Projeto Memórias de Serra Pelada
Entrevista de Raimundo Nonato da Silva
Entrevista por Victoria da Silva Conceição e Dedison Carvalho Martins
Serra Pelada,15 de agosto de 2024.
Código da entrevista: MSP_HV016
Transcrito por Bruna Piera
Revisado por Nataniel Torres
P/1 - Ceará, desde já queremos agradecer o senhor por disponibilizar esse tempo aqui para estar conosco, para nos conceder essa entrevista. Para dar início a nossa entrevista, gostaria que o senhor dissesse o seu nome, a sua cidade de nascimento, e a sua data de nascimento?
R - Meu nome é Raimundo Nonato da Silva, e eu sou de 57, de 26, do dia 28 de julho.
P/1 - O senhor nasceu em qual cidade?
R - Eu nasci na Aroeira.
P/1 - Aroeira fica em qual estado?
R - No Ceará.
P/1 - Contaram para o senhor como foi o dia do seu nascimento?
R - Dia do nascimento? Por que? Não sei se me contaram, não.
P/1 - Me conte o nome da sua mãe e do seu pai?
R - O nome do meu pai é Pedro Alexandre da Silva, minha mãe é Maria Elvira da Silva.
P/1 - Me conte qual são o nome dos seus avós?
R - Meus avós eu não tenho muita lembrança, não.
P/1 - Queria que o senhor me contasse como os seus pais se conheceram?
R - A minha mãe? O meu pai trabalhava e conseguiu conhecer a minha mãe, né? Era novinho, ele tanto era novinho como a minha mãe, aí na época minha mãe casou, parece se eu não me engano foi com 16 anos, casou com o meu pai.
P/1 - E o que que seus pais faziam nessa época, seu Ceará?
R - Na época o meu pai trabalhava de roça, lavrador, né? Era a profissão do meu pai era essa. Aí eu fui crescendo e meu pai foi me levando para a roça, trabalhava de roça, está entendendo?
P/1 - Me conte agora qual era o nome do seus avós?
R - Dos meus avós eu não tenho muita lembrança não, mas parece que tem um que é Benaluzia da Silva e D.Raimunda da Silva também.
P/1 - Queria que você me contasse um pouquinho da história dos seus avós.
R - Os meus avós eles...
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Entrevista de Raimundo Nonato da Silva
Entrevista por Victoria da Silva Conceição e Dedison Carvalho Martins
Serra Pelada,15 de agosto de 2024.
Código da entrevista: MSP_HV016
Transcrito por Bruna Piera
Revisado por Nataniel Torres
P/1 - Ceará, desde já queremos agradecer o senhor por disponibilizar esse tempo aqui para estar conosco, para nos conceder essa entrevista. Para dar início a nossa entrevista, gostaria que o senhor dissesse o seu nome, a sua cidade de nascimento, e a sua data de nascimento?
R - Meu nome é Raimundo Nonato da Silva, e eu sou de 57, de 26, do dia 28 de julho.
P/1 - O senhor nasceu em qual cidade?
R - Eu nasci na Aroeira.
P/1 - Aroeira fica em qual estado?
R - No Ceará.
P/1 - Contaram para o senhor como foi o dia do seu nascimento?
R - Dia do nascimento? Por que? Não sei se me contaram, não.
P/1 - Me conte o nome da sua mãe e do seu pai?
R - O nome do meu pai é Pedro Alexandre da Silva, minha mãe é Maria Elvira da Silva.
P/1 - Me conte qual são o nome dos seus avós?
R - Meus avós eu não tenho muita lembrança, não.
P/1 - Queria que o senhor me contasse como os seus pais se conheceram?
R - A minha mãe? O meu pai trabalhava e conseguiu conhecer a minha mãe, né? Era novinho, ele tanto era novinho como a minha mãe, aí na época minha mãe casou, parece se eu não me engano foi com 16 anos, casou com o meu pai.
P/1 - E o que que seus pais faziam nessa época, seu Ceará?
R - Na época o meu pai trabalhava de roça, lavrador, né? Era a profissão do meu pai era essa. Aí eu fui crescendo e meu pai foi me levando para a roça, trabalhava de roça, está entendendo?
P/1 - Me conte agora qual era o nome do seus avós?
R - Dos meus avós eu não tenho muita lembrança não, mas parece que tem um que é Benaluzia da Silva e D.Raimunda da Silva também.
P/1 - Queria que você me contasse um pouquinho da história dos seus avós.
R - Os meus avós eles nasceram também trabalhando de roça, toda a vida de roça, aí ele foi indo e foi indo, e foi indo, aí conseguiu uma área lá e ficou aí na dele aí, e nós trabalhávamos de roça e eles também, todinhos, de roça, nós nascemos na roça.
