela questão de tudo aquilo que você começa a criar, neguinho se assusta. Eu tive até uma briga com o Breno por causa disso, porque o sujeito tinha dito que aquilo não poderia ser, que era um absurdo e tal, e eu fiquei também muito ‘P’ da vida com esse processo. Não foi criado o fundo de investimento mineral porque iria dar uma autonomia à Docegeo incrível. Mas estava lá o projeto do fundo e esse negócio todo. Uma outra coisa que a gente mexeu muito na Docegeo foi esse negócio do respeito ao próprio geólogo, ao sujeito que trabalha no campo, a gente dando melhores condições de trabalho comprando carros novos, comprando equipamento, botando os melhores equipamentos, as sondagens, nós contratamos do exterior, rompendo todo um clientelismo e um, mais do que, um cartelismo, vamos dizer assim dos sondadores nacionais, que pareciam um – eu até apelidei aquele negócio, negócio de carnaval, como é que chama? Um andaime – parecia um andaime de carnaval, porque era uns ferros assim muito mal jambrado, tudo colorido, feio pra caramba, empregado mal cuidado, os caras todos..., e aí nós contratamos firmas canadenses pra fazer a sondagem aqui, lá em Serra Pelada. E foi uma vitória legal, porque a gente conseguiu vencer inclusive os prazos que a gente tinha, a gente cumpriu ali legal porque a gente rompeu com qualquer dificuldade jurídica, tinha um advogado lá que eu falava assim: “Eu quero fazer isso”. E ele: “Ih Godoy, mas isso vai dar problema, isso é complicado”. “Problema teu, eu vou fazer, agora você tem que resolver pra não colocar a diretoria em maus lençóis, porque eu vou fazer de qualquer jeito.” Então, a gente inovou até uma coisa legal que foi na auditoria ministerial, nós tínhamos quatro auditorias: auditoria interna, auditoria externa, auditoria do Ministério de Minas e Energia e – tinha mais uma auditoria, acho que o DNPM fazia uma auditoria – mas enfim, o Ministério, ah, o Tribunal de Contas, mas o Ministério de Minas e Energia e o Tribunal de Contas é o cara que ficava ali pentelhando o tempo todo, e nós mostramos para os auditores que, numa época de internet, de modernidade, a gente não poderia ficar fazendo licitação com três meses e buscando equipamentos e fazendo cartinha e isso e aquilo se você poderia resolver via internet, não fazia sentido, você só estaria encarecendo os custos de uma licitação dando aqueles prazos todos, e a gente mandou bala. A gente foi muito elogiado também com a Docegeo, nos quatro anos que eu estive lá, a Docegeo sempre tirou nota dez na avaliação que o governo fazia; a gente tinha um contrato de gestão com o Governo Federal, a Docegeo foi a empresa do grupo da Vale que sempre tirou nota dez.
P2 – Era uma avaliação anual?
R – Era avaliação anual do Governo Federal. Eu brincava sempre com o Breno e depois com o Tié...
P1 – Era critério técnico de gestão?
R – Técnico, técnico de postura e desempenho mesmo, desempenho, Docegeo foi nota dez. E eu me lembro bem, quando a Docegeo saiu, quando eu saí da Docegeo, foi na época da privatização, eu fiquei lá na Docegeo quatro anos, quando foi a época da privatização, o Schettino me chamou pra dizer: “Olha, você vai pra Fundação”. Porque ele iria se livrar da Fundação, então ele se livraria de dois pepinos: a Fundação e eu. Eu não ficaria parecendo uma coisa de perseguição: “Não, o cara está como diretor da Fundação, não dá pra você voltar, não dá pra você vir pra outro lugar”. O engraçado é que o Anastácio que era o compincha do Schettino, uns dizem que quem não gostava de mim era o Anastácio por causa do Schettino e outros diziam que era o Schettino por causa do Anastácio, e eu: “Pô, todos os dois foram sacanas comigo, mas isso aí é problema deles”. O Anastácio quis colocar um amigão dele de Itabira no meu lugar, aliás, colocou esse cara no meu lugar na Docegeo. Assim que a Vale foi privatizada, o primeiro cara que dançou foi ele, foi esse amigo dele e a Fundação deu a volta por cima e foi lá pra cima. Enfim, na Docegeo eu fiquei esses quase cinco, quase quatro anos, 1993, 4, 5, 6, saí no início de fevereiro de 1997 – depois eu preciso até me lembrar de coisas mais específicas, o que que eu fiz mais em termos de Docegeo.
P2 – Todo o período de pré-privatização você estava na Docegeo?
