IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Pietro Carlos Mônaco, eu nasci em primeiro de junho de 1951, em Niterói, Rio de Janeiro. INGRESSO NA PETROBRAS Trabalho na Petrobras desde 1974, há bastante tempo. Me formei em Engenharia Química pela Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nessa época, nós tínhamos algumas opções de trabalho e uma delas era a Petrobras. As outras opções eram o BNDES e a Companhia Estadual de Gás. Havia uma oferta maior de oportunidades. Hoje, praticamente, é só a Petrobras. Eu fiz concurso para os três, mas optei pela Petrobras. Eu diria mesmo que não optei, meu pai optou por mim e me aconselhou a entrar na Petrobras, mas acho que foi uma decisão correta. Na visão do meu pai, engenheiro tinha que trabalhar em uma empresa de engenharia ou de petróleo, não tinha sentido eu ir para um banco. A visão dele era essa, claro, uma visão muito limitada, ele é uma pessoa muito simples. Mas entre a Petrobras, o BNDES e a Companhia Estadual de Gás, o próprio tamanho da Petrobras favoreceu essa opção. Trabalhar na Petrobras não significava para mim o quanto significa hoje. Quer dizer, em termos salariais, eu lembro que o salário do BNDES era até melhor inicialmente. Mas a Petrobras não tinha essa imagem que tem hoje, de uma empresa reconhecidamente forte, uma empresa internacional, uma empresa vencedora. Na época, era uma empresa que, não me lembro bem, devia estar produzindo algo em torno de 200 ou 300 mil barris de petróleo. Era uma grande empresa, como sempre foi, mas não como hoje. CURSO INTERNO - ESPECIALIZAÇÂO Na época, nós já éramos admitidos como engenheiros estagiários, na categoria de estagiário. Fomos fazer um curso interno de 10 meses. Eu recordo que éramos 53 engenheiros ou alunos, não sei qual seria o termo correto, e no final de 10 meses só ficaram 42, porque alguns foram eliminados. Eram quatro períodos. A cada período havia uma verificação...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Meu nome é Pietro Carlos Mônaco, eu nasci em primeiro de junho de 1951, em Niterói, Rio de Janeiro. INGRESSO NA PETROBRAS Trabalho na Petrobras desde 1974, há bastante tempo. Me formei em Engenharia Química pela Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nessa época, nós tínhamos algumas opções de trabalho e uma delas era a Petrobras. As outras opções eram o BNDES e a Companhia Estadual de Gás. Havia uma oferta maior de oportunidades. Hoje, praticamente, é só a Petrobras. Eu fiz concurso para os três, mas optei pela Petrobras. Eu diria mesmo que não optei, meu pai optou por mim e me aconselhou a entrar na Petrobras, mas acho que foi uma decisão correta. Na visão do meu pai, engenheiro tinha que trabalhar em uma empresa de engenharia ou de petróleo, não tinha sentido eu ir para um banco. A visão dele era essa, claro, uma visão muito limitada, ele é uma pessoa muito simples. Mas entre a Petrobras, o BNDES e a Companhia Estadual de Gás, o próprio tamanho da Petrobras favoreceu essa opção. Trabalhar na Petrobras não significava para mim o quanto significa hoje. Quer dizer, em termos salariais, eu lembro que o salário do BNDES era até melhor inicialmente. Mas a Petrobras não tinha essa imagem que tem hoje, de uma empresa reconhecidamente forte, uma empresa internacional, uma empresa vencedora. Na época, era uma empresa que, não me lembro bem, devia estar produzindo algo em torno de 200 ou 300 mil barris de petróleo. Era uma grande empresa, como sempre foi, mas não como hoje. CURSO INTERNO - ESPECIALIZAÇÂO Na época, nós já éramos admitidos como engenheiros estagiários, na categoria de estagiário. Fomos fazer um curso interno de 10 meses. Eu recordo que éramos 53 engenheiros ou alunos, não sei qual seria o termo correto, e no final de 10 meses só ficaram 42, porque alguns foram eliminados. Eram quatro períodos. A cada período havia uma verificação de notas, então quem tinha abaixo de sete era eliminado. O curso era no Rio, no Edise. Nem me recordo qual era a sigla, não sei se era Universidade Coorporativa. Não, ainda não existia Universidade Coorporativa, mas o curso foi todo feito no Edise. Depois de 10 meses, nós fizemos a escolha. Era muito interessante porque era em função da nota final, porque na verdade havia uma classificação. No quadro-negro – ainda era quadro-negro – eram colocados as vagas e os locais, e chamavam assim: “Quem ficou em primeiro lugar? Você quer ir para onde?” E a pessoa escolhia. Podia escolher o local onde iria trabalhar. Os melhores classificados, os primeiros classificados escolhiam os melhores lugares, os locais que interessavam. Não preciso dizer que o Rio de Janeiro era disputadíssimo, porque a maior parte da turma era do Rio de Janeiro mesmo. Tinha também muita gente do Rio Grande do Sul e São Paulo, mas eles acabavam voltando para o seu local de origem. Assim foi feita a escolha. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu escolhi ficar no Rio de Janeiro na Engenharia, que a gente chamava de “Serviço de Engenharia”. Foi interessante porque, depois da escolha, havia um estágio. Era preciso fazer um estágio nas refinarias. Então, por exemplo, eu tive que ir para a Reduc, só que quando me apresentei no Serviço de Engenharia, descobri que tinha sido trocado de lugar, porque o Serviço de Engenharia devia uma vaga de engenheiro para o Departamento Industrial, o antigo Depin, que hoje é Refino. Eu costumo dizer que já entrei na Petrobras brigando. Hoje, eu não brigo mais, mas na época já entrei brigando. E eles me disseram: “Não, você não vai.” Da minha turma, eu era o terceiro colocado e tinha escolhido Serviço de Engenharia. Embora estivesse muito bem colocado na turma, entre os cinco ou seis primeiros lugares, eu era o terceiro colocado. E alguém tinha que ir para o Departamento Industrial. Naquela época, a imagem que a gente tinha do Departamento Industrial era a de fábrica, onde se usava macacão e coisas desse tipo, não tinha nada a ver com engenharia. Aí não preciso dizer que eu briguei, mas não teve jeito, tive que ir. Foi quando eu ouvi uma frase muito interessante. Acho que isso foi em 1974. Eu ouvi um comandante, não sei se ele era superintendente adjunto – não vou citar o nome, não sei nem se ainda está vivo –, dizer assim: “Você vai porque nós estamos mandando” Eu falei: “Eu não vou, por que tenho que ir? Eu dei um duro danado para poder escolher, escolhi Serviço de Engenharia.” E ele falou: “Meu filho, manda quem pode, obedece quem tem juízo” Eu era muito novo, devia ter menos de 23 anos, e falei: “Isso é papo de militar” Ele disse: “Mas quem é que está mandando?” Eu falei: “Eles” E o Comandante: “Eles não, Nós Então você vai” E eu fui. Não sabia que ele tinha sido Comandante na Marinha ou coisa desse tipo. Naquela época, na Petrobras, muitos cargos eram ocupados por militares ou reformados. Eu fui me apresentar ao Departamento Industrial chateadíssimo: “Nessa empresa não fico mais” Mas éramos obrigados a ficar dois anos. Havia uma cláusula no contrato que, terminado o curso, deveríamos permanecer na Empresa por dois anos, porque o curso era muito caro. A Petrobras gastava muito dinheiro para dar esse curso e nós tínhamos uma obrigação de ficar no mínimo dois anos, senão teríamos que pagar algo em torno de 50 – não lembro se era 50 mil, 50 milhões, não me recordo qual era a moeda –, mas era um valor altíssimo. Para você ter uma idéia, o meu salário era 3.217, até hoje eu lembro. Se eu saísse, teria que pagar uns 50 mil. E falei: “Vou ficar dois anos e vou embora dessa empresa que recebe a gente desse jeito” DITADURA MILITAR Eu não fiquei assustado com aquele Comandante. Na verdade, quando estava na faculdade, eu peguei ainda o finalzinho da ditadura. A Escola de Química era muito ativa nesse negócio político. Quando eu entrei para a Escola de Química, ela ainda era na Praia Vermelha. Não tinha medo; não tinha na Praia Vermelha, mas na Ilha do Fundão, na Cidade Universitária, sim. Quando estava cursando o segundo ano, a Escola de Química foi transferida para a Universidade Federal do Rio de Janeiro, quer dizer, ela foi para a Ilha do Fundão. Na minha época, por exemplo, o vestibular era separado, não era Cesgranrio, depois eles unificaram. Então, nós fazíamos vestibular separado, só para a Escola de Química. Mas as forças policiais tinham um certo receio da Escola de Química, porque o pessoal jogava ácido na polícia. Então, os alunos mais antigos contavam que bastava puxar um vidrinho que os “caras” se apavoravam, não sabiam o que tinha dentro. Então, eu não tinha esse medo. Era muito novo e quando a gente é muita nova é meio inconseqüente, ainda bem Já chega o medo da velhice. A velhice dá um certo medo, deixa a gente mais inseguro. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / DEPARTAMENTO INDUSTRIAL / REDUC Eu fui para o Departamento Industrial e chegando lá fomos recebidos pelo superintendente que era o Alberto Boidyjan, uma pessoa muito austera. Naquela época, superintendente era quase Deus. Lá pelas tantas, ele fez aquele discurso de boas vindas, referindo-se a “sangue-novo” e aquelas coisas que a gente fala normalmente. E perguntou se alguém queria falar alguma coisa. Eu levantei a mão e falei assim: “Eu não escolhi para vir para cá.” Com isso, aquela festa acabou, botei água no chope. Já pensou? Chegar lá na frente do superintendente, tinha um que era o superintendente e outros adjuntos – naquela época tinha o superintendente e os adjuntos, tudo pessoal antigo – e dizer: “Eu não escolhi vir para cá Estou vindo obrigado” Eu contei a história e ele falou: “Não, senhor, não quero ninguém obrigado aqui. Você vai voltar para o Serviço de Engenharia.” “Agora eu estou morto quando encontrar aquele Comandante de novo.” Mas, finalmente, eu acabei indo para a refinaria. Eu tinha que ficar na refinaria estagiando na parte de operação. Gostei e fiquei dois anos na Reduc, mas me mantive ligado ao Serviço de Engenharia. Não tive problemas com o Comandante, nem sei se ele soube, mas quando encontrava com ele no elevador, eu dava um jeito de me esconder. São momentos na vida da gente. Não tenho mágoa disso, consegui superar. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / SERVIÇO DE ENGENHARIA Eu fui para o Serviço de Engenharia, onde fiquei dois anos. Quando cheguei lá, o chefe era o Jonas Boechat, uma pessoa fantástica, um engenheiro de processamento também, e ele disse para mim: “O que eu vou fazer com você aqui?” Lá só tinha terraplanagem, só tinha máquina, e ele falou: “Engenheiro de processamento vai fazer o que aqui? Vai contar a quantidade de estacas que a gente vai estar fincando aqui no chão?” E ele disse ainda: “Você quer ir para a operação e estagiar lá? Eu arranjo.” O superintendente da Reduc, o Skinner, era muito amigo dele, foi da sua turma. Então, ele falou com o Skinner que estava com essa situação e se poderia me dar o estágio na operação. REDUC / ENGENHARIA BÁSICA Eu fui para a Reduc, e foi aí que eu comecei, mas continuei lotado nesse Serviço de Engenharia. Depois do estágio, eu voltei para o Serviço de Engenharia para um grupo que estava tentando criar o que se chamaria de Engenharia Básica. Ela seria criada no Serviço de Engenharia, mas depois foi criada para ficar Centro de Pesquisa da Petrobras. CRIAÇÃO DA ENGENHARIA BÁSICA NO CENPES Eu voltei para o Serviço de Engenharia, para esse grupo que era um núcleo, um embrião de uma futura Engenharia Básica. O Diretor Leopoldo (Américo Miguez de Mello) havia criado a Engenharia Básica no Cenpes e não havia mais razão da nossa existência ali. Então, fomos todos para o Centro de Pesquisa, para a Engenharia Básica, em 1977. Praticamente, eu fui um dos primeiros da Engenharia Básica do Cenpes. Por sinal, foi uma decisão acertadíssima, ter sido criado lá. REDUC Foi minha segunda decepção. Quando eu cheguei na Refinaria, agora na operação, alguns colegas meus de turma, do curso, escolheram Departamento Industrial e foram para a Reduc fazer estágio. Eles já foram direto para a Reduc. Eu fui para a Reduc indiretamente, como já contei. Chegando lá, eu fui para um setor e era assim: tinha um engenheiro, um técnico de operação, e esse setor era responsável por duas unidades; na época eram duas unidades. E quando eu cheguei lá não tinha lugar para sentar, fui recebido pelo chefe do setor, uma pessoa já muito antiga, assim: “Mas o que vou fazer com você?”. Outra vez essa conversa. Eu contei a história toda e falei: “Eu estou a fim de aprender, vou ficar apenas dois anos, tá? Depois que passar esse tempo, essa minha algema, porque tenho que ficar dois anos, eu irei embora. Mas, enquanto isso, eu quero aprender, já que vou ficar aqui, não vou ficar à toa na refinaria.” Aí nós fizemos um acordo: eu ocuparia a mesa do TO quando ele não estivesse presente. TO é técnico de operação. Ele ficava muito mais tempo na unidade do que na sala, e eu ficava na sala sentado. Quando ele chegava, eu me levantava para dar o lugar a ele. Eu disse: “Pôxa, para que vocês querem a gente então?” E foi assim que fui recebido. Passei alguns dias naquela sala, e ninguém me levava para a unidade. Eu fui perdendo a paciência. Não chegou a ser uma briga, mas fui um pouquinho mais áspero: “Me diz onde é a unidade que eu vou andando, deve ser fácil chegar