P/1 - E o senhor era muito apegado mais com a sua mãe ou com o seu pai?
R - Todos os dois. Tanto a minha mãe como o meu pai.
P/1 - O Senhor tem irmãos?
R - Tenho, nós somos 8 irmãos.
P/1 - E o senhor chegou a trabalhar na roça?
R - Muito, trabalhei na roça até quando eu cheguei aqui, quando o garimpo fechou, aí fui obrigado, eu, ir para a roça.
P/2 - Quando senhor, quando tinha contato com os seus irmãos, ou você ainda tem?
R - Não, eu achei a família com 32 anos. Antes disso eu não tinha contato. Com 32 anos minha mulher entrou em contato, aí encontrou minha família.
P/2 - O senhor disse que tem mulher, como vocês se conheceram?
R - Olha, no início quando eu cheguei no garimpo, em Serra Pelada, era, não tinha mulher, de jeito nenhum, aí eu, como eu não tinha mulher, aí eu cheguei pro garimpo, não era? E aí eles me conheciam como Furão, como que é o Furão? Porque não tinha o documento, nós não tínhamos documentos, eu pelo menos não tinha documento, aí eu trabalhava nos barrancos e todo mundo gostava de mim, trabalhador, botava 100 sacos… Todo mundo gostava de mim, só que eu não dormia dentro do barraco do meu patrão, só podia dormir atrás da casa, ele me falou tudinho: “Se a polícia federal chegar, nós vamos dizer que não temos nada a ver com você, mandar você sair daí” E assim ficou, e aí…
P/2 - O senhor conheceu ela antes de entrar aqui em Serra Pelada?
R - Minha mulher? Não, eu só fui conhecer ela quando ela entrou, as mulheres entraram em 86, em 86, elas entraram, aí eu fui conhecendo ela na rua, fui conhecendo, fui conhecendo, fomos namorando, é….
P/1 - Seu Ceará, voltando um pouquinho para sua infância, o senhor lembra dá casa que vocês moravam quando o senhor era criança?
R - No Ceará era casinha de tijolo, de rolinho de barro.
P/1 - Fale mais um pouco sobre essa casa…
R - Quando, a nossa casa, eu me lembro hoje, da data que eu saí de lá, era uma casinha de tijolo, de barro, né? Aí nós morávamos todos dentro dessa casinha lá, aí com o tempo, ela era pequena, quando eu saí, o meu pai fez uma casa grande, eu nunca a vi, meu pai fez uma casa grande, mas eu não cheguei a ver. Aí com o tempo eu vim para cá, não sei…
P/1 - E nessa época, existia TV?
R - Hum?
P/1 - Existia televisão nessa época?
R - Não, não existia nada, nem para gente beber água, era água quente, era um pote, poço de água, né? Tinha um poço de água, na casa do meu pai tinha um poço de água, a gente puxava ela na —, né? Aí enchia os potes ali, botava nas bacias, lavava os pratos, aí nós vivíamos no caneco de alumínio.
P/2 - Quando o senhor era criança o senhor morava perto de tia de tios? Tinha a convivência junto com os seus irmãos e os seus primos?
R - É, nós todos éramos pertinho, tanto os meus tios moravam perto, como o meu avô, nós morávamos na terra do meu avô, que meu avô conseguiu, então minha mãe, meu avô deu esse pedacinho de terra para a minha mãe, e o meu pai fez a casinha de tijolo para nós morar.
P/2 - E o que mais vocês brincavam na infância?
R - Hum?
P/2 - O que o senhor mais brincava na infância?
R - Eu não me lembro que eu brincava não, quando eu já fiquei grande eu já fui para a roça, já chegou a ir para a roça.
P/1 - E nessa época, vocês frequentavam a escola?
R - Não, eu não cheguei a ir a escola. Eu não cheguei a ir a escola, não.
P/1 - Me conte um momento assim, que marcou a sua infância?
R - É, um momento, infância, eu fui crescendo, e aí meu pai foi me levando para a roça, eu não cheguei a ir nas escolas. Quando eu cheguei, eu fui para São Paulo, consegui passar poucos meses na escola, aí com o tempo vai, com o tempo vai, aí ainda consegui ainda uns dias aqui também nos colégios.
P/1 - O senhor falou que foi para São Paulo , certo? Você foi para São Paulo com quem?
R - Fui com um amigo meu, um amigo meu morava em São Paulo, aí falou para o meu pai: “Seu Pedro, deixa eu levar o Raimundo para São Paulo, para ele morar de…” Aí eu cheguei a ir, aí eu até, com o tempo, eu mandei rádio para minha mãe, dinheiro, tudo eu mandei. Quando eu vim para o garimpo, eu esqueci da família.
