IDENTIFICAÇÃO
Roberto Anderson de Miranda Magalhães. Eu nasci em São Paulo no dia 15 de janeiro de 1954.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Eu sou arquiteto. Desde a época de faculdade, eu já vinha me interessando pela área de patrimônio e urbanismo. Eu sempre trabalhei com as duas áreas: patrimônio e urbanismo. E já havia trabalhado antes com essa área de patrimônio, no INEPAC. Trabalhei um período na Prefeitura, cuidando do Centro do Rio. Nessa época, criei um trabalho chamado “Fim de Semana no Centro”. Era um projeto muito interessante. Durou um tempo, duas gestões de governo. E depois eu voltei para o INEPAC, que é um órgão de preservação do patrimônio aqui do Estado do Rio, onde retomei um trabalho que já havia sido iniciado na Secretaria de Cultura, que é o Distrito Cultural da Lapa. A nossa idéia é dar seqüência a um projeto que estava formatado, mas não estava definido ainda de onde viriam os recursos etc. Então, nós conseguimos chegar até a Petrobras e deu tudo muito certo. E, para nossa felicidade, o projeto está andando.
PROJETO DISTRITO CULTURAL DA LAPA
O projeto se chama Distrito Cultural da Lapa. O Distrito nasceu do seguinte: o Governo do Estado, que herdou todo o patrimônio imobiliário da antiga Guanabara, é proprietário de uma série de imóveis na área do Centro, principalmente, na área da Lapa, em função dos vários planos urbanísticos e viários que geraram desapropriações de sobrados, desapropriações de imóveis. Então, muitos desses sobrados até a década de 80 não tinham um uso definido e, nessa época, no Governo Brizola, se não me engano, houve uma primeira iniciativa de destinar parte desses imóveis, principalmente os que estavam na Lapa, para atividades culturais. Foram para lá o Grupo Hombu, o “Tá na Rua”, o Augusto Boal, a Federação de Blocos Afros, Casa Brasil-Nigéria, todos instalados em alguns sobrados. Mas isso ainda não contemplava todo o universo de imóveis do Governo do...
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Roberto Anderson de Miranda Magalhães. Eu nasci em São Paulo no dia 15 de janeiro de 1954.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Eu sou arquiteto. Desde a época de faculdade, eu já vinha me interessando pela área de patrimônio e urbanismo. Eu sempre trabalhei com as duas áreas: patrimônio e urbanismo. E já havia trabalhado antes com essa área de patrimônio, no INEPAC. Trabalhei um período na Prefeitura, cuidando do Centro do Rio. Nessa época, criei um trabalho chamado “Fim de Semana no Centro”. Era um projeto muito interessante. Durou um tempo, duas gestões de governo. E depois eu voltei para o INEPAC, que é um órgão de preservação do patrimônio aqui do Estado do Rio, onde retomei um trabalho que já havia sido iniciado na Secretaria de Cultura, que é o Distrito Cultural da Lapa. A nossa idéia é dar seqüência a um projeto que estava formatado, mas não estava definido ainda de onde viriam os recursos etc. Então, nós conseguimos chegar até a Petrobras e deu tudo muito certo. E, para nossa felicidade, o projeto está andando.
PROJETO DISTRITO CULTURAL DA LAPA
O projeto se chama Distrito Cultural da Lapa. O Distrito nasceu do seguinte: o Governo do Estado, que herdou todo o patrimônio imobiliário da antiga Guanabara, é proprietário de uma série de imóveis na área do Centro, principalmente, na área da Lapa, em função dos vários planos urbanísticos e viários que geraram desapropriações de sobrados, desapropriações de imóveis. Então, muitos desses sobrados até a década de 80 não tinham um uso definido e, nessa época, no Governo Brizola, se não me engano, houve uma primeira iniciativa de destinar parte desses imóveis, principalmente os que estavam na Lapa, para atividades culturais. Foram para lá o Grupo Hombu, o “Tá na Rua”, o Augusto Boal, a Federação de Blocos Afros, Casa Brasil-Nigéria, todos instalados em alguns sobrados. Mas isso ainda não contemplava todo o universo de imóveis do Governo do Estado nessa área. Então, foi criada por decreto uma figura chamada Distrito Cultural da Lapa, que engloba todos esses imóveis públicos desde a Igreja Nossa Senhora da Lapa até o fim da rua do Lavradio. Todos os imóveis que são públicos passam a ter uma destinação prioritária a atividades culturais. E o Estado teria que buscar meios de recuperar esses imóveis. Muitos deles estavam em péssimo estado de conservação. Então, essa é a figura legal do Distrito. Mas uma coisa é você entregar a uma entidade cultural que, às vezes, não tem capacidade e recursos para levantar o prédio em si. Pode tocar a sua atividade, mas o prédio já é uma obra mais cara. A nossa função foi começar a pensar como se poderia buscar uma outra formatação do projeto que fosse mais ampla e que o Estado tivesse uma intervenção mais ativa no sentido de recuperar os imóveis e buscar outras atividades. Não só aquelas que já estavam, mas criar outras atividades. Então existe uma idéia de criar um Centro de Documentação da Lapa, criar uma página na Internet do Distrito Cultural da Lapa, criar uma série de quiosques eletrônicos que conectem todos os Centros Culturais, todas as Casas de Cultura da Lapa, de forma que você possa, em cada uma dessas, acessar a programação de todas e saber o que está acontecendo. E, principalmente, recuperar os imóveis.