R – Docegeo. Inclusive, nas reuniões eu coloquei muito claramente que os direitos minerários da Vale do Rio Doce, aqueles que a gente conhecia “tudo bem, bota lá no balde”, mas aqueles que a gente..., fiz várias propostas da gente fazer uma cisão da Vale do Rio Doce, uma cisão daquelas com os direitos minerais e você montar uma Docegeo linha com outros direitos minerais pra ela tocar por fora. O BNDES conseguiu fazer, o Breno deve ter contato de um acordo que foi feito com o BNDEs de alguns direitos minerários ficarem com o BNDES e ficaram fora da privatização.
P2 – Não foi o Breno, mas essa história...
R – Isso aí foi uma ideia que eu tive numa reunião de Conselho da Docegeo e passei pro Breno: “Breno vamos passar por aí”. Não sei que fim levou, mas eu acho que foi feito alguma coisa assim. Da Docegeo, teve a privatização da Vale, eu fiquei na dúvida se saía ou não saía da Vale, porque eu tinha uma baba pra receber, eu iria receber quase quinhentos mil reais na época, eu tinha tempo para aposentar, eu falei: “Fico, não fico, fico, não fico”. Eu falei: “Quer saber de uma coisa, vamos ver o que é que vem aí”. Quando começou a privatização, o pessoal que já sabia que iria ficar, o Otto, o Gabriel já tinha chegado também, o Otto chegou pra mim e falou: “Godoy, eu quero te convidar para ser o presidente da Fundação, mas a Fundação com uma outra – porque eu já tinha feito a proposta durante a privatização, eu fiz a proposta para o próprio Schettino, de a gente pegar a Reserva da Zona do Rio, esse fundo e transferi-lo para a Fundação, para a Fundação ser a gestora dos fundos que iriam para o BNDES e cheguei a negociar isso para o BNDES, com o presidente do BNDES através de dois deputados amigos meus e os caras concordaram com isso tudo, mas quando o Schettino ficou sabendo que eu estava mexendo, fez a maior caca e esculhambou tudo, e o Henrique que era o cara que foi o meu sucessor lá na gerência de reserva, o cara fez a maior sacanagem, ele com o Paulo Hartung, eu tenho inclusive os textos dos negócios pra mostrar, aí eu fui mostrar quem tinha criado a Reserva tinha sido eu, que eu tinha dado os critérios, como é que funcionava, como é que eu estava pensando em fazer o negócio em sinergia com o próprio BNDES e com a Comunidade Solidária, isso foi tudo ideia minha de colocar, então quer dizer, deu certo, o BNDES adotou tudo aquilo que eu tinha proposto para que a Fundação fosse fazer, aliás, eu tenho todas as cartas, uma carta que o próprio Benjamim tinha assinado para o BNDES com a proposta que eu mesmo tinha escrito, tinha feito. Aí eu fui para Fundação, mas quando eu fiz essas propostas todas de transformar a Fundação nesse instrumento de ação social da Vale, não era com o foco definido de educação ainda não, mas quando o Otto me chamou para ser o presidente, nisso aconteceram outras coisas paralelas, o Benjamim não me conhecia, mas o Brafman que era muito amigo do Benjamim, que era quem arrumou o dinheiro para o Benjamim comprar a Vale CSN, foi meu amigo de turma e ele tinha ódio mortal do Schettino, então a coisa casou bonitinho, o Schettino dançou. Agora tem uma coisa, é um registro legal, todo o cara que me sacaneia dança, não, mas é verdade, dança mesmo, some, some do mapa, ou fica numa posição ou some do lugar de onde eu estou trabalhando, isso sempre, eu estou registrando esse negócio. Não me faça mal, hein, é mau negócio. (risos) Mas é verdade, ih, eu sou abençoado menina.
P2/P1 – Santo Antônio.
