Vou contar só um pouquinho, por que eu escolhi o primeiro salário. Como minha família teve muita dificuldade, principalmente quando eu era criança, eu não tive infância na verdade, porque de criança trabalhei na casa da vizinha porque eu não conhecia minha mãe, conheci minha mãe a partir dos 18 anos e hoje eu ainda não conheço meu pai e fiquei com a minha avó, mas a minha avó eu só a via à noite, eu já tava dormindo e durante o dia eu ficava na casa das vizinhas fazendo as coisas para poder comer e às vezes essas vizinhas saíam e eu passava o dia catando comida das árvores, às vezes as minhas colegas faziam as brincadeiras e eu aproveitava, via que tinha comida e ficava ali com elas. Comecei a estudar com sete anos, eu era doida para estudar, eu queria estudar e nada, ninguém me levava, eu fui no colégio, tudinho, mas a diretora dizia que eu só podia estudar se os pais fossem lá me matricular. Só que eu não via a minha avó, então eu era praticamente solta, na rua, mas não na rua literalmente, eu ficava nas casas trabalhando, carregando água porque lá onde eu moro, eu moro no Jordão, tinha muita ladeira, então subia e descia ladeira, então se eu enchesse um tonel eu ganhava cinqüenta centavos, e seu enchesse uma caixa eu ganhava um e cinqüenta, então era aquele esforço tudinho para poder comer depois e aí foi quando uma mãe de uma colega minha - eu estava numa barraquinha - ela fez assim: "Olha, essa que é Andreza, minha colega”. Disse: "É, você estuda onde?" Eu disse: “Eu não estudo...” “Você não estuda?" Foi quando peguei uma certa amizade com essa menina, comecei a estudar, foi uma alegria, né, eu estudando, eitá, com aquela sainha assim, bonitinha, era todo dia assim... Aí: "que horário você quer?". “Eu quero de manhã cedinho.” De manhã cedinho eu já estava no colégio. Meio-dia eu largava mas passava o dia todinho no colégio, eu ficava com a merendeira lá, ajudava a merendeira. Depois, essa...
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Vou contar só um pouquinho, por que eu escolhi o primeiro salário. Como minha família teve muita dificuldade, principalmente quando eu era criança, eu não tive infância na verdade, porque de criança trabalhei na casa da vizinha porque eu não conhecia minha mãe, conheci minha mãe a partir dos 18 anos e hoje eu ainda não conheço meu pai e fiquei com a minha avó, mas a minha avó eu só a via à noite, eu já tava dormindo e durante o dia eu ficava na casa das vizinhas fazendo as coisas para poder comer e às vezes essas vizinhas saíam e eu passava o dia catando comida das árvores, às vezes as minhas colegas faziam as brincadeiras e eu aproveitava, via que tinha comida e ficava ali com elas. Comecei a estudar com sete anos, eu era doida para estudar, eu queria estudar e nada, ninguém me levava, eu fui no colégio, tudinho, mas a diretora dizia que eu só podia estudar se os pais fossem lá me matricular. Só que eu não via a minha avó, então eu era praticamente solta, na rua, mas não na rua literalmente, eu ficava nas casas trabalhando, carregando água porque lá onde eu moro, eu moro no Jordão, tinha muita ladeira, então subia e descia ladeira, então se eu enchesse um tonel eu ganhava cinqüenta centavos, e seu enchesse uma caixa eu ganhava um e cinqüenta, então era aquele esforço tudinho para poder comer depois e aí foi quando uma mãe de uma colega minha - eu estava numa barraquinha - ela fez assim: "Olha, essa que é Andreza, minha colega”. Disse: "É, você estuda onde?" Eu disse: “Eu não estudo...” “Você não estuda?" Foi quando peguei uma certa amizade com essa menina, comecei a estudar, foi uma alegria, né, eu estudando, eitá, com aquela sainha assim, bonitinha, era todo dia assim... Aí: "que horário você quer?". “Eu quero de manhã cedinho.” De manhã cedinho eu já estava no colégio. Meio-dia eu largava mas passava o dia todinho no colégio, eu ficava com a merendeira lá, ajudava a merendeira. Depois, essa mesma menina, alguns anos depois, ela: "Olha, eu estou na ONG e lá é bom, não sei o quê...”