P/1 - Qual que era a idade que o senhor tinha nessa época que o senhor foi para São Paulo?
R - Eu era novinho, eu não me lembro a idade, mas era bem novinho, era novo. Eu cheguei aqui no garimpo, eu não tinha bigode, vim pegar bigode aqui.
P/1 - Me conte, como que foi, assim, para o senhor, sair de uma cidade pequena no Ceará, e ir para uma cidade grande, com prédios, muita gente, como é que foi essa experiência para o senhor?
R - Bom, São Paulo, né? Quando eu cheguei, aí fiquei lá, meu amigo já era empregado, e tentou conseguir uma vaga para mim, e essa vaga eu passei 2 anos. Com 2 anos entrou um carro de som na rua, para trazer, quem quisesse trabalhar, para vir para a barragem de Tucuruí, naquela data, era, procurasse o hotel lá fulano, lá em São Paulo, e assim eu fiquei agoniado, eu estava ganhando menos, e aqui para a barragem ia ganhar mais. Aí eu pedi as contas, passei 15 dias no hotel lá por conta da Camargo Corrêa, aí da Camargo Corrêa nós chegamos no Tucuruí, naquela balça 12H00 da noite, e aí nós atravessamos, e fomos para o alojamento da empresa, da Camargo Corrêa, passei mais 15 dias sem ir lá no serviço. Aí depois, arrumou tudinho, fiquei trabalhando.
P/2 - Na sua juventude o senhor disse que foi para São Paulo, nessas idas e vindas de São Paulo, você saia muito com seu amigo para conhecer a cidade, alguns locais?
R - Lá em São Paulo eu saí com um ano, eu tinha medo de sair, com um ano um amigo meu levou em um lugar chamado “chaguinha”, local de um chaguinha lá, mas eu não saia só que eu tinha medo, era.
P/1 - Ceará, ainda retornando na sua juventude, qual foi o motivo que você deixou a sua cidade natal e quis vir para São Paulo?
R - Foi assim, porque o meu amigo, ele chegou, ele era muito amigo, ele já tinha ido para São Paulo, aí ele chegou e falou comigo, e falou com o meu pai, aí o meu pai deixou eu ir, né? Aí eu fui.
P/1 - E sua mãe disse o que?
R - Não, a mãe chorou muito, chorou muito, disse: “Olha meu filho, cuidado, tal…” Assim foi.
P/1 - E o senhor, o que o senhor achou?
R - Achei bom, lá, eu sofri lá uns dias, porque quando a gente chega lá assim, sem saber leitura, não é bom não, por isso eu sempre digo para os meus filhos: “Aprendam que seu pai sofreu muito”. Aí, como eu não tinha leitura, porque a leitura é um seguinte, lá tinha vários empregos de garçom, que você ganhava dinheiro, garçom, como eu não tinha, fui lavar prato, está entendendo? É desse jeito.
P/2 -Em São Paulo, depois que o senhor chegou, qual foi o motivo de vocês terem ido para lá mesmo?
R - Para lá? Para São Paulo? Eu fui atrás de uma melhora, né? De uma melhora, mas mesmo assim, quando eu estava lá, eu mandei muita coisa para minha mãe.
P/2 - O senhor conseguiu um emprego por lá, deu orgulho para ela?
R - Dei, mandei dinheiro, mandei rádio, mandei um bocado de coisa para minha mãe.
P/2 - Quando que o senhor começou a estudar? Ou o senhor não chegou a estudar?
R - Eu não estudei, eu fui só mesmo por acaso, lá em São Paulo, eu entrei lá, foi onde eu aprendi a fazer meu nome, mas eu não estudei, não vou falar, não vou falar, não estudei não, aí eu fiz meu nome.
P/1 - Seu Ceará, e nesse período aí, como que era a comunicação com a sua família? Como que o senhor conseguia falar com a sua mãe, com seu pai, com seus irmãos?
P/2 - O senhor usava orelhão, celular de alguém?
R - Era orelhão, aí os amigos que ligavam para mim, próprio meu amigo, pedia uma pessoa para ligar, e entrava em contato com a minha mãe, era direto. Aí eu entrava em contato com a minha mãe direto, e com meu pai, meus irmãos, tudinho.
P/1 - Nesse período que o senhor estava em São Paulo, o senhor arrumou alguma namorada?
R - Rapaz, é o seguinte, na época eu arrumei uma mulher lá, uma coroa, ela tinha 67 anos, eu morava com ela, ela me tirou de lá onde eu trabalhava e eu fiquei com ela, ela tinha uma brasília, ela tinha uma brasília, e ela me tirou do serviço, né? Aí eu fiquei com ela, namorei um bocado de tempo com ela, novinho.
