Projeto Memória dos Trabalhadores Petrobras
Depoimento de Thereza Aguilar
Entrevistado por Márcia de Paiva
Rio de Janeiro, 12/11/2004
Realização Museu da Pessoa
Depoimento PETRO_CB622
Transcrito por Susy Ramos
P/1 – Bom dia!
R – Bom dia!
P/1 – Queria começar a entrevista pedindo que você nos diga seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome completo é Thereza Aguilar, nasci no Rio de Janeiro em 30/3/74.
P/1 – Teresa, conta um pouco da sua trajetória e como você chegou a esse projeto tão bonito que é o Dançando Para Não Dançar?
R – Na verdade eu passei sete anos fora do Brasil, fiz balé na Alemanha, na DDR, na Alemanha comunista e depois fui para Cuba trabalhar lá, então eu tirei a idéia do Balé Nacional de Cuba que foi formado com crianças carentes, órfãs de pai e mãe. Cheguei no Brasil e gostaria de fazer algo parecido, e comecei sozinha no Cantagalo, Pavão e Pavãozinho, com uma tremenda dificuldade, mas ...
P/1 – Sozinha?
R – Sozinha, sozinha para tudo, em 94. E fui indo para as outras comunidades, fui indo, tive muitas dificuldades mesmo, até dentro da comunidade mesmo, o próprio preconceito da dança clássica ser coisa de gente rica,material muito caro, e eu fui lutando, essas crianças foram crescendo, passando para a Escola de Dança do Teatro Municipal Maria (Olineuva?), e foram se destacando, e a própria escola onde eu estudei, em 99 ficou super empolgada, estava sabendo que eu estava fazendo um projeto desse, então me convidou para ir para lá, eu fui com 10 crianças para lá dançando...
P/1 – Para qual escola?
R – A Estat Ballet ______ Berlin, a Escola do Estado de Berlim, e daí me cedeu duas bolsas para duas meninas do Dançando irem estudar lá, e Cuba também, eu tenho duas em Cuba, mas isso tudo foi através de, foi em 99, foi através do patrocínio da Petrobras que foi uma maravilha para a gente. Chegou a um ponto que eu já não agüentava mais, eu não dava conta do...
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Depoimento de Thereza Aguilar
Entrevistado por Márcia de Paiva
Rio de Janeiro, 12/11/2004
Realização Museu da Pessoa
Depoimento PETRO_CB622
Transcrito por Susy Ramos
P/1 – Bom dia!
R – Bom dia!
P/1 – Queria começar a entrevista pedindo que você nos diga seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome completo é Thereza Aguilar, nasci no Rio de Janeiro em 30/3/74.
P/1 – Teresa, conta um pouco da sua trajetória e como você chegou a esse projeto tão bonito que é o Dançando Para Não Dançar?
R – Na verdade eu passei sete anos fora do Brasil, fiz balé na Alemanha, na DDR, na Alemanha comunista e depois fui para Cuba trabalhar lá, então eu tirei a idéia do Balé Nacional de Cuba que foi formado com crianças carentes, órfãs de pai e mãe. Cheguei no Brasil e gostaria de fazer algo parecido, e comecei sozinha no Cantagalo, Pavão e Pavãozinho, com uma tremenda dificuldade, mas ...
P/1 – Sozinha?
R – Sozinha, sozinha para tudo, em 94. E fui indo para as outras comunidades, fui indo, tive muitas dificuldades mesmo, até dentro da comunidade mesmo, o próprio preconceito da dança clássica ser coisa de gente rica,material muito caro, e eu fui lutando, essas crianças foram crescendo, passando para a Escola de Dança do Teatro Municipal Maria (Olineuva?), e foram se destacando, e a própria escola onde eu estudei, em 99 ficou super empolgada, estava sabendo que eu estava fazendo um projeto desse, então me convidou para ir para lá, eu fui com 10 crianças para lá dançando...
P/1 – Para qual escola?