lá.” Então, acho que eles entenderam que eu estava a fim mesmo de aprender e trabalhar. Eu me integrei à Refinaria, depois acabei sendo convidado para continuar. Hoje, o TO é padrinho do meu filho e muito meu amigo. É o Sérgio Flávio Peregrino, uma pessoa excelente. Ele é meu compadre, padrinho do meu filho, que já tem 25 anos. Eu fui esquecendo aquela questão dos dois anos e fui gostando. Eu realmente me interessei. Depois, quando eles precisaram de mim no Serviço de Engenharia, porque estavam criando esse núcleo de engenharia, me chamaram de volta. Foram me esquecendo e eu fui ficando lá. Era para ter sido um estágio de um ano e eu fui ficando, ninguém me chamava, também ia ficando, até que finalmente me chamaram para esse grupo. Fui para o Serviço de Engenharia, na época era no Edise. Fiquei alguns meses nesse núcleo e depois houve a decisão de criar a Engenharia Básica. Logo depois todos nós fomos, inclusive meu chefe, para o Cenpes. ENGENHARIA BÁSICA Ela foi criada em 1975 ou 1976, por aí. Na verdade, eu não lembro. Eu lembro das discussões, das negociações. Nós tínhamos que ir para lá porque o Serviço de Engenharia queria criar a Engenharia Básica. Havia uma, não vou dizer, disputa, mas uma certa negociação. Estou falando sempre na área de Refino. Todos os projetos de refino eram feitos no exterior, quando feitos aqui, empresas do exterior vinham e faziam o projeto aqui. Então havia um sonho de algumas pessoas da Petrobras de ter uma verdadeira engenharia, de nós sermos os donos dos nossos caminhos, das nossas decisões. Por isso, foi criado esse núcleo. Eu gostaria de citar uma das pessoas, até como uma homenagem, que considero um dos maiores, um dos melhores engenheiros de processamento que conheci; não vou dizer o melhor porque estaria sendo injusto, mas um dos melhores, foi o João Batista Skinner. Ele foi meu chefe e brigou para criar essa Engenharia Básica. Nos primórdios, para tomarmos qualquer decisão, nós devíamos perguntar às empresas estrangeiras o que fazer, como se fazia, como não fazia. Foi todo esse sonho que criou a Engenharia Básica no Cenpes. Por que no Cenpes? Na verdade, o que é a pesquisa e desenvolvimento a não ser a geração de dados? É a engenharia que dá o corpo, que cria a parte física e transforma todos aqueles dados em algo, digamos assim, que não é virtual. Transforma aquilo em físico. Por isso que eu disse que a decisão de colocar a Engenharia Básica no Centro de Pesquisa foi acertada. Com isso, nós fomos para lá. A Engenharia Básica foi criada com pessoas oriundas da área principalmente do Departamento Industrial. Nós não tínhamos muita experiência nessa parte de engenharia de projetos e começamos, lentamente, com algumas transferências de tecnologias, algumas cópias, fazendo tudo que se pudesse pensar. Éramos muito novos. Essa é a grande vantagem quando se junta novo com antigo, porque o novo é meio impetuoso, acha que tudo pode, e o antigo tem a experiência e o conhecimento, então junta esses dois e dá uma mistura fantástica Dá um equilíbrio fantástico. Nós começamos a dizer que faríamos os projetos e a Petrobras começou a acreditar. Claro que havia muita dificuldade. A gente contratava empresas estrangeiras de alto nível. E, de repente, no Centro de Pesquisa, a garotada e – chamo de garotada no sentido não só da idade –, mais a experiência, dizendo que faziam um projeto desse. E nós fizemos DESENVOLVIMENTO DE TECNOLOGIA Houve uma época em que a Petrobras reduziu os seus investimentos na Área de Abastecimento, na Área de Refino, e deslocou o seu foco mais para a Área de Exploração e Produção. Isso foi na década de 80. O que aconteceu? Houve também a questão do choque de petróleo, do que chamam de choque do petróleo. Em 1973, teve o primeiro choque. Para vocês terem uma idéia, o petróleo estava na faixa de dois a três dólares o barril. No primeiro choque, em 1973, o preço do barril passou para algo em torno de 12 dólares. Ou seja, em valores médios, passou de três para 12. Em 1979, quando teve o segundo choque, ele passou de 12 para algo em torno de 30, por ai. Um absurdo. Hoje, o barril está em 54 dólares. Para nós, da Área de Refino, foi um desafio violentíssimo. Você imagina uma situação em que o preço do petróleo dispara, a demanda interna cai, porque os preços dispararam, e se começa a ter excesso de derivados, principalmente, de óleo combustível. É por isso que eu digo que o conhecimento é um fator