P/1 - Quanto tempo, na faixa de quantos anos o senhor ficou com ela?
R - Rapaz, eu acho que eu namorei assim, 1 ano e 6 meses, por aí assim, aí ela tinha as coisas e eu não tinha nada, ela tinha os filhos e os filhos ficavam reclamando. E aí eu tentei, pedi para ela passar as coisas para o meu nome, ela não quis passar, eu fui e larguei ela e fui embora. Aí me empreguei em outro restaurante lá, quando eu me separei dela, na época era que a Camargo Corrêa estava trazendo o povo para cá, aí eu saí, nesse eu trabalhei 6 meses só, vim direto.
P/1 - Lá em São Paulo o senhor chegou a frequentar festas?
R - Se eu chegava a ir? Cheguei a ir em um tal de “chaguinha”, eu não sei como que é não, “chaguinha”, né? Que tinha lá um uma área de festa lá, “chaguinha” lá, na área de São Paulo, foi isso aí mesmo. Aí eu fui me acostumando, me acostumando, depois eu ia para aquele bairro de Santo Amaro, brincar mais os meus amigos,
P/2 - Na sua juventude, quando o senhor morava lá no Ceará, o senhor costumava sair com seus irmãos à noite?
R - Direto, saia, com os meus tios, meus irmãos. Ainda eu me lembro que eu namorei com uma menina lá, eu não sei a data não, era um de longe, ela aí, eu aqui, e o pai ali, e a mãe daquele lado, aí eu fui indo, namorando com ela, parece se eu não me engano eu namorei 6 meses com ela, parece, ou foi… Aí que eu fui dar um beijo nela e ela me largou, porque não podia.
P/1 - Por quê?
R - Porque eu beijei ela, ela me largou, era de longe, ninguém namorava assim, hoje, como é não. Ela estava desse jeito e eu aqui aí nesse meio tem uma mesa grande, e um farol na lamparina, nessa época, aí eu fui lá e beijei ela, ela não esperava, e no outro dia ela me despachou, que não queria mais eu não.
P/1 - O senhor se sentiu mal?
R - Fiquei assim imaginando, depois eu fui para São Paulo, aí pronto.
P/1 - E ela chegou a ligar para o senhor, algo do tipo assim?
P/2 - Sentir falta do senhor?
R - Não, eu acho que ela ficou muito… Porque ela disse que não podia beijar ela antes de casar, eu era novinho, ela era nova, naquele tempo você não namorava com mulher assim abraçado não, era longe, a mãe de um lado, e o pai do outro, não tinha chance para você, aí foi em uma fuguinha lá, não sei como é que foi, eu levantei, fui lá e beijei ela, aí ela não quis mais eu não, foi, aí pronto, acho que ela já casou já.
P/2 - O senhor tem lembrança dela?
R - Hum?
P/2 - O senhor tem lembrança dela?
R - Não, tenho mais não, ela era bem novinha. Na verdade eu já namorei várias mulheres lá.
P/1 - O senhor lembra o nome dela?
R - Hum?
P/1 - O senhor lembra o nome dela?
R - Não, não lembro mais não, lembro mais não.
P/1 - Agora me conta, o senhor falou que foi com seu amigo para São Paulo, ficar na casa dele, quanto tempo o senhor trabalhou para você poder ir morar sozinho na sua casa?
R - Aí é o seguinte, lá no restaurante que eu trabalhei, o homem gostava muito de mim, e aí tinha um quartinho assim de tijolo, e ele me deu para eu ficar morando lá, você está entendendo? Aí eu trabalhava lá, eu almoçava, jantava, nos horários, aí ia lá, para o quartinho lá que ele me deu. Com o tempo, quando eu fiquei mais, aí eu já fui morar em um lugar chamado “Capão Redondo” em São Paulo, ‘Capão Redondo”.
P/1 - E o senhor foi de que do Ceará para São Paulo? Qual transporte que o senhor usou?
R - Nós fomos de ônibus, nós fomos de ônibus para Fortaleza, de Fortaleza pegamos um direto para São Paulo.
P/1 - Quantos dias?
R - Rapaz, se eu não me engano foram 3 dias, ou foram 4 dias, mas não lembro mais não, era coisa assim, para chegar lá, né?
P/1 - São Paulo foi o primeiro lugar assim, que o senhor foi? Para ficar distante da sua família?
R - Foi, foi, aí de lá eu vim para a Camargo Corrêa, diretamente para Tucuruí do Pará.
P/1 - No tempo que o senhor ficou sabendo da Camargo Corrêa, o que levou o senhor sair de São Paulo e vir para o estado do Pará?