R – A Estat Ballet ______ Berlin, a Escola do Estado de Berlim, e daí me cedeu duas bolsas para duas meninas do Dançando irem estudar lá, e Cuba também, eu tenho duas em Cuba, mas isso tudo foi através de, foi em 99, foi através do patrocínio da Petrobras que foi uma maravilha para a gente. Chegou a um ponto que eu já não agüentava mais, eu não dava conta do meu trabalho mais, então eu tive que pedir ajuda, eu falei: “Eu preciso de ajuda!”, e elas estavam pedindo muito mais para mim, não era só aula de balé, elas precisavam de outros recursos porque só aula de balé não resolve, ajuda mas não resolve. Através do patrocínio eu consegui ter dentista, médico, assistente social, fono, psicóloga, nutricionista, professora de espanhol, explicadora, se formou uma equipe muito grande, maravilhosa, é uma equipe que está trabalhando há anos juntas.
P/1 – O que é explicadora? Só para a gente entender.
R – É explicadora porque agora se fala explicadora. É uma professora que ensina matemática, física, química, ensina as outras matérias para as crianças quando elas têm dificuldades. Conseguimos crescer bastante, hoje em dia são 450 crianças, 11 comunidades já e nós não temos condições de partir, as comunidades ficam pedindo a gente, mas é muito difícil porque o trabalho é muito sério, elas têm toda uma assistência social por trás disso, médico, dentista, psicóloga, a nutricionista, todo mundo por trás das crianças, fora a aula de balé, nós já temos mais de 50 crianças na Escola de Dança Maria (Olineuva?) do Teatro Municipal, temos duas na Alemanha, uma fazendo o primeiro papel de Gisele agora, que é a Bárbara Freire, que mora no Cantagalo, temos duas em Cuba, no Balé Nacional de Cuba e nosso sonho é crescer e formar uma grande escola agora, deixar de ser projeto e formar uma grande escola de balé onde a gente possa também atender não só as nossas crianças de comunidade, mas atender também crianças de rua, por isso precisávamos também de um internato e de um espaço maior para poder trabalhar.
P/1 – Então vamos por partes, porque você falou tanta coisa. Como de uma aula de dança se transformou em um enorme projeto com apoio a tudo. Eu queria te perguntar, como é esse funcionamento? É uma equipe de assistência por detrás?
(PAUSA)
P/1 – Teresa, é toda uma equipe por trás coordenada. Você faz essa coordenação também?
R – Eu faço toda essa coordenação com a equipe inteira do Dançando, nós trabalhamos em conjunto, lógico que elas não estão todo dia, a psicóloga atende uma vez na semana nas comunidades, a assistente social vai acompanhando de casa em casa, e através do acompanhamento da assistente social nós conseguimos, nós temos famílias de extrema carência, então formamos o Dançando em Família, que é um outro projeto que é ligado a um nucleozinho do Dançando que nós temos agora 15 mães estudando em um curso até particular para estimular um pouco, porque na verdade a gente coloca na, se você coloca nessa, na escola pública que elas não, acaba perdendo até o incentivo, nós mudamos a história, colocamos em um curso particular, elas estão fazendo o primeiro grau, duas estão fazendo o segundo grau, já pretendem até fazer faculdade, nós estamos mudando essa família que é uma família que tem extrema carência, essas 15 famílias são de extrema carência mesmo do Dançando. Nós já vimos, já estamos vendo porque agora elas fazem prova em dezembro, vários resultados na família, várias mudanças, comportamento, inclusive na própria comunidade, está sendo maravilhoso esse projeto Dançando em Família.
P/1 – E o Dançando, ele tem uma base, você trabalha com várias comunidades, mas a partir dessa base que o trabalho é feito, que é ali naquele prédio...
R – Não, a base agora está em um escritório na Rua Alice, e em cada comunidade nós temos as salas de balé.
P/1 – Vocês já estão baseados em cada uma dessas comunidades?
R – É, cada comunidade tem uma sala de balé onde as crianças têm aulas todos os dias e onde vão os professores, os professores vão na comunidade, essa é a diferença do Dançando. Porque na verdade a grande dificuldade é você ir na comunidade, é conviver com aquele dia-a-dia delas que é muito difícil e muito complicado, porque quando você traz a criança para você, depois ela volta para aquela realidade que é muito cruel, são mundos completamente diferentes, então nós não, nós trabalhamos dentro da comunidade mesmo, quer dizer, é difícil, não é nada fácil, é muito difícil trabalhar lá dentro mesmo porque você passa por várias dificuldades.
P/1 – Qual é uma dificuldade? Que demanda mais esforço?