R – Santo Antônio e o resto da curriola lá, Dona Henriqueta e Doutor Paulo estão lá de olho, filhinho querido, filho único, imagina. (risos) Bom, aí o Brafman, o Otto estava me convidando, mas quem mandava na Vale naquele momento era o Benjamim e o Brafman, aí o Brafman fez uma reunião comigo e falou: “Você vai ser o presidente da Fundação, eu estou precisando saber o que você está precisando fazer”. Eu contei pra ele tudo o que eu estava querendo fazer que era isso mesmo, transformar a Fundação para ser um instrumento de ação social, mas não estava fechando a questão da habitação não, deixei a habitação lá. “Mas a gente não quer mais essa questão corporativa”. “Está bem, não vejo problema”. Porque hoje você tem financiamento em tudo quanto é lugar, a Vale já tinha feito dezesseis mil atendimentos, a demanda que sobrava lá era muito pequena, eu acho que as pessoas poderiam se resolver mesmo via Caixa Econômica, Bradesco enfim, tanto que nós fizemos dois convênios, um com o Banco Real, comecei a fazer um com a Caixa Econômica para atender os empregados da Vale, e enfim estavam bem atendidos, então vamos voltar o foco. Por que educação? Eu contratei um consultor e a gente fez várias pesquisas com várias empresas, várias entidades e a gente verificou que a educação era o grande foco que todas as empresas estavam trabalhando, e todas estavam trabalhando através de Fundações, então foi sopa no mel, quer dizer, a Vale estava precisando de um instrumento de ação social, a minha proposta era que a Fundação fosse um instrumento de ação social, esse instrumento era um instrumento que toda grande empresa estava usando, aqui e no mundo inteiro, então não teve dificuldades maiores para ser aprovado esse trabalho social. Eu fiz uma apresentação sobre a Fundação, várias apresentações, aquilo foi se somando, várias apresentações e a Fundação iria ser, iria ser não, passou a ser um instrumento de ação da Vale desde de 1998. Mas o Benjamin cismou, porque ele brigou com o Brafman e falou: “Porra, esse cara é amigo do Brafman eu não vou botar ele não”. Aí o Pousa, falou assim: “Orra, você quer mandar o cara embora?”. “Não, não quero que mande o cara embora não, mas eu não quero ele como presidente.” Eu falei: “Quer saber de uma coisa, eu vou-me embora”. Falei pro Gabriel: “Gabriel, não tenho mais saco pra aguentar essa galinhagem não, eu vou é me embora, eu vou é jogar o meu futevôlei, eu não vou mais me aporrinhar mais não”. O Otto falou: “Não Godoy, fica, porque essa questão vai ser resolvida”. O Gabriel também. Eu falei: “Tá bom”. Eu fui ficando, botaram a Carla como – como é que chama isso – ela ficou como diretora superintendente, mas não apitava nada, mas perturbava, perturbava porque tudo que eu queria fazer o Gabriel não deixava, o Gabriel tinha muito medo, não é medo, talvez a insegurança dele chegando, ele ficava agoniado: “Poxa, os sócios ainda não estão definidos”. Ele tem uma, Gabriel é um cara que eu gosto muito, é meu chapa, meu amigo, mas ele tem essa dificuldade, essa insegurança na relação dele com próprio Benjamin, era relação complicada, muito complicado mesmo, e a Carla complicava muito, porque a Carla era uma tranca rua do capeta, ela veio do Governo Federal, então ela acha que todo mundo do Governo Federal rouba, não faz bem feito, tem uma cabeça ainda burocrática com a experiência e vivência no serviço público federal, e eu tenho uma outra cabeça, eu quero é fazer as coisas, “Sai de baixo, não aporrinha que a coisa acontece. Em dez, uma pode dar errado, mas nove vão dar certo, então você tem que fazer. Estava muito difícil pra gente começar a fazer, foi tudo aos trancos e barrancos, todos os projetinhos que a gente começou a fazer saiu a fórceps, e fórceps enferrujada, porque estava difícil mesmo, tudo contra, eu falei: “Mas vem cá, vocês querem ou não querem que eu fique aqui na Fundação?”. “Não, queremos, queremos.” “Então me deixa agir, pô!” “Ah, mais o sócio...”“Deixa o sócio rapaz, vamos tocando.” A gente começou realmente a tocar alguns projetos, o elenco deles, a cronologia depois posso até te dar, não me lembro agora, mas por exemplo, a nossa entrada no Canal Futura, que eu estava vendo televisão, não só questão de televisão, mas especialmente a visibilidade para Vale do Rio Doce. Primeiro que ela saiu com a nossa entrada, ela saiu de uma TV por assinatura para ser uma TV para ser apanhada por todas as parabólicas do país e eu estava vendo a coisa um pouco na frente, porque eu tinha certeza que o Roberto Marinho não queria ficar com a televisão só a cabo, ele queria transformar aquela televisão numa televisão aberta, que é o que está acontecendo, a TV Futura vai ser mais uma televisão aberta, então você iria ter mais uma visibilidade para população do país inteiro. E a dificuldade para emplacar o Canal Futura com o Gabriel, a Carla e o Otto foi um cão, mas conseguiram emplacar, levei isso para o conselho, defendi, a Elena Landau foi muito minha parceira nesse negócio, o Brafman também foi parceiro nisso, emplacamos o Canal Futura, isso deu uma visibilidade maior na Fundação. Enfim, começamos a