diferencial. Com a criação da Engenharia Básica, nós estávamos no meio da crise. Ela foi criada em 1976 ou 1977. Quando houve o segundo choque, em 1979, nós já tínhamos um conhecimento muito grande. Nós já conhecíamos as nossas unidades, embora elas tivessem sido projetadas por outras empresas, pelo pessoal de fora. Nós já conhecíamos como elas funcionavam, com essa geração de conhecimento. Em 1979, nós tivemos um grande problema, nós nos deparamos com excedente de óleo combustível. Nós tínhamos que refinar petróleo, porque nós tínhamos a demanda de diesel e de gasolina, GLP, mas o óleo combustível teve uma queda no mercado muito grande. Para dar uma idéia, nós usamos navios para estocar óleo combustível. Com o nosso conhecimento, nós criamos alguns programas. Eu costumo dizer que os primeiros programas, não vou dizer só tecnológicos, foram criados na área do Departamento Industrial. Eram programas de minimização de óleo combustível. Por exemplo, com o nosso conhecimento, nós pegávamos uma unidade de Craqueamento Catalítico, que gera a gasolina, onde tinha que ser uma carga super – o pessoal chamava de filé mignon, um negócio assim – e botávamos praticamente o óleo combustível nela, uma loucura. E o pessoal dizia: “Esses caras vão destruir tudo” Nós nos tornamos um dos principais conhecedores desse processo. Voltando à questão do choque do petróleo, nós tivemos uma prova de fogo nesse momento, quando nós fomos lá e dissemos: “Nós temos a solução, pode ser paliativa, mas temos a solução. Vamos ganhando, conseguindo passo-a-passo.” Nós conseguimos, mostramos que éramos capazes, e aí foi o verdadeiro reconhecimento da nossa competência, não digo só do pessoal da Engenharia Básica, porque foi um trabalho de todo pessoal da Engenharia do Centro de Pesquisa, do pessoal do Departamento Industrial. O mérito não é só da Engenharia Básica, o mérito é de todo mundo, da Pesquisa e Desenvolvimento. Todos têm o seu dedinho ali, um pouquinho mais uns, um pouquinho mais de outro, mas todos estavam envolvidos. Com isso houve o reconhecimento. A partir de então, nós tínhamos que fazer algumas modificações. Praticamente 90% do investimento da Petrobras é na Área de Produção e Exploração. Por que isso? Porque com o choque de petróleo a Empresa tinha que ser auto-suficiente e direcionou seus investimentos de forma correta. Na época, eu fiquei chateado porque era da Área de Abastecimento e tinha pouco investimento na nossa área. Todo o investimento ia para essa questão da exploração e produção, tanto que nós conseguimos a Bacia de Campos com esse esforço do momento. Com isso nós ficamos fazendo modificações nas nossas unidades. Mas, hoje, podemos dizer o seguinte: nós modificamos praticamente todas as unidades das nossas refinarias. Nós fomos refazendo, ampliando, mudando, atualizando. Começaram a aparecer alguns investimentos. Aí eu vou para a questão da água profunda. O que aconteceu com essa questão? Com a descoberta desses petróleos, novos desafios foram aparecendo para a Área de Refino. Eu só gostaria de fazer um parêntese: o Refino é desafiado desde o primeiro dia que foi criada a Petrobras, porque as refinarias não eram da Petrobras e eram todas projetadas e muitas operadas por estrangeiros. Quando eu falo: “operadas”, estou me referindo ao pessoal que tinha um conhecimento e não ao pessoal do operacional. E a gente disse o seguinte: “Nós temos que adquirir esse conhecimento” Isso aconteceu quando criaram o curso de engenharia de processamento, que na época se chamava Cenap, coisa desse tipo, Centro de Engenharia de Petróleo, ainda na Praia Vermelha. E, com isso, nós fomos adquirindo e fomos vencendo desafios. A Petrobras começou com a área de refino, o Centro de Pesquisa era da área de refino, praticamente não tinha quase nada de exploração e produção. A área de refino, o Departamento Industrial, na época se chamava Departamento Industrial, o tempo todo desafiava, esse foi o desafio do primeiro choque, do segundo choque do petróleo, depois com a questão da Petrobras investir pesadamente nessa questão da exploração e produção doméstica, nós começamos a descobrir petróleos, petróleos que tinham características diferentes daqueles... ÓLEO DA BACIA DE CAMPOS As nossas unidades foram projetadas para petróleos que naquela época eram mais comuns, digamos assim. Era o árabe leve, petróleo leve, que era 34 API e um árabe pesado, que era 27 API. O que