R – Quando começa tiroteio, não tem para onde correr, aí não tem jeito, a gente tem que ficar, tem que continuar normal como se nada tivesse acontecido, continuar a aula, porque não tem para onde correr, e esperar passar. Estamos correndo risco direto, lógico, com muito mais freqüência do que uma pessoa que está aqui embaixo, e com muito mais freqüência naturalmente porque você não sabe a pessoa que pode entrar e fazer o quê com a gente, lógico, está vendo a gente com criança, mas hoje em dia as pessoas não se respeitam, e eu acho que está faltando cidadania e eu acho que a arte é um grande mecanismo de transformação social, então eu acho que o Dançando, não está sendo nada fácil, esse ano foi muito mais difícil para a gente, é um ano com muita violência, muito complicado, mas nós estamos vencendo, aos poucos estamos vencendo.
P/1 – É uma batalha, né?
R – É uma batalha muito forte porque a gente está remando contra a maré.
P/1 – E qual é assim a sua maior alegria? Você falou da maior dificuldade, qual é sua maior alegria nesse projeto?
R – A minha maior alegria, eu acho quando a gente está ensaiando, quando chega o final de ano, as mães passando, uma mãe agora me mandou um e-mail maravilhoso, depoimento, ela nunca mexeu na internet, eu falei para ela que cada passo que ela dava seria uma lágrima de vitória nossa, do Dançando Para Não Dançar, porque você vê uma mãe, enfim, que mora ali dentro, que passa por milhões de dificuldades, já mexendo na internet, estudando, correndo atrás, encarando, vendo que o leque, tem outro leque da vida e que ela pode crescer naquele leque, é só ela lutar, quer dizer, a pessoa não consegue lutar sozinha, tem que estimular, trabalhar em cima daquela pessoa e mostrar para ela que ela pode. O que mais tem dentro do morro são pessoas com talento, qualidade, pessoas muito boas também, mas é muito mais fácil o outro mundo, está muito mais próximo e não precisa trabalhar tanto como a gente trabalha.
P/1 – Não demanda esforço nenhum.
R – É, pois é, mas ao mesmo tempo a vida é muito curta, e as pessoas sabem que isso não é bom, tanto que colocam seus filhos nos projetos sociais.
P/1 – Teresa, você trabalha então com uma faixa etária bem ampla, que você pega desde as crianças até as mães. Qual é a idade menor que você...
R – Nós estamos pegando as nossas babies com seis anos, que agora nós vamos até fazer um espetáculo maravilhoso, vai ser no teatro João Caetano, com as 400 crianças do Dançando participando, super lindo, e todas estão participando. A gente pega desde os cinco anos, cinco para seis anos, começa a aulinha com baby, nós temos monitoras dando aula, são meninas da própria comunidade que já trabalham há anos com a gente e já estão dando aula, nós estamos formando a companhia de dança Dançando Para Não Dançar Cia. e até as nossas mães atualmente, que é a nossa grande dificuldade, um dos trabalhos mais difíceis porque essas pessoas já estão formadas.
P/1 – Mudar uma cultura.
R – Mudar, é muito difícil mudar aquela família, mas nós estamos tendo vários progressos, você vê as mães falam: “Eu vou fazer a prova, vou passar, vou terminar o meu primeiro grau.”. Pôxa, como é gratificante, eu espero que elas passem, é o nosso primeiro ano trabalhando direto com a família, é um trabalho de todos os sábados estar ali, dentro da casa delas, tentando melhorar, tentando modificar o hábito, o costume, a educação, porque isso é muito difícil porque já está, não é igual ao Dançando que nós pegamos com seis anos e vamos trabalhando com essas crianças. Quando elas chegam com 15, 16, têm outra mentalidade, é outra criança, se você pegar a que está na Alemanha, você cai dura, você fala: “Não, essa garota não mora ali.”, aí você vai na casa dela, você fala: “Não, impossível!”, entendeu? A menina maravilhosa, mas vem, foi formada por pessoas, e ela vai mudando a família dela, a mãe dela depois que ela foi para a Alemanha passou a estudar já também está fazendo, vai querer fazer faculdade de direito, olha que maravilha, o pai dela é cozinheiro, trabalha naquele restaurante Garota da Urca, ele é o cozinheiro lá do Garota da Urca, quer dizer, a família inteira já começa a trabalhar, já começa a batalhar, já começa a ver outros caminhos, o leque já aumenta bastante deles. E um vai levando o outro, vai virando uma grande corrente, é por isso que eu digo, o Dançando é uma grande corrente, eu espero que seja. (RISOS)
P/1 – Não é só uma aula de balé, né?