montar alguns projetos, mas a gente ainda não tinha uma clareza, uma definição, um orçamento, claro, para Fundação, e eu estava detonando, estava gastando e a gente conseguiu aprovar um orçamento de dez milhões de dólares para a Fundação, nisso houve aquele problema do câmbio e o dólar caiu, então o nosso orçamento de quase vinte milhões passou a ser dez milhões de reais, mas mesmo assim era um belo orçamento. Eu tinha feito essa apresentação toda, depois tive que fazer uma outra apresentação para o próprio conselho de administração da Vale para provar que o meu orçamento não eram dez milhões de reais e sim dez milhões de dólares, mas a própria Vale não queria esse negócio, o Otto não queria, enfim ficou em doze milhões de reais o primeiro orçamento da Fundação. Mas olha, isso aqui vai ser um espetáculo. A grande coisa que a gente conseguiu na Fundação foi transformá-la em utilidade pública. A gente conseguiu até, agora, a gente conseguiu no final do ano passado e eu defendi uma tese lá que colou, uma tese jurídico-social, porque para ser de utilidade pública, você precisa ter três anos e, a Fundação, só tinha três anos que ela estava fazendo trabalhos gratuitos, fazendo doações e não voltada para o público interno, você tem que ser voltado para a comunidade. A Fundação, eu levantei a tese de que a Fundação era a sucessora empresarial da RDRI e com essa tese, que é uma verdade, é um seguimento, é uma continuidade, uma continuação, o governo aprovou esse título de utilidade pública. Hoje, a Fundação, só a Vale do Rio Doce ela pode abater no seu lucro operacional até dois por cento do seu lucro, miseravelmente no ano passado ela teve um milhão e oitocentos de lucro operacional, vai ter esse ano dois milhões e meio, então o orçamento da Fundação pode, tranquilamente, sem a Vale botar a mão no bolso pode ser da ordem de quarenta, cinquenta milhões por ano, fora isso, outras empresas que queiram investir na questão social vão ter também como fazer esse tipo de operação, então a Fundação, de repente, ela vai se transformar numa Fundação basicamente autônoma e autossustentável em função do interesse das próprias empresas em investir para abater o seu imposto de renda, e o nosso orçamento vai aumentar brutalmente nesse processo e você com orçamento fixo seu com as parcerias que você alavanca em outros órgãos e outros parceiros, meu Deus, a Fundação vai ser um sucesso, já é um sucesso, mas tende sempre a crescer. Eu me sinto muito orgulhoso porque eu participei desse processo todo de mudança da concepção, da transformação e estou seguindo, acompanhando junto o sucesso dela, participando efetivamente no dia a dia dessas coisas todas. E o que você ajuda as pessoas, o que você beneficia, o que você dá de visibilidade à Vale do Rio Doce é uma coisa que nunca vai acontecer, aconteceu comigo agora em função, aconteceu com a Vale na relação com duas comunidades onde era muito ruim as relações, Itabira e Marabá, a relação da Vale hoje com a Itabira e Marabá é de muito amor, de muito respeito. Pra você ter uma ideia, eu recebi uma medalha de cento e cinquenta anos da Fundação de Itabira, eu Luiz Antonio de Godoy Alves, da Vale do Rio Doce eu fui o único que recebi. A Vale recebeu a medalha, mas nenhum empregado da Vale recebeu, eu da Fundação recebi. Agora mesmo o Jorio foi fazer as festas da Vale do Rio Doce lá em Itabira, o prefeito citou o meu nome por duas ou três vezes na questão do memorial Carlos Drummond de Andrade e um outro negócio, quer dizer, a relação da Vale do Rio Doce com Itabira está dez hoje graças ao trabalho da Fundação. Marabá, a mesma coisa, o prefeito de Marabá usa um vídeo que eu fiz um convênio, assinamos um convênio e eu enalteci o trabalho dele na prefeitura. Ele usa esse vídeo como cabo eleitoral dele na eleição, ele está com noventa por cento de voto favorável, está eleito. Ou seja, a Vale do Rio Doce através da Fundação está crescendo em termos de aproximação com as comunidades, porque, na verdade, sempre foi uma relação muito clientelista, muito “dá isso”, “dá aquilo”, “dá trilho”, e isso na visão nossa da Fundação, isso, o Fernando, o embaixador, a gente tem uma identidade muito boa, a gente combinou o seguinte, tudo o que a gente der, tem que ter uma contrapartida e tudo o que a gente der ou negar dizer sim ou dizer não, e dizer porque que disse sim e porque que disse não, e não ficar a reboque daquela visão antiga clientelista e tal. Então, essas coisas todas mudaram e eu acho que isso vai ser fundamental para Vale do Rio Doce para o sucesso cada vez maior da Vale e para mim é uma coisa muito prazerosa, muito gratificante. Enfim, o que que eu vou fazer depois, não sei, a minha vontade é: enquanto eu me sentir útil e respeitado e prestigiado na Vale do Rio Doce, eu acho que eu continuo, porque, eu acho que o dia que eu parar de trabalhar, eu acho que eu morro. Se você pudesse perguntar assim pra mim: O que que é a Vale pra você? Eu acho que a Vale pra mim é isso mesmo, é uma vida, é uma vida eu diria bonita, uma vida como toda vida tem seus altos e baixos, tem momentos felizes, momentos de