Projeto Memórias de Serra Pelada
Entrevista de Ivonete Maria de Araújo
Entrevistado por Lucas Torigoe (P/1) e Daiane Silva (P/2)
Serra Pelada, Pará, 08 de agosto de 2024
Código da entrevista: MSP_HV019
Transcrito por Bruna Piera
Revisado por Nataniel Torres
P/1 - Vou começar então, dona Baixinha, uma pergunta bem difícil para a gente começar, qual é seu nome completo? Em que cidade a senhora nasceu? Que dia a senhora nasceu, por favor?
R - Meu nome completo é Ivonete Maria de Araújo, nasci em 15/05/1967,e foi em Viçosa do Ceará.
P/1 - E contaram para senhora quando a senhora nasceu, como é que foi?
R - Não, não contaram.
P/1 - Mas foi de parteira?
R - Foi, de parteira, parto normal.
P/1 - E foi tranquilo?
R - Foi, foi tranquilo sim, foi.
P/1 - Me conta uma coisa, como é a família da sua mãe? Quantos são? Você conheceu?
R - É tudo do Ceará, para dentro de Viçosa, mas não lembro assim, ainda conheci uma tia minha, uma tia e um tio, que estavam no Maranhão, e eu conheci esses dois tios, lá da minha mãe.
P/1 - E avô, avó?
R - Não, não lembro nem de avó, nem do meu avô, não lembro. A gente veio embora do Ceará com 5 anos, eu tinha 5 anos, a gente veio embora com a família, meu pai ... A gente veio embora para o Maranhão, né? Estava difícil lá, não sei, sei que levaram a gente para o Maranhão, eu vim de lá com 5 anos de idade.
P/1 - E a família do seu pai você conhece mais, então?
R - Não, meu pai também de lá, não conheço a família do meu pai, não cheguei, assim.... Eu lembro que tinha todo mundo, uns tios, eu ainda tenho uns tios lá ainda, mas não tenho conhecimento, sabe?
P/1 - E vocês foram para qual cidade do Maranhão?
R - Nós fomos para uma vila por nome de “Vila Bandeirante”, próxima ao Bom Jardim, ao São João do Caru, foi ali, no Maranhão.
P/1 - Por que vocês foram para essa vila?
R - Porque a vida lá no Ceará estava muito difícil, tempo de seca, e aí tinha um tio...
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Entrevista de Ivonete Maria de Araújo
Entrevistado por Lucas Torigoe (P/1) e Daiane Silva (P/2)
Serra Pelada, Pará, 08 de agosto de 2024
Código da entrevista: MSP_HV019
Transcrito por Bruna Piera
Revisado por Nataniel Torres
P/1 - Vou começar então, dona Baixinha, uma pergunta bem difícil para a gente começar, qual é seu nome completo? Em que cidade a senhora nasceu? Que dia a senhora nasceu, por favor?
R - Meu nome completo é Ivonete Maria de Araújo, nasci em 15/05/1967,e foi em Viçosa do Ceará.
P/1 - E contaram para senhora quando a senhora nasceu, como é que foi?
R - Não, não contaram.
P/1 - Mas foi de parteira?
R - Foi, de parteira, parto normal.
P/1 - E foi tranquilo?
R - Foi, foi tranquilo sim, foi.
P/1 - Me conta uma coisa, como é a família da sua mãe? Quantos são? Você conheceu?
R - É tudo do Ceará, para dentro de Viçosa, mas não lembro assim, ainda conheci uma tia minha, uma tia e um tio, que estavam no Maranhão, e eu conheci esses dois tios, lá da minha mãe.
P/1 - E avô, avó?
R - Não, não lembro nem de avó, nem do meu avô, não lembro. A gente veio embora do Ceará com 5 anos, eu tinha 5 anos, a gente veio embora com a família, meu pai ... A gente veio embora para o Maranhão, né? Estava difícil lá, não sei, sei que levaram a gente para o Maranhão, eu vim de lá com 5 anos de idade.
P/1 - E a família do seu pai você conhece mais, então?
R - Não, meu pai também de lá, não conheço a família do meu pai, não cheguei, assim.... Eu lembro que tinha todo mundo, uns tios, eu ainda tenho uns tios lá ainda, mas não tenho conhecimento, sabe?
P/1 - E vocês foram para qual cidade do Maranhão?
R - Nós fomos para uma vila por nome de “Vila Bandeirante”, próxima ao Bom Jardim, ao São João do Caru, foi ali, no Maranhão.
P/1 - Por que vocês foram para essa vila?
R - Porque a vida lá no Ceará estava muito difícil, tempo de seca, e aí tinha um tio lá, que é o esposo dessa tia, irmã da minha mãe, Tio Abidon, levou meu pai para trabalhar lá, trabalhar, e foi lá e construiu uma casinha, uma roça, e todo ano, todo ano, e a gente se criou lá, na Vila Bandeirantes.
P/1 - Você ficou até que idade lá?
R - Eu fiquei até com 25 anos...
P/1 - Bastante tempo...
R - Muito tempo, foi.
P/1 - Me fala então qual é o nome completo do seu pai?
R - Nelson José dos Santos.
P/1 - E como que ele era? Ele está vivo?
R - Não, mas era uma pessoa muito, muito especial na vila, todo mundo, respeitado por todo mundo, uma pessoa honesta, generosa, deixou um legado assim, sabe? Os filhos todos, a família toda, até hoje, todo mundo se referencia a ele, sabe? Uma pessoa muito especial, muito temente a Deus, um pai que nunca bateu nos filhos, nós somos 10 irmãos, nunca bateu em nenhum, só ensinando, né? Por onde é o caminho certinho, falando boas maneiras, e dando conselho.
P/1 - E a sua mãe, como era o nome dela?
R - Maria do Carmo de Araújo.
P/1 - Como ela era?
R - Uma mãe muito protetora, muito boa também, sabe? Muito, muito especial, criou a nós todinhos sem... Nos tornamos todos, graças a Deus, todos filhos bons, todos boas mulheres e bons homens, de verdade, sabe? Graças a Deus.
P/1 - Você sabe como é que eles se conheceram?
R - Não, não sei.
P/1 - Não dá para chutar, não?
R - Não, assim, nunca vi eles falando, acredita? A gente parece que não, sei lá como que é, nunca procurou, nunca, não sei.
P/1 - A gente está nessa fase da vida, falando de quando você era pequena, a senhora consegue puxar assim, qual que é das primeiras lembranças que a senhora tem da sua vida?
R - Só a convivência mesmo entre os irmãos, sabe? Eu lembro que meu pai era uma pessoa muito farta, né? Um cearense que fazia, tipo assim, criava porco, matava só para nós comermos, fazia farinha só para guardar dentro de casa aquele saco de farinha, sabe? Plantava bananal só para nós, sabe? Então, a gente lembra muita fartura dentro de casa, meu pai, naquela época não tinha mesa, meu pai fazia umas esteiras de olho de palha e colocava no chão, ainda hoje eu tenho lembrança disso, que era tão boa aquela esteira no chão. Minha mãe botava as panelas, né? E todo mundo sentava, e aí ela colocava o prato de cada um, ai como eu lembro daquilo, deu saudade acredita? Aquela esteira era tão friazinha, sabe? Chega era gelado, colocava lá, faz de conta que era uma mesa que colocava, toda vez que ia comer, colocava no chão, e todo mundo ali, almoçava, jantava, sabe? Era muito bom.
P/1 - Você lembra da viagem?
R - Lembro, esse daí eu lembro, acredita? Eu lembro que a gente veio em um trem, que o nome era Maria fumaça, eu ficava assim: “Meu Deus, que Maria fumaça”. E aí, quando chegou em um certo, no caminho aí que parou o trem, né? Foi um primo meu nos buscar, eu lembro que ele me amarrou em cima de um animal, as minhas pernas para eu não cair, então eu vim toda amarrada de corda, eu tinha 5 anos na época, e meus irmãos também, todo mundo veio montado, para chegar nessa Vila Bandeirante, o transporte, veio todo mundo de cavalo.
P/1 - Você em cima do animal?
R - Erra, as pernas amarradas aqui para não cair de cima do animal, eu lembro que eu cheguei toda marcada de corda, as cordas na perna amarrada.
P/1 - Mas não tinha espaço para todo mundo para ir sentado ou?
R - Não, no animal, que eu vinha em cima, montada naquele cavalo, né? Em uma cela, aí tinha que, aí, eu lembro que tinha um negócio de um Jacá, né? Que colocava menino dentro assim, e um montado no meio, e os outros aqui ao redor desse Jaca.
P/1 - O que é o Jacá?
R - É feito de taboca, não tem do mato? Eles constroem, e põe no animal que carrega carga, põe um de um lado e outro do outro, na verdade não é cela, é cangalha que chama, cangalha.
P/1 - E era coberto esse trem?
R - Não, descoberto mesmo, né?
P/1 - Por isso você poderia cair lá embaixo?
R - Era, tinha que agarrar, se não poderia cair.
P/1 - E foi você e seus 10 irmãos, sua mãe e seu pai?
R - Sim, e esse meu primo que trouxe a gente.
P/1 - E você achou muito diferente quando você chegou?
R - Não lembro mais, acredita? A gente ficou um tempo na casa do meu tio, muita gente na casa. Depois meu pai construiu uma casinha de palha, coberta de palha e fez um quarto de palha também, com a corda de palha, e a gente se mudou tudo para lá. Aí depois foi fazendo, devagarinho, aí construiu uma casinha de barro, né? Aquelas casinhas de palha e barro.
P/1 - E como é que era vida nessa vila, o que vocês faziam?