R – Não, não é só uma aula de balé.
P/1 – Teresa, me diga uma coisa, a equipe, você sabe calcular mais ou menos a quantas anda essa equipe? É uma equipe grande?
R – É uma equipe direta de 33 pessoas, agora indiretamente trabalha muita gente porque, por exemplo, eu tenho mães agora, todas trabalhando na parte da costura, porque tem que fazer as roupas das meninas, no final do ano são 400 roupas novas, é uma loucura, é um corre-corre danado, falta isso, falta aquilo. Então uma costura sapatilha, outra bota elástico, outra faz as redes, indiretamente muita gente.
P/1 – Você também está agregando para esse trabalho a própria comunidade.
R – Também, que é o nosso sonho quando formar a escola de dança, de ter o clube de mães, as nossas mães trabalhando. Elas deixam seus filhos lá para fazer aula, ter todas as suas aulas, e ela fica trabalhando ali porque a dança não é só balé, a dança tem som, tem luz, tem carpinteiro, tem muita gente envolvida para um espetáculo sair, e por que não eles trabalharem com isso? Estar ali do ladinho dos filhos? (RISOS)
P/1 – Teresa, me diga, você começou a falar do projeto da Petrobras, então ele veio para apoiar vocês a partir de que ano?
R – De 99, foi em 99 que tudo começou a crescer, que eu vi que eu não dava conta mais e consegui o patrocínio, e a Petrobras dá toda a manutenção do Dançando, inteira, para a gente isso é fantástico e através desse patrocínio que começamos a crescer e chegamos onde estamos e queremos crescer muito mais.
P/1 – Ainda tem muito mais pela frente?
R – É, porque na verdade aqui no Rio de Janeiro só tem uma escola de balé oficial, que é essa do Teatro Municipal, e realmente você chega lá para fazer a audição, tem milhões de crianças querendo fazer prova para lá e não conseguem passar e têm dificuldades, o Dançando até passa até demais de lá, mas nós gostaríamos de ter a nossa própria escola, uma escola onde a gente pudesse ter de tudo ali dentro, não só aulas de balé, aulas de (padedê?), aula de dança moderna, formar realmente, uma escola reconhecida pelo MEC, além de formar, ainda dar toda a parte social que fosse em um núcleo só sem deixar de termos os nossos núcleos nas nossas comunidades, porque isso é fundamental, estarmos dentro da comunidade. Essa é a grande diferença do Dançando e de outros projetos, porque normalmente os projetos acontecem fora da comunidade, o nosso realmente é lá dentro.
P/1 – Teresa, e com tudo isso você ainda consegue dar aula de dança? Tem tempo ainda para você estar dando aula?
R – Eu vou te falar, eu não estou dando aula mais não, eu só estou ensaiando porque eu tenho que estar em todos os ensaios e mudar muita coisa e botar do jeitinho, porque um vai ajudando o outro, enfim, a gente tem uma coisa muito legal, saber trabalhar em equipe, saber dividir, saber somar, entendeu? Saber recuar, e eu acho que a equipe do Dançando é muito unida, consegui depois também de um bom tempo, de pelo menos uma equipe de quatro anos juntas, todo mundo junto, são as mesmas pessoas, isso é um trabalho de equipe, de estar todo mundo junto, com o mesmo objetivo e querendo crescer junto.
P/1 – Teresa, tem alguma outra coisa que você gostaria de deixar registrado?
R – Sim, eu acho que é uma grande saída, são projetos sociais que dão certo, que trabalham com seriedade e eu acho que a educação vai mudar, com certeza a gente consegue mudar através da arte, e vamos conseguir mudar o nosso país, mas cada um fazendo o seu pouquinho dentro da sua área, e que você desenvolva o seu trabalho dentro da sua área bem. Eu acho que é por aí, ___ você passar mal o que você faz.
P/1 – Mais Teresas.
R – É. (RISOS) Mais Teresas e mais projetos que trabalham dessa forma.
P/1 – Exatamente. Teresa, queria agradecer a sua participação.
R – Obrigada a você.
(fim da entrevista_________).
Olineuva
Padedê
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