R - Porque lá eu estava ganhando menos, aqui na Camargo Corrêa ia ganhar mais de um salário, era… Não lembro mais não, mas eu sei que era bem mesmo, lá era menos, e aqui, aí eu fiquei doido, pedi as contas. Aí eu fui bater lá no hotel, já fiquei logo, já fichado lá, por conta da firma, passamos 15 dias no hotel almoçando e jantando por conta do patrão lá da Camargo Corrêa, com 15 dias ele encheu o ônibus e viemos diretamente, chegamos 12h00 horas em Tucuruí, na balsa, né? Para atravessar para a cidade de Tucuruí.
P/1 - O senhor estava trabalhando onde nessa época quando o senhor ficou sabendo desse trabalho no estado do Pará?
R - Quando eu vim? Eu estava trabalhando em São Paulo.
P/1 - Em qual local você estava trabalhando em São Paulo, empresa?
R - Lá era um seguinte, lá era um restaurante Borba Gato, um negócio assim aí tem um homem chamado Borba Gato, ele é de frente ao restaurante que eu trabalhava, quando você vem de Santo Amaro para a cidade, né? Quando você desce para cá, Capão Redondo, onde eu tava, depois eu fui morar no Capão Redondo, aí o ônibus está assim escrito “Praça do Correio”.
P/2 -Quando o senhor chegou em São Paulo foi difícil a se adaptar lá por ser uma cidade muito grande, e o senhor sendo do Ceará, de uma cidade pequena ?
R - Foi, quando eu cheguei lá meu amigo já trabalhava em um local lá, e aí ele falou com outro amigo, aí o amigo falou para mim: “eu consegui uma vaga para você, não esquente não, deixe estar que eu vou trabalhando, vou te dando as coisas aí, até chegar a vaga”. Eu passei 90 dias trabalhando para pegar a vaga do cara que ia embora, 90 dias, só almoço, janta e merenda.
P/1 - Como que o senhor ficou sabendo da divulgação que a Camargo Corrêa viria trabalhar aqui no estado do Pará?
R - Tinha um carro anunciando, chamando trabalhador: “para Tucuruí do Pará, é tanto por mês, quem quiser procura o hotel, asim, assim…” Eu já esqueci, faz tempo, né? E assim, assim, aí eu fiquei, eu digo: “Eu vou já já para Tucuruí” Aí eu cheguei no patrão e pedi minhas contas, e aí fiquei lá no hotel, por conta lá da empresa lá, eu ganhava bem, cheguei aqui eu ganhava bem, mais da metade do que eu estava em São Paulo.
P/1 - Quanto que o senhor ganhava nesse trabalho lá em São Paulo?
R - Aí era o seguinte, lá era um salário, parece, né? Era um salário que eu ganhava, aqui eu ia ganhar dois e meio, parece, era uma coisa assim,
P/1 - Quanto que era o salário nessa época?
R - Não lembro.
P/2 - Mas era mais do que é hoje em dia? Porque hoje em dia é 1300.
R - Não, eu acho que não, naquela época, né? O salário, para gente era muito, mas não chegava a essa quantidade… Era um salário, mas era menos.
P/1 - O senhor pediu contas, e o senhor conseguiu fichar lá mesmo em São Paulo para vir para o Pará?
R - Foi, lá mesmo eles pegaram meus documentos todinhos, eu passei para eles, e pronto. Aí quando eu cheguei lá em Tucuruí eu já estava fichado lá, eu já fichei lá. Quando eu saí, que eu pedi as contas, eu pedi as contas, ficou setecentos que eu deixei lá, no banco Itaú, setecentos, quase um milhão, e aí eu deixei lá, por 20 anos eu procurei e não existia mais esse dinheiro lá, mas até hoje, até um dia desses eu tinha comprovante que eu tinha esse dinheiro lá, aí eu falei para —, com 20 anos que eu já estava aqui, 20 anos ou é 25, eu não sei, aí saiu dizendo, aí eu peguei, tentei tirar: “ a Tem muito dinheiro lá.” Aí eu peguei, tentei de todo jeito, não existia mais esse dinheiro lá, foi setecentos, podia ser setecentos mil, eu não sei, até um dia desses eu tinha um documento. Aí tentei de todo jeito, não consegui tirar meu dinheiro, ficou lá no banco Itaú, eu mesmo deixei o dinheiro todinho lá, setecentos mil, na época, né?
P/1 - Aí o senhor fichou na Camargo Corrêa, e o senhor chegou a ligar para sua mãe? Quando o senhor fichou, para vir aqui para o Pará?