R - Meu pai só colocava roça mesmo, só era roça, plantava arroz, feijão, essas coisas. E a gente estudava, meu pai colocou a gente para estudar, a gente estudava por aí assim, e foi assim.
P/1 - E me conta uma coisa, como é que era o dia a dia de vocês? Vocês acordavam que horas? Vocês faziam o quê?
R - Acordava todo mundo cedo, e ficava por ali mesmo cuidando de casa, minha mãe fazia o café, e ficava todo mundo ali, aí depois foi indo, os irmãos foram indo embora. Foi uns 3 para o Rio de Janeiro, né? Foram uns para o Piauí, aí ficou pouca gente em casa, os mais novos, os grandes depois foram embora, todinhos.
P/1 - A sua mãe ficava na roça ou não?
R - Não, ficava em casa mesmo, aí quando, depois que eu cresci, nós íamos deixar comida para o meu pai na roça, longe, colocava a comida na cabeça, e ia deixar lá.
P/1 - Como é que era isso?
R - Bom, tudo era bom, na estrada tinha umas águas assim, quando o papai vinha tomava banho, era bom, eu gostava.
P/1 - E me conta uma coisa, vocês tinham energia?
R - Nada, não tinha energia, não tinha geladeira, não tinha cama, não tinha nada não... O quarto, meu pai fazia, o povo cearense tem uma mania de fazer quarto para os filhos, é todo mundo dentro do quarto, sabe? Os homens não, os homens dormiam para outro lado, mas as filhas mulheres, era tudo em um quarto, com um monte de rede armada, e ele ficava bem na porta, botava a rede bem na porta, e todos para trás, os outros. Não fazia os quartos com janela, janela um coisa assim, sabe? E era assim, era bom, a gente achava que a vida era daquele jeito e pronto, então... Meu pai não nos deixava sair, não deixava dormir na casa de ninguém, não deixava ir para lugar nenhum, só dentro de casa mesmo, sabe? Mas a gente vivia muito feliz, porque não era um homem agressivo, era um homem que dava conselho, era um homem que sabia criar os filhos, sabe? Foi muito boa a nossa criação.
P/1 - Vocês brincavam?
R - Sim, brincávamos, de noite vinha umas crianças lá para casa, e a gente brincava muito, Tinha uma areia, era muito bom, brincava sim.
P/1 - Brincavam de que?
R - De roda, de jogar pedra, era umas coisas, umas brincadeiras assim, que ficar na porta de casa mesmo, não saiamos para longe não.
P/1 - Mas aí nessa idade vocês não conheciam crianças de outras casas?
R - Conhecíamos, vinham as pessoas, muitos vizinhos, lá em casa era uma casa muito visitada, muito, sabe? Sempre teve muita amizade meu pai, muito amigo principalmente, sempre tinha muita gente por lá. E eu lembro também que ele gostava de mandar eu ler romance, né? E aí juntava, e não era na energia não, era lamparina aqui, e lendo os romances. Ele dizia que eu lia bem, e eu gostava de ler, sempre gostei, e eu li muito romance para esse povo, arrumava uns romances “é para ler esse aqui hoje”. Aí juntava um monte de gente, as vezes debulhando o feijão, as vezes debulhando milho, né?
P/1 - O que você lia nessa época?
R - O que que eu lia? História de cordel? Esses romances, essas histórias, era aquele livro, uns livrinhos que contam história desse povo de cangaceiro, história de amor, um monte de história bonita, bonitas as histórias, sabe? Li muito romance, muito mesmo.
P/1 - Rimava?
R - Rimava sim, li muito, nossa, como eu li, toda noite, dois, três que eu lia, que eu lia rápido, né? Parece que meu pai dizia, parece que eu já sabia da história.
P/1 - Você lia em voz alta?
R - Era, em voz alta.
P/1 - Para o povo ouvir?
R - Sim, estava todo mundo assim, sentadinho, e eu sentadinha na cadeira com uma lamparina aqui.
P/1 - Você por acaso lembra de alguma coisa de alguma dessa época ou está muito longe?
R - Do romance? Eu lembro de um que nome era assim, “os olhos de dois amantes por cima de uma sepultura” Eu lembro demais desse, sabe?
P/1 - Por quê?
R - Era porque eles estavam chorando a morte da pessoa que tinha morrido, sabe? Lá enterrado, e aí nem era, nem tinha morrido, era ele, era a pessoa que estava ali chorando, um chorando pelo outro, e eles achavam que estava morto, ou um ou o outro, era uma história assim, sabe? Não sei explicar.
P/1 - E além de contar...
R - João Grilo, aquele negócio, história do João Grilo, umas história assim....
P/1 - Lampião?
R - Lampião, todas essas histórias.
P/1 - E além de você contar essas histórias, por acaso você ouvia histórias dos mais velhos também? Ou não?
R - Não, não lembro da história, não. Aí nós íamos para igreja católica, aí depois eu me tornei muito frequente da igreja, né? E eu ensinava catecismo para as crianças, sabe, as crianças amavam, nossa, aí eu fiquei, dia de domingo ensinava, eu ia sempre para igreja, sempre eu ia com uma senhora que ainda hoje está lá na Vila Bandeirante, e nós frequentávamos muito essa igreja, muito, muito catecismo com essas crianças lá.
P/1 - Então a senhora estudou, aprendeu a ler e escrever?
R - Sim, estudei a quarta série umas 4 vezes lá, naquele interior, estudei sim.
P/1 - Mas como era a escola lá?
R - Boa, era boa, eu gostava da escola, sabe? Era boa sim. Aí eu, teve uma época que nessas políticas, o pessoal me colocava até para ser professora leiga, no interior lá, e eu ia, era longe, e eu ia sozinha, não tinha perigo naquele tempo, aí ensinava uns meninos lá.
P/1 - A ler também?
R - Sim, ensinava a ler, era.
P/1 - E a senhora gostava?
R - Gostava, gostava sim.
P/1 - Teve alguma professora, professor, ou aluno que a senhora lembra assim mais?
R - Que foram meus professores?
P/1 - É, ou aluno também.
R - Eu lembro dos meninos que eu ensinava lá, lembro sim, uns rapazinhos, que eu ficava na casa do pessoal lá, eu lembro todas essas coisas assim, mas eu não lembro muito das minhas professoras, sabe? Que me ensinava, eu não lembro.
P/1 - Mas dos meninos alguns você lembra?
R - Lembro, lembro dos meninos.
P/1 - Algum em especial?
R - Tinha, tinha um rapazinho que o nome dele era Francinaldo, a irmã dele, eu lembro que ela uma vez fez um chocolate quente, eu nunca tinha tomado chocolate quente, sabe? Mas ainda hoje eu lembro do chocolate quente, eu nunca consegui mais tomar um chocolate igual aquele, no interior, muito de dentro assim, ela fez um chocolate, me convidou, a Selma, era um pessoal lá que eram irmãos, né? E me convidaram, eu ainda hoje lembro disso.
P/1 - Como é que estava? Estava gostoso?
R - Muito, o chocolate bom, nunca vi, estou te falando que eu nunca consegui mais achar um chocolate daquele, nunca mais...
P/1 - Por falar em comida e bebida, o que vocês comiam, o que a mãe da senhora fazia?
R - Pois é, meu pai, igual eu falei, era um homem muito farto, né? Matava porco só para nós comer, e minha mãe, minha mãe fazia. Os cearenses daquele época, é caldo, né? Então, é assim, não tinha fritura não, é caldo, é feijão, arroz, e carne de caldo, e a gente gostava, daquele jeito era bom demais, sabe? Era muito bom.
P/1 - E vocês ouviam música, tinham rádio?
R - Rádio, meu pai era viciado lá no radinho, ficava caçando sinal assim com o radinho, tinha um grande também assim, ele gostava mais do radinho, colocava assim e ficava ouvindo “A voz do Brasil” naquela época, o jornal, né? Hoje chama jornal, “A voz do Brasil”, era viciado mesmo.
P/1 - E vocês não podiam ouvir não?
R - Aí, sim ouvia, tinha um dentro de casa que a gente também ouvia, ouvia, na época era Márcia Ferreira, Delson Moura. Eu ia para a roça e vinha correndo para poder ouvir a novela, assistir, ouvir a novela, né? Na verdade, a novela, a tia Leninha, tinha o programa da Tia Leninha que são as novelas, eita que eu vinha ligeiro para ouvir, para não perder a hora, sabe? Dessa novela no rádio.
P/1 - A novela de que? Que história que era?
R - De historinha, essas histórias, eu aprendi até do “lobo mau”, entende? Daquela “chapeuzinho vermelho”, “os três porquinhos”, eles contavam muitas histórias bonitas e eu aprendi as histórias, e hoje eu conto para o meu neto, contei para os meus filhos, sabe? E eu conto, meu neto adoro quando eu conto as histórias que eu aprendi no rádio, no programa da tia Leninha.
P/1 - Era uma locutora que ela falava?
R - Tia Leninha era, era... Ela era locutora, sempre ensinava as brincadeirinhas, esse programa era de criança, sabe? “Hoje é o programa da tia Leninha.” Eu lembro, era muito bom, e a gente fica naquela coisa de chegar para ouvir aquilo, né? É uma diversão.
P/1 - De música o que tocava na sua casa?
R - Tocava música lá diretão, um monte de música nas rádios, o pessoal pedia, aí tinha muita música.
P/1 - Me conta uma coisa, você começou a ir na igreja muito cedo?
R - Foi, foi muito cedo. Aí meu pai deixava eu ir com a senhorinha lá, ela, não tinha energia na época, ela colocava a lamparina na cabeça, e a gente ia, e não apagava, era engraçado, ela caminhava ligeiro, e a lamparina ia aqui, com o querosene dentro, né? A lamparina, e a gente ia para igreja, voltava e ela com essa lamparina na cabeça. Foi um tempo bom da igreja, tinha as missas, todo mês tinha uma missa.