tristeza, mas é realmente uma vida construída, construída com muita dedicação, muita, muita dedicação, muito amor. Eu tenho um orgulho da Vale, tem uma frase que eu escrevi eu vou até pedir ao pessoal de Carajás pra mandar pra mim, porque eu estava falando sobre Carajás que eu dizia alguma coisa dizendo que era uma benção ser brasileiro, eu acho que a gente ser brasileiro é uma benção, é um país fantástico. Lamentável esses nossos políticos, que eu acho que isso aí é uma coisa democrática, o Congresso, mas eu acho que a gente deveria arranjar uma nova forma de escolha dos nossos representantes porque eles são muito mal escolhidos, eu acho que a culpa é nossa mesmo. Mas tinha que ser mudado, esses caras tinham que trabalhar melhor, os nossos governantes deveriam governar realmente com a vontade de fazer as coisas pelas pessoas, sempre um esqueminha da curriola. E o Fernando Henrique tem a cara de pau de dizer: “Estamos chegando ao nível depois de seis nãos”. Pô, o que é isso! Eu acho que esse momento que eu estou vivendo é um momento muito importante da minha vida, eu estou com cinquenta e cinco anos bem vividos eu diria, eu diria muito bem vividos, não tenho arrependimento de nada, os arrependimentos na verdade são de coisas que eventualmente eu deixei de fazer, eu deixei de encarar, porque o que você fez está feito, não adianta nem se arrepender porque já está feito, se a consequência for boa ou ruim, o máximo que você pode tirar é a lição, se tirar, porque normalmente a gente não aprende também não, a gente faz de novo. Esse é um negócio, pelo menos comigo acontece muito, papai é que dizia que o homem inteligente vivia com a experiência dos outros e eu devo ser muito burro, porque nem com a minha eu aprendo. Mas então, eu continuo a fazer muita coisa porque eu acredito nas coisas que eu faço, eu nunca fiz nada pela cabeça dos outros ou seguindo uma orientação, se aquele negócio não for uma coisa que eu não acredito, seguramente eu não vou fazer, então para mim é uma coisa que me faz muito bem, eu acho que é importante, por exemplo, para os meus filhos, para mim pessoalmente foi problemático em certas ocasiões, porque você quando não cumpre a ordem..., aliás, você viu naquele ___, naquele parecer que eu dei lá, ordem burra não se cumpre, então ordem burra no máximo você diz assim: “Olha, não vou fazer”, ou dá uma solução política, fazendo uma coisa diferenciada, negociando, ordem burra não se cumpre, ordem burra, desonesta, isso você não faz. Agora, você precisa chegar a um nível de maturidade, que eu acho que eu estou começando a entrar e, mais do que maturidade, administração da vaidade, eu acho isso fundamental, onde você consegue articular bem as coisas, ou seja, você não se julga o dono da verdade, você ouve mais as pessoas, e você, até quando você pensa, pensa não, acha que você está certo, mas antes de você forçar a barra na sua definição, você se lembra disso: “Vem cá, será que eu não estou sendo vaidoso não, será que isso não é uma coisa personalista?”. Esse exercício é fundamental e eu aprendi a fazer esse exercício, e está sendo muito legal pra mim e quando eu acho que eu estou caindo numa recaída eu falo: “Eh, te cuida Godoy rapaz, o negócio não é por aí não”. E se eu pudesse passar alguma experiência para quem quer que seja, para os meus filhos, para vocês eu acho que isso é fundamental, sempre pensem quando forem fazer as coisas, como o outro está te vendo, não para você ficar preocupado com o outro, mas como você se sentiria na situação do outro, é um transpasse, é você se colocar na situação do interlocutor, de repente você vai ver é, de repente o cara está certo, de repente você está extrapolando. Enfim, Vale do Rio Doce é a minha vida junto com a minha família. Aliás, eu acho, minha mulher diz isso mesmo, que a Vale é mais a minha família do que a minha família própria. Mas é uma família muito legal.
P2 – Casou duas vezes.
R – Ah, a Vale é a minha vida, a Vale é a minha vida. E eu devo ser hoje, eu vou averiguar, eu devo ser o decano da Vale, não o mais velho, mas o mais antigo, mas mais velho do que eu deve ter outros.
P1 – Você está com trinta anos?
R – Trinta anos de Vale. Como diz o meu sogro, que é milico: “Trinta anos duros”. Duros mas bonitos. Eu achei que foi uma vida bem vivida. Eu falei para minha mulher, uma vez eu disse para ela o seguinte: “Sônia, esse meu batido coração”, batido coração, gostei dessa expressão, esse meu batido coração, ele vive com muita intensidade e vivi todos esses anos de Vale do Rio Doce com muita intensidade, foi muito bem vivido, a experiência, as coisas que eu vi, as coisas que eu curti, tudo o que eu tenho hoje em termos materiais devo à Vale, o dinheiro que eu ganhei na Vale, os prêmios que eu ganhei na Vale e esse momento, isso para mim é um prêmio, é uma recompensa bonita, que eu não criei para mim, mas que a vida me deu através da Vale esse retorno, eu acho muito legal. Eu acho que eu estou muito bem de vida e registrar essa minha vida, eu acho uma coisa muito boa. Aí, meu amigo, tem que ter vaidade mesmo. (risos) Por hoje eu acho que é por isso mesmo.