A Lapa é uma área rica culturalmente que, durante um certo tempo, ficou um pouco em baixa. Mas eu acho que, pela força das entidades culturais que estão ali, ela foi renascendo. Hoje em dia a Lapa é uma efervescência muito grande. Mas sempre tem que pensar que não basta essa efervescência, tem que ter suporte físico. As edificações têm que estar mantidas, dando inclusive segurança aos usuários.
PATROCÍNIO DA PETROBRAS/ PROJETO DISTRITO CULTURAL DA LAPA
Nós procuramos a Petrobras com uma proposta. Levamos num primeiro momento uma série de possibilidades de intervenção para a Petrobras. E foi muito boa a acolhida. Nos parece que há intenção de um investimento em longo prazo, em várias fases. Nós formatamos uma primeira fase inicial que consta de quatro projetos já em curso. Três são ligados a edificações e um ligado à memória documental - uma das entidades que funciona lá, o Museu da Imagem e do Som. Nesse caso, nós já iniciamos a obra.
PROJETO DISTRITO CULTURAL DA LAPA / PRIMEIRA FASE
Nós iniciamos a obra em três imóveis, que são: o Museu da Imagem e do Som, cuja sede é na Lapa, que tem um acervo fantástico, mas que não tinha condições nem materiais de digitalização desse acervo, que dessem um fácil acesso a todo mundo para pesquisar. No caso do Museu da Imagem e do Som, o nosso projeto com a Petrobras inclui a recuperação do imóvel, de toda a fachada, todo o telhado, as fachadas laterais e a criação de uma recepção no térreo para que as pessoas possam ser atendidas e ter acesso a computadores para pesquisa etc. E, ainda, o outro projeto é a digitalização de grande parte do acervo de partituras. Tem um acervo imenso de partituras e esse, então, é muito mais difícil de acessar se ele não estiver digitalizado, porque são papéis frágeis. O valor da obra do MIS é em torno de 400 mil reais e o valor da digitalização do acervo está em torno de 380 mil reais. E tudo isso já está andando. Quanto às outras duas obras, é interessante. De um lado, temos o MIS, que é um órgão oficial, e do outro lado duas entidades ligadas ao movimento negro: a Federação de Blocos Afros e Afoxés do Estado do Rio de Janeiro e a Casa Brasil-Nigéria. Para esses dois, o projeto contempla a recuperação da fachada e do telhado. No caso da Federação, nem telhado eles tinham. Eles tinham um telhado improvisado, que não era o telhado original. Então, a gente vai refazer todo o telhado. Aí, obviamente, obra é sempre obra. Quando se começa uma obra, você descobre mil outros problemas. A gente encontrou um problema sério que era a laje, o piso entre o primeiro e o segundo andar, entre o térreo e o primeiro andar, estava completamente comprometida. Era um risco realmente. Eles nem percebiam que estavam correndo o risco de desabamento. Foi muita sorte não ter acontecido nada. Esses dois sobrados fazem parte de um conjunto muito bonito onde estão o “Tá Na Rua”, o “Augusto Boal”, o Grupo Hombu e essas duas entidades. Todos eles formam uma fachada contínua. Quando todos forem recuperados, você vai ter a noção de um grande casarão muito imponente. Eles são ecléticos, são do século XIX. É difícil precisar. Às vezes, na falta de um documento preciso, você situa em função do estilo do imóvel. Nesse caso, é um estilo eclético com influência neoclássica. Então, a gente situa no final do século XIX. Pode ser 1890, 1880, por aí. Estava com um problema na laje. Ela teve simplesmente que ser demolida. A gente vai ter que reconstruir toda a laje, vamos construir um novo telhado. E, quando finalmente estiver pronto, o prédio vai estar em condições de uso com segurança. No caso da Casa Brasil-Nigéria, tinha um telhado original, mas já estava tão comprometido que tinha uma escora. Realmente, nos dois casos, também no caso da Brasil-Nigéria, a sensação que a gente teve é que eles tiveram muita sorte de não ter ocorrido um desabamento. Já estava por um triz mesmo. A intervenção foi providencial. As duas obras estão em curso. Então, no final, a gente espera entregar tudo pronto. Mas é nosso interesse e agora nós já estamos com outros projetos na Petrobras para dar seqüência ao Distrito Cultural da Lapa. Seria, então, a segunda fase do projeto.