P/1 - Vocês andavam como para casa, era a pé?
R - Era a pé, era perto, não era longe, a minha casa, da minha para a igreja, era perto, mas eu ia todo dia, bem frequente mesmo. Aí eu fiquei ensinando os catecismos, aí quando eu vim embora, os menininhos ficaram com muita saudade, e eu voltei lá, depois no lugar, e eu recebi tanto bilhetinho que os menininhos pedindo para voltar, os rapazinhos, as mocinhas, para voltar, eu chorei tanto, fui ler esses papeizinhos, quase morro de chorar, com a história deles, sabe?
P/1 - E você, me conta uma coisa, você sentia uma fé mesmo ou ia porque era obrigada?
R - Não, a fé, nossa, sim, com certeza.
P/1 - Quando começou?
R - Eu tinha uns 13 anos quando eu comecei a ir para a igreja.
P/1 - 13?
R - 13, 13, por aí. Aí era bom, eu cantava, eu era levita, ficava na frente, eu nunca fui de ler na igreja, eu tinha muito nervoso, agora de cantar eu cantava muito hino na igreja.
P/1 - Posso te pedir para cantar um hino?
R - Pode, dessa época?
P/1 - Se a senhora lembrar...
R - Sim, não sei se eu sei todo, mas eu sei... “Maria de Nazaré, Maria me cativou, fez mais forte a minha fé, e por filho me adotou. Às vezes eu paro e fico a pensar, e sem perceber me vejo a rezar...” Eu não sei mais, só sei até aqui.
P/1 - Engraçado, eu tocava essas músicas na igreja
R - É? É bom...
P/1 - É bom, né?
R - É, hoje eu sou evangélica, não sou mais católica, é? Mas era bom também.
P/1 - A senhora lembra algum por acaso, são tão bonitos essas aí?
R - Eu sabia tudo decorado, depois não decorei mais, meu Deus do céu, hoje eu canto nos grupos de, eu moro aqui, mas eu canto nos grupos de oração que tem... Eu só canto olhando para o papel, não sei mais nada decorado homem.
P/1 - Não tem problema não...
R - Deixa eu ver se eu lembro, se eu lembro... Não lembro, queria cantar, eu gosto de cantar, sabia?
P/1 - Ah é?
R - Gosto, adoro...
P/1 - Canta o que mais?
R - Eu canto esses louvores mesmo, gosto de cantar por aí, eu gravo muito vídeo cantando por aqui...
P/1 - Quando nós chegarmos na parte da senhora evangélica a gente volta a cantar, pode ser?
R - Pode, está bom
P/1 - Então vamos, continuando então Baixinha, essa época que a senhora estava na igreja, a senhora pensava, queria alguma coisa, uma profissão?
R - Não, a gente não pensa não, sabia? Não sei se hoje é assim as pessoas, mas naquele tempo não pensava não, só que a vida era aquela ali, só viver ali, né? Casei com 15 anos, 16 anos, por aí, casei, a gente achava que a vida era aquela dali. [intervenção]
P/1 - A senhora estava falando que casou com 15, 16 anos, né? Como é que foi isso, seu pai que mediou? O cara foi lá na sua casa?
R - Foi, foi, ficamos um tempo namorando, né? E depois a gente casou, pediu para o meu pai em casamento, nós casamos na igreja católica.
P/1 -Você conheceu esse... Qual é o nome do seu marido?
R - É João do Nascimento.
P/1 - Você conheceu como? A senhora conheceu como?
R - Lá na nessa igreja, ia para igreja, parente dessa senhorinha que eu ia com ela, e...
P/1 - E como ele era?
R - Acho que eu não quero falar, não...
P/1 - Me conta uma coisa, tinha festa tradicional?
R - Tinha, tinha sim, a gente, eu ia em algumas, minha mãe ia com a gente, sabe? Minha mãe ia, mas quando meu pai pedia para a gente não ir tal, a gente não ia também não, sabe? Na igreja, tinha uma, tinha uma que eles faziam que chamava o nome de vesperal, o nome de umas festinhas de dia de domingo, aí meu pai... “ Pai, eu vou ali para igreja...” Ele dizia bem assim: “Vai para igreja, mas você não vai lá naquele lugar”. E eu não ia não, passava nem... Sabe? Nem ia lá
P/1 - Mas aí o que tocava no vesperal? O que era isso?
R - Aí era umas músicas lá, um monte de música lá, eu lembro de nenhuma... “Quero você, quero você...” Eu lembro que essa música tocava... “Quero você todinha para mim...” Nossa, como tocava essa música lá.
P/1 - Era um forró?
R - Não sei não, acho que é.
P/1 - E a senhora se casou, e teve filho?
R - Tive, tive um filho desse casamento. Eu vivi 6 anos, aí ele foi para garimpo, durou uns 5... Passava um ano, dois no garimpo, aí não deu certo não, eu vim embora para o Pará, aí meu filho, trouxe o meu filho, né? Criei meu filho com esse daqui, e hoje meu filho é um engenheiro agrônomo, é formado, mora em Paraíso no Tocantins, e isso.
P/1 - E como é que foi o nascimento do seu filho?
R - Difícil demais, naquele interior, meu Deus do céu, aí, primeiro filho, né? E tinha umas parteiras lá, mas eu não dei conta, aí me levaram em uma rede em um lugar muito longe, um monte de homem levando em uma rede, tinha uma parteira lá melhor, sabe? Foi difícil, não foi fácil não, Deus me livre...
P/1 - Demorou para nascer?
R - Demorou, demorou, eu lembro que foi cedinho, fui ganhar lá para noite, sofrido...
P/1 - Qual é o nome do seu filho?
R - Gilvan...
P/1 - E por que que foi Gilvan o nome?
R - Não, nem sei mesmo, sabe? Ficamos escolhendo, aí ficou Gilvan mesmo, tinha um programa, Gilvan Chaves na televisão, sabe? “Olha Gilvan Chaves, não sei o que.” E ficou Gilvan.
P/1 - E o que a senhora sentiu assim quando virou mãe, mudou a sua vida?
R - Virou sim, muda a vida da gente, sabe? É muito amor, muito cuidado, muita dedicação, você tem que criar seu filho, sabe? No caminho certo, sabe? Você tem que ensinar, sabe? É o futuro dele lá, hoje é um homem de verdade o meu filho, sabe? Um homem de verdade. Bom pai, bom esposo, bom funcionário, então...
P/1 - E quando ele nasceu a senhora tinha quantos anos?
R - 17, foi com 17 anos.
P/1 - E aí então a senhora se separa do seu marido?
R - Foi, foi, não deu certo e eu vim embora para o Pará, fiquei um tempinho em Marabá, trabalhei lá nas coisinhas, arrumei um monte de gente boa para trabalhar, mas aí eu não ficava porque o menino ficava longe de mim, eu não dava conta, sabe? Falei: “Não, eu não vou criar meu filho longe de mim”. Aí eu fui embora para Serra Pelada.
P/1 - E por que você foi, antes de chegar em Serra Pelada, por que você foi para Marabá?
R - É, quando eu vim de trem, eu encontrei uma mulher, que é esposa do meu primo, dentro do trem, que morava em Serra Pelada. Eu vinha para Marabá, para o interiorzinho lá onde meu irmão morava, sabe? Esse interior onde eles moravam, a cidade deles era Marabá, aí eu vinha lá para essa roça lá, uma terra que meu irmão tinha lá, aí ela disse assim: “Mulher, por que tu não vai para Serra Pelada?” Aí eu falei: “Não, por enquanto não vou não, vou ficar lá onde meu irmão é”. Aí eu fiquei, eu fui para o meu irmão, depois eu fui para Marabá, consegui um emprego lá em Marabá na casa de uma pessoa lá, de família mesmo, sabe? Aí ela foi lá, conheceu meu irmão, e eu trabalhei 7 meses na casa dessa mulher lá em Marabá, sabe? Aí de lá eu falei: “Menino, essa vida não dá, não.” O menino não ficava comigo, ficava longe, e ele chorava, e eu chorava, era muito difícil, sabe? Só via ele final de semana e eu não gostava não, aí eu vim para Serra Pelada, para casa do meu primo, casa do meu primo, a Fátima, que foi que me acolheu lá, foi muito bom, porque eu cheguei lá, eu já agradeci ela foi muito, eu não tinha roupa nem para trabalhar, não tem? Eu vestia roupa dela, aí fui trabalhar lá que eu comprei, né? Trabalhava no supermercado por nome de “Pague Pouco”, trabalhei foi um tempo, aí a vida foi melhorando, ela tinha um, ela tinha um bar que fazia seresta, sabe? Fazia bingo, várias coisas, trabalhava no mercado e fazia festa a noite, e também ela, ela vendia bolo na beira do garimpo, ela era muito trabalhadeira. Fazia umas vasilhonas de leite, de café, de bolo, e a gente ia vender lá na beira do garimpo, onde o pessoal estava trabalhando. Aí eu saia de lá, aí ia para o mercado, entrava 8 horas, e passou um tempão assim trabalhando assim, em Serra Pelada.
P/2 - Dona Baixinha, e assim, a senhora veio para Marabá, qual foi o incentivo para a senhora vir, qual foi o motivo para senhora veio?
R - Que eu vim? Fugindo do meu ex-marido, foi...
P/2 - A senhora conhecia alguém de lá ou veio...
R - Não, só meu irmão mesmo, só meu irmão que morava na roça, só, não tinha, não conhecia mais ninguém. Aí eu vim embora.
