Projeto Memória dos Trabalhadores Petrobras
Depoimento de Heitor Manuel Pereira
Entrevistado por Miriam e Arnaldo
Rio de Janeiro, 11 de abril de 2003
Realização Museu da Pessoa
Depoimento PETRO_HV031
Transcrito por Transkiptor
00:00:34 P/1 - Eu gostaria de começar a entrevista, então, pedindo que você nos forneça o seu nome completo, o local e a data de nascimento, por favor.
00:00:41 R - Meu nome é Heitor Manuel Pereira. Eu nasci no dia 19 de agosto de 1925, na cidade de Recife, no estado de Pernambuco. Eu sou nordestino assumido.
00:00:57 P/1 - Seus pais, o nome completo deles é a profissão, Heitor?
00:01:02 R - Meu pai tinha o nome de José Domingos Pereira, um cidadão da baixa classe média, filho de português, que não conseguiu fazer o primário, mas venceu na vida naquela época e terminou como despachante estadual, trabalhando numa fábrica de tecido de propriedade do capitalista Batista da Silva. Hoje falecido, como todas as suas indústrias também faleceram.
00:01:36 P/1 - E a sua mãe, Heitor? O nome dela e a profissão?
00:01:40 R - Minha mãe é Liza de Barros Pereira. Essa é a minha linha afro-índia, porque o bisavô dela era africano e o outro era índio. E nasceu no interior de Pernambuco, na zona da mata, quer dizer, hoje está muito perto de Recife, deve ser até no Grande Recife, chamada Amaragi, no século XIX, 1900 e pouco, 1800 e pouco. E era costureira de profissão. Costurava em casa. As amigas dela, as madames da época, Não teve curso primário completo, porque ela ficou ofa muito cedo e foi criada numa instituição de freiras católicas.
00:02:37 P/1 - E seus avós, você conheceu seus avós?
00:02:40 R - Eu conheci minha avó paterna. Meu avô paterno era o português, que morreu muito jovem, com trinta e poucos anos. E minha avó já morreu com oitenta e tantos anos. Então, eu conheci minha avó materna, minha tia-avó paterna. Materna não, porque morreram muito cedo. Até minha mãe era pequenininha quando os seus pais morreram.
00:03:06 P/1 - E o que você lembra um pouco dessa tua avó?
00:03:10 R - Ora, uma parte da minha vida eu morei com ela. Não tem nada de Tinha uma tia minha, casada também com um português, pobre. Morávamos na torre, casa própria delas. E o que eu me lembro muito da minha infância era a lixeira do rio Capim-Maribo, que invadia a minha casa. Era uma beleza. A água vinha chegando, a gente ficava olhando ali, era uma beleza. Então, isso aí não tem nada de mais na minha avó. Como sempre, até hoje, a maioria das mulheres brasileiras não tem oportunidade de estudar. quase sempre, não tem nem curso primário completo, as mulheres brasileiras. Porque as mulheres brasileiras não são essas do Grande Rio, nem do Grande São Paulo, não. São a grande pessoa que mora nesse Brasil grande aí. Então, essa é a minha avó.
00:04:11 P/1 - E a sua infância um pouco? Quais são os seus lembranças? Sua casa era muito cheia, você tinha uns irmãos...
00:04:18 R - Não era... Era cheia pra mim, era cheia, porque essa questão de sensação de medida depende muito da idade da pessoa. Quando a pessoa é muito pequenininha, criança, com essa distância até aquela parede, é longe pra chuchu. Então, quatro pessoas pode ser muita gente, né? Minha casa era grande porque era eu, logo em seguida tinha duas irmãs, depois passaram alguns dois anos e veio outro irmão, depois veio outro irmão, E era isso. Morava numa vila operária. Minha juventude toda foi no meio dos operários, numa fábrica de tecido. Então, minha relação com os operários é desde pequenininho. Hoje, os que estão vivos ainda são meus amigos. Esperamos que todos eles também migraram para o Rio de Janeiro e para São Paulo. Estão por aqui, estão morando em Caxias, Novo Iguaçu, nessas bandas aí do Grande Rio.
00:05:20 P/1 - Mas quais são as suas lembranças, assim, como criança, nessa vila? Brincadeiras?
00:05:26 R - Ora, nessa vila, nós éramos crianças, em Recife, nós éramos marcados por umas quatro ou cinco eventos. A maioria dele ligada até à religião. Era muito importante para nós o Natal, o Ano Novo. Depois vinha a Semana Santa, que na minha época era o feriado, era a semana todo dia. São João e São Pedro em Pernambuco, que era uma festança, ainda é. Depois vem a Semana da Pátria, que também naquela época era a semana todinha de parada, de jogos na escola, etc. Depois vinha o Natal, meu ano novo, então, e o carnaval no meio, que eram quatro dias naquela época, né? Quatro dias, que era um negócio muito bom. A gente se fantasiava, ia brincar, ia para a cidade, procêndo a cidade, para a casa de uma prima da minha mãe, e brincava no carnaval, que era uma beleza o carnaval.
00:06:25 P/1 - Você se lembra de carnaval de que?
00:06:26 R - Ah, de Pierrot, de Arlequin, dessas coisas que se fazia naquela época. Minhas irmãs de bailarina, desse negócio, certo? Mas não havia essa violência que havia hoje. E as marchas, as músicas carnavalescas que vão fazer mais... eram muito singelas. Não essa porcaria que existe hoje... na música popular brasileira... com raras e honrosas exceções. Tem música que não dá para se ouvir. Naquela época era a música dos irmãos... dos irmãos Valença, do qual o Sr. Valença é um descendente. O pai e o avô dele, o tio e o avô, eram grandes músicos em Pernambuco, faziam muita marchinha de carnaval. E eram essas festas, meu. Agora, como é que era, um pouco?
00:07:26 P/1 - Eu queria tentar, não sei se você tem um pouco dessa memória, desse ambiente da vila operária, esses trabalhadores eram trabalhadores de indústria de tecidos. Você tinha discussão? Na época, alguma grande greve marcou a sua memória? Seu pai participava disso?
00:07:45 R - Meu pai não participava disso. Meu pai trabalhava no escritório, junto dos donos da fábrica. E era um período que, em greve, o cara ia para o xadrez e, às vezes, nem voltava, que era o período do Estado Novo. Eu, quando Getúlio Vargas decretou o Estado Novo, a 10 de novembro de 1937, eu estava na minha escola, era estudante de ginásio, e tomei conhecimento. Eu não entendia nada. E os operários também, a fábrica era tecido, era uma fábrica que montou, construiu uma vila para os operários ficarem junto da fábrica, teve transporte. Então, nessa fila que moravam os operários, meu pai também teve direito a uma casa... e nós moramos dentro dessa casa, dentro dessa fila. E as brincadeiras eram essas. Na São João, a faca mandava fazer um tabrado lá, apagavam a orquestra, a gente sambava São João e São Pedro, todo mundo lá junto, os operários e eu no meio, que eu também me considerava igual a ele, como ainda hoje me considero. Outra festa muito importante na minha juventude, que hoje não se comemora mais, é o dia 13 de dezembro, que é o dia de Santa Luzia. E Santa Luzia, não sei por qualquer motivo, era a padroeira dos operários da fábrica, e a fábrica bancava uma festa. Então a fábrica tinha um orquestra, uma banda de música, e montava o palanque, iluminava todas as ruas para a igreja e pagava os padres certamente. Era uma festa que durava 13 dias. Santa Luzia era marcante no nosso bairro porque terminava sendo uma festa pré-carnavalesca, porque a moçada tocava frevo e o pessoal da porta da igreja ficava dançando frevo, que é uma delícia, frevo. O frevo é o banhado, mas não precisa ter fôlego para dançar o frevo. Naquela época eu dançava, hoje eu não danço nem forró.
00:10:05 P/1 - Como é essa coisa da religiosidade na sua família?
00:10:11 R - A religiosidade da minha família, segundo eu percebo hoje, Era uma religiosidade informal. Todo mundo era católico, porque o pai era católico, porque o avô era católico, porque o pisavô era católico. E você era católico por isso, mas como os católicos não são chegados à lei bíblia, Eu acho que lá em casa não tinha nem bíblia. Mas todo mundo ia para a missa no domingo. Por que eu ia para a missa? Porque era uma festa ir para a missa. Não tinha nada para fazer na década de 20 nem de 30 na cidade. Então, qual era o encontro? O encontro era ir para a igreja. Coisa maravilhosa, fazer novena de Santo Antônio, novena não sei de quanto. Aí fazia nas casas, as mocinhas iam lá fazer, o moço cantava. A gente ia participar desse negócio. Então, essa aí era a época, a vida daquela época era uma vida muito singela, não tinha rádio, não tinha nada. O primeiro rádio que apareceu no meu bairro, era na casa de um cara que acho que era alemão, um rádio desse tamanho, um bicho imenso, que ele tinha na sala, a gente ficava tudo na calçada do cara para ouvir o rádio, do lado de fora da rua. Essa aí que eu me lembro da minha juventude.
00:11:24 P/1 - E escola? Quais são as suas memórias da sua primeira escola?
00:11:30 R - Minha primeira escola, eu fui para a escola muito cedo, devia ter o quê? Uns sete anos. Era uma escola particular. Duas professoras e a mãe, viúva, que tinha a escola na casa dela. A escola no Nordeste, em Recife, era a grande cidade do Nordeste. Era uma escola que eu não sei como é que hoje funciona, mas naquela época a professora estava lá. e tinha menino dele, de aprender as letras, até o quarto ano e o quinto ano, para fazer o tal de exame de admissão. Então, eles misturavam tudo na mesma sala. Ela perguntava a um, eu perguntava a outro. E é isso aí que a gente passava lá. Eu gostava muito da igreja, da escola, achava uma felicidade ir para a escola. Sempre gostei de ir para a escola, para todas as escolas que eu participei. E a camaradagem, a amizade. E a professora tinha uma parte que ela fazia cultural, hoje se diz cultural, porque ela fazia umas pecinhas de teatro e, no fim do ano, havia a formatura daquele grupo que ela achava que estava se formando e fazia uma festa, um teatro, uma representação. E, às vezes, a gente até participava como extra nas pecinhas que ela montava lá na coisa. Mas eu era muito feliz e não sabia. O ginásio... Eu estava terminando essa escola e meu pai... Aí tem um colégio em pé, no meu bairro, que era dos protestantes.
00:13:12 P/1 - Como era o nome desse bairro?
00:13:14 R - Torre. Torre. Torre. O bairro da Torre. Fica mais do Capivaribe. Quase tudo fica mais do Capivaribe. Fica fazendo volta lá dentro da cidade. Fica mais do Capivaribe. Onde o ponto importante era essa fábrica de tecido. Dos Batista da Silva. E, ligado nesse bairro, tem um bairro chamado de Madalena. Em continuação, que vai até a Praça João Alfredo, tem um edifício, um casarão antigo, que era do conselheiro João Alfredo, personagem do Império. E lá tem um casarão que tem o Colégio Batista, chamado Colégio Batista, do Recife, de uns protestantes. E meu pai me colocou lá, numa admissão. Isso foi nos idos de 1934. Em 1935, foi o levante comunista, no qual eu tinha que me deitar todo dia embaixo da cama por causa dos tiros, porque Recife era uma cidade onde havia sempre movimentação política. Então, nós já estávamos acostumados. Tiro, todo mundo embaixo da cama. a moça, quatro, cinco meninos deitados embaixo da cama. Então, os moleques vão vendo comunista. Eu já estava nessa escola.