R - Falei para minha mãe, liguei direto, eu falei que eu ia para o Pará “meu filho, fica aí” “Não, mãe, eu vou para o Pará, no Pará eu vou ganhar mais, eu vou para o Pará” Aí eu esqueci da minha família,
P/2 - Por isso o senhor foi perdendo o contato?
R - Foi, ficou 38 anos, ou foi 37 anos… Foi que eu entrei em contato, aí eu achei minha família todinha.
P/2 - O senhor já foi lá visitar eles, desde então?
R - Fui não, na realidade eu não fui nenhuma vez não, porque eu fui esquecendo da família, né? Só que eu entro em contato, direto…
P/1 - Como era o trabalho na empresa Camargo Corrêa na construção da barragem? Conta para nós, como foi?
R - Olha, na Camargo Corrêa foi o seguinte, o meu serviço lá era uns negócios, você pegava ele, aí amassava o concreto, que era para jogar dentro do buraco lá, né? E assim, meu trabalho era esse, né? Então, o seguinte, lá eu fui , eu saí de lá, porque quando deu o início do garimpo eu fiquei doido, aí também foi obrigado eu pedir as contas para ir para o garimpo, assim…
P/1 - E qual que era o projeto da Camargo Corrêa lá em Tucuruí?
R - Hum?
P/1 - Qual era o projeto que ela ia executar?
R - Ela ia fazer a barragem, fazer uma barragem, e essa barragem era, era, não era muita gente, afogar, parece, se eu não me engano, 7 dias com 7 diaas, era um negócio assim, não me lembro mais não, faz tempo, era…
P/1 - E o que o senhor fez quando recebeu o primeiro salário, da Camargo Corrêa?
R - A menino, aí eu já estava mais, aí eu fui atrás das primas, né? A menino, toda hora era as primas lá, a gente ia lá pro quatro, lá em Tucuruí, o local lá, das primas lá, se chamava quatro, né? A gente gastava o dinheiro lá, eu era solteiro, gastava o meu dinheiro lá, aí eu chegava lá, diziam: “O Cearazinho chegou” Aí todo mundo bebia mesmo, não estava nem aí não.
P/1 - O senhor recebia só em salário seco, né? Tinha algum outro benefício que a empresa pagava para vocês?
R - Olha, era só, parece se eu não me engano, ela pagava dois salários para mim, ou era, um negócio assim, tudo era bacana. Aí com o tempo eu arrumei uma mulher lá também, uma mulher.
P/2 - Aí o senhor deve ter parado de ir na casa das primas, né Raimundo?
R - Aí foi o seguinte, quando eu arrumei ela, sim, aí quando eu saí, eu vim para cá, eu cheguei lá, eu comprei uma casa, eu dei 300 gramas de ouro em uma casa lá, se ela fosse minha hoje, ela vale no mínimo, hoje, ela vale quatro milhões essa casa lá. Aí nós trabalhamos lá em Tucuruí, trabalhava 7 dias de noite, e 7 eu folgava, era alguma coisa assim, aí que tinha os outros para… Aí os amigos um dia, aí com um ano que eu morei com ela, a mulher ficou diferente comigo, toda diferente, e aí: “O que essa mulher tem? Que ela não era assim”. Aí chegou um irmão dela lá na, aí chegou um irmão dela lá na minha casa, do Maranhão, acho que era do Maranhão, aí quando eu cheguei em casa: “Meu velho, não sei o que foi que meu irmão veio fazer aqui”. Ela falando, aí chegou sem nada, sem roupa, sem rede, aí eu fui lá, eu digo: “Eu vou arrumar um emprego para ele na mesma firma.” Aí eu fui lá em uma loja, comprei sapato, tênis, roupa, camisa, porque lá, antigamente nas casas, hoje, aqui não, a gente entrava na porta e tinha que ter um chinelo aqui, lá na minha casa, né? E uma para você entrar para lá, mas quando você chegava do passeio tinha que deixar aqui, você está entendendo? E aí eu não sei o que foi que aconteceu, depois que esse homem chegou na minha casa, a mulher ficou falando mal de mim, e eu falando: “Mas, mulher o que tu tem, mulher? Tu não era assim e tal”. Até que um dia eu sai de folga, o meu amigo foi olha, quando chegou a janela estava aberta, aí ele disse que viu um cara mordendo o pescoço dela, mordendo o pescoço. Aí ele foi e bateu na porta, aí ela chegou lá, ela foi lá, e ele disse: “Cadê o Bigode de arame?” Eu era conhecido lá como Bigode de arame, aí: “Cadê o bigode de arame?” “Foi lá comprar carne”. Aí ele foi lá me acompanhar, quando ele chegou, ele disse: “Bigode de arame, quem é aquele cara lá que está na sua casa? Ele estava mordendo o pescoço lá da sua mulher lá” “Não moço, é o irmão dela.”E irmão morde pescoço?” Aí, eu fiquei velhaco, meu amigo, eu fiquei olhando rapaz, não é que não era irão dela não, era um gigolô lá com ela. Aí ela ficou brigando comigo, até a comida ficava diferente, sempre ele encostado nela, e eu do lado de cá, ela não encostava. Eu fui para Altamira, saí lá no meio do caminho, não sei a onde era, aí lá eu estava com fome, entrei em uma bananeira lá, e tinha muita banana madura, eu com fome estava comendo, aí o cara foi: “É você que está comendo minhas bananas?” Eu digo: “Não, não sou, não sou eu não, é a fome, mas você fique aqui, converse comigo” Aí eu contei para eles, “se for assim pode comer.” Aí eu comi, enchi a minha barriga, aí fui para Altamira.