significa isso? Eram petróleos que tinham muito enxofre, e produziam pouco óleo combustível quando a gente compara com os petróleos nossos descobertos na Bacia de Campos principalmente. Então eram unidades projetadas para essa característica. À proporção que a Petrobras foi descobrindo petróleo, e esse petróleo, o que ele tinha de diferente? Ele tinha uma vantagem, tinha menos enxofre, porém ele tinha um complicador, ele tinha uma acidez. Então nós precisávamos mexer nas nossas unidades, porque ele destruía as nossas unidades, é como colocar o aço dentro de um ácido. Nós tivemos que fazer um trabalho violentíssimo de adaptar as nossas unidades para processar esse petróleo com teor mais alto, teor do ácido naftênico, porque o petróleo que a gente processava na época era o árabe leve e o árabe pesado. Ele tinha mais metais e com isso ele trazia problemas em algumas unidades nossas, catalisadoras com esse tipo. Com o nosso conhecimento nós começamos a adaptar as nossas unidades para esse petróleo. As unidades adaptadas para esse petróleo foram, principalmente as unidades de destilação a vácuo, que é a primeira unidade. Porque na refinaria é assim: o petróleo vem normalmente com sal, sofre uma dessalgação para a retirada desse sal, porque senão esse sal destrói as unidades de destilação. Depois ele vai para a destilação onde é separado em diversas correntes, então sai a nafta que vai para a petroquímica, sai o diesel – não sai gasolina porque ela sai, inclusive, para outra unidade – sai o óleo combustível, sai o gás óleo, que a gente manda para a unidade de FCC para a produção de gasolina. Nessa primeira unidade é tudo destilação, que é o processo físico, ali não há quebra de molécula, há só separação das moléculas em cortes, a gente chama de corte, que é o diesel, a nafta, a destilação direta, o gás óleo. É um primeiro processo. E depois cada um vai sendo enviado para as outras unidades para tratamento, remoção de enxofre, craqueamento do gás óleo para a geração de gasolina, GLP. O resíduo de vácuo a gente manda para uma unidade de coqueamento retardado que na verdade é a unidade que retira o carbono para gerar óleo diesel, quer dizer, é uma forma de você valorizar mais o petróleo. Isso tudo trazia problemas quando começaram a aparecer os petróleos da Bacia de Campos. ÓLEO DA BACIA DE CAMPOS Ele é um óleo mais pesado do que o petróleo árabe leve ou árabe pesado. Ele é mais ácido. Tem menos enxofre, que é uma coisa boa, por um lado. Mas, hoje, as especificações de combustíveis estão tão restritivas que o fato de ter muito enxofre, pouco enxofre, não altera muito a questão, porque de qualquer forma a gente tem que ter unidades para remoção desse enxofre. O petróleo nacional também tem um nitrogênio elevado, que faz com que a qualidade dos produtos tenha uma estabilidade menor, por isso também tem que ser removido, sem contar que influencia as outras unidades da refinaria. REFINO DO PETRÓLEO DA BACIA DE CAMPOS Na verdade, ainda bem que as coisas foram lentas e graduais. Na época, eu me lembro que a gente falava do petróleo de Cabiúnas. Achávamos horroroso o petróleo Cabiúnas, que é na faixa de 25 API e tem um teor de ácido em torno de 0.6, 0.7. Nós achávamos uma coisa horrorosa. Depois começamos a descobrir petróleos piores, mas nós já tínhamos passado por uma experiência com o Cabiúnas que nos permitiu, quer dizer, não começou do pior para o melhor, começou do mais fácil para o mais difícil. Então nós tivemos tempo de ir treinando, mudando. Foi um aprendizado. Hoje, praticamente, todas as nossas refinarias processam petróleo nacional. Tem vários petróleos. Tem o petróleo Marlim, que é um petróleo que tem um teor ácido maior. Eles se diferenciam, mudam de campo para campo. Tem o de Roncador. Quer dizer, tem petróleos muito pesados; cada vez mais pesados. O que significa petróleos pesados? Significa que a parcela de óleo combustível no petróleo é muito grande. Por que isso é um complicador? É um complicador porque com a entrada do gás natural, ele está substituindo o óleo combustível. Então, por um lado, você produz mais óleo combustível, e, por outro lado, o mercado está diminuindo. São dois efeitos que se somam, cumulativos. Com isso nós tivemos que investir pesadamente nas nossas refinarias em unidades que quebravam a molécula do óleo combustível para gerar diesel, que é o nosso carro-chefe. Esse é o caso do petróleo pesado, e cada