P/1 - Então a senhora estava fugindo do seu marido?
R - Foi, do meu ex-marido.
P/1 - Mas ele estava atrás de você?
R - Não, não, não estava atrás não, eu fugi de noite, ele tinha ido para o serviço no circo, e aí eu peguei meu Gilvan, né? Ele tinha uns 4 anos de idade, aí eu tinha uma amiga lá que me ajudou a fugir, aí eu fiquei na casa dela, dormi a noite, quando foi no outro dia cedinho ela foi me deixar na beira de onde pega o trem, sabe?
P/2 - Dona Baixinha a senhora estava falando de quando chegou em Marabá e começou a trabalhar, a senhora ficava longe do seu filho...
R - Sim, ele ficava com a minha irmã, tinha uma irmã lá morando na época em Marabá...
P/2 - Na cidade?
R - Na cidade mesmo, na cidade, e um irmão morava na roça, uma irmã que morava na cidade e um irmão que morava na roça, aí ele ficava na minha irmã.
P/1 - Ele era pequenininho?
R - 4 anos, foi difícil, nossa, dei conta de ficar longe do meu filho não. Aí a mulher, depois ela deixou eu ficar com ele lá, sabe? Ela me achou boa para cuidar da filha dela, e ela deixava, mas depois eu falei “não, essa vida não dá não, trabalhar para procurar uma melhora.” Foi na época que eu vim para trabalhar no supermercado.
P/1 - E como é que você chegou a Serra Pelada? A senhora foi como para lá?
R - Tinha uns carros que iam, eu lembro que eu fui em cima de um caminhão, em cima de um caminhão. A estrada tanta lama, tanta lama, tanto atoleiro, Meu Deus do céu, foi tão difícil para chegar lá, mas eu cheguei mais o Gilvan. Aí fui para casa da minha prima, a Fátima me acolheu muito bem, sabe? Foi muito bom, graças a Deus.
P/1 - E a senhora lembra qual o ano que a senhora chegou em Serra Pelada?
R - Qual o ano? 1990.
P/1 - 1990, então aqui já tinha outras mulheres?
R - Já, já sim, já tinha, o garimpo funcionava, mas já estava tudo liberado, não tinha nada proibido de mulher entrar, não.
P/1 - Quem mais estava nesse caminhão com a senhora?
R - Vinha um monte de gente nesse caminhão, eu não conhecia ninguém, sabe? Eu não conhecia ninguém não. Sei que só era um caminhão, daqueles Chevrolet.
P/2 - Era um caminhão que trazia _____?
R - Era, era.
P/2 - A senhora lembra de quem era o caminhão?
R - Se eu não me engano era de seu Antônio Serrador, --- lá do seu Serrador lá, era ele, eu vim em cima desse caminhão.
P/1 - Seu primo foi garimpeiro, era isso?
R - Sim, era garimpeiro.
P/1 - Qual o nome dele?
R - Zequinha
P/1 - Está vivo ainda?
R - Está, hoje mora em Marabá, ele mora lá.
P/1 - O que falavam do garimpo nessa época? Do garimpeiro? O que se falava antes, assim?
R - Era animado, a gente andava lá, o pessoal disse que dava rec para a gente, nunca ganhei não, prometia, né? “Não vou te dar um rec aqui..” Se alguém passava assim onde eles estavam trabalhando, todos sujos, que seja brilhava o corpo, sabe? Daquele rec , aí eles diziam que ia dar rec não sei o que. E a gente viveu muito aí, eles iam merendar na beira do garimpo nas nossas banquinhas, comia ali, pagava, rapidinho acabava café, leite, os bolos, e a gente ia embora, e aquele povo tudo com esperança que ia pegar ouro, que... Acho que pegava, pouquinho mais pegava também, sabe? Não era muito não, mas pegava.
P/1 - E repete para mim, por favor, qual o nome desse supermercado que você trabalhava?
R - Supermercado “Pague Pouco”, “pague pouco”, depois do “pague pouco” aí eles foram embora , trabalhei 7 meses lá, aí foram embora. Eu trabalhei em outro lá que o nome era “Superbox” lá na Tábua do Sereno “Superbox 2001” o nome lá dele, do supermercado.
P/1 - E o “Pague pouco” ficava em que rua?
R - Ali perto da casa do seu Alrino, você não sabe onde é não, aonde que hoje é a verdura , é quase de frente a loja atual, por aí assim , a loja atua que tem lá, por aí , era por ali.
P/1 - E quando você chegou em Serra Pelada o que você achou da cidade?
R - Era estranho o garimpo, aquelas casas de madeira, uns negócios, era estranho, sabe? Era muito estranho, tinha uma rua lá para o final que chamava Currutela, onde ficava mais um pessoal de garimpo lá, onde era os comércios, era Currutela, Currutela, sabe?
P/1 - Estranho como? Feio, bonito?
R - Era feio, era uma casa coberta de lona, sabe? Na época não era nem madeira, era lona.
P/1 - E, mas o supermercado não era assim?
R - Não, era construído, normal mesmo, sabe? Eu trabalhava na balança, ficava mexendo com verdura, era normal, muito funcionário, sabe? Tinha muito funcionário.
P/1 - Como é que era o seu dia a dia desses supermercados? Era animado?
R - Era animado, era animado, a gente dia de domingo a gente trabalhava, a gente almoçava lá, sabe? Era animado, era bom, muita gente boa no supermercado, a gente pega amizade com as pessoas, né? Aquele conhecimento, o gerente era meio ruim, sabe? Gostava de dar bronca, era, reclamava tudinho, sabe? Meu Deus do céu. [intervenção]
P/2 - Dona Baixinha, para que vai assistir essa entrevista e não conhece os termos locais, explica para gente o que é um rec?
R - Um rec é uma terra tirada lá de onde eles estão trabalhando que se você lavar ela vai ter ouro, sabe? Uma terra bem preta lá, misturada com aqueles cascalhos, aquelas coisas...
P/2 - Ganhava um rec, na sorte para ver se tem ouro...
R - Isso, isso, isso, aí o pessoal prometia “menina vou te dar um rec aqui, tal”, sabe?
P/2 - Entendi...
R - Nunca ganhei não, tinha muita promessa, a gente andando por lá e eles ficavam, a gente conhecia, né? Os conhecidos, né? Os que não conhecem, aí sei lá...
P/1 - E você foi morar aonde? Em que rua? Como era a casa?
R - Eu morava na rua Transgarimpo, rua do transformador, na casa do meu primo, aí era uma casinha altos e baixos, ele mexia com açougue, e trabalhava no garimpo também, sabe? Aí andava, vendia carne lá, e a gente morava embaixo, em cima assim, eu com meu filho, eles também tinham uns filhos, a gente viveu um bom tempo. Aí foi quando conheci José Dutra Martilho, meu velho.
P/1 - Como é que era, a senhora veio aqui, a senhora estava solteira, mulher...
R - Solteira, tinha, tinha muito homem. Era solteira, né? Tinha o meu filho, né? Que eu falei, com 4 anos, e tinha muito homem, muita mulher também, normal, da cidade de pessoas, né? Era um lugar normal.
P/1 - E a senhora se lembra quando a senhora viu a cava pela primeira vez?
R - Lembro, lembro assim, era bem profundo naquele, onde ele está lá embaixo, não era? Aí depois apareceu, de vez em quando soterrava uma pessoa, soterrava gente, o pessoal: “A alguém lá dentro... Aterrou não sei....” Era muito triste aqui, sabe? Gente que a gente conhecia, sabia que estava soterrado, o trator arrancando gente lá de dentro, escavadeira puxando gente, sabe? Era triste aquilo.
P/1 - A senhora via a cava enchendo de água?
R - Sim, eu lembro sim. Eu lembro que a gente descia lá em baixo para, o pessoal que ia rezar, fazer missa lá dentro, para as pessoas que morreram, a gente descia, descia, ia lá dentro, o pessoal católico ia lá dentro rezar para os mortos, lá, que foi morto lá dentro.
P/1 - A senhora lembra de alguém que a senhora conheceu que faleceu?
R - Não, assim, de vista, né? Mas de conhecimento não sei de ninguém, só de vista mesmo.
P/1 - Como eram essas missas na cava, a senhora se emocionava nas missas?
R - Sim, todo mundo ficava com o coração muito apertado, muito triste, sabia que morreu muito pai de família ali soterrado, tiraram, e era muito triste, ficava com o coração apertado, é difícil.
P/1 - E me conta uma coisa, como é que a senhora conheceu seu marido?
R - Foi trabalhando no “Pague Pouco” na balança, ele ia lá comprar uma caixinha de 51 para revender, ele tinha um comercinho, aí ele ia lá, comprava, botava na cabeça a caixinha de 51, e ia fumando o cigarro dele, que a caixa no final é esse. Aí ia lá na balança um dia, tinha uma outra funcionária que o nome dela era Rita, e ele aprendeu a me chamar de dona Rita, “e aí dona Rita, como é que está? Não sei o que... “ E aí eu falei: “ Esse homem aqui me chamando de dona Rita, não tem nada a ver, né?” Aí, eu sei que foi indo, foi indo, e eu andei um dia na casa dele, solteiro, era viúvo, sabe? Aí conheci ele, assim, ele sempre ia lá no comércio e falava. Só que na época ele bebia, ele bebia muito, era quase um alcoólatra... “Vixi, estou é fora”. Aí eu sei que ele passou foi tempo bebendo, bebendo, aí nós conversando, tal, eu tentei viver um tempo com ele, mas ele bebia, eu falei: “Não, vou embora lá pro meu irmão de novo”, sabe? Fui embora lá para o meu irmão, aí ele andou atrás de mim, lutou, aí eu voltei de novo para a casa do meu primo, aí ele parou de beber nessa época, estava com 2 anos que ele parou de beber quando a gente se casou.