P1 – Obrigada. Continuamos na próxima.
P2 – É, porque está com quanto trinta por cento da vida, falta setenta por cento.
P1 – É tem mais dois encontros viu, obrigada, foi ótimo.
R – Tudo bem. (risos)
Parte 2
P/1 – Bom, doutor Godoy, eu acho que a gente podia explorar hoje um pouco mais a Fundação Vale do Rio Doce hoje, os projetos que ela desenvolve, quer dizer, esse carro chefe da educação que ela vem puxando, e um pouco como é que as comunidades respondem e veem a fundação, o trabalho dela, essa interação entre as duas.
R – Olha, eu acho que, acho não, tenho certeza que o trabalho da Fundação cada vez vai ser mais valorizado não só pela Vale, a empresa, a instituição, mas pelos seus empregados e pelas comunidades onde a Vale atua, ou seja, pelo Brasil como um todo, porque a proposta da Vale de ser a maior empresa, ou a grande multinacional brasileira, evidentemente que o desenvolvimento econômico, como tem que estar com o seu contraponto necessário que é o desenvolvimento social, vai ter na Fundação a maior fundação e a melhor Fundação desse país. Eu não tenho a menor dúvida disso. E vocês sabem que eu tenho um ufanismo pelo país e pela Vale, e pelo trabalho que a gente faz, eu acho que sem restrições, eu acho que o que a gente tem avançado nesse processo tem sido fantástico. Primeiro lugar: a Fundação era zero, na verdade, na questão social voltada para comunidade, ou seja, ela começou efetivamente a partir da privatização da Vale do Rio Doce, esse trabalho novo, inovador, que a Vale está fazendo através da Fundação. Então, a Vale definiu uma estratégia da sua atuação tendo o social como um negócio, mas um negócio importante, fazendo parte do negócio da Vale do Rio Doce, a antiga filantropia assistencialista da Vale estatal, clientelista, que a gente já falou anteriormente, ela deu lugar a um instrumento poderoso, atual, moderno, e fundamental para o sucesso da Vale do Rio Doce, que é o investimento social, e, como todo investimento, ele tem que dar retorno, e o retorno se dá de uma forma muito clara e mensurável, ele é medido pela produtividade do empregado, e ele é medido pela visibilidade que essas ações dão para a Vale do Rio Doce, não só junto à comunidade mas como junto, evidentemente, aos órgãos políticos e governamentais que acompanham esse trabalho que são necessários para o êxito da Vale do Rio Doce. Então, esse discurso que eu faço e que hoje eu tenho como comprovar, isso para nós foi uma coisa muito importante. Eu sempre digo o seguinte: o orgulho que o empregado tem de ver uma empresa preocupada com o desenvolvimento da sua comunidade, com a melhoria de qualidade de vida dos seus empregados e da comunidade onde ele atua, vai fazer esse empregado produzir mais e melhor, e isso, evidentemente, vai repercutir no resultado da própria empresa. Outro dia mesmo a gente teve uma resposta sobre, “Meu Deus, mas como é que se mede esse negócio, como é que funciona isso?”, o que nós recebemos de e-mails dos empregados do sistema Norte elogiando o trabalho da Fundação, e dentro dessa linha, como eles se sentiam e se diziam orgulhosos por trabalhar naquela empresa, que aquilo era uma dádiva. Enfim, em função de um projeto social que a gente estava fazendo lá no Norte, na estrada de ferro Carajás, que é exatamente a educação nos trilhos, nós vamos colocar, esse projeto eu acho ele porretíssimo, eu acho que isso vai dar uma visibilidade, vai ser um marco na história da Vale do Rio Doce. Você vai ter o trem dando educação, passando educação, mas não uma educação formal, educação para vida, educação, para essa palavra que está desgastada, que é a cidadania, mas é isso mesmo, educação para vida, para todos os passageiros da estrada de ferro Carajás. Nas estações você vai ter televisões passando também essas mensagens educativas, esses filmes educativos, mas educação ali no dia a dia, necessária para vida, e nós vamos ter também um vagão parado nas cidades ao longo da linha fazendo cursos supletivos e agora, isso foi de ontem para hoje, uma ideia que surgiu do governo do Maranhão com a gente numa reunião que nós tivemos ontem com o gerente de planejamento do governo do Maranhão, que é o (Murah?), da gente fazer educação, alfabetização e educação para a vida junto aos assentamentos do Incra ao longo da estrada. Isso é inovador, isso é revolucionário, isso vai acabar e desmistificar, e