P/1 - Você contou para ele o que tinha acontecido?
R - É, eu contei para ele, contei para ele. Aí na realidade, depois peguei uma carona, um madeireiro me levou, eu contei para ele. Mas, não me acharam, se tivessem me achado… Aí eu perdi minha casa, perdi minha casa, não fui mais atrás também não.
P/2 - O senhor ficou em Altamira?
R - Fui, eu trabalhei lá na fazenda mais de tempo, uns 6 meses, 7 meses, entocado lá.
P/1 - E depois que o senhor saiu dessa fazenda, o senhor foi para onde?
R - Eu vim para Serra, para o garimpo. É, vim para o garimpo.
P/1 - Como que o senhor ficou sabendo do garimpo?
R - O garimpo, era saindo direto os garimpeiros indo e voltando, e tal, e aí eu vim bater aqui no garimpo. Quando eu cheguei aqui no garimpo ninguém aceitava um furão dentro do barranco, a receita federal, que era que tomava conta do garimpo, se o dono do barranco deixasse um furão, eu estou dizendo um furão é o seguinte, na realidade eu tenho até lá em casa, era para eu ter trazido para apresentar, mas eu tenho lá em casa, a orelha de anta. Eu sofri demais, saía para fora, mas só vivia por dentro dos matos, aí inventaram um tal de pau de arara, um carro, né? Pau de arara que carregava os garimpeiros, mas só ia dentro se tivesse a orelha de anta, e aí eu não tinha, foi indo, e foi indo, até que eu cheguei e consegui tirar. Aí todo carro que eu via no caminho, que eu via zoando, aí eu entrava no capa bote, tinha vez que eu nem… Com medo, quando eles pegavam a gente, a federal, eles eram, botavam você para trás.
P/1 - O que que era a “orelha de anta?”
R - A orelha de anta era pela receita federal, um papel, “garimpeiro”. A orelha de anta para você, tantos dias para você entrar, aí depois com o tempo eu tirei a carteira de garimpeiro, está tudo lá em casa, guardadinho, né? A carteira de garimpeiro, amarelinha, está tudo lá em casa guardado, orelha de anta, e a carteira amarela.
P/1 - E qual foi sua primeira impressão que o senhor teve, quando chegou em Serra Pelada no primeiro dia?
R - Olha, eu quando eu cheguei no garimpo da Serra Pelada, logo na entrada, tinha um lugar chamado “troca troca”. O “troca, troca” era trocar, era gravador, era só o que tinha, era gravador, bolsa, era aquela multidão, cem mil homens, né? Aí eu cheguei, e fiquei lá, e fiquei sentado em uma loja lá, e assim os garimpeiros viram: “Você é furão” Nós naquele meio, né? Falando que eu era furão, aí eu fiquei assim, eu não sabia o que era furão, né? Aí eu sentei lá, do jeito que eu estou aqui, botei o chapéu aqui, e aí esse chapéu encheu de dinheiro, os garimpeiros não tinham dó de dar nada para ninguém. “E aí pessoal, olha aqui, você é da onde?” “Eu sou cearense" “E aqui, não conhece dinheiro não?” E aí eles encheram chapéu de dinheiro, e as notas que eu não conhecia, eu dizia: “Essa aí eu não quero não, essa aí eu não quero não.” “E garimpeiro, nós vamos trocar os dinheiros todinhos, dá o dinheiro que ele conhece” Moço, mas vou dizer, rapaz, mas foi ligeiro, eu enchi o chapéu de dinheiro, garimpeiro era coisa boa, não tinha dó de dar nada para ninguém. E assim eu fui levando a vida, eu fui, né? Peguei esse dinheiro, fui para o Marabá. Aí quando eu voltei, fui trabalhar, mas aí não aceitava porque eu não tinha nem a orelha de anta, nem a carteira amarela. Aí eu desci com um saco de chinelo, por lá o seguinte, na época, eu trabalhava com o pé descalço, chinelo era aqui, chinelo era carregando saco no ombro, assim. Eu cheguei para caçar o serviço, cheguei em uma sacaria de saco branco, e aí um homem me conheceu, tinha um sentado no banquinho assim, no meio, recebendo uns cascalhos lá, aí ele falou: “Você é furão, né?” Eu digo: “ O que é furão?” “Furão, assim, do garimpo.” Eu digo: “É a primeira vez que eu estou vindo.” “Você já conhece ouro?” Eu digo: “Não senhor, nunca vi..” “Pois, você meta as mãos aí” Eu meti uma mão, rapaz tudo pelo meio só de pedaço de ouro, mas eu não sabia, eu sabia porque eles falaram, quando eu peguei um pedaço, rapaz, rapaz, era pesado, desse tamanho o pedaço de ouro. Nesse tempo ninguém pegava nada dos outros, eles só recebendo e olhando os sacos de areia todinhos, e arrumou um serviço para mim no garimpo. Onde eu trabalhei todo mundo gostava de mim, mas de noite eu não podia dormir dentro do barranco, dormia beirando.