P/1 - Como que ele era na época fisicamente?
R - Ele era sabor, limpo, né? Bonito, né? Eu achava ele muito bonito, agradava muito meu filho, gostava muito de agradar o meu filho, né? Minha família, e tranquilo, sabe? Ele era bem tranquilo. [intervenção]
P/1 - Você achava ele bonito?
R - Sim.
P/1 - Ele se vestia como?
R - Meu velhinho nunca gostou de se vestir direito, ele não estava nem aí, moço, nessa época ele comprava tanto cigarro da Souza Cruz, para tu ver que cigarro da Souza Cruz é caro, né? Ele comprava 5, 6 caixas, aquelas pilhazonas, ele tinha um comercinho lá, vendia bebida, vendia tudo lá. E ele nunca gostou de comprar roupa, sabe? Era uma briga, nunca gostou, vestia umas bermudinhas velhas, umas camisonas, gostava de umas camisonas de 4 bolsos, mandava fazer, aí era a roupa que ele gostava, um tênis, e o cigarro. Era isso.
P/1 - Sempre fumou?
R - Sempre, eita, sempre fumou.
P/1 - E não incomodava a senhora?
R - Não, nunca incomodou não.
P/1 - E me conta uma coisa a senhora, antes de voltar a falar do seu marido, a senhora fez amizade lá com quem? Nesse período todo...
R - Na Serra?
P/1 - Quem te marcou mais assim?
R - É um povo que já foi todo embora, não sabe, eu sempre fiz muita amizade, sempre gostei de fazer muita amizade, sabe?
P/1 - Mas pode falar de quem faleceu, que a senhora sente saudade, para registrar esse povo.
R - Pois é, nessa época eu me lembro que tinha a Angelita, a Marizete, a Marizete ainda mora lá, dessa época, sabe? E não lembro de outras pessoas, acredita? Lembro dessas duas pessoas que eram quem era mais próximo, sabe? As meninas que trabalhavam no supermercado também, tinha a Raimundinha, ainda hoje eu tenho vontade de encontrar a Raimundinha, eu sei para onde ela mora, é assim, não lembro mais de outras pessoas.
P/1 - E qual é o apelido do seu marido?
R - Fogoió
P/1 - Por que Fogoió?
R - Aí, eu digo, ele era loiro, sabe? Ele é branco e o cabelo dele está branco, mas ele era loiro, cabelo cacheado, sabe? Ele era bem loiro.
P/1 - O que te chamou atenção, o que chamou sua atenção nele?
R - Ele era uma pessoa assim que queria me acolher, que queria cuidar do meu filho, ter um lar, uma família, e aí ele, pareceu que era aquela pessoa mesmo, sabe? Inclusive esse mês agora fez acho que 33 anos que a gente está junto.
P/1 - E a senhora pensa que foi por conta da senhora que ele parou de beber esse tempo?
R - Foi, foi sim, foi sim, ele me dava conselho, ele bebia, mas me dava conselho para eu não beber, eu nunca fui de beber mesmo não. Eu mexia em um bar e ele: “Mulher tu não bebe não, tu é uma pessoa boa, não sei o que”, sabe? Ele bebia, mas eu não podia beber, ele me dava muito conselho, sabe? Ele era aquela pessoa boa que... E deu certo, né? Graças a Deus.
P/1 - Vocês se casaram em que ano?
R - Em 92.
(00:44:11)
P/1 - Seu filho já tinha 6, 7 anos?
R - É, isso, foi nessa época por aí.
P/1 - E aí vocês foram morar juntos?
R - Foi, a gente foi morar, ele tinha uma casa lá, ele me chamou, mostrou a casa, sabe? Aí tinha uma casinha assim do lado, ele falou assim: “Você vem morar comigo aqui, eu vou comprar essa casa aqui do lado”. Aí eu olhei, gostei “menino, pois eu venho”. E deu certo.
P/1 - Era aonde essa casa?
R - É lá, hoje está fechado o supermercado que era nosso lá, né? Ali subindo, que vai para a rua do Sereno, naquela subida, tem aqueles comércios, aí você sobe, naquele alto, bem naquela casa alta amarela, que é de altos e baixos fica a nossa casa e do lado aqui, que é a casa que ele morava primeiro, onde é os depósitos hoje lá, a casa nossa de morar assim, e do lado era os depósitos. E foi essa casa que ele comprou na época para a gente morar.
P/1 - Então vocês tocavam a partir de agora o supermercado?
R - Foi, trabalhamos muito tempo no mercado ali, aí foi crescendo, ele morava desse lado aqui, mexia com comércio, aí logo que a gente se juntou ele foi comprar dois caminhões de mercadoria, sabe? Para... Foi para Imperatriz e comprou dois caminhões de mercadoria, aí foi indo. Aí depois ele construiu do outro lado um comercio, construiu uma casa, e a gente viveu muito tempo com o supermercado lá, bom, grande, tinha de tudo, sabe? Vendia de tudo.
P/1 - Qual era o nome do supermercado?
R - “Comercial Matias”, está fechado lá hoje.
P/1 - Agora, nesse período, o garimpo fechou, não foi?
R - Ainda ficou muito tempo, eu lembro que a gente vendia, quando eu morava ainda do lado de cá, que era a casinha lá que ele comprou que... Eu lembro que a gente atendia muito garimpeiro, muito, sabe? Eles todos sujinhos, todos pretos de melechete, chega brilhava, e a gente atendo lá eles, funcionou muito tempo o garimpo, sabe? Quando a gente estava lá.
P/1 - Mas e quando fechou como é que ficou para vocês?
R - Ficou ruim, quando fechou o garimpo o comércio caiu muito, caiu muito o comercio, porque eles não compravam muito, mas compravam todo dia, não tem? “Me dá um óleo, me dá um arroz, me dá um café, um açúcar.” Todo dia comprava, aí quando fechou, caiu, né? Aí ficou só os aposentados, uns fazendeiros ali perto, né? Nessa época não tinha a Vale, não tinha empresa por ali.
P/1 - E para vocês, chegou a fechar?
R - Não, aí foi indo, né? Vendia para o pessoal das escolas, vendia... A gente foi, foi aumentando as coisas da gente, foi construindo um mercado maior, né? Aumentando as coisas.
P/1 - E vendia, o que que vocês vendiam mais assim?
R - Mais era bebida, de caixa fechada, a gente vendia, fornecia, engradado de cerveja, caixinha, vendia muito, cigarro, né? Vendia demais, era o que mais vendia. Comida também, mas o que vendia mais era cerveja lá. Vendia material de construção, tudo a gente vendia, tinha de tudo mesmo, tudo, tudo tinha lá.
P/1 - E tem alguma lembrança que você tenha desses mercados que a senhora guarda hoje, assim?
R - Tenho uma lembrança boa, as pessoas, é muita gente, quando eu chego lá hoje, nossa, é todo mundo falando, falando. Tenho saudade das pessoas, muita gente amiga hoje, sabe? Muito, muito mesmo, todo mundo ali é conhecido, e a gente pega aquela amizade como se fosse parente, sabe? Da gente, a gente sente falta disso, das pessoas. E era bom aquela convivência lá, mas era muito, trabalhava muito, eu não dei conta mais não, muito cansativo mexer com gente, muito funcionário, sabe? Não é fácil.
P/1 - E para vocês, vocês não sentiram então essa queda do garimpo tanto assim, né?
R - Não, não, não sentiu tanto não, sabe?
P/1 - Agora vocês perceberam que tinha muita gente indo embora?
R - Sim, aí foi, aí foi muita gente embora, está doido, foi muita gente embora, foi... Desiludindo, foram embora que não tinha nada, né? Não tinha nada para fazer, não tinha, igual eu falei, não tinha as empresas, que hoje é muita empresa que emprega as pessoas ali, muita firma.
P/1 - Você, e seu filho estudou em Serra Pelada?
R - Estudou, estudaram sim, até a oitava série estudava lá, aí a partir da oitava que ia para fora tudinho, só o mais novo que não foi, não quis ir mesmo, sabe? Queria ir não, estudou lá mesmo e deu certo.
P/1 - Você teve outros filhos?
R - Tive, vixi, tenho muito, tive mais 5...
P/1 - Com o Fogoió?
R - Sim, sim, 5.
P/1 - Quem são?
R - O Herbert, Laiana, Junior, Lorena, Pedro... Esqueci do nome, tem que contar nos dedos, 5, e o Gilvan 6, é 6.
P/1 - E como é que era, a senhora se preocupava, tinha funcionários, para fazer alguma coisa da vida? Com é que era isso?
R - Sim, eu sempre trabalhei em comércio, meu Deus do céu, minha vida era ali, sabe? Não tinha outra coisa, mas eu tinha gente que cuidava deles, né? Tinha a pessoa da cozinha que cuidava deles, então eu não tinha muito problema com eles não, graças a Deus. Aí gostavam de estudar, todos sempre gostaram, aí quando estudavam a oitava série, aí a turma de primeiro ano eles iam para fora, foram para Araguaína, estudar para lá, sabe?
P/1 - Todos?
R - Aí formaram, sim, só não foi o Pedro mais novo, que hoje tem 19 anos. O Pedro não quis ir, mas os outros todos foram, aí a gente conseguiu formar um bocado lá ainda.
P/1 - Mas eles tinham que sair por quê? Não tinha ensino médio?
R - Não, não tinha, não tinha não, só tinha até a oitava série, depois primeiro ano e tal, não tinha.
P/1 - Vocês faziam questão deles estudarem, né?