mais do que isso, vai dar uma certa eficácia ao assentamento, porque o assentamento só o assentamento não resolve nada, então, você tem que privilegiar esses assentados com educação, mas educação pragmática. Então, você tem que alfabetizar esse pessoal, você tem que mostrar para eles como fazer determinado plantio, ou determinada semeadura compatível, condizente com a região, quais as técnicas para você melhorar a qualidade desse plantio, dessa semeadura, para você ter uma colheita mais produtiva, mais importante. Então, e eu acho que isso aí vai ser, é como dizem: “Nós vamos arrebentar”. Os procedimentos burocráticos desse país, ou seja, a Vale mais uma vez vai inovar, ela vai ser aquilo que ela sempre foi, uma precursora, uma desbravadora de processo, e nesses processos sociais de melhoria de qualidade de vida da população do país. Só voltando um pouquinho, esses trabalhos que a Fundação..., eu falei exatamente, essa é uma primeira questão do retorno do investimento social, quer dizer, o empregado orgulhoso, ele produzindo mais e melhor. O segundo ponto fundamental, que também é mensurável, é a questão da visibilidade, a questão da visibilidade e o resultado desta visibilidade dessas ações, eu vou citar para vocês dois exemplos de Itabira e um lá de Marabá porque essas coisas são muito importantes, as relações da Vale do Rio Doce com a prefeitura de Itabira, de fundamental importância para o êxito e o sucesso da Vale do Rio Doce, inclusive, com a comunidade de Itabira, estavam muito desgastadas, estavam muito, eu diria, azedinhas, para não dizer um termo mais pesado. Duas ações da Vale do Rio Doce através da Fundação quebraram esse gelo e tornaram hoje a Vale a maior parceira da prefeitura de Itabira, onde o prefeito tem não só a Vale, mas especialmente a Fundação, como um parceirão, isso foi comprovado pelo próprio presidente da Vale agora, o Jorio Dauster, quando ele chegou em Itabira, quer dizer, a fundação não só foi citada como foi motivo de placas e especialmente motivo de comentários positivos pela sua atuação e como a Vale ganhou com isso, então, são coisas mensuráveis, uma foi o Memorial Carlos Drummond de Andrade, outro foi a busca de recurso no canal da praia e, finalmente, um convênio que a gente assinou para apoiar o processo de profissionalização do Valério Doce, onde a gente está fazendo um projeto social acoplado com o processo de profissionalização do Valério Doce, foi um processo que a gente pegou o Romário, que tem um instituto aqui, estamos lançando esse projeto do Romário com cem crianças inicialmente lá em Itabira, mas isso está dando uma visibilidade e mostrando à sociedade que a Vale do Rio Doce além de ser uma grande instituição, uma grande empresa que gera o desenvolvimento econômico, que ela está profundamente preocupada com o desenvolvimento social. Então, a Vale, para mim, é uma empresa inteira hoje, ela tem o seu desenvolvimento econômico, tem o seu sucesso empresarial, colocando uma garra e uma postura muito firme na questão do desenvolvimento social. Eu acho que, um outro exemplo que a gente pode dizer é Marabá, que é outro município da maior importância e Parauapebas, nesses dois municípios nós fomos buscar recursos do BNDES, estamos trabalhando com recursos do BNDES, estamos fazendo alguns empreendimentos, todos os dois prefeitos são ótimos, são altamente competentes, mas a ação da Vale do Rio Doce tem sido muito positiva, para vocês terem uma ideia como a ação da Fundação tem sido forte nessas áreas, filmes de entrevistas e palestras e inaugurações com os dois prefeitos têm sido levados à mídia na campanha desses dois prefeitos, inclusive de Itabira, coincidência não houve não, os três prefeitos, claro que eles são bons, muito bons. Mas as ações que a Vale tem apoiado e aquilo que a Vale tem incentivado, esses três prefeitos estão praticamente eleitos com índices de aprovação da população de oitenta a cem por cento. Então, este trabalho, este investimento social, ele é mensurável, ele é visível, ele é palpável, e nenhuma empresa que pretenda ser uma empresa de sucesso no mundo hoje poderá ter esse sucesso sem ter esta preocupação no investimento social que a Vale hoje tem de uma forma muito clara e muito transparente.
P/2 – Com a diretoria da Vale, como é que se faz essa ponte dos projetos da Fundação com a Vale, e essa troca, para viabilização?
R – Olha, até o ano passado a gente teve muita dificuldade nessa relação, até porque a Vale se encontrava, como ainda tem algumas dificuldades entre os próprios acionistas de encontrar um rumo claro nesta questão social, quer dizer, mas também a questão do conhecimento das pessoas, enfim, estava uma relação ainda muito complicada, com a chegada do Jorio Dauster, ele colocou dentro da Fundação uma pessoa da sua total confiança, que era um colega de turma, um embaixador também, e, o embaixador, ele se colocou numa postura de parceiro, de afinado com o processo, chegou à Vale do Rio Doce com uma postura competente, e uma postura de uma humildade sem preconceitos, ou melhor, pieguice, ou seja, uma área onde ele nunca havia trabalhado, ele deixou que a equipe que estava tocando as coisas trabalhasse, e ele passou a ser um agregador de valor a essa equipe e nós temos uma relação da melhor qualidade, eu diria uma relação de amizade inclusive. Evidentemente, ele passou a ser a grande avenida onde os processos e os projetos da Vale do Rio Doce começaram a passar, porque a coisa levada por ele ao Jorio tinha uma tranquilidade para o presidente apoiar os projetos em função do seu conhecimento já com o embaixador. Então, hoje, a nossa relação com a diretoria da Vale eu diria que é dez, seja ela com o presidente, seja ela com todos os diretores da Vale do Rio Doce, inclusive com os conselheiros da Vale do Rio Doce. Mas isso não foi de graça, isso foi um trabalho suado, dedicado. Eu, particularmente, fiquei até com pressão alta por causa desse negócio, até que estou administrando legal, um coroa assim com cinquenta e cinco anos que toma bala para hipertensão. Então, essas coisas também ajudam (riso) no êxito do processo, ou melhor, ajudam não, fazem parte, lamentavelmente, mas fazem parte, o desgaste é necessário, o estresse é consequência e algumas mazelas acontecem, eu espero até, mais tarde, largar essa bolota, de repente, quando eu sair da Vale, porque aí vou jogar mais um vôlei de praia, um futvôlei, aí a coisa ameniza. Mas, hoje, a nossa relação com a diretoria da Vale e com os conselheiros é da melhor qualidade, há um respeito pela Fundação, há um reconhecimento pelo trabalho da Fundação. Evidentemente, que toda equipe, não só nós diretores, mas, fundamentalmente, nós temos sucesso porque nós temos uma equipe pequena, enxuta, mas de profunda qualidade e muito comprometida com a própria Fundação. É nessa linha que a gente está trabalhando e eu não tenho dúvida que essa linha vai ser um sucesso, com a gente, tanto o embaixador e eu, como os diretores, como aqueles que vão nos suceder... é isso.
P/2 – Vamos aos sonhos?
R – Pode, oh, o negócio do sonho eu falei “Meu Deus”, um homem que, porra, pensa um sonho grande, não conseguiu externar naquele momento, eu estava meio perdido, acho que eu devia estar cansado, eu me lembrei uma coisa, eu devo ter falado na entrevista anteriormente, eu fiz análise durante quatro anos, aliás, estou voltando para análise porque análise é fundamental, tenho que organizar ainda uns pontinhos que ainda não estão bem fechados, espero fechá-los até o final desse ano para desespero da minha analista (riso), mas ela me falava um negócio que era o seguinte: “Godoy, você quer simplesmente nada menos do que tudo”. Eu falei “É, por que não?”, então, quando vocês me falaram no grande sonho, eu acho que o grande sonho que eu tenho na verdade, claro, grandes sonhinhos, não é, sonetinhos, você tem vários assim, coisas merrecas, agora o grande sonho mesmo que eu tenho, não necessariamente nessa ordem, mas tem que aglutinar essas questões, porque isso é a minha cabeça, o que eu queria muito mesmo, grande sonho, não é, é que fossem preservados na minha vida: a minha saúde, que eu acho muito boa e a minha coragem; e que fossem fortalecidos a minha paciência, a minha humildade; e nesse mix de saúde, coragem, humildade e paciência me fosse dado muito poder, não o poder pelo poder, mas o poder para gente poder fazer isso tudo que a gente sonha, tudo que a gente sonha em relação a minha família, tudo que eu sonho em relação às pessoas que trabalham comigo, com a Vale do Rio Doce, e aquilo que eu sonho com esse país. Então, o que eu gostaria muito era de preservar: a minha família ser um sucesso, uma mulher maravilhosa, uns filhos maravilhosos que eu tenho, tive esse prêmio da vida, essa empresa fantástica que eu tive o privilégio de conhecer e trabalhar já por trinta anos, e esse país, que eu tenho certeza que ele vai acordar para o seu destino que é o maior destino de todos os países desse mundo. O Brasil será, eu não tenho dúvida, a grande potência com “P” maiúsculo desse mundo, talvez não seja para o meu mundo aqui na Terra, mas eu tenho certeza que eu vou morrer dormindo, mas antes de eu morrer dormindo eu vou ver este país acordar para o seu destino fantástico, e eu não tenho dúvida que neste destino a Vale do Rio Doce vai ser um fator fundamental nesse acontecimento, é isso.
P/2 – Muito obrigada.
R – Eu estou liquidado.
P/2 – (riso) Bom.
P/1 – Ótimo.
R – Era isso que eu queria dizer, falei: “Porra, como é que eu não vou dizer porra”.
P/1 – Amarra.
R – Acho que amarra ali, não é? Vamos para próxima.
P/2 – Nossa, hoje foi denso, foi curto e denso.
R – Eu sou, curto e grosso (riso).
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