00:14:45 P/1 - Quer dizer, o bairro que você vivia era um bairro, assim, nesse movimento?
00:14:50 R - O bairro que eu vivia, o bairro que eu vivia é o seguinte, o bairro que eu vivia tinha uma delegacia, como tem quase todos os bairros, uma delegacia. Eu sei como é que era, eu sei que era o tempo que havia o movimento comunista e o movimento fascista, que era o partido antirregalista. E havia antirregalista e antifascista, só que eu não entendia muito esse negócio. Eu devia ter, nessa altura, em torno de 10 anos, mais ou menos. Então, o que acontece é que no movimento comunista tem um fato interessante da minha vida. A minha escola me colocaram no Catecismo. O Catecismo é um curso que se faz na igreja católica para o cara fazer a primeira comunhão. Então, aquelas mocinhas que se chamam catequistas, as catequistas ensinavam o Padre Nossa Amor e contavam aquelas histórias. E eu fui fazer a primeira comunhão, eu e minha irmã, que era uma irmã mais nova do que eu. E, naquela época, a primeira comunhão sempre fazia fantasiado mesmo, porque ia todo de branco, gravata, um molequinho assim mesmo, vestida como se fosse uma noiva, uma vela maior do que eu. Aí fomos para a missa. O que acontece? Por coincidência, essa minha primeira comunhão foi no dia do levante comunista, na cidade. Então, meu pai estava depois da missa da primeira comunhão, vamos tirar retrato. A maneira de tirar o retrato. Ainda bem, não é? Tem que se tirar o retrato. Então, se tirou o retrato, o meu pai levou-me para a cena da cidade do Recife. Quando eu cheguei, a gente via um negócio meio esquisito, não tinha mais ninguém na rua, uma correria para lá e para cá. Eu chego no centro da cidade, nós chegamos no centro da cidade, entramos na rua para tirar o retrato. Quando eu saí, cadê? Não tinha meio de transporte. E um cidadão chegou e disse ao meu pai, você está com essas duas crianças aí, Então, o levante comunista aí toma uma revolução danada, é fogo por todo lado. Eu acho que você dá um jeito e ir embora. Nisso passou o bonde. O bonde elétrico é um bonde de transporte daquela época. Teve muito no Rio também, até a década de 50, mais ou menos. E meu pai pegou o bonde. Só tinha aquele... O último bonde, meu pai pegou o bonde. E o bando terminou no meio da batalha dos comunistas com o Vê lá numa praça chamada Largo da Paz. Os caras até eram lá em cima da torre da igreja. Foi uma luta. Então, o que acontece? Não tinha carro, não tinha táxi, não tinha táxi. Não se chamava táxi naquela época, não, era carro de aluguel mesmo. Não tinha. Então, o que acontece é que chegaram e disseram, mas você vai para casa. Vai de qualquer jeito. Aí nós viemos a pé. do Largo da Paz até a minha casa, na Torre, por uma estrada de barro, hoje está toda asfaltada, mas é chamada Estrada do Remédio, que liga Largo da Paz à Torre, termina na beira do rio, lá na Torre. Viemos a pé, ao meio-dia. De roupinha, de coisa. A vela se derretendo na mão da gente. O sapato apertando o pé. Foi a loucura. Nunca mais me esqueci dessa Primeira Comunhão. Ficou na história do Brasil. Primeira Comunhão. Então, eu estou na política desde pequenininho. Eu participei da Revolução Comunista como... Como anjinho. Como anjinho. Então, esse é o negócio da Primeira Comunhão. Aí, a Revolução Comunista começa a perseguição dos estudantes, como é de comum, perseguir os estudantes. Então, perseguiram os estudantes. E a Faculdade de Direito, como historicamente era um centro de geração de políticos, gente de discussão de problemas brasileiros. A Escola de Pernambuco, de Recife, a Escola de Direito que foi a primeira escola do Brasil em Direito, foi a de lá e de São Paulo. Tinha muitos estudantes que eram ativistas, etc. E tinha dois jovens que se formaram naquela ana, que era de origem paraibana, o pai era promotor, às vezes, no interior da Paraíba, e acharam que ele era esquerdista. E, com medo de perseguição, porque a perseguição no Nordeste era mais ou menos violenta às vezes, o pai dele resolveu que ele comprasse aquele colégio. Então ele comprou o colégio, o colégio dos protestantes, mudou de nome do colégio, o colégio passou a se chamar Genásio da Madalena, e esse cidadão fez um grupo de professores de alto nível, porque eram aqueles professores que estavam mais ou menos perseguidos, Então nós tivemos grandes professores de Geografia, de História, de Matemática, de Física, de Química. Aquela coisa, aquela juventude que era interessada, que estudava, que não ia ter os problemas, foram ser professores na minha escola com esse cidadão. Esse cidadão se chamava Abelardo Jurema, que já faleceu, Abelardo Jurema. Era esquerdista. Diziam que ele era esquerdista. Ele achava que era. E, depois, ele era o meu camarada, porque ele ficou esquerdista, ele era o esquerdista e o meu diretor. E, naquela época, se respeitava muito o professor. A gente podia não gostar do professor, mas respeitava o professor. Era o senhor professor, a senhora professora. E, então, aquela relação de respeito que havia muito entre nós e os professores. Os professores já ouviam a teoria. E hoje o Abelardo fez carreira política, porque mudou de lado. Foi ser secretário de Estado do general Corneiro de Farias, que foi governador interventor em Pernambuco. Foi deputado estadual, deputado federal, secretário de Educação. Terminou como senador biônico de Erasmo Gás. Maravilha. Quando ele me encontrava, eu ficava toda canhada. Mas eu ia falar com ele, não tinha nada com a vida dele. Então, esse era o meu colégio. Eu fui a última turma que se formava num tipo de graduação chamada Bacharel em Humanidades. Era um curso que era de cinco anos e ele se concluía em cinco anos. Aí você entrava na faculdade de Direito de Engenharia e Medicina, que eram as que existiam com mais forte lá em Pernambuco. E eu fui na última turma dessa tal bacharel em Humanidade, que era um curso em cinco anos. Em seguida, eu fui para um colégio particular, que era um colégio num bairro da Boa Vista, mas chegado pelo centro, muito conhecido, onde faziam um curso que naquela época se chamava curso pré. Curso pré. Então, pré antes. Pré-engenharia, pré-direito, pré-medicina. uma das engenharias, eu vou fazer medicina. Então você ia, ia para um curso pré-jurídico, pré-direito, pré-engenharia, pré-medicina. E eu fui para a pré-engenharia. Sem por que razão fui para a pré-engenharia. E também tive muito sorte porque peguei uns professores de alto nível.
00:22:32 P/1 - Algum que tenha te marcado mais?
00:22:34 R - Ora, muitos deles me marcaram muito. O professor Newton Mayer, uma grande personagem, Mayer. grande personagem, professor da escola de engenharia, foi depois professor da escola de engenharia, professor Siqueira, professor Gesteira, quer dizer, uma série de professores, Amaro Quintas, professores muitos, ele já era do ginásio e depois foi desse colégio. Os da área de engenharia, Nilton Maia, Siqueira, Gesteira, eram professores que também eram da universidade, eram professores desse colégio, que não existe mais. Não existe mais.
00:23:15 P/1 - Que ano, então, você entra? Isso é a Universidade Federal?
00:23:18 R - Não, isso aí foi esse tal curso pré. Aí também eu fui o último do curso pré, porque o Ministério da Educação, quando tem o que fazer, muda esse negócio de currículo escolar, inventa esses cursos, essas coisas. Não sei por que razão, porque cada vez piora mais. Ainda bem que esse agora não foi feito pelo brasileiro, foi feito em Chicago, para desmontar toda a formação de lideranças no Brasil, se montou esse tal desse de curso de conceito, esse troço todo que, para mim, é uma droga, mas tem um objetivo político claro, que é desmontar a formação de lideranças no Brasil. Então, você encontra as lideranças atuais, são lideranças feitas na minha época, Marco Maciel, Brizola, Arraes. Essa turma veio de um outro tempo, quando a escola tinha outra formação. Então, os estudantes discutiam política, discutiam os problemas brasileiros, E daí saíram vários políticos de renome. Mário Covas e outros personagens. Serra foi presidente da UNE. Aldo Rebelo, que hoje é líder do governo, foi presidente da UNE, União Nacional dos Estudantes. Mas a Revolução, por determinação norte-americana, que a elite brasileira costuma obedecer com muita sofreguidão, mudou o sistema. E o sistema foi mudado, inclusive por um cara que foi meu chefe na Petrobras. Eu trabalhei na Petrobras em vários estados do Brasil. E um deles foi, na época, na Jó, terminou como coronel. E o coronel foi ministro da Educação e implantou a ferro e fogo, as determinações do Decreto 447, daquela época. e desmontou todo o ensino universitário brasileiro.
00:25:07 P/1 - Quem é?
00:25:08 R - É o Jarbas Passarinho. Jarbas Gonçalves Passarinho. Está vivo, está no Pará, mora lá no Pará, aposentado.
00:25:17 P/1 - Mas, Heitor, então, voltando ao período da universidade. Que ano você entra na Universidade de Engenharia e quais são suas lembranças desse início de curso?
00:25:25 R - Na Universidade de Engenharia eu entrei em 1947. Mas, no momento, eu tinha uma atividade política muito ativa. E o que é que acontecia com os estudantes que tinham uma atividade política muito ativa? Ele chegava, passava no vestibular, se matriculava. Quando chegava no mês de maio, mais ou menos, trancava, o tal de trancar a matrícula. O que a atividade não estava a tempo dele permitir. Eu fiz toda a campanha do Petróleo é Nosso. Podemos chegar lá depois. E a política foi se desenvolvendo, chegou em 1950, 1951. Então, eu resolvi terminar o curso de engenharia. Então, a partir de 1951, eu perguntei o curso regularmente e em 1956... Você.
00:26:26 P/1 - Passou cinco anos fazendo um movimento estudantil, é isso?
00:26:30 R - Então, se chama... Eu fiz um longo curso. Os outros fazem cinco, eu fiz dez. Mas acontecia que eu fazia porque eu não ia, fechava a matrícula. E muita gente fazia isso. Hoje eu não sei como é que é. É um movimento político, né? Porque eu fui comunista, fui do Partido Comunista do Brasil. Naquela época só havia o Esquerdismo, que era o comunismo. O resto não era Esquerdismo. Não existia esse negócio de ter 10, 15 partidos de esquerda, que eu acho que nenhum dele é de esquerda, então estou meio confuso por aí. Então, o que acontece é o seguinte, eu era jovem, não sei por que razão, possivelmente pela minha vivência no meio operário, eu, na escola, Tinha o quê? Tinha nove anos, dez anos, quando veio a guerra. E eu já torcia pelos aliados contra o Nazismo. Por que eu torcia contra o Nazismo? Eu não sei contra o Nazismo. A partir daí, ir para aquela juventude, ir para o Partido Comunista foi um salto. Então, foi Comunista, Partido Comunista, uma atividade durante esse tempo todo. E até que, em 1956, eu resolvi terminar o curso de engenharia. Aí me afastei um pouco da política. militante. Fiquei mais na área estudantil, às vezes, na própria escola. A história é nossa, fazendo trote político com os estudantes, porque nós alteramos a filosofia do trote lá em Pernambuco.
00:28:01 P/1 - Conta um trote. Como é que era feito um trote naquela época?