PROJETO DISTRITO CULTURAL DA LAPA / SEGUNDA FASE
Na segunda fase do Projeto, a nossa intenção é recuperar os vizinhos, que são as casas do Augusto Boal, do “Ta na Rua” etc. Quereremos trabalhar um monumento da rua que é muito bonito: o lampadário da Lapa. É um monumento. É um lampadário que está sem lâmpadas, sem luminárias. A gente quer recuperar a sua forma original. Inclusive, em pesquisas, a gente descobriu algo muito interessante, ele remete aos descobrimentos portugueses. Os temas são as caravelas, os monstros marinhos, as ondas, mar, essa coisa toda. E são vários anéis sobrepostos. Houve um determinado momento em que isto foi desmontado e remontado na ordem errada. Então, quando se restaurar, a gente pretende botar na forma correta e aí vai se ter uma leitura mais clara do que se trata.
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO DA LAPA
E também contemplar o prédio em que a gente quer construir o Centro de Documentação da Lapa, que seria um centro de referência sobre a história do bairro. A idéia, quer dizer, vai ser a história da Lapa, mas também a história do Centro, de uma certa forma. Mas mais centrada na Lapa, toda a área, essa história urbanística é uma história cultural: a Lapa dos boêmios, a música, o samba, tudo isso. A idéia é que o espaço não seja tão grande, mas com recursos audiovisuais, para você ter acesso a uma série de informações, poder ter projeção de filmes, de vídeos, entre outros. Então, esse seria um pouco a âncora do projeto do Distrito Cultural da Lapa. Essa seria a segunda fase. E temos já definido o que seria a nossa terceira fase também.
PROJETO DISTRITO CULTURAL DA LAPA /TERCEIRA FASE
A terceira fase do Projeto está no papel, mas já é de conhecimento dos órgãos que analisam dentro da Petrobras e também eles já sinalizaram com muita simpatia que têm interesse nisso. Também no centro da Lapa. É um casarão muito bonito, o antigo Hotel Bragança, aquele prédio das duas torrinhas ao lado da Sala Cecília Meirelles. Ele tem uma história bonita. Ele já foi hotel. Ele está invadido por dezenas de famílias. Tem gente morando debaixo das telhas. Pessoas que conseguiram criar uma ventilação e estão morando ali embaixo das telhas. E o risco de desabamento é muito grande. A gente tem sempre uma preocupação de que possa ocorrer um problema maior. E ele já foi Casa dos Estudantes durante muito tempo. Então, tem muita história. Muita gente, inclusive o próprio Santa Rosa, se hospedou lá quando era estudante aqui da Petrobras. Então, a gente quer criar um grande centro de artes. A idéia é criar ateliês, para que os artistas fiquem com residências provisórias, onde possam criar e depois expor. Deverá haver um rodízio de artistas e tal. Mas ele ficou para uma terceira fase, porque é um imóvel privado. Então, nós precisamos resolver o problema da propriedade, o problema da locação desses moradores. E aí sim poder investir no imóvel. Isso tudo ainda é um pouco demorado.
PROJETO EDUCACIONAL NA LAPA
O outro projeto também é ali na Lapa. É um terreno do Estado, que não tem edificação. A edificação que havia ruiu e não tem vestígios, não tem nada. É apenas uma garagem. A nossa intenção é criar uma escola de formação para restauro, para que jovens entrem nessa área. É uma área que avançou muito aqui no Rio. A gente passou a cuidar muito do patrimônio. E, no entanto, a gente depende muito de uma mão-de-obra de pessoas de idade, já muito antigas. Os antigos artesãos, às vezes, passam o seu conhecimento para outros, mas não há um lugar onde isso esteja sistematizado. Essa passagem de conhecimento artesanal, de como trabalhar com o gesso, como trabalhar a madeira, aquelas volutas, aquela coisa do restauro de ladrilho, a pintura, tudo isso que são coisas muito delicadas e importantíssimas. Sem isso não adianta a gente conhecer sobre restauração, fazer cursos, se não tiver o artesão que vai lá na hora e vai efetivamente pôr a mão na massa. E se isso for localizado na Lapa é perfeito, porque está no meio da área de concentração desse patrimônio e no meio de um lugar onde a gente vê muitos adolescentes em situação problemática, de risco. Isso seria uma forma de tentar atraí-los para um projeto educacional. Esses seriam o coroamento do projeto do Distrito Cultural da Lapa.