R - Isso, alugava uma casa e eles moravam todinhos, alugava uma casa e eles moravam todinhos, mandava dinheiro das despesas, e eles se viravam para lá mesmo, estudando... Só estudando, não trabalhavam não, só estudando. A gente formou o Gilvan, formou o Herbert, formou a Laiana, a Lorena parou na época da pandemia, o Junior também. Aí tem uma enteada que a gente formou também, que ele teve com outra mulher, eu criei ela um certo tempo, aí, ela mora em Parauapebas, sempre ela vem por aqui, a Gabriela, é filha do coração também, sabe? Amo como se fosse meus filhos também.
P/1 - A gente estava mais ou menos nos anos 90, né?
R - Sim...
P/1 - Os filhos nasceram quando? Nos anos 80 o Gilvan, depois...
R - É, o Gilvan foi em 83, né? O Gilvan, aí do Gilvan, aí vim ter o Herbert e o Gilvan já ... E homem, eu não lembro a idade dos meninos, eu lembro os meses, mas eu não lembro o ano, mas o Herbert, eu lembro que com 3 meses que eu estava com Fogoió eu engravidei do Herbert, né? Então ele já tem 32 anos, por aí assim, né? 32 mesmo que o Herbert, e aí era 2 anos de 1 para o outro, sabe?
P/1 - E como é que era criar eles assim, você trabalhava?
R - Sim, dava certo, tinha a menina que cuidava, eu tinha a pessoa que cuidava deles, e da casa, sabe? Tinha sim, mas eles ficavam no comércio, eu colocava umas redinhas lá, e eles dormiam por lá mesmo, sabe? Era junto lá todo mundo.
P/1 - E como é que foi esse período que o pessoal estava ruim… Você viu muita gente mal? Como é que ficou a comunidade no período?
R - Era todo mundo fraco, mas tinha um pessoal aposentado. Sempre teve o aposento do povo, né? Sempre teve o pessoal trabalhando em fazenda. E o garimpo que nunca parou assim, parava assim, mas proibido mesmo sempre tinha alguém trabalhando no garimpo, sempre teve, nunca parou totalmente, e assim as pessoas sobreviviam.
P/1 - E como é que era essa casa que vocês moravam? Foi uma só que vocês ficaram por um bom tempo?
R - Foi, foi, era uma casa de madeira, de altos e baixos, sabe? De altos e baixos, emendada com o comércio, tudo junto, a casa onde morava assim, e o comércio do outro lado, na época
P/1 - E você conhece as histórias de Serra Pelada, pessoas que são famosas lá?
R - Eu não tenho muito conhecimento assim das histórias, porque sempre foi aquela vida cuidando de menino e do comércio, nunca sabe? A gente, nunca, a gente vê falar assim, assim, se for me perguntar para mim contar, eu não sei contar, porque eu não me envolvi mesmo assim, não sei. A gente conhece, agora quem conhece muito é meu velho, que conhece muita história, ele conta muita história. Aí eu não sei.
P/1 - E aqui, lá em Serra Pelada, tinha festa? Tinha...
R - Tinha tudo, na época tinha cinema, muita festa, tinha seresta, nossa, era muito coisa que tinha lá uma época, sabe? Tinha muita coisa, muito lugar de fazer festa, era bingo, precisava de ver.
P/1 - Você ia, participava?
R - Não, não ia não, a gente ficava no comércio vendendo até tarde. A gente ficava até 10 horas, 11 horas da noite. Aí foi um dia que teve um assalto, aí a gente ficou fechando mais cedo.
P/1 - Vocês sofreram muitos assaltos ou não?
R - Sim, sofremos 3 assaltos, foi, aí...
P/1 - A senhora gosta de lembrar para falar disso ou não?
R - Não, não tenho nada... Assim, falo sim. O primeiro foi, já era umas 11 horas da noite, aí o meu filho estava no comércio, e eles mandaram o menino abrir o cofre, né? Ele abriu, pegaram o dinheiro, mandaram os meninos deitar no chão, era o meu sobrinho e meu filho, aí atiraram no pneu da moto, que era para não vir atrás, o menino ficou traumatizado aquele dia, o Gilvan, ficou foi tempo muito traumatizado. E o outro foi do outro lado, a gente tinha mudado, acho que no mesmo mês que a gente mudou para o outro lado o supermercado teve um assalto às 7 horas da noite. A é, só dois, não foram 3 não, foi só 2 assaltos. E esse foi mais difícil, né? Esse lá, entraram lá e passaram o dia inteiro pegando informação e a gente sem saber o que era ainda queixava, que mais tarde ia fazer uma compra, sabe? Pegaram um carro de um conhecido nosso, ficava passando com esse carro que era trabalhador de lá, e eu sei que levaram um monte de coisa, sabe? Na época era bom de dinheiro assim, eu nunca organizei o dinheiro, sempre pegava o dinheiro e botava na sacola. Nunca arrumava, não tinha paciência não, aí pegava, botava no bolso, do bolso botava em uma sacola, amarrava a sacola e botava no cofre. Aí “a senhora abre o cofre para mim?” “Abro” Eles achavam que o cofre era distante, “não, o cofre é aqui.” Aí saíram para pegar umas coisas, água mineral, era biscoito, enchendo as sacolas, aí eu lá dentro do cofre, quando eu olhei não tinha ninguém, eu peguei a sacola de dinheiro e enfie de trás do cofre, aí levaram muito pouco nessa época. Tinha uns cheques, aí eles tiraram os cheques, deixaram os cheques, cheque da rastro, né? E Deixaram, eu falei: “Ai, Meu Deus...” Tive ação naquela hora, sabia? Umas 3 sacolas com dinheiro, a gente fica traumatizado é tempo. Dessas coisas, mas deu certo também, graças a Deus.
P/1 - Como é que faz para se recompor disso?
R - Não, a gente fica, depois que passa assim, depois você dá uma crise, você chora, aí depois você, passa um monte de dias com medo, você não pode ver ninguém desconhecidos, que acha que já era um assaltante. Você acha as pessoas parecidas com aqueles homens. “Meu Deus será parecido com aquele homem?” Mas depois esquece, Deus limpa a mente da gente, sabe?
P/1 - E vocês, você fala que vocês colocaram todos os seus filhos para estudar, e você não que queria que eles virassem garimpeiros, é isso?
R - Não, não queria não, tinha que estudar mesmo, formar, né? Também na época deles lá não tinha mais nem nada de garimpo não, só esse pessoal que mexia ainda procurando uma coisinha. Para sobreviver, tinha mais nada.
P/1 - Então, em outras palavras, você achava que não dava futuro?
R - Não, não dava, não dava não.
P/1 - E, mais para frente, o que foi acontecendo na vida da senhora, nos anos 2000, como é que foi andando?
R - Aí foi, foi isso mesmo, trabalhando no comércio, ajudando os meninos que estudavam fora, e assim, foi só essa vida mesmo nossa, sabe? Quando tinha uma folguinha vinha aqui, meu velho comprou essa terra, e assim foi vivendo esses tempos todos, foi passando.
P/1 - E me fala um pouquinho dos seus filhos, quem se formou? A senhora já falou, mas quem formou, formou em que? Como foi essa caminhada?
R - Gilvan se formou em engenheiro agrônomo, sabe? Trabalha lá hoje. O Herbert formou em sistema de informação, esse nome que chama hoje, EPI, TI... TI, né? É o Herbert, né? A Laiane é em Direito, e a Lorena estava fazendo direito também, mas parou, sabe? E o júnior não quis muita coisa de faculdade, estudou depois parou, estava fazendo engenharia lá de, engenharia elétrica, uma coisa assim, aí parou. E o Pedro só estudou mesmo até, terminou os estudos dele aí, mas ele disse que não ia fazer faculdade não, porque os irmãos dele iam ganhar o tanto que ele estava ganhando sem fazer faculdade. Disse que não mexer com isso não, acabou. Gabriela formou em farmácia.
P/1 - E a senhora sabe se estão todos empregados? A senhora tem netos? Como é que é?
R - Estão, estão, os homens, falta só o Júnior, que ainda está sem emprego, mas está correndo atrás. E eu tenho 8 netos, né? Lorena tem 2, o Júnior tem 2, Gilvan tem 2, Laiane tem 1, e o Herbert tem 1, coisa mais linda do mundo, amo demais.
P/1 - Me conta, como é que é ser avó?
R - Sou avó coruja demais, pensa, só em falar já me emociono, apaixonada pelos meninos, meu Deus do céu, eles por mim também, chega aqui não querem ir embora mais não “quero ficar mais a minha avó”, aí as mães ficam dizendo que os meninos estão dando trabalho, “pois, traz para mim todinhos, eu quero, pode trazer tudinho que eu quero tudinho” São todos pequenos ainda. O maior parece que tem 8 anos, uma turminha pequena.
P/1 - A senhora achava que a senhora ia ficar todo esse tempo em Serra Pelada quando a senhora chegou?
R - Sim, achava sim, sabe? A gente ia viver sempre ali, nunca pensei em ir embora para outro lugar, nunca pensei de mudar. Só queria ficar ali mesmo trabalhando com a meu velho a vida inteira mesmo, até que a morte os separe, né? Aí viemos para cá, e ele me chama, “bora montar comércio de novo?” Eu falei: “Rapaz eu não quero não.” Para começar ele não fica dentro, sabe? Aí só coloca a gente e não quer ficar, quando a gente tinha o mercado lá, ele ficava não, de manhã cedo ele vinha para cá, ficava até a noite, quase morro de trabalhar, pense na luta, aí hoje que ele me chama de vez em quando “mulher não dou mais conta de ficar por aqui trabalhar, bora pra lá?” Eu não quero não, eu não vou sair daqui não, só quando Deus me levar mesmo, enquanto isso eu vou viver aqui, ainda aquietamos por aqui, sabe?
P/1 - E vamos voltar um pouquinho para registrar as coisas da Serra Pelada, que a senhora chegou mais de 30 anos atrás lá. Como que eram os outros comércios que tinham lá? Logo que a senhora chegou aqui, que outros comércios que tinham?
R - Nossa, tinha tanto comércio, se tu visse, tanta mercearia, tanto... Mercado só tinham esses, na época né? Que era esse “Pague Pouco”, “Superbox”, tinha o “Pague e Leve”, mas outros comércios tinham, negócio de material de construção, tinha demais, sabe? Era bem lotado aquelas ruas ali, sempre tinha um comercio bom, grande, tinha lanchonete, tinha churrascaria, tinha muita coisa, só se vendo, tinha sim, era um lugar bem avançado assim, muita gente, né? Muita gente, sempre teve, Serra Pelada teve muita gente, muita gente. E aí era bem movimentado.
P/1 - Qual era o nome desses lugares, a senhora se lembra?
R - Desses comércios? Eu sei que tinha não sei o que, “Churrascaria do Baiano”, tinha um material de construção ali bem, perto ali que era, na rua do transformador, perto ali de onde eu morava, meu Deus como é que é o nome? Que eu lembro o nome do dono era Arnaldo, aí eu não lembro, meu Deus, mais não, não lembro, o nome desse comércio, era um comércio bem grande, bem, empregava muita gente, era material de construção, não lembro. Mas não lembro, mas tinha muito, é que eu não lembro dos nomes também.
P/1 - E bar, essas coisas, também tinha muito?
R - Vixi, não, ainda hoje, só, o que tem mais é isso em Serra Pelada, é bar, tem muito, na época tinha muito, na época tinha uns que faziam festa por ali assim, que ficava, é que eu não lembro moço, eu esqueço do nome das coisas, mas tinha muito. Ali onde nós morávamos mesmo, era um sonzão de noite, ali, tinha um lugar que era seresta que chamava, lá na tia, é “Fundo da Casa”, “Quintal de Casa”, era uma coisa assim, “quintal de casa”, era o nome assim, que fazia seresta, era bem animado, sabe? Era muito cheio de gente.
P/1 - E a senhora parou de ir em festa, essas coisas?
R - Sim, logo que eu arrumei meu velho ali, sabe? E pronto, nós não fomos mais para canto nenhum, parou por ali mesmo.
P/1 - Ele não gostava de sair não?
R - Não, nunca gostou de sair, sabe? E a gente acaba acostumando com aquela vida ali, trabalhar e ficar em casa, logo apareceu um monte de menino, aí como é que vai com um monte de menino? De dia tem gente, mas de noite não tinha, para cuidar, era eu mesma.
P/1 - E a senhora voltou para igreja, é isso?
R - Sim, eu ia com os meninos, eu ia muito para igreja católica, ia para igreja evangélica, ia sim, sempre a gente ia para igreja.
P/1 - E por que a senhora mudou da católica para evangélica?
R - Fiquei um tempo sem ir para a católica, sabe? As irmãs iam muito lá em casa, das evangélicas, fazer culto, tarde de louvor, sabe? E ficar comigo, e elas frequentavam mais a minha cada do que as católicas, sabe? E falavam, e me ajudavam muito em oração. E aí um dia me perguntaram se eu queria aceitar Jesus, aí oraram lá por mim, e eu aceitei, e eu sou muito feliz hoje, porque sou evangélica, sabe? Muito mesmo.
P/1 - E é diferente para a senhora católica da evangélica, a igreja?
R - Não muito, não é muito não, mas é um pouco, sabe? É um pouco sim.
P/1 - O que é diferente?
R - É, eu não sei explicar, eu não vou saber explicar não, que eu não vou saber explicar direito e não...
P/1 - É o sentimento?
R - É o sentimento, é o modo de você, parece que você fica, você se aproxima mais de Deus, você fica mais próxima. Você fica mais, parece que você busca mais, e é bem diferente. Você tem mais o temor de Deus, sabe? Você pensa um monte de vezes antes de fazer uma coisa que não agrada a Deus. Porque os ensinamentos que vem é para isso. Ensina seu modo de vestir, modo de ser, o que deve usar, o que não deve, principalmente a Assembleia de Deus, né?
P/1 - Mais próximo de pessoas também? Mais próxima de outras pessoas também?
R -Sim, sim, ficar mais próximas, eles visitam mais a gente, sabe? Aqui não tem visita, mas lá na Serra tinha muita visita, o pessoal sempre estava me visitando, marcava para louvar a tarde, sabe? Era muito bom.
P/1 - E você a senhora voltou a cantar, não foi?
R - Sim, eita, mas gosto de cantar, não sei decorado, o problema é esse.
P/1 - A senhora quer cantar uma que está na ponta da língua?
R - Agora me dá um branco, meu irmão, como é que a gente lembra? Vamos ver... Sim, vou cantar um pouquinho, é pequeno, porque corinho é pequeno, né? Vou Cantar: “Deus está aqui, tão certo como o ar que eu respiro, tão certo como o amanhã que se levanta, tão certo como eu te falo e podes me ouvir”
P/1 - E a senhora sente o que quando canta?
R - Sente um, sei lá, Deus mais próximo, você sente aquele... Uma coisa boa, sabe? Gosto muito de louvar.
P/1 - E como é que é esse amor pelo seu marido?
R - Eita, é amor demais, você é doido, é muito. Porque, ele sistemático do jeito que ele é, e eu amo ele do jeito que amo, vou te falar, tem que ser muito amor, porque não é fácil. Nordestino, mas eu amo ele demais, ele sabe, e todo mundo sabe, os filhos, todo mundo.
P/1 - E conta para gente aqui, eu sou de São Paulo, o que é ser sistemático?
R - Ele? Reclama de tudo, não gosta. Um monte de coisa que ele não gosta. Um monte de coisa, tem que saber falar, falar assim, procurar as horas direitinho. Tem que ser, como é que fala, pisando em ovos, convivendo, sabe? Viver pisando em ovos.
P/1 - Pontual também?
R - Não, não, não é bem assim não, não é porque é sistemático.
P/1 - E a senhora é mais como, será?
R - Ave Maria, tranquilona demais. Ele fala a todo mundo que nunca me vê zangada, que o abusado é ele, mas eu não, ele nunca me vê zangada, nunca me vê com raiva, nunca me vê reclamando, triste, não, nunca me vê, é um tipo só. E ele não, ele é, uma hora está bravo, uma hora está manso, uma hora está alegre, outra hora não está, começa a pensar, quando vejo ele quieto só pensando eu falo “vixi, não está bom da cabeça hoje não”. Ele diz que eu não penso, mas eu penso, eu penso, mas não deixo nada, nem me tirar do sério, nem deixar eu triste não, pensar eu penso, se preocupa sim. Mas acreditando que Deus está no controle de tudo, né?
P/1 - E me conta uma coisa, quais são os lugares assim, que você mais gosta, em Serra Pelada? De estar, de ir? Mesmo os que não existem mais...
R - As igrejas mesmo, na casa de algum amigo, tenho amiga ali, ainda tenho muita amiga ali. Passar rapidinho, dar um abraço, e já vou embora, tudo rápido, que ele é agoniado demais, não deixa ninguém conversar não, “vamos embora, vamos embora”, tudo rápido. Até tempo que eu não vou em Serra Pelada em canto nenhum. Vou no mercado comprar uma coisa, ver uma pessoa, um amigo, paro aqui em algum lugar, entro na casa, dou uma abraço na amiga e já vai. É tudo rápido.
P/1 - Você geralmente vê quem lá?
R - Hoje quando eu vou, aí tenho a minha amiga Nazaré que era minha vizinha, cuidava das minhas plantinhas, tenho a Paizinha minha amiga, tem a Nena, pessoal do Aderbal, a Josi, aí é muita gente. As minhas comadres, tenho muita comadre ali, muita compadre, muito afilhado. Teve um dia que a gente batizou 3 de uma vez só, então tenho muito afilhado, é tudo moça, rapaz, tudo casado, tudo. Então, imagina, um monte de comadre, compadre para você sair, tenho que passar um monte de dias para ir na casa de todinhos e conversar, né? Mas é o que eu sonho, ter tempo de ir lá conversar, almoçar com um e com outro. É o que eu penso, faz tempo que não dá certo.
P/1 - Mas me conta uma coisa, vocês vieram para cá que ano? Como é que foi a compra daqui desse lugar onde está?
R - Ele ficou comprando. Que aqui era pedacinho, pedaço daqui, pedaço dali, ficou comprando, comprava de um, de outro, de outro, aí foi juntando. Na época do comércio, aqui é do comércio, e graças a Deus, Deus preparou esse cantinho para nós. Para mim principalmente que antes eu não tinha tempo de nada, almoçava lá em casa, bebia água no comércio, o pessoal chamando, falando, não fechava para o almoço, aí Deus preparou aqui, aí Meu Deus, aqui é só lugar de paz.
P/1 - Faz quantos anos que vocês estão aqui?
R - A gente veio para cá de muda na pandemia, a gente veio para cá de vez.
P/1 - E por que na pandemia?
R - Por que a gente, lá em casa é um lugar muito movimentado, minha casa, mesmo com o comércio que fechou, mas mesmo assim o pessoal ficava atrás de mim. E eu sou diabética, tenho diabetes, tomo insulina, e os meninos ficavam: “ Mãe, a senhora não pode estar falando com o povo , o povo vindo aqui, a senhora recebo, abrindo essa porta, mãe não dá certo” “Então, vamos embora para roça, vamos embora.”
P/1 - Com medo, então?
R - É, com medo de pegar, de pegar o Covid.
P/1 - E me diz uma coisa, vocês, pelo que a senhora me contou, vocês viveram relativamente bem durante esse tempo?
R - Sim, graças a Deus, Deus deu graça. Nos sustentou e sabe, até hoje.
P/1 - E vocês ajudavam as pessoas?
R - Vixi, eu, ajudei, graças a Deus, as pessoas me falam que eu ajudei, nem lembro quase direito. As pessoas falam “você me ajudou sim, naquela época, tal, tal”. Eu não lembro, eu não sei se eu tenho problema de memória, não sei o que é, só sei que eu não lembro não, mas é muita gente que me conta história, sabe? Eu lembro assim, que as pessoas chegavam lá, aquele monte de paninho de prato, crochê, essas coisas, né? Capa de almofada, moço, se você ver o tanto que eu tenho lá ainda, tenho é muito guardado lá, que eu nunca nem usei, que as pessoas “O mulher, eu não tenho nada lá em casa para comer, tenho que comprar, ajuda aqui para mim”. Eu não aguentava não, sabe? Eu comprava, para ajudar a pessoa, comprar mercadoria, aí a pessoa comprava um lanchinho, levava para casa, sabe? Comprei muita coisa sem necessidade, era o que passava lá, era, era uns vasos de cerâmica, era santinho, era um monte de coisa. O que aparecesse meu irmão, porque era difícil você ver a pessoa oferecendo aquilo dali por uma situação de ter filho em casa, você poder ajudar e você não ajudar, é muito triste, sabe? A gente poder ajudar e tem que ajudar.
P/1 - Mesmo sendo evangélica a senhora comprava santo?
R - É, mas nessa época eu não era evangélica não, ainda não, sabe? Não era não.
P/1 - Você lembra de alguém, alguma história específica, que a senhora lembra de ajudar a pessoa, e a senhora ter se sentido bem, e a pessoa ter se levantado?
R - Não lembro, lembro assim que eu emprestava dinheiro para uma pessoa que estava em uma dificuldade, tal, assim, comprar umas coisas, e depois a pessoa me pagava. “Olha, graças a Deus, você me tirou do sufoco, tal...” Lembro, dessas coisas eu lembro. Aí depois me pagou, pagava o dinheiro depois, e tipo assim, alguém está com uma receitinha de remédio, e não tem o dinheiro para comprar, “Ai não. Está bom, vai lá, compra esse”, ligava para o meu amigo da farmácia que nem é mais vivo: “Atende aí, dá um remédio para fulana”. Essas coisas que eu lembro.
P/1 - Você lembra quando chegou aquela empresa...?
R - Colossus? Eita, aquilo ali foi uma mãe para nós. Nós que abrimos a primeira conta, na época o Adonei que era o gerente lá, foi lá, a gente abriu a conta, e foi bom, e a gente vendeu, vendeu, vendeu, foi o que levantou a gente. Era muita coisa, a gente vendia muito, a gente vendia também para o pessoal dos restaurantes, que fornecia comida para o pessoal lá, a gente vendia para o povo, aí a mulher fazia comida, e a gente dava nota fiscal para ela poder receber o dinheiro. Então, vendia comida, vendia material de construção. Menino, aquela época a gente vendeu, vendeu, vendeu, vendeu. Ela não deu prejuízo para nós não, graças a Deus, Colossus.
P/1 - Então, para vocês foi bom? Vocês chegaram a conhecer pessoas da Colossus?
R - Conhecemos gringos, pessoal, conhecemos sim, sabe? Conhecia sim, nós íamos lá dentro, quando via que demorava para resolver alguma coisa, nós íamos lá, eu mais meu velho, o pessoal recebia a gente, conversava, resolvia, fornecia água… Nossa, fornecemos água demais, muita coisa, era serviço demais, homem do céu! Chega eu me lembro, hoje eu ainda.... Era bom ganhar dinheiro, mas era trabalhoso, cê é doido, trabalho demais.
P/1 - A senhora chegou a ir nas escavações, é isso? Lá na porta da empresa, para fornecer mercadoria, é isso?
R - Não, não, porque eles vinham, né? Faziam os pedidos e tal, e eles mesmos levavam, eles mesmo levavam as coisas, não precisava a gente ir lá entregar, era assim.
P/1 - Me conta uma coisa, esses anos todos em Serra Pelada, a senhora observou mudanças na cidade?
R - Agora nessa época?
P/1 - Não, desde que a... Pesando aí de quando a senhora chegou.
R - Vixi, mudou, mudou sim, e está mudando cada dia. Pessoas construindo, essa época não tinha casa quase nenhuma construída, é tanto que a gente nem construiu a nossa, achando que, Serra Pelada aqui era assim, agora que parou mais,“Não, tal tempo vai tirar todo mundo daqui, ninguém vai ficar aqui mais”. Aí foi naquela, tipo assim, nós fizemos nossa casa no mês de julho, aí disse; “Não, em outubro não vai mais ter ninguém aqui, aí para que construir?”. Oh, meu Deus, era para ter construído, não era? Porque o tanto de casa construída que tem lá, um monte de coisa boa, bonita, né? E como mudou, cada dia mudando.
P/1 - Mas, para melhor ou para pior?
R - Para a melhor, para a melhor, com certeza.
P/1 - Por que você acha que para melhor?
R - Ah, porque só em ver aquelas pessoas construindo as casas. Fazendo os seus comércios, renovando, é mudança, aquelas escolas boas. As creches para as crianças, um monte de coisa boa assim, que a Serra Pelada precisava, né?
P/1 - E o que você acha que vai acontecer no futuro aqui em Serra Pelada?
R - Eu acho que vai ficar sempre assim, um monte de emprego trabalhando, empresas entrando de lá, as pessoas, muito emprego, e cada dia as pessoas tendo condições de construir suas casas. E para sobreviverem ali, acho que vai ser sempre melhor, cada dia. Acho assim.
P/1 - E nessa época estava todo mundo indo embora, por que vocês ficaram aqui?
R - A, a gente, nessa época, teve uma época que o pessoal estava comprando as casas todas, botaram um monte de dinheiro na nossa casinha lá, meu velho: “Não, aqui eu vou ficar, vou embora daqui não”. Que teve muita gente que foi embora vendendo as casas. Naquela época, para a empresa, eles botaram um monte de dinheiro na nossa casa, “Não, vamos ficar aqui”. E ficamos, foi melhor.
P/1 - É?
R - Foi, foi sim.
P/1 - E ele não quis sair por que?
R - Não, queria trabalhar ali mesmo, botar o comércio tudo, ir para frente, né? Era melhor para nós, de vez em quando tinha que formar os meninos para dentro do comércio, porque botou tudo particular, não era fácil, faculdade. O tempo todo era mais de mil reais cada um que a gente pagava. Então, se não tivesse o comércio assim não tinha como pagar. As escolas dos meninos.
P/1 - Agora indo para as últimas perguntas para a senhora, me fala, o que é mais importante para você hoje assim?
R - O mais importante é minha família. Graças a Deus, Deus abençoou que tivemos filhos bons, nenhum dá trabalho. A noite nós podemos deitar e ficar tranquilos, sabendo que todo mundo está em casa. Todo mundo quietinho, todo mundo da sua casa para o serviço, então é muito gratificante você ter uma família boa, sabe? É muito bom.
P/1 - E a senhora tem algum sonho hoje?
R - Eu sonho de, estou sonhando aqui de construir uma casa bem bonita aqui, em nome de Jesus. E ver meus meninos todos bem, cada um com suas casas, todo mundo tendo seu emprego, viver dignamente bem. É isso.
P/1 - Tem alguma coisa que a senhora gostaria de falar? Alguma mensagem que a senhora gostaria de deixar para a gente registrada?
R - É que as pessoas procurem sempre andar no caminho do bem. Ter Deus em primeiro lugar na vida. Ser bons, ser honestos. Que em primeiro lugar, você tem que ser honesto, em tudo que você for fazer. E assim, Deus abençoa grandemente cada um.
P/1 - Tem alguma pergunta que eu não fiz que a senhora gostaria de falar alguma coisa?
R - Não, está certo, tudo certo.
P/1 - Como é que foi contar um pouquinho a sua história?
R - Bom, gostei, achei que não ia poder, saber falar, mas tranquilo, né?
P/1 - A senhora falou bastante... Então está certo Dona Baixinha, a senhora quer fazer alguma pergunta? Não?
P/2 - Eu quero fazer a última. A senhora gosta de morar em Serra Pelada?
R - Sim, amo, apaixonada, pense...
P/2 - Por que?
R - Eu não sei, menina, mas eu amo demais. Eu acho bom viver, sair, todo mundo, eu sou muito conhecida. Eu, meu velho, nossa, todo mundo... Dinheiro não tem não, mas conhecimento e nome a gente tem. Então isso é gratificante, isso é bom. Eu acho bom quando as pessoas contam as histórias que eu fiz, de bom que eu fiz, que eu nem lembro. Eu falo para ele, que eu não sei se eu tenho uma memória ruim, eu não sei o que é, eu sei que eu não lembro de muita coisa boa que eu fiz, mas um monte de gente fala que eu fiz, eu falo: “Sério?” “Foi.” Então, isso é bom, e um monte de gente amigo, todo mundo é amigo. E é bom viver em um lugar assim, que você conhece todo mundo, todo mundo te conhece.
P/1 - Como uma família?
R - Como uma família, sim, sim.
P/1 - Então tá, dona Baixinha, muito obrigado, viu?
R - Por nada, obrigada vocês.
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