00:28:04 R - Antes de nós entrarmos na escola de engenharia, o trote era um trote meio massacrante. raspar a cabeça dos caras e pintar o cara todo de tinta e fazer humilhação com os colegas, etc. A partir do nosso momento, nós passamos a fazer um trote político. O cara se fantasiava às vezes, mas eram muito cartazes, muitas fases, pelo petróleo nosso, contra a guerra da Coreia, etc. Aquele troço todo que nós fizemos. Então, o trote passou a ser político. Começou pela escola de desenharia. Em seguida, A escola de direito começou a fazer medicina. Então, os trotes em si passaram a ser uma festa na cidade. Toda a cidade via passar, via o trote passar. Então, via milhares de pessoas ficarem nas calçadas das ruas onde o trote passava. O trote saia de casa e o trote passava. Era aquela festa. Ficou um trote sem violência. pintava os caras, mas já com esse sentido político, de fazer cartaz com bonequinhos, etc., etc., tal, versos e saía aquilo ali, com a moçada na rua, protestando ou reivindicando alguma coisa nesse sentido.
00:29:17 P/1 - Concordando ou não, eles tinham que sair?
00:29:19 R - É, concordando. Mas, em princípio, como era uma... Eles gostam de sair, a juventude gosta de sair, eles gostam dessa onda toda.
00:29:26 P/1 - Conta como é que foi a sua participação.
00:29:30 R - Bem, frente a minhas preocupações, também não sei por que razão me levaram a ter essas preocupações, eu fiquei curioso em tomar conhecimento de alguns problemas. Às vezes são coisas que aparentemente são muito secundárias. Por exemplo, Montelobato ajudou muito a juventude a pensar no problema do petróleo. Bem, eu li toda a literatura daquela época sobre o petróleo. Aí veio a briga em duas teses no Brasil. Por quê? As grandes companhias do petróleo, que naquela época eram sete, chamadas Sete Irmãs, cuja coordenação era norte-americana, era dos anglo-saxões, eu costumo chamar anglo-saxões, porque este é que é o inimigo da humanidade, se chama a elite anglo-saxã, que é a norte-americana, a elite norte-americana e a elite inglesa, a elite inglesa. A Inglaterra é uma federação, tem quatro nações lá na Inglaterra, na Grã-Bretanha, a elite inglesa que domina. A elite inglesa e a elite norte-americana, a elite norte-americana com a ESO, que tem outros nomes, Mobile, etc. E a inglesa tinha uma companhia de petróleo fundada pelo holandês chamado Deterling. E o holandês disse, não, para eu avançar eu tenho que ter uma nação forte que me dê um apoio. E essa nação forte naquela época era a Inglaterra. E há então Deterling, que fez o tal Shell. Shell se associou com o Império Britânico, com a casa real inglesa. E a Shell passou a ser Anglo. mas quem manda são os anglo-saxões. E não interessava a essas companhias que se descobrisse mais petróleo no mundo, porque o que ela tinha no momento controlado não era suficiente. Então desenvolveram uma campanha intensa que no Brasil não tinha petróleo. No Brasil não tinha petróleo, no Brasil não tinha petróleo, não adianta procurar petróleo, não tinha petróleo. Nós ficávamos, aquela jovem naquela, preocupados. Por quê? Se na Argentina tinha petróleo, na Bolívia tinha petróleo, na Venezuela tinha, porque tinha na fronteira, porque não tinha por lá de cá. Que mistério. Nós não entendemos de geologia, mas que mistério danado. Tem lá e não tem cá. Aí, nessa época, se desenvolveu a discussão, alcançou a área militar, através do clube militar, esse da Praça da Sinaloa, E um general, que foi da coluna Prestes, cearense de nascimento, Juarez Tavra, do qual os amigos deles são meus camaradas hoje, são colegas meus, os filhos do general Juarez Tavra. Juarez Tavra, que foi da coluna Prestes, fez a Revolução de 1930, defendeu uma tese de que realmente o Brasil não tinha capacidade nem técnica, nem financeira, nem econômica, nem de qualidade nenhuma, para desenvolver uma pesquisa de petróleo. Um outro general, que depois passou, foi promovido a marechal chamado Horta Barbosa. Não. O petróleo ou é do Brasil ou é das grandes companhias. Porque é uma indústria que requer capitais, requer maturação demorada, etc. E o Brasil tem que ter, ou ela tem, ele é o dono do seu petróleo, ou ela é, ele passa a ser das grandes companhias internacionais. E essa tese, chamada tese de Horta Barbosa, foi empolgando toda a sociedade. Foi daí que apareceu o movimento Petróleo é Nosso. E nós, como estudante em Pernambuco, engajamos nesse movimento, Petróleo é Nosso. E o Petróleo é Nosso foi feito uma campanha nacional como nunca tinha visto na história do Brasil. Comiços, caravanas a parcelar, coronéis, brigadeiros e coisas, professores universitários, estudantes, líderes trabalhistas. E nós fazemos uma campanha nacional. Naquela época se fazia escrita lá nos muros, né? Pegava a calça, fazia uma lata de calça, saia uma com a lata de calça, outra com pincel, pintando os muros. Petróleo é nosso, petróleo é nosso. E, como sempre, o estabelecimento, o poder estatuído, estabelecido, achava que aquilo era um negócio subversivo, que o petróleo não podia ser nosso. E prendia a gente. A gente saia, às vezes, quando tem um cara de polícia na esquina, quando a gente chega, pega todo mundo, leva para o xadrez. Então, como é que é? Isso aí, muitas vezes, eu e outros colegas fomos presos nessas condições. Aí, os estudantes, o diretor acadêmico fazia aquelas caravanas, ia na delegacia, tirava a gente na delegacia, etc. Geralmente, a gente saia de lá para ir para uma festa. Saia do xadrez para ir para uma festa de estudantes. Então, essa luta continuou. A tese de horta-barbosa foi vitoriosa. Porque Getúlio Vargas mandou um projeto para a Câmara Federal, e esse projeto efetivamente não atendia o que nós defendemos, chamado Estatuto do Petróleo. permitia a entrada de empresas estrangeiras no Brasil. E esse projeto foi discutido com a pressão do povo, nas ruas, etc. Houve muito tiroteio nos comícios.
00:35:37 P/1 - Você lembra de algum comício que você tenha participado, que tenha te marcado mais?
00:35:41 R - Não, porque eu participava em muitos comícios, não me marcou mais, não. O comício que me marcou mais foi um comício em que em que os estudantes mataram um colega nosso, estudante de direito, chamado Demócrito de Sousa Filho, na Praça da Independência, em 1944. Quando tem a arjetura do Demócrito de Sousa Filho, a polícia chegou, deu uns tiros lá pra cima e o rapaz levou uma bala e morreu. Era um líder estudantil. Ficou marcante esse negócio da emoção da filha. Foi um dos pretextos que incentivou a derrubada do Getúlio Vargas, em 1944. Então, o que acontece é que o movimento foi, mas no Congresso houve a coisa mais interessante, que a bancada da UDN, que era mais conservadora, resolveu apresentar com birra, O Getúlio Vargas resolveu apresentar um substituto. E foi o substituto do deputado, um personagem interessante, que era o Olavo Pilaquepito. O substituto foi aprovado e foi aqui que nasceu o Petrobras como monopólio estatal do petróleo. Getúlio Vargas sancionou a lei no dia 4 de outubro de 1953 e a Petrobras como empresa foi instalada no dia 10 de maio de 1954. E Getúlio Vargas, com aquela competência política que ele sempre teve, pegou o inimigo do monopólio e botou na presidência da Petrobras. Botou um cidadão da UDN, general Juarez. Juarez, não. Aquele baiano. Juraci Magalhães, como presidente da Petrobras. Mas botou uma diretoria de jeito muito bom. Hélio Beltrão, uma grande figura. Um outro que era um funcionário do Ministério da Fazenda muito bom também. E um outro que era um paraibano também, estudioso de economia, etc. Também era uma diretoria muito boa e a Petrobras montou-se e criou.
00:37:51 P/1 - E como é que vocês viram, então, essa criação da Petrobras?
00:37:55 R - Nós, quer dizer, a juventude brasileira, em regra geral, participou da construção da Petrobras, porque era um desafio. Os americanos diziam que nós não tínhamos competência de formar uma empresa de petrolíferos. Imagina, nós temos competência e formamos a empresa. Ela saiu de zero. Aí apareceu o petróleo na Bahia. uma gotinha de petróleo no subúrbio da Salvador, chamado Lobato, e a partir daí se impulsionou a campanha do petróleo. Tem em Salvador, tem em outros lugares do Brasil. Então nós íamos para Petrobras, não atrás do salário, que era muito bom naquela época, mas não era isso que nos preocupava, mas formar uma grande empresa competente e conseguir fazer.
00:38:54 P/1 - Então, Heitor, conta, como é que se deu, então, esse seu elo com a empresa Petrobras? Quando é que você vai trabalhar? Em que situação você se torna, então?
00:39:02 R - Então, nós estamos na Petrobras, na escola. Na escola, eu digo, eu vou para a Petrobras, ou eu vou para a Volta Redonda, ou eu vou para a Sergita. Para isso, eu preciso fazer também engenharia metalúrgica. Aí eu fiz engenharia metalúrgica. Nesse inteirinho apareceu uma comissão comandada por um cidadão chamado Mogi, que era o superintendente da área de treinamento, etc. Então, naquela época chamava-se Senap, que, por determinação da diretoria, foi convidar engenheiros E não somente engenheiros, mas pessoas que estudaram, por exemplo, físicos, que fizeram coisas de física, de matemática, determinados cursos que fizeram, que podiam ser para contratar para a Petrobras. E chegou na Petrobras, na escola de Recife, em Pernambuco, um grupo, chefeado por esse cidadão, E perguntou quem quer fazer o teste para ir para a Petrobras. A Petrobras naquela época tinha três anos, dois anos e pouco. Aí apareceram uns vinte, não sei quantos. E nós fizemos lá umas provas que eles botaram. Fizemos umas arguições, umas coisas. Então vocês estão convidados para ir fazer um estágio na Bahia. Um estagiário já remunerado pela Petrobras.
00:40:47 P/1 - Essa prova era uma prova técnica, do ponto de vista de conhecimento?
00:40:50 R - Era uma prova de conhecimento geral, mas eu não sabia bem qual era o objetivo daqui do cara, porque de petróleo a gente não sabia nada. Tinha que ser uma prova em relação ao conhecimento geral da engenharia, o que é que nós tínhamos aprendido, se nós tínhamos noção. Porque, na realidade, eu não posso dizer hoje, mas na minha época, o cidadão saía engenheiro, mas ia aprender depois de formado, porque só existia uma tal chamada engenharia civil. e de lá o cara saía com uma base para se especializar no trabalho. Ele ia ser rodoviário, ferroviário, trabalhar em doca, contra-seca, etc. E lá é que ele ia aprender efetivamente na prática. Então, a Petrópolis nos convidou, achou que nós podíamos entrar depois desse curso, desse teste, e nós fizemos um curso na Jiquitaia, que era a sede da região de produção da Bahia, que era a única que tinha petróleo naquela época, e fizemos como contratado para fazer o primeiro curso teórico, lá em Salvador, na Jiquitaia. Fizemos lá uns três meses ou quatro.
00:41:54 P/1 - Vocês já eram formados?