PATRIMONIO CULTURAL NO BRASIL
Ainda bem que está começando a passar a era da incompreensão. Havia muito essa noção de que “é uma propriedade privada, eu sou dono daquilo, posso dispor do meu patrimônio como quiser, porque ninguém tem nada com isso”. Essa é uma mentalidade que, pouco a pouco, está desaparecendo até porque se percebe que um bem restaurado, um bem mantido em boas condições agrega valor à atividade que se exerce naquele local. Seja um restaurante, seja uma loja. Então, de uma certa forma, essa incompreensão está sendo mais ou menos vencida. São outras gerações que estão entrando aí e que já vêem isso com uma visão mais arejada. Mas, fora isso, há sempre a questão do financiamento, do recurso. Esse é que é o grande problema. Aqui no Centro do Rio isso é muito comum. Eu trabalhei num projeto em que a gente tentou levantar os imóveis nessa situação de risco de desabamento no Centro. O que a gente percebeu é que, muitas vezes, eram imóveis herdados por parentes de algum português ou espanhol, que já tinham voltado para sua terra. Os herdeiros eram empobrecidos. Não tinham condição de cuidar daquele capital, daquele patrimônio. Ou nem o proprietário se encontrava mais por aqui. O imóvel tinha sido completamente abandonado. Quer dizer, não se sabe quem é o proprietário de muitos imóveis e aqueles que se sabe, às vezes, são de famílias que não têm mais condições de mantê-lo. A legislação é bastante avançada nesse sentido, tanto a legislação municipal quanto a estadual e a federal. Ela prevê que, no caso de incapacidade do proprietário de cuidar do imóvel, o Poder Público seria responsável por adjudicar a si essa tarefa de recuperação e depois, um dia, cobrar desse proprietário. Mas aí o Poder Público ainda não tem condições ou vontade política de fazer isso. Então a gente depende muito de estar buscando esses patrocínios, financiamentos etc. No caso do Município do Rio, por exemplo, já existe um incentivo fiscal. E isso já resolve bem a situação de quem tem uma atividade real, ou mora, ou tem um comércio. Ele vai ter um ganho com a isenção de IPTU, o que faz ele se interessar em recuperar o imóvel. Mas aqueles imóveis abandonados são muito difíceis. O Poder Público tem que agir, não pode ficar querendo. E nós que trabalhamos com isso temos uma certa angústia de ver aquilo se deteriorando, como esse caso do prédio do Hotel Bragança, das duas torrinhas. Um prédio maravilhoso. Um prédio que, enquanto não for recuperado, você não vai ter a sensação de que a Lapa está recuperada. Ele vai ser sempre uma marca muito forte na Lapa. Então, a gente tem que recuperá-lo.
TRABALHO
Eu adoro a história do Rio de Janeiro, trabalho com isso, dou aula sobre a história do Rio. E acho que o que eu gostaria muito de ver é essa cidade tendo esse patrimônio vivo, mas não de uma forma artificial. Às vezes, é muito comum a gente ver projetos de recuperação que se artificializam. Fica tudo muito limpo, exageradamente limpo. O comércio que se instala é um comércio sofisticado, que atrai o turista, mas a gente sente que não são espaços vivos. No caso do Rio, a gente tem chance, porque isso não ocorre. A gente tem uma chance na medida em que, cada vez mais, as pessoas compreendem o valor desse patrimônio. A gente já passou uma fase muito difícil nos anos 70, em que esse patrimônio estava sendo demolido para se edificar prédios altos, escritórios. Isso, graças a Deus, é passado. Mas a gente tem o desafio de transformar a proteção legal, que existe, numa proteção efetiva. Porque só a legal não basta.
PATROCÍNIO PETROBRAS
Eu gostaria muito de agradecer a Petrobras, que é onde eu estou e que deu força. Foi muito bom ter tido essa aceitação do projeto. Foi tudo muito fácil. Obviamente, profissional. A gente teve que fornecer as informações necessárias, o que é normal. Eu sei que existem outras, mas no caso é muito importante que a Petrobras tenha esse papel. É muito difícil esse trabalho que a gente está fazendo.
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