. E eu: “Ah, sei lá, estou com minha tia agora, vim morar aqui no centro da cidade, estou com a minha tia, eu acho que não vou não”. Ela me incentivou tanto: “Então eu vou, eu vou”. E aí foi a Casa Menina Mulher, eu fui parar lá, foi quando eu vi as meninas com a farda, tudinho, que na época, assim que eu entrei na Casa eu fiquei fazendo parte da aula de dança, no caso. Eu fiquei dançando, tudinho, teve eventos, não sei o que, aí eu apareci na televisão a primeira vez: "Eu te vi na televisão, não sei o quê...”. Que eu estava dançando, afoxé, lá dançando e eu disse: “Pronto, agora... Dancei mesmo”. Depois, fui crescendo, fui para a Casa Menina Mulher quando já estava com quinze anos já, aí pronto. Com dois anos depois entrei no curso básico, foi havendo algumas mudanças e depois eu me aproximei mais da minha avó, que não via muito a minha avó, conheci minha tia, depois conheci a outra tia, finalmente comecei a conhecer a minha família, porque antes eu não conhecia, eu era muito na rua, pronto. Passei por muitas pessoas viciadas mesmo, já me chamaram para roubar, já me ofereceram loló, já me ofereceram tudo, tudo, tudo, tudo, mesmo que eu não tive nenhuma educação na minha família, mas eu acho que foi Deus mesmo que não fez eu ir para esse meio, para o meio das drogas. Acho que foi de mim mesma, acho que não me influenciou nada, ninguém por mais que dissesse: "roubar é bom, olha loló é muito bom, fumar é ótimo. “Essas eram as conversas, essas eram as amizades que eu tinha, mas nenhuma fez com que eu mexesse, que eu usasse isso. Eu via e sabia que aquilo não era para mim, via muitas meninas espancadas, sabe, é uma violência total mesmo, eu vendo aquilo, eu disse: eu não vou, eu não quero isso para mim. Pronto, aí foi quando finalmente fiquei na Casa Menina Mulher, quando eu entrei no Projeto Criando Arte, assim que eu entrei, eu não tinha noção, eu disse: “vou ver se é isso que eu quero, né, aí eu fui visitar o salão, tudinho, tinha lá todo mundo pintando, tudinho eu disse: “ah, como eu gostava, eu sempre gostei de desenhar de pequenininha”. Aí de repente assim, você passou, você agora está no projeto, porque antes era só uma criação, só um tempozinho, um local para eu não ficar na rua, tudinho, assim encontrei outras amizades também. Foi quando um dia, na época era o professor Roma, ele disse: "ó, o seu pagamento”. “Pagamento?” Depois veio aquela consciência: eu tô no projeto, sabe, porque eu era tão "voada", toda lerda mesmo, eu fiquei muito alegre mesmo. Daí foi que, eu era muito rebelde também, por não ter nenhuma educação familiar, e conhecendo outras coisas, o mundo está me ensinando e eu fiquei um pouco rebelde, teve uma certa época que eu fiquei rebeldezinha, mas depois que eu fui vendo a realidade eu fui mudando, percebi que eu estava mudando e que a minha mudança estava sendo muito gratificante e as pessoas estavam me reconhecendo. Quanto mais você percebe que o que você está fazendo está agradando, está automaticamente lhe ajudando, isso fortalece muito. Depois eu tive uma filha, com dezoito anos eu tive uma filha, agora ela está com 1 ano e 9 meses, pronto, e agora estou na minha casa, minha filha fica com a minha avó e de noite eu pego ela, pronto, eu estou morando sozinha com a minha filha. É isso.
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