00:41:56 R - Todos engenheiros. eram dois cursos, um para a área de produção e outro para a área de refino. Tinha uns 60, 80, nesses cursos, na gente, todo o Brasil. Todo o Brasil em termos, porque onde tinha escola. Por exemplo, Pernambuco centralizava todo o movimento estudantil de Alagoas até o Norte. Sergipe ficava com a Bahia. Minas, Espírito Santo com o Rio de Janeiro ou com o Belo Horizonte, juiz de fora. Então, o que tinha de escola? Tinha gente do Rio Grande, do Paraná, de São Paulo, do Rio, de Minas, da Bahia e do Pernambuco. Pernambuco pegava o Cearense, pegava o Paraíba, o pessoal do Rio Grande do Norte, etc. Então, passamos esses quatro meses nesse tal curso teórico e depois mandavam pra gente, Quem ia para a perfuração ia para uma sonda de perfuração... fazer toda a atividade do operário. Começava pelo operário de baixo, que se chama plataformista. Pegar tubo, carregar no peito, roscar tubo, botar o tubo lá no buraco do poço... tirar todo molhado de lama de perfuração... e trabalhava por turno, porque a perfuração não para. É 24 horas por dia até terminar o poço. e fazia todas as funções da perfuração, que era plataformista, torrista, o cara que ficava lá em cima segurando o tubo, etc. E ajudava a auxiliar de soldador e soldador. Depois de passar mais uns seis meses nesses cursos, a Petrobras me mandou para o Maranhão. Era uma unidade da Petrobras para o Maranhão. E, no Maranhão, me disseram que eu ia comandar uma equipe de perfuração no Paranhão, no interior do Maranhão. O interior do Maranhão era uma cidadezinha criada por Vitorino Freire, que tinha duas ruas, no fundo da Baía de São Marcos, não tinha meio de transporte nenhum, ou era barcaça, barcaça mesmo, ou era teco-teco, cabia duas pessoas no teco-teco. O teco-teco descia, aterrissava, num campo de pelada de futebol. Enquanto tinha um cavalo, um boi lá, nós fazíamos uma luta para espantar o boi para o avião descer. Então, eu fui para lá chefiar essa equipe numa cidade chamada de Bequimão. Essa cidade teve esse nome em homenagem a um revolucionário maranhense, chamaram João Beckmann. João Beckmann fez uma revolução lá na Maranhão e deram o nome dele a essa cidade, a cidade de Beckmann. Talvez nem o povo de lá saiba que é isso, mas essa foi a razão.
00:44:52 P/1 - Como é o nome da cidade?
00:44:53 R - Beckmann? Beckmann. Porque o homem se chamava Beckmann. O pessoal era muito complicado de dizer Beckmann, eles dizeram Beckmann. Então passou o nome da cidade.
00:45:05 P/1 - Qual é a data da sua entrada na Petrobras?
00:45:08 R - A data da minha entrada na Petrobras, nós podemos considerar duas datas. 2 de janeiro de 1957, onde eu entrei como contratado para fazer o curso de estagiário teórico, aquele curso que é fazer, ler, estudar, aquelas preleções, fazer trabalho, escrita, etc. E abril de 1957, eu entrei como estagiário, que era a carreira inicial de engenheiro na Petrobras, registrado na Petrobras, como funcionário da Petrobras, como engenheiro A, como ele chamava, para fazer o estágio no campo. Em abril, 6 ou 8 de abril de 1957. A partir daí foi o Maranhão, chefe dessa equipe. Fizemos um poço, o poço deu, o poço seca, quando não tem nada, não tem petróleo. E a sede, o Rio de Janeiro, resolveu transferir minha equipe para o Mato Grosso, fazer um poço no Mato Grosso. Mas a Petrobras achou que eu tinha que ficar no Maranhão. Então, me transferiu para a cidade, para a capital, São Luís, que era a sede da Unidade.
00:46:15 P/1 - Mas essa experiência anterior assim, como é que era esse convívio com essa tua equipe, a sua equipe? Eram moradores da região?
00:46:24 R - Olha, moradores da região, o que podia se arranjar era o peão que fosse trabalhar mais braçal. Os outros eram pessoas que vinham até da Bahia, onde tinha mais experiência. Eram operários inteligentes e analfabetos. Mas eram operários inteligentes que aprendiam o ofício dele com muita competência e desenvolveram o trabalho. Chegaram até a ser sondadores. Agora, o chefe da operação era um americano. E o geólogo também era um americano. E nós comandávamos a tal equipe, mas como administrador, Porque como técnico não tem aquela experiência de furar, e os americanos tinham. O americano também não era multiletrado, não. Era operário mesmo, mas chegava lá com a função que eles chamam de puxa, puxador, puxa. E tinha um geólogo, que é um geólogo que chama geólogo de poço, que fica lá o dia todo para analisar a arinha que sai lá dentro do poço. Então eram americanos. Aliás, nessa altura, toda a Petrobras, a área técnica, era comandada por americanos. Americanos, os grandes comandantes. Agora tinha australianos, neozoolandeses, canadenses. Tinha alguns cubanos, ingleses, franceses. Cubanos também. Cubanos que já tinham passado para os Estados Unidos. Gente boa. Acho que eu vou tomar uma vinha aí. Obrigado.
00:48:04 P/1 - Agora, assim, você é uma pessoa politizada, quer dizer, nesse ambiente, nesta época, já haviam discussões políticas sobre condições de trabalho?
00:48:13 R - Não.
00:48:14 P/1 - Sobre condições de trabalho, por exemplo?
00:48:18 R - Olha, eu nunca assisti, porque nessa época não tinha nem sindicato, quando a Petrobras a Petrobras tinha atividade produtiva na Bahia. Tinha uma refinaria, 2 mil barris, processava 2 mil barris de águia, que era uma refinaria de Mataripe, que fica no Rio de Janeiro e Salvador, e tinha uma produção na Bahia de 2 mil barris de petróleo. Mas não tinha, era E a Petrobras procurava petróleo no Amazonas, no Rio Grande do Norte, no Ceará, no Mato Grosso, no Paraná, procurava petróleo. Então, quando tinha muita atividade, criava uma superintendência regional, como chamavam na época. Tinha no Maranhão, tinha no Amazonas, tinha na Bahia. Quando era menorzinha, chamavam de distrito. Isso era a parte de geologia comandada pelos americanos, notadamente, e a de perfuração também. O que é que faz a Petrobras? A Petrobras diz, não diz, faz. O negócio não é dizer, o negócio é fazer. A Petrobras toma uma decisão de formar técnicos brasileiros para substituir os americanos. Então, a Petrobras manda aqueles que se destacavam mais fazer curso nos Estados Unidos, na França, na Itália, por conta dela. E monta escolas de geologia, que é a tarefa primeira para descobrir petróleo, nas universidades brasileiras, que não tinha. A escola da Universidade do Pará foi feita pela Petrobras, de Pernambuco pela Petrobras. da Bahia pela Petrobras e aí afora todas as escolas de geologia que foram montadas na década de 50 e 60 foi feita pela Petrobras. Pagava os professores, pagava tudo. E mantém convenos ainda até hoje com várias dessas escolas. Porque se não fosse a Petrobras, nós não tínhamos condição de substituir os americanos. Então a Petrobras pagava peso de ouro. Onde é que tem quem tem o melhor de pai na teologia? Aí um cara da Hungria, mandamos buscar esse cara da Hungria. O cara vinha, botava o cara mais vivo em torno daquele cidadão e começava a absorver os conhecimentos daquele. Quem é que entende mais de não sei o que lá? Então vinha, tá certo? Então vinha. E o camarada, como nós não sabíamos, por exemplo, determinadas atividades de tirar PFU elétrica, etc. A Petrobras contratava firmas estrangeiras e botava dois, três engenheiros brasileiros lá junto pra aprender. Quer dizer, então nós formamos uma memória técnica tão importante que hoje, na atividade de produzir petróleo no mar, a Petrobras é a campeã. Americano não sabe, inglês não sabe. Porque os porcinhos da Inglaterra, que tem no Mar do Norte, são porcinhos de lâmina d'água de 400 metros. Nós estamos produzindo a 3 mil metros de profundidade de lâmina d'água. São 3 mil metros de lâmina d'água, mais 3 mil metros dentro da terra. E produzimos. Então, a produção agora é no mar nosso, que é um perigo.
00:51:42 P/1 - Então, assim, voltando, você fica quanto tempo no Maranhão?
00:51:47 R - Eu tive... A Petrobras era um sistema assemelhado com o sistema do Exército. O cidadão, quando entra, assina um papel dizendo que ele vai para onde a Petrobras mandar, Ele entra nessa condição. Se eu precisar de você ir para os Estados Unidos, você vai. Mas se eu precisar de você ir para o Acre, você vai para o Acre. Certo? Então é assim como entrava a gente na Petrobras, mas que ainda hoje continua sendo. Então eu fui para... De lá eu fui para São Luís, como eu te falei, né? Aí ele disse assim, você agora vai chefiar o... Não vai fazer perfuração, porque aqui você vai chefiar o serviço de suprimento. de material. É o cara que compra, vende, estoque, transfere para o pessoal usar, etc. E me botaram como chefe desse negócio, no Maranhão. Aí, em seguida, em princípio eu passava, como Néstor já passava um ano e meio, dois em cada função. A Petrobras era bem menor. Então, chegava um determinado tempo, a Petrobras dizendo, agora você me mandou... A operação está deslocada para a Amazônia. Nós temos 80% da nossa operação no Amazonas, para a Amazônia, aquela zona toda de lado. Você vai chefiar Petrobras no Amazonas". Aí me mandaram para Manaus. Manaus era uma beleza, porque Manaus não tinha luz. Continuava no blackout de 1940, da guerra, não tinha luz nenhuma. Não tinha transporte coletivo, tinha muita coisa, muito parque. E mandaram pra Petrobrás, que era a coisa mais importante de Manaus. A Petrobrás não tinha nada, então a Petrobrás botava um motorzinho, uma gasolina pra dar luz pra minha casa. Botava uma geladeira, a querosene, um tal de gelão matique, que hoje não existe mais, mas era... Botava uma coisinha de querosene embaixo, acendia, gelava. E o motorzinho no fundo do quintal lá da casa pra dar luz. Então a gente ia acender o motor, ligava aquelas horas que precisava daquela energia. Lá nós éramos a entidade mais forte na região, porque nós tínhamos mais carro, mais caminhão. Tínhamos dois aviões que faziam todo o serviço lá manobrado, que passavam por Manaus todo dia. e nós tínhamos muitas lanchas e coisas, Petrobras tem, que nós operamos tudo aquilo lá. O governador não tinha quase nada e nós tínhamos tudo isso. Tanto é que, quando o governo mandou fazer a usina elétrica de Manaus, mandou um major do exército, que passou a ser nosso amigo, também já faleceu. E a Petrobras é quem ajudou, por ordem do Rio de Janeiro, ajudou a montar essa indústria, essa usina elétrica em Manaus, porque senão não tem energia. Então, a Petrobras. Isso na Manaus. E lá eu passei quase dois anos em Manaus.
00:55:00 P/1 - Nessa parte de suprimentos também?
00:55:01 R - Não, não. Chefeando tudo. Chefeando todo o escritório petrobras. Toda a atividade da Petrobras. Suprimento, transporte pessoal, etc, etc, etc. Perfeito. Era isso aí. Aí depois, dois anos eu não sei, agora vai para Belém. Aí eu fui para chefiar uma entidade maior, que atendia o suprimento em sete estados do Brasil, todo o norte. Nós tínhamos três escalões de suprimento, aquela movimentação medonha de comprar material, e eu fiquei em Belém comandando esse negócio. O nosso escritório desse departamento era no Belém, na cidade, transferido mais para o subúrbio. Nós nos transformamos para um lugar chamado Tapanã. A capital está toda lá agora, no Tapanã, em Belém.
00:55:55 P/1 - E como era essa região nessa época?
00:55:58 R - Na Belém, foi uma cidade muito mais importante que a Manaus. Tinha luz, tinha água. Era uma cidade muito simpática, muito arborizada. Muita mangueira. Na praça de Mangueira, aquela rua cheia de mangueira. Ótimo, porque o povo pobre come as mangueiras. É o único lugar que o General Rossi chama Generalissimo. A Rossi chama Generalissimo Deodoro. Mas é uma beleza. A beleza porque a viagem ao Amazonas, a Amazônia, de modo geral, são sete estados. É muito interessante porque é uma cultura diferente, mas tem um denominador comum. Nós temos uma coisa que pouca gente tem no mundo e é uma das qualidades, é uma das características importantes para o Brasil como nação. Nós temos uma única língua, que por sinal querem acabar, querem violentá-la, uma única língua. Você chega no Amazonas, você com poucos dias você se sente em casa, porque você fala igual a todo mundo que está lá. Eu que andei do Rio Grande do Sul ao Norte, nunca tive dificuldade, porque eu achava interessante a maneira de falar as coisas, mas é uma língua só. Isso não existe na França, não existe na Itália, não existe na Espanha. Na Espanha são seis línguas. Não existe na Inglaterra. Na Inglaterra você tem o escoces, tem o irlandês, tudo tem dialeto diferente. E o Brasil tem uma língua só nesse continente. Isso é uma vantagem comparativa muito importante para o Brasil como uma grande nação. Infelizmente, as nossas elites não têm essa vocação de serem brasileiras.
00:57:48 P/1 - E a relação assim da Petrobras, do seu trabalho, por exemplo, com essa coisa das populações ribeirinhas?
00:57:54 R - O trabalho com a população ribeirinha, a preocupação sempre teve. E eu acho que ainda tem. Eu estou afastado há 10 anos. Sempre teve uma preocupação de colaboração. Porque quando nós chegávamos, em muita região, é um choque. É um choque. É um choque de tudo. Da maneira de cozinhar, da maneira de... Por exemplo, eu cheguei no interior da Bahia, A carne, que não valia nada, era o tal do filé mignon, que aqui não valia nada. Então, eu passei só a comer filé mignon. Cheguei no Maranhão, a maneira de cortar uma galinha, um coiso espessíssimo, patifar com a galinha todo dia, um negócio que não se fazia na minha terra. E tem certas características interessantes. A influência índia na Amazônia é muito grande. Por exemplo, você tem peixe maravilhoso na Amazônia, tudo de rio, e os caras cozinham peixe enterrando no chão. Faz uma cova, bota o peixe lá, o tabaqui, que é um peixe assim, gororoso, grande. Bota umas folhas por cima, etc. Bota até, eu não sei quanto... Daqui a pouco o peixe está uma delícia. Então, os caras fazem coisa mais rara.
00:59:05 P/1 - E o que aconteceu com os índios? Havia alguma relação assim, se empregavam?
00:59:08 R - Eu não tive relação nenhuma com os índios, mas toda vez a turma que tinha relação, era uma relação profundamente cordial e respeitosa. não somente com o índio, como com a natureza lá. Nós procuramos não estragar quase nada. Em muitos lugares que nós descobrimos, e é uma sugestão que nós damos até agora para a atual administração da Petrobras, uma maneira de ajudar o Brasil, muitas vezes nós descobrimos poços que não tinham petróleo, mas tinha muita água potável. E, muitas vezes, nós oferecíamos aquele poço para o município. A gente completava o poço e dava para o município iniciar. Não sei. Às vezes, o cara dava e o fazendeiro ficava com o poço. Aí é outro problema, que não cabia nós, porque nós saímos do lugar. Então, isso aí. Hoje, a possibilidade, porque a Petrobras sabe onde é que tem água. Tem muita água embaixo do terreno do navio, água potável. É só fazer um convênio com as repartições federais estaduais que têm interesse nesse assunto, que por engano só tem de propaganda, porque se tiver de fato pode fazer, e aproveitar. onde já, sabe, aqui tem água, fura água, Petrobras ajuda, mas deixa para os caras administrais da prefeitura, que é a responsabilidade deles. A relação da Petrobras sempre foi muito interessante. Nós temos projeto desenvolvido, por exemplo, que Fernando Henrique mandou suspender em Caxias, na nossa refinaria. Nossa refinaria fica cercada por favelas, lá num lugar chamado Campos Elísios. Não tem nada com o Chans Elysée de Paris. É um pouquinho diferente. Então, o que acontece é que o pessoal lá fez a refinaria, campos de polivalente, salões para cursos, etc., e montou um trabalho que absorveu mais de mil alunos, mil estudantes, moças e rapazes, garotos, desde a pequena idade até a idade de jovem, 12, 14 anos, cursos. Cursos complementares de música, de capoeira. Está conveniente. Eu faço o que vocês mandarem.
01:01:34 P/1 - Você estava falando, então, do trabalho que se faz hoje com os alunos.
01:01:38 R - Isso é um projeto que eu tomei conhecimento com mais profundidade na refinaria Duque de Caxias, aqui em Duque de Caxias, onde tinha mais de mil alunos. onde foram, onde eram eletrônicas, etc., onde saíram pessoas muito bem preparadas, está certo, nas diversas atividades, e tiraram essa juventude daquela falta do que fazer, que leva a droga, leva a malandragem. Então, esse projeto foi suspenso, o Fernando Henrique disse que Petrobras é para procurar petróleo, não tem nada de castanheiro com isso, porque é toda equipe de profissionais. professores, instrutores de diversas atividades esportivas, professores de diversas atividades culturais, etc. Quer dizer, era uma coisa realmente que ajudava. Isso para a Petrobras... Olha, é muito menos do que a camisa do Flamengo, que a Petrobras manda botar aquele Lubrax lá, para o pessoal roubar, que a liderança desses clubes esportivos só tem ladrão. Eu li com Miranda e outros. Então, o problema é o seguinte, eu, se eu tivesse, mandasse na Petrobras, o meu negócio ia para esse tipo de atividade.
01:02:50 P/1 - Então, quanto tempo você passa chefiando esses sete estados?
01:02:56 R - Chefiando a Petrobras. Não me comprometa.
01:03:00 P/1 - Chefiando a Petrobras?
01:03:02 R - Na base de Manaus, depois eu fui para a sede em Belém. A sede de Belém administrava Manaus, Manaus estava subordinada à sede de Belém. O superintendente era Jaba Gonçalves Passarinho, que foi ministro da Justiça, ministro da Educação, ministro daquilo, daquilo, outro, revolucionário de 1964. E lá eu passei aproximadamente dois anos, como eu sempre ficava, sempre um ano e meio, dois anos em cada lugar. Aí, para a minha felicidade ou não, me convocaram para me chefiar aqui no Alto Administração da Petrobras. Eu vim ser chefe do Escritório Central de Compras.
01:03:47 P/1 - Isso em que ano, Heitor?
01:03:48 R - 1963. No princípio de 1963. O Escritório Central de Compras era a unidade da Petrobras que era responsável pelas compras no território brasileiro e nos estrangeiros. E nós tínhamos um escritório em Paris e outro em New York, naquela época. Depois mudou para Houston, mudou para Londres, mas naquela época era um em Paris e outro em Nova York. E nós, então, fazíamos encomendamento de preço controlável, independente do nível de autorização de cada autoridade. aquela diretoria resolvia o conceito da administração, etc. Então, eu fui chefiar essa entidade, quando eu vim de Belém.
01:04:37 P/1 - E a sua participação política, como é que ela vai ser construída?
01:04:41 R - A minha participação política teve duas etapas. Teve a etapa estudantil, teve a etapa que eu entrei na Petrobras, aí não teve a participação política, só tinha a participação profissional, Não fazia política. A minha política estava muito satisfeita em criar uma Petrobras forte e competente. Essa era a minha política. Como ainda hoje, continuo nessa linha. Não faço parte de partido político nenhum. Não sou candidato a nenhum cargo eletivo. A minha luta hoje, ainda hoje, é para fortalecer a Petrobras e colocar a Petrobras nos seus trilhos. Na nossa avaliação, ela está fora de trilho. Vamos ver se agora ela entra nos trilhos. Então, eu não fazia política. Porque política é a arte da vida. Você faz política todo dia, toda hora. Você faz política com o filho, se tiver filho, com o marido, com o sogro, com a sogra, com o pai, com a mãe. Todo mundo só faz política. Por isso que eu digo, se você quer fazer uma boa política, você lê o livro de Sun Tzu, o grande estrategista chinês do ano 2500 a.C. fez um livreto que está sendo muito distribuído por aí, eu leio quase sempre, chamado A Arte da Guerra, que ensina a fazer política. Então, política é o que há, é a vida da pessoa. O homem, o animal homem faz política toda hora, todo instante. Você tem política dentro do escritório, você tem política em todo canto. Então, política, quando se fala no sentido pejorativo, é outra coisa, mas política é uma coisa importantíssima. Eu, por exemplo, eu faço política No momento em que eu sou dirigente de uma entidade de engenheiros e profissionais do nível universitário da Petrobras, eu estou fazendo política, mas não política partidária. Não sou do PT, não sou do PMDB, não sou do PFD, sou de coisa nenhuma. Sou apenas petroleiro dirigente dessa entidade, que tem 41 anos de idade.
01:06:41 P/1 - Mas o ano de 1963...
01:06:43 R - O ano de 1963 eu chefei, aí foi um ano muito mutuado no Brasil. Eu, num determinado momento, eu fui numa embaixada, numa comissão para a Europa, os seis colegas da Petrobras, os caras de outras entidades do governo, o Vale do Rio do Ocequielá, e o embaixador do Itamaraty, e nós fomos para correr o leste europeu, porque havia um acordo do Brasil com o leste europeu para fornecimento de equipamento de petróleo. Então, nessa comissão, eu fui nessa comissão, tivemos, o meu pai terminado de Checoslováquia, visitamos várias indústrias do Checoslováquia, tivemos na Hungria, tivemos na Alemanha, em Berlim, nessa época. Depois veio a Revolução. Veio a Revolução e, como eu, na minha administração, eu não gosto de dar, nunca gostei de usar, o meu cargo para benefício meu, nem de amigos, tanto é que eu nunca botei nenhum parente na Petrobras. Nunca indiquei nenhum parente para a Petrobras. Então, o cara trabalhava, eu, tá bom, se não trabalhava, de acordo com aquilo que eu achava que era importante, eu pedia para ele ser deslocado para o outro lado, não que aquilo fosse para o outro lado. Então, acontecia que eu encontrei Nesta unidade, uma série de coisas que eu não concordava. Por exemplo, na história da Petrobras, que tem que contar, eu cheguei, eu tinha três secretárias. Mas por que eu quero tantas secretárias, meu Deus do céu? Aí veio e falou assim, você não tem um remedinho para tomar? Você não quer? Meu Deus do céu, três secretárias? Eu não tenho coisa para três secretárias. Eram pessoas que qualquer momento... O chefe certamente gostava de ser rodeado de secretários, mas eu não havia necessidade. Então, tinha outras atividades dentro da própria unidade de trabalho que precisava de gente. Minha filha, você não é daquele lugar? Volta pra lá, volta pra lá. Então, eu reduzi o meu, como chamava, de gabinete. Eu e uma secretária só. Eu não precisava de três secretárias, tá certo? Eu não gostava de receber convites pra almoço, nem pra jantar, nem pra tomar uesquinho. de fornecedores, porque, embora entendendo que isso faz parte da vida social no sistema capitalista, eu considero isso um fator de corrupção. Então, para evitar, eu não gostava de ser convidado para coisa nenhuma. Se era uma inauguração onde ia toda a diretoria da Petrobras, eu ia. Se era um negócio de uma embaixada, eu ia. Agora, o negócio de o Sára me chamar para ir almoçar, etc., eu não gostava de ir. Porque eu, pessoalmente, considero que isso é um fator de corrupção. Como eu não gosto de receber presentes. Porque presente não é minha pessoa física. Presente é o meu cargo. No momento que eu perder o cargo, não ganho mais presente. Então, eu não gosto de presente. Não me dê que eu não receba. Ai, Natal, não quero presente. Não quero presente. Ai, aniversário, não quero presente. Porque o presente não era minho. Era o meu cargo. Então, o cargo, os presentes, tinha que ficar por lá, não era para mim. Então, eu tinha um bocado de milícula na hora. Brigadeiro, o que é que o senhor está fazendo? Brigadeiro, o senhor não tem o que fazer aqui mesmo. Vamos já para outro lugar para o senhor fazer, ou para outro lugar fazer. Ô, coronel, mas coronel, não tem o que fazer aqui, coronel. Ô, mariguerra, mariguerra, não tem o que fazer. Isso certamente criou uma simpatia para o Dia da Revolução e uma comissão de dois brigadeiros e um coronel me prender, porque eu tinha afastado eles de lá. Claro que a minha vida de estudante político, de manifestação, os meus dias de xadrez pelo Petróleo é Nosso etc. Valeu? Contou? Mas também contou, porque disseram que eu tinha feito o que? O inventário que eu tinha feito. Eu fiz um negócio que os americanos faziam há muito tempo, que era uma atividade muito simples. A burocracia emperra. Emperra. Emperra por quê? Emperra porque eu tinha tanto chefe de divisão, eu tinha três secretárias. Mas o chefe de santo tinha duas, o chefe de setor tinha uma. Então era mulher espalhada por todo canto. Não tenho nada contra. Eu sou feminista. Eu gosto muito de mulher e sou a favor das reivindicações das mulheres. Acho que são justas. Então o que aconteceu? Vamos formar o quê? O que é que a menina é? A menina é datilógrafa. O que é que faz fundamentalmente isso aí? Não é datilografia? Não havia computador. Eu fiz o que os americanos chamam de um pool de datinografia. Então, botei 20 e tantas mulheres lá dentro, botei três caras para subordinar, que eram estudantes de direito, para coordenar. Em menos de dois meses, tirei o atrasado de dez anos. Papel que tinha lá, porque não tinha quem fez a datinografia. E passei a fazer para os outros departamentos. Vocês não têm coisa para fazer, não? Porque não tem aqui. Isso, chamaram isso que era um negócio de guerrilha ou sei lá o quê, deram um apelido que eu tinha feito aquilo lá. Eu rio porque fiquei impressionado pela burrice lá dos marechais. Te prenderam? Ah, prenderam. Prenderam a mim, prenderam vários colegas. Prenderam um outro colega meu que no final terminou presidente da Petrobras, mas foi preso comigo nessa época. No mesmo camburão.
01:12:33 P/1 - Quem foi?
01:12:34 R - Carlos Santana. Hoje está aposentado. Carlos Santana foi diretor muitos anos da Petrobras, mas terminou como presidente. E passou uns dias comigo no xadrez lá do Udópis. Mas ele era, tinha prestígio. O sogro dele, me parece, dizem as mais línguas, não sei se é verdade, e só passou alguns dias no xadrez. E eu passei 45 dias fazendo a turnê por conta dos cofres públicos que ficavam no Udópis, na Ilha das Flores, não sei aonde, não sei se foi em Caneco. Depois... Você volta a Petroponte? Aí eu sou caçado numa lista ilustre. Não sei quantos generais, não sei quantos almirantes, não sei quantos governantes. Lá está meu nome lá no meio. É muito impressionante. Eu tenho esse diário oficial. O cara me deu esse diário oficial com a caçação em junho de 1964. Eu estava encaçado. Minha mãe me telefonou de Recife. Você leu do jornal? Eu disse que não li nada. Você foi encaçado. O que é que eu vou fazer? Ainda estava na Petrobras, porque eu estava apenas afastado. Fiquei na Petrobras até agosto. Agosto, me demitiram. Sem coisa nenhuma, porque fizeram não sei quantos EPIs, esses negócios de, sei lá, militares, não acharam nada. Infelizmente, não tem nada contra mim até hoje e nem vai ter. Então, esse negócio. Saí nessa caçação e aí fui quebrar pedra. Quebrar pedra porque eu sempre trabalhei na Petrobras. e estava praticamente com medo de trabalhar na área do petróleo. Aí foi um transtorno para mim, porque eu tinha dois garotos pequenos. Aí eu fui vender livros, a coisa mais chata do mundo, vender livro técnico. Aí eu vendei, meus camaradas, vendi para a Petrobras, que o diretor era meu amigo, Vendi para o BDS, que o diretor era meu camarada. Enfim, vendi para outras firmas aí. Enquanto acabou esse circo de camaradas, eu não vendi mais livro e mudei de atividade. É uma luta para a sobrevivência. Mas a gente, quando é moço, enfrenta isso com muita facilidade. Eu, pelo menos, enfrentei.
01:15:03 P/1 - Mas o que era isso para você? Você era um engenheiro de petróleo, não era isso? De repente, ter os teus direitos políticos e profissionais cassados, impedidos.
01:15:15 R - Você não imagina o que fazer. Porque eu aí fui fazer, fazer. Daí, nos livros, o cara me convidou para ir fazer uma fabriqueta lá em Jem do Dentro, Jem do Meio, sei lá, um engenho que tem aquele subúrbio que tem aí, no fundo do quintal, para fazer armário de aço. uma mesa para desenhos. Eu fui lá administrar o troço, passei uma temporada lá. E, finalmente, me chamaram, um cara que trabalhava com Petrobras, me chamou para ir trabalhar com ele na firma dele, como o que eles chamavam de Engenheiro de Venda. É um nome que os americanos chamam de Seire de Engenharia, Engenheiro de Venda. Eu falei, vou trabalhar também. Aí eu fui trabalhar em uma série de atividades na área científica, na área nuclear. Então eu visitei esses laboratórios, fiz amizade com esses cientistas todos do Brasil afora, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas, onde tinha, né? Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas e Rio de Janeiro. De repente, o dono da filma falou assim, você não pode trabalhar na Petrobras, eu vou perguntar ao presidente da Petrobras e aos diretores. Aí fui lá perguntar a eles. Todos os meus colegas estavam lá naquelas funções. Como nunca tiveram nada contra mim pessoalmente, eles me recebiam com muita gentileza, nunca tivem nada. Ah, rapaz, vem cá, vem cá, pode vir, tá liberado, pode vir trabalhar.
01:16:53 P/1 - Mas como empregado da outra empresa?
01:16:55 R - Não, como representante de firmas estrangeiras, norte-americanas. Porque os estrangeiros, os capitalistas do primeiro mundo, não tem esse negócio, não. Ah, o cara é esquerdo. Não tem. Ele quer que o cara trabalhe pra ele. Acabou. Se for muito, ele até mata. Mas se não for, ele vai explorar. Acabou o trabalho do cara, até não poder mais. Então eu trabalhei para firmas americanas, inglesas, alemãs, francesas. Mas nessa primeira fase eu trabalhei com as universidades e com outras empresas que não tinham nada com petróleo. Não, você tem que trabalhar com o pessoal do petróleo. Eu perguntei, não, vou ter que vir. Aí eu fui lá o cara que me substituiu naquela unidade que eu fui chefão dele. Era um general. Era um general e ali junto dele era o Mari Guerra. Olha lá, você está com ordem da diretoria para trabalhar aqui. Vê o que você vai fazer. Eu não vou fazer nada, apenas oferecer o negócio. Fiquei lá. Aí eu comecei, veja bem o seguinte, a pior coisa do regime militar, que não se sabe, da ditadura militar, não é a cassação explícita, não é você sair no decreto, porque aquilo você vai fazer parte até do seu currículo. Mas fizeram muito com os aviadores, fizeram muito com os aviadores. E fizeram comigo. Eu estava trabalhando, representando uma filha, Daqui a pouco, o meu chefe chamava. Rapaz, eu recebi uma telefonema do coronel fulano de tal, me dando os conselhos, que não seria bom para mim você ficar trabalhando comigo. Olha, eu gosto muito de você, mas você vai compreender. Eu disse, claro que eu compreendo, você não vai perder seu negócio por minha causa. Aí eu me afastava. Isso aconteceu várias vezes. Uma vez eu ia fazer um negócio que parecia ser um negócio grande, o pessoal fica com o olho desse tamanho. Então, chegaram... Eu já estava trabalhando dentro da Petrobras, como representante. Então, chegaram e botaram um papel na mesa do presidente da Petrobras, que era aquele almirante que foi governador do Rio quando fizeram a fusão. Tem até uns irmãos também que eram brigadeiros. Aquele almirante era o presidente da Petrobras. entrar em todos os departamentos da Petrobras. Se eu entrasse, o chefe ia sofrer punição. Eu digo, o que é que eu vou fazer? Vou para ajudar o meu colega lá. Aí eu tinha, nessa altura, eu tinha três diretores que eram meus colegas, desde a Petrobras. Eles eram meus colegas, eu disse, vamos ter uma boa relação com eles. Eu digo, o que é que eu faço? Dizem, vamos derrubar esse negócio. Tem uma repartição, que é o serviço secreto que os militares montaram, chamado Divisão de Informação, Divim, investigação, o negócio se chama Divim, lá a sigla. Você vai lá e diz as coisas para ele, que não tem problema. Eu peguei, fiz um requerimento. peguei a assinatura de vários diretores, ex-diretores, superintendentes, ex-superintendentes, general, brigadeiro, etc., dizendo que não tinha nada que me impedisse de trabalhar na Petrobrás. Olha aquele troço, tá vendo? O coronel da coisa, olha aqui, eu trouxe isso aqui para o senhor, por orientação do diretor. Tá muito bem, vou tomar conhecimento e depois volto aqui. Há alguns dias, ele me telefona. Se eu quero comparecer aqui, pois não. Aí eu fui lá. Isso no tempo militar, 2005. Aí ele disse o seguinte. Olha, eu tenho um ordem aqui para o senhor voltar a trabalhar na Petrobras. Agora você vai voltar devagarzinho. Você vai escolher qual é a unidade de trabalhar que você quer trabalhar. Então a gente vai deixando, todo mês a gente deixa, libera várias unidades. daqui a uns quatro, cinco meses, você está entrando em todas. Muito obrigado. A partir daí, eu não passei mais nem na calçada da Petrobras. Eu só voltei à Petrobras quando eu entrei para trabalhar lá dentro. Anistiado em 1985. Então, isso foi comigo. Experiência própria. Agora, hoje, há uma comissão de anistia no Ministério da Justiça e essa mídia que merece muita preocupação dos leitores, dizem que existem indenizações, que não é o meu caso, indenizações milionárias. Essas indenizações são de oficiais da aeronáutica, que eles proibiram de trabalhar, através de um decreto secreto, que nenhum país do mundo tem decreto secreto, que eu saiba. Proibiram os aviadores de trabalhar. O aviador que foi para a escola pequenininho para ser aviador só sabe ser aviador. De repente, você não pode trabalhar aviador? O cara ia trabalhar numa fazenda de um cara no teco-teco, aí vinha o telefone do colégio. Bota esse cara para fora, você não pode. Teve gente que se suicidou. Teve gente que endoideceu. Teve gente que, para não morrer de fome, foi trabalhar em Angola, Moçambique. E eu espero que as anestesias pessoais tenham direito a essa indenização, do qual o Estado comandado por esses milíquos. impediram dele viver, estão achando que é estrambólico. Mas a imprensa não levanta dos que se suicidaram, dos que enlouqueceram por essas providências. Está entendendo? Então a gente tem muito cuidado. Eu não leio mais nem televisão, esses jornais do Iraque eu não leio, porque tudo aquilo é o Pentágono que manda. Então eu achei esse jornalista brasileiro, com todo o respeito, uma pessoa que precisa ganhar o seu dinheiro, mas eu preferia mudar de profissão se eu fosse jornalista.
01:23:29 P/1 - E por você ser anistiado em 1979, em 1985?
01:23:35 R - Não, eu fui anistiado em 1979, em 1977, por uma lei do Congresso assinada pelo general Figueiredo. O general Figueiredo assinou essa lei. E dizia o seguinte, a lei, que eu encaminharia minha requisição para a empresa de minha origem. Não, para o ministério do qual a minha empresa era subordinada. O ministério mandava para a empresa da minha origem. Independente da opinião da empresa, se precisava do meu serviço, eu seria reintegrado ou seria aposentado na marra. Muito bem. Era ministro o coronel César Caos, cearense. Esse coronel do exército. E era presidente da Petrobras, honestíssimo. o doutor Sérgio Akiweke. Honestíssimo, o doutor Sérgio Akiweke. Era o presidente da Petrobras, ministro das Minas e Energia, que fez o negócio da light, a compra da light. Ele disse o seguinte, deve ter perguntado a alguns cupins, disse assim, está doido para ter esse cara aqui dentro? Então, eu disse, não preciso do Sr. Itomar Neopereira. Aí eu fui para o Cesar Karl. O Cesar Karl mandou, não preciso do Sr. Itomar Neopereira. Então, o Sr. Cesar Karl me aposentou na marra. É uma excrescência jurídica que não existe. Só não foi pior porque tinha um procurador-geral da República, um homem honestíssimo e sábio que orientou como devia funcionar aquele troço. Houve a queda do regime militar, houve a Tancredo Ney foi eleito, morreu, não assumiu, mas Sarney assumiu, mas ele aceitou o ministério. E colocaram no Ministério da Vila Geral um patriota, um elemento conservador, patriota honesto, chamado Aureliano Chaves. E Butana Petrobras, também um cidadão, que participou do Ministério da Revolução, foi um dos ministros generais, mas era um homem patriota, foi o primeiro diretor da Petrobrás, competente, chamado Hélio Beltrão. Então, nós retornamos toda a Petrobrás reclassificada, etc, etc. Voltamos para a Petrobrás em 1985.
01:26:03 P/1 - E você vai para que função?
01:26:05 R - Aí, o que é que acontece? Em regra geral, você pega uma geração defasada de 20 anos. Eu saí em 64, volto em 85. 64 para 84 são 20 anos. 20 anos, 21 anos de diferença. Aquela engenheirada toda, já não é mais aquela do meu tempo. Então, não, você é o homem do suprimento, porque eu fui chefe desse troço, você vai ficar lá, eu vou estar lá numa mesa. E praticamente, não me dava nada para eu fazer. Ele me ligava. Aí o diretor era meu camarada, que teve preso comigo, que era o Carlos Santana. Eu botava duas comissões lá para fazer umas coisas lá e lá eu fazia as coisas que ele mandava no grupo de trabalho. Grupo de trabalho e tal, bota aí, tô lá. Eu ia lá, passava 10, 15, 20 dias naquela coisa. Eu fiquei lá o tempo todo. Aí o cara me chamava e dizia o seguinte, o meu chefe lá já faleceu. Olha, rapaz, Eu só tenho um lugar para você aqui, mas não vou dar o lugar que é o meu. Então não vou dar o meu lugar para você. Você compreende? Eu compreendo. Está muito bem, então fica lá. E quando o Collor assumiu, o primeiro Fernando, desencadeou aquela campanha que foi o início do desmonte do Brasil como nação, todo o Brasil. Foi o Collor que recebeu essa tarefa. Cumpriu mal, foi com muita sede ao pote, então só durou dois anos. Começou a providenciar as dimissões dos funcionários públicos e das estatais atrás de Marechal, não sei o que lá, etc. E começou um negócio na Petrobras. de quem tinha antes de dar a dita devia se aposentar e quem não tinha, para a lista de demissão. O que acontece? Eu era aposentado já pelo governo e fiquei preocupado com meus colegas mais jovens, estava todo mundo apavorado. Apavorado. Será que vão botar o meu nome? Será que vão botar o meu nome? Olha, rapaz, eu vou dar o meu nome porque eu não tenho problema, eu não preciso, não tenho como quer viver. Aí pedi para ser afastado da Petrobrás em 1990. Aí me afastei da Petrobrás. E hoje meu trabalho são todos não remunerados, porque eu sou o diretor da Associação dos Engenhos da Petrobrás, que une os profissionais de nível universitário da Ruding, de toda a empresa, Sou conselheiro há já mais de 12 anos do Clube de Engenharia. Tenho 10 anos de remuneração, mas tenho possibilidade de fazer política com P maiúsculo. Quer defender a Petrobras, votar a Petrobras aos seus eixos, é ser contra a seleção da base de Alcântara aos norte-americanos, é ser contra a ALCA. e é lá no Clube de Engenharia e na Associação dos Engenheiros que nós fazemos esse tipo de política. Não é política de PT, de PSB, de PTT, nada disso. Essa é a minha posição hoje. Como é que é um pouco o.
01:29:34 P/1 - Trabalho do sindicato, de divulgação, por exemplo, campanhas, alguma que tenha te marcado mais como membro desse sindicato?
01:29:44 R - Olha, mesmo o sindicato, Eu só sou sócio, eu nunca fui lá, nunca ia lá. Primeiro, eu tinha uma posição na Petrobras de chefe, então não tinha condição, porque era uma posição muito contraditória, eu ser chefe e ir para o sindicato. Eu acho que o sindicato é um importante instrumento, deve ser, está certo, dos trabalhadores, é uma maneira de se defender, como qualquer organização tem que se defender. Mas eu não ia, primeiro eu não tinha, nunca tive muita simpatia, muita afinidade com o movimento sindical. Mas é outro nível, pelo menos eu achava. Então, eu sou amigo dos sindicalistas, sou colega deles, etc. Agora, nunca tive a atividade de ir lá para o sindicato, em greve, não greve, etc. Nunca tive. A associação serve um pouco? Ela faz um pouco esse papel de sindicato? Vamos ver. O importante da nossa associação, que tem 41 unidades, feita o ano passado, a Petrobras era pequenininha. Então, tinha um grupo de economistas muito ativos, Sobral, Massa, Fernando Senna e outros camaradas nossos, muito ativo, vamos criar uma entidade de profissionais. Mas qual? Mas a empresa só tem engenheiro? 99% é de engenheiro. Então vamos criar uma entidade de associação dos engenheiros da Petrobras e entre engenheiros economistas. E fizeram um estatuto onde os sócios da Petrobras, da associação seria engenheiros economistas. E quais são os objetivos dessa entidade? Os objetivos das entidades é defender o monopólio estatal do petróleo como a melhor solução para o Brasil em política de energia petrolífera. Segundo objetivo nosso, defender a Petrobras como a única capaz de exercer esse monopólio em benefício do Brasil. Terceiro, defender os interesses do seu corpo técnico. Esse é o nosso objetivo. a corrença, que não devia ser, defender os interesses da soberania nacional, por isso que nós discutimos Alcântara, Alca, Amazônia e transgênicos, essas situações ao mesmo tempo. Então, esse é o objetivo da empresa. Na década de 1980, houve uma campanha muito grande, porque os profissionais dos outros níveis superiores, que estavam conseguindo se regulamentar, Administrador, enfermeira, psicólogo, que não tinha conselho regional, não exigia, começaram a conseguir. Começaram a pressionar para entrar na IPET. Então, nós amontando, era o nosso estatuto. Manteve a denominação, que já era conhecida, mas mudou o corpo social. Todos os engenheiros de nível superior que assim estejam empregados na Petrobras. que esteja registrado como tal na Petrobras. Porque na Petrobras você tem dezenas e dezenas de engenheiros, de administradores, de contadores, de sociólogos, de psicólogos, de assistentes sociais, que são do nível médio. Porque há 11 anos não tem concurso na Petrobras para esse pessoal ser classificado. Às vezes até usa o cara naquela atividade, mas não como ele, não são classificados como tais. Está entendendo? Então, na década de 80, se mudou o estatuto. Ou seja, a IPET é uma entidade que, em princípio, deve alcançar, atualmente, apesar de todas as pressões, deve alcançar em torno de uns 70 e poucos por cento do corpo técnico da Petrobras. Tem 4.500 sócios no universo que não chega a 7.000. Porque quando tinha 12 mil, nós tínhamos 8 mil e 500 sócios. Mas aposentou-se, morreu muita gente. Então, nós somos em função do enxugamento do corpo tênico da Petrobras, que foi uma rásia. Coisa impressionante. O governo Fernando Henrique Cardoso vai para a história como um dos maiores governos que o Brasil já teve, fora de brincadeira.
01:34:17 P/1 - Você consegue quantificar? Quer dizer, a associação hoje tem quantos sócios?
01:34:20 R - 4 mil e 500, aproximadamente. E nós temos alguns aposentados. Porque o cara se aposenta, eu quero continuar. Então, entra como aposentado. Tendo essas condições na termodatívia, ele continua. Como eu, no meu caso. Então, essa é a sociedade. E a sociedade tem como sua arma a comunicação. Nós já tivemos grandes batalhas, até meados de 90, Por exemplo, quando houve a Constituição de 1988, aquele artigo que estabeleceu que o monopólio estatal do petróleo continuaria daquele maneira, assim que foi feito por nós. Certo? Discutindo a nossa sede, com o nosso pessoal, levamos ao Congresso Nacional, lutamos e ele foi aprovado. Nós lutamos contra os contratos de risco até comprovar que os contratos de risco eram prejudiciais. Na revisão da Constituição, nós conseguimos derrotar a revisão, mas aí houve um fato ocasional, que colo caiu, Itamar subiu a presidência. Itamar é patriota, é nacionalista. Itamar disse, vocês vão defender a Petrobras. E a Petrobras então bancou a manutenção de um hobby de 20, 30, 40, 50 ingênuos no Congresso Nacional, explicando o que é a Petrobras. Porque o político nacional, na minha experiência, tem uma característica. Uma profunda ignorância dos próprios brasileiros. Uma profunda ignorância. Porque quem manda no Congresso é meia dúzia de deputados e senadores, porque os outros são uma negação. Ninguém nem conhece os caras, nem na terra deles se conhece quem é deputado. Então a gente ia lá e explicava para o cara. Tem uns que tinham uma posição já consolidada, como o do centro de Oliveira da Minha Terra, que é o latifundiário lá do Sertão Pernambucano. Isso não tem jeito, mas a gente ia lá. E conseguimos que a Constituição não fosse revisada. Colaboramos para que ela não fosse revisada. Então, continuando a mesma coisa. A mais, temos perdido muito tempo com o Fernando Henrique, tivemos derrotas sérias. Como as quais? A derrota séria do regente Fernando Henrique Não foi minha, nem tua, nem da Petrobras, foi do Brasil como nação. No momento em que Fernando Henrique conseguiu controlar o Congresso Nacional, cor-responsável daqueles atos, e aprovou a reforma da Constituição brasileira na área econômica, porque fez coisas que ninguém fez. no mundo, ele fez no Brasil. Você imagina, liquidou com o monopólio estatal do petróleo. Venezuela tem, o México tem, os países do Oriente tem. Liquidou no Brasil, totalmente. Liquidou com o monopólio das telecomunicações. Fez uma coisa que ninguém faz no mundo. Igualou as empresas brasileiras às empresas estrangeiras. O BNDES era proibido de emprestar dinheiro a Petrobras e a Eletrobras. O BNDES foi quem ajudou a privatizar no Brasil, tanto é que os americanos não estão nem pagando ao BNDES, como a AES, que é dona da Eletropolo. Foi comprado com dinheiro do trabalhador brasileiro, porque Fernando Henrique determinou Fernando Henrique acabou com a cabotagem no Brasil. Ninguém faz isso no mundo. Ninguém permite que navios de bandeira estrangeira entrem no seu interior. Faça a navegação costeira e Fernando Henrique acabou com isso. E acabou com as nossas companhias de navegação costeira, noide nacional, noide brasileiro e essas particulares que têm aliança, não sei o que lá. Isso nem pesa mais. Enquanto isso, nós defendemos... Porque ela toma uma posição igual à dos americanos. A lei americana diz o seguinte... nas costas dos Estados Unidos ou das áreas que os Estados Unidos mandam. E nos seus rios só entram navios construídos pelos Estados Unidos. Só entra navio de propriedade de norte-americano e tripulado pelo norte-americano. Senão não entra. O Brasil abriu, liquidou tudo. O que é que acontece? Nós estamos com essa coisa terrível. Acabou com nossa indústria naval. Tudo isso. E a lei do petróleo, que ele botou o gerro dele, que hoje não é mais gerro, como presidente da ANP, o cidadão chamado David Gilberstein, que resolveu doar os nossos campos de petróleo para as multinacionais. E fez uma lei em que, nessa lei, se achava essa descobri o petróleo, o petróleo é dela, não é mais nosso. O petróleo é nosso? Como que é nosso? O sumistário reuniu as grandes companhias internacionais e disse, minha gente, o petróleo agora é vosso. E esse é da ANP. Esse é o governo Fernando Henrique Cardoso, seu gênero. Então, as companhias que conseguem descobrir petróleo, só essa descobriu alguma coisa, esse petróleo é dela. Não é mais no Brasil. Ela pode fazer o que quiser com o petróleo. Mas o Brasil vai precisar desse petróleo. Tem culpa. Preços internacionais. Está na lei. Lei do petróleo. indiferente nos Estados Unidos, que tem a tal agência reguladora nos Estados Unidos, que é para defender o consumidor, as agências reguladoras no Brasil, montadas por Fernando Henrique Cardoso, é para defender as empresas multinacionais. Veio um aumento agora de energia elétrica violenta contra os pobres, telefone, etc. O que é que fez Fernando Henrique? Você tem que vender gasolina para o brasileiro como você vende para o francês, para o alemão e para o americano. Mas, meu Deus do céu, salário mínimo na Europa é US$ 800, no Brasil é US$ 80. Como é que eu posso comprar gasolina se eu ganho US$ 80 e o cara ganha US$ 800? Mas é o mesmo preço. Fernando Henrique, no governo de Fernando Henrique, vendeu 36% das ações da Petrobras para firmas norte-americanas e foram vender em Nova Iorque. Seu Registro e seu Gró. Foi em Nova Iorque vender, pela balança das aulas, na bolsa de Nova Iorque, 36% das ações brasileiras. Nós estamos com uma diferença muito pequena. O Brasil E a gente é que diz isso para o povo. Nós é que dizemos isso para o povo. Procuramos dizer. E dizemos como? Através dos nossos meios de comunicação. Nós montamos, porque nós estamos lutando agora que mudou o governo. Mudou o governo. Mas eu estou com quase 100 anos. Então, eu tenho a seguinte posição. Mantenho a esperança, mas cada vez mais preocupado, cada vez mais preocupado pela inação e pela linguagem das autoridades cada vez mais confusa, que eu não sei se eu estou vendo um replay de Pedro Malan ou quem é esse Palocci. Eu não estou vendo quem é o presidente do Banco Central, que é o presidente do Citibank. O presidente do Banco do Brasil é o presidente do Imbócio, do Banco do Imbócio. Foi buscado lá. Se quiser cortar, corte tudo.
01:43:18 P/1 - Bom, então, Heitor, para a gente ir finalizando, como é que é um dia seu hoje?
01:43:24 R - Bem, o dia meu hoje, eu concentro minha atividade em duas entidades. Uma, velhinha. tem cento e tantos anos de idade, chamada Clube de Engenharia, do qual eu sou do conselho diretor já há mais de 12 anos. E lá eu participo discutindo os problemas nacionais, problemas da engenharia brasileira, etc. E outro, na minha Associação dos Engenhos da Petrobrás, que eu sou diretor. E na Associação dos Engenhos da Petrobrás, cujo objetivo eu já disse aqui anteriormente, nós temos somente uma arma, que é a comunicação. E como nós fazemos essa comunicação? Nós fazemos através dos veículos de comunicação. Nós temos um programa de rádio, na TV Conabara, de segunda a sexta-feira, de sete e meia da manhã, às nove horas, cujo âncora, como chamam, é o jornalista e economista Paulo Passarinho, e o outro é Milton Temer, um grande deputado, que não quis ser eleger agora, é um dos nossos âncoras nesse programa. Nós temos um informativo, quem trabalha com papel sabe a três que é dobrada, que nós mandamos para 40 mil endereços. Todos os petroleiros, que nós conseguimos, quando conseguimos todos os petroleiros, e várias entidades civis e personalidade que pedem. Nós temos um informativo eletrônico, que nós chamamos de iPad Direto, que vai para 15 mil endereços atualmente, e o nosso objetivo é chegar no fim do ano a 100 mil endereços. E nós temos que a nossa maior satisfação, que ninguém conseguiu no Brasil, nós montamos uma rede alternativa de televisão. Nós descobrimos que tem TV comunitária. Nós fazemos um convênio com ela. Hoje nós passamos com nossos filmes em 42 cidades no Brasil. Só em São Paulo são 28. e fazemos quatro programas por mês de debates. Nesse mês está passando uma entrevista com o general Nery. Nós fazemos, já divulgamos nessa cidade, uma entrevista com o embaixador, hoje vice-ministro do exterior, Samuel Benjamin Maestro. Nós fizemos uma entrevista com o embaixador do Brasil em Londres, Bustane, quando os americanos botaram ele para fora da Alpac, Passou para aqui, vem cá. Passamos nessas 42 cidades. Fazemos regularmente, há mais de um ano, quatro programas por mês. Tudo por nossa custa. São os meios de comunicação que nós temos. E palestras. Por exemplo, amanhã mesmo o nosso presidente vai para Caratilha, uma cidade que tem umas faculdades lá em Minas Gerais, e vai lá fazer palestra.
01:46:42 P/1 - Então, para finalizar, o que você acha desse projeto de memória dos trabalhadores da Petrobras? O que achou de dar o seu depoimento?
01:46:51 R - Olha, eu acho um projeto que me parece positivo, porque o que me preocupa no Brasil, na sociedade brasileira, é a desmemorização. Ninguém tem memória aqui. Ninguém tem memória. Então, você montar uma memória para a Petrobras, que é a empresa mais importante que o Brasil já teve e que tem, eu acho fundamental a importância para a consolidação da nossa sociedade brasileira. Eu acho importantíssimo. Qualquer que seja o resultado dessa operação, eu já me considero satisfeito. porque o que é preciso é a memória do Brasil, tem que ser cultivada. Você imagina, destrói as coisas com a maior tranquilidade. Destruíram aquele monge, aquela coisa lá que tinha no Rio Branco, mutaram aquele obelisco. Mas que coisa! As fotografias que eu vi do monge, que fizeram a exposição aí no Ipanema, no Ceaúna, coisas fantásticas, aqueles vitrais, aquelas coisas. Vai tudo para o lixo. O lixo. Então, a memória é importante em qualquer sociedade. E nós precisamos aprender a cultivar a nossa memória. Eu acho importante esse projeto.
01:48:13 P/1 - E o que achou de dar um depoimento para esse projeto?
01:48:18 R - Olha, aí eu não sei, né? Porque quem vai achar é vocês que me arguiram e que vão ver esse negócio. Talvez seja bom. Hoje eu não estou mais com medo, não. Em 70 não dava. Você imagina que eu não ia a minha terra durante todo o regime militar? Porque lá tinha uma pessoa perigosa e se eu fosse, eu totalmente ia preso, porque eles diriam que eu ia subverter com o D. Helder o regime militar. Esse cara criou coisas impressionantes. Então, o problema é o seguinte, eu acho que é muito importante, eu não sei, talvez tenha sido útil, eu não sei se é útil, porque o meu depoimento possivelmente vai ter uma conotação diferente de outros depoimentos, porque o meu depoimento tem um viés político talvez mais acelerado do que outros depoimentos, porque eu acho, eu olho o problema dessa natureza. Eu tomei a minha posição no Brasil. Hoje, hoje, no dia de hoje, tenho grande preocupação pelos meus netos, porque, para mim, eu não vou mais ser soldado, eu não vou ser mais nada. Ou seja, eu já estou com 77 anos e meio, não tem problema. Os meus netos me preocupam, porque eu estou muito com o agravamento da situação, na mão de um louco, um louco, um poderio que tem esse louco. vai tocar fogo no mundo, está me preocupando muito, muito. Porque... Acabou, não acabou? Então eu vou ficar calado.
01:50:04 P/1 - Qual é o seu time de futebol?
01:50:06 R - Eu não tenho time de futebol. Eu, quando era jovezinho, pequenininho, meu pai, na minha cidade, era sócio de um clube chamado Clube Inalto Capibaribe. Naquela época, a semelhança do Fluminense era um clube racista. Não entrava nem preto para jogar, nem para ser sócio. Eu era considerado preto. Meu pai era branco, que era filho de português, mas eu era preto. Eu entrei depois que saí da escola de engenharia, entrei no clube. E tem outro clube que já acabou, que também é da elite pernambucana, que era uma das mais apodrecidas do Brasil, a elite pernambucana, que se chamava Internacional, que já acabou. Não entrava. Meu pai era sócio, mas eu não podia ser sócio porque era preto. Aí eu entrei na Petrobras, passei a ser engenheiro da Petrobras, autoridade. Quando eu cheguei no Recife, as portas se abriram. Fiz o maior carnaval do internacional, levei uma dúzia de cafas de uísque, levei meus amigos também para o carnaval. Para eles não tem mais problema. É como Pelé hoje. Pelé hoje é louro de olhos azuis, porque a canta bancária dele é muito grande. Existe no Brasil mais uma diferença em torno da posição do bancário do que da cor dos caras. No meio dos pobres não tem esse negócio. no meio dos povos não tem. Aliás, no Brasil, você vê uma japonesa com pretinho passeando na Avenida Rio Branco, vê um alemão com uma mulata, todo entusiasmado, não tem. No Brasil não tem esse negócio. Tem, tem discriminação, mas não tem racismo. É diferente de discriminação de racismo. Vocês é que me provocaram.
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