vez mais está se achando, nos obrigando a investir em novas tecnologias. Inclusive, a tecnologia que nós tínhamos já não é suficiente, nós estamos desenvolvendo outras tecnologias. NOVAS TECNOLOGIAS A primeira grande mudança foi a acidez naftênica; essa foi a grande mudança. Na verdade, nós tivemos que mexer nas unidades, nós tivemos que mudar o interior dos equipamentos e estudar onde que essa acidez afetava mais. Nós fomos mudando. Eu digo que é como fazer manutenção em um avião com ele em vôo. Então, na proporção que as unidades iam parando para fazer manutenção, nós íamos mudando essas unidades. Felizmente a curva de descoberta do petróleo foi lenta, não foi aquela coisa violenta, deu para a gente ir misturando com os petróleos que eram importados e nós, a partir das misturas, controlávamos essa acidez. Para mim, foi o primeiro grande desafio. O segundo grande desafio foi a questão do petróleo pesado que fez com que nós tivéssemos que investir em uma nova tecnologia e a Petrobras optou pelo coqueamento retardado, que era para pegar aquele excedente de óleo combustível e transformar em algo mais nobre, nesse caso específico era o diesel. Foi o segundo grande desafio. O terceiro desafio está sendo da seguinte forma: o mercado de gasolina está caindo tremendamente. No caso do Brasil, por exemplo, toda gasolina brasileira tem que ter no mínimo 22% de álcool, o que significa 22% a menos de mercado de gasolina, isto é, já é uma redução. O gás natural está substituindo violentamente a gasolina, reduzindo mais ainda o mercado de gasolina. O que nós já estamos sentindo há algum tempo, não só nós, o mundo todo. A gasolina está tendo uma redução muito grande, não só no Brasil, mas no mundo. Eles já estão partindo para carros movidos a diesel. Antigamente, diesel era usado para caminhão, ônibus, veículos que precisavam de potência e não de velocidade. Com o advento do motor turbinado, coisa desse tipo, e também eles conseguiram reduzir o ruído do motor porque o motor a diesel era muito barulhento, trepidava muito. Então, diesel não era para carro de passeio. Mas na Europa eles conseguiram e, hoje, quem compra um carro novo está comprando um carro a diesel. Com isso o mercado de gasolina no mundo está reduzindo drasticamente. DIESEL A questão do diesel é que o nosso perfil de demanda, a nossa matriz energética é distorcida, era muito focada em diesel. Quando comparávamos o nosso perfil de demanda com outros países, com a Índia, por exemplo, que também tem uma demanda de 40 e tantos por cento, quase 50% de diesel. O petróleo não produz essa quantidade de diesel. Então você tem que investir em unidades que transformem as outras correntes em diesel. Agora, por que isso? Isso tudo porque houve uma decisão no passado de acabar com o transporte ferroviário. Tudo é feito por caminhão, e com isso houve uma distorção da matriz energética. Quando eu falo distorção estou comparando com os grandes países. Então nós temos esse desafio que é a questão do mercado de gasolina agora. Um outro desafio que a gente tem e, é permanente, é a questão ambiental, cada vez mais produtos com exigência, especificação mais restritiva, o que exige que a gente coloque mais unidades, mais investimentos porque nós temos que tratar, temos que tirar o enxofre. O petróleo nacional, por exemplo, tem essa questão, como eu disse, do nitrogênio, embora ele tenha baixo teor de enxofre, mas que não adianta muito porque a gasolina está quase com enxofre zero, daqui a pouco a gasolina, o diesel não vai ter mais enxofre, e com isso você tem que cada vez mais investir. Isso nós do Centro de Pesquisa, na Petrobras, estamos cada vez mais buscando desenvolver novas tecnologias, decidindo quais aquelas que são estratégicas para desenvolver e quais aquelas que a gente pode comprar fora, porque a nossa grande vantagem é o conhecimento. Eu gosto de contar uma história muito interessante. HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Eu gostaria de contar uma história porque ela é muito elucidativa. Há alguns anos atrás estive na França, em um seminário em Paris. Nós fomos visitar o Instituto Francês de Petróleo e, no carro, junto com o presidente, acho que na época ele era diretor, hoje ele é presidente, eu perguntei: “Quem foi que criou o Instituto Francês de Petróleo?” Esse instituto é o equivalente ao Centro de Pesquisa da Petrobras, digamos assim. E ele disse: “Foi o General De Gaulle.” E eu disse: “Interessante um General criar um Centro de Pesquisa, acreditar em tecnologia.” Ele disse: “Ele não acreditava em tecnologia, ele acreditava em independência.” Ou seja, o conhecimento te traz independência. Eu acho que essa história é importante. Então, o Centro de Pesquisa em uma empresa, promove o conhecimento e a geração do conhecimento traz independência. Em um momento de crise, você sabe qual caminho a tomar, o que fazer. O desafio das águas profundas foi reconhecido no mundo, a Petrobras é vencedora também nesse campo. Teve o conhecimento e o mais importante de tudo, coragem. É preciso também ter coragem. ATENDIMENTO À GRANDE DEMANDA DE PETRÓLEO Nos primórdios, quando importávamos petróleo, nós importávamos também aquela cesta dos chamados petróleos variados que, digamos assim, seria o melhor para as nossas unidades. À proporção que foi entrando petróleo nacional e nós não tínhamos opção de escolher petróleo, quer dizer, foi diminuindo a escolha do petróleo importado, foi nos trazendo dificuldades – claro, essas dificuldades vão sendo vencidas com o tempo. Por isso que foi importante, como disse, que essas coisas tenham sido bem lentas, que não foi tudo de uma vez só. Esse tempo nos permitiu conhecer e modificar as unidades. É claro que criou problemas. Nós, hoje, fazemos um planejamento para saber onde colocar esses petróleos, porque não temos só Bacia de Campos. E, dentro da Bacia de Campos, nós temos diversos petróleos, temos inclusive petróleos muito bons, mas em função das nossas instalações é preciso fazer um planejamento para ver qual a melhor mistura de petróleo para colocar ali. Tem tudo isso. À proporção que a gente vai atingindo a auto-suficiência, a gente vai tendo mais restrições; as variáveis vão diminuindo. A gente continua importando algum tipo de petróleo. Até pouco tempo, nós importávamos o árabe leve – que é um petróleo que passou a ser muito valorizado – para fazer lubrificante na Reduc. Então, dentro da Petrobras nós passamos por um projeto de pesquisa para substituir esse petróleo árabe por petróleo nacional. Para isso foi necessário um trabalho de identificação do petróleo, qual o melhor petróleo, fazer a destilação dele, verificar que lubrificantes que ele dá. E nós já estamos substituindo parte desse petróleo, na Reduc, por petróleo nacional. Estamos valorizando mais ainda o petróleo nacional. Alguns petróleos, por exemplo, a fábrica de lubrificantes naftênicos, a Lubnor, lá em Fortaleza, até pouco tempo atrás usava petróleo importado da Venezuela. Hoje, praticamente, só usa o nosso petróleo. Houve o desenvolvimento de todo um trabalho, anos de pesquisa, de testes, coisas desse tipo. Mas a gente continua importando algum petróleo até por questão de oportunidade de negócio, por questão de logística. Na verdade, a gente procura maximizar tudo. IMAGEM DA PETROBRAS Quando a gente chega nesse tempo, depois de 31 anos de Petrobras, a gente tem que olhar para trás. É muito tempo, é uma vida. Eu costumo dizer que dediquei minha vida muito mais a Petrobras do que a mim mesmo no final das contas, e não me arrependo disso. Fui extremamente feliz. A Empresa de alguma forma me facilitou tudo isso, e me reconheceu. Se eu não me capacitei mais foi porque não quis, porque é uma Empresa fantástica, ela realmente acredita na capacitação, acredita em tecnologia, acredita no conhecimento. Então, essa é a grande virtude da Petrobras. Olhando para trás, eu tive muitos momentos de tristeza, mas também muitos momentos de bastante satisfação, bastante alegria. E, na vida da gente, o que vale é o saldo. Não existe o totalmente bom e o totalmente ruim. Eu digo o seguinte: felizmente, graças ao meu pai, eu entrei para a Petrobras. Embora em um primeiro momento tenha sido tratado de uma forma que não me parecia correta. Foi interessante porque quando eu vi o pessoal recebendo aquele escudinho de dez anos de trabalho, eu disse: “Pôxa, eu vou ganhar esse de dez” Depois chegou o de dez, eu falei: “Eu vou ganhar o de 20” E agora em janeiro ganhei o de 30 anos, um pouco atrasado, mas ganhei. De qualquer forma é uma Empresa fantástica, que dá oportunidade para todo mundo. É claro que tem que haver um certo comprometimento. Eu agradeço a oportunidade de reviver 30 anos em 40 minutos, não sei exatamente quanto foi, eu é que agradeço essa oportunidade. Muito obrigado
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