P/2 - Quando o senhor conheceu o ouro pela primeira vez, o senhor já estava dizendo que era furão, alguém te ensinou a trabalhar, ou fica olhando os outros, “ah, é assim que funciona, a é dessa forma”?
R - Na realidade, os caras lá fizeram a armação, como é que se botava o saco, como era que amarrava, isso aí eu não sabia, né? Então, eles subiam todos de… Que chama? Os kichute, né? E eu com os pés descalços. Subia as escadas, tinha uma escada que subia de barranco, a “Malvina” e a “Adeus mamãe”, na “Adeus mamãe”. Eu escapulí, mas era tanta gente, os caras me seguraram, me seguraram, se não eu tinha ido de viagem, que era longe, era alta, lá da pedra preta, né? Foi.
P/1 - E o senhor chegou a pegar ouro?
R - Olha, eu na realidade, eu não peguei ouro assim, para bamburrar não, mas eu peguei muito ourinho, dava para eu fazer a minha vida, mas aí, era, as primas que me acabaram, rapaz. Se não fosse as primas, eu poderia ter alguma coisa. Aí o que foi que eu fiz? Eu ia lá para o quarto, lá para —, gastava o dinheiro todinho lá.
P/1 - O que eu era as primas, que o senhor fala?
R - As primas são as mulheres, né? Que comem o dinheiro da gente. Eu solteiro, não tinha mulher, sozinho, igual menino novo.
P/2 - O senhor falou uma palavra muito interessante, que me chamou atenção, o que que era bamburrar?
R - Bamburrar era o seguinte, era o que pegava muito ouro, se você pegasse 100 kg, 2 kg, aí chamava você de bamburrar. Mas, eu só pegava 100 gramas, 200, até 300, 500, mas tudo que eu já peguei eu gastava tudo.
P/2 - Com as primas?
R - Com as primas, eram as primas que tomavam nosso dinheiro.
P/1 - Aí o senhor pegava esse ouro, e ia para onde as primas, onde que o senhor encontrava essas primas?
R - Era, lá em Tucuruí, eu brincava lá, em um local que chama “forró e água”, é um negócio assim, “quatro bocas”, eu não me lembro mais não, era lá que era o lugar das primas lá. Quando eu chegava lá e dizia: “Olha rapaz, o Cearazinho garimpeiro chegou” Aí pronto, todas as mulheres para cima, sabiam que eu era, pegava tudo, né? Às vezes apresentava a conta, que às vezes eu não tinha gastado, mas eu tinha que pagar.
P/1 - E o senhor ia de que para Tucuruí?
R - Ah não, ia de carro, ia de carro direto.
P/1 - Nessa época, aqui em Serra Pelada, tinha algum aeroporto pequeno?
R - Tinha, na realidade, o primeiro aeroporto foi feito lá na Currutela lá, na Currutela lá, o avião baixava lá, está entendendo? E dali ele levantava, dali ele ia embora, com o tempo, fizeram outro para cá, para baixar, que hoje terminou.
P/1 - O senhor chegou a andar de avião?
R - Andei de avião, mas é bom de avião, não é ruim não, se você não tiver um acidente é bom demais.
P/1 - O senhor ia para onde de avião?
R - De avião eu fui direto para Tucumã, lá em Tucumã, no Rio Branco, quando fechava o garimpo eu ia para lá. Aí lá eu peguei uma malaria lá, lá no Rio Branco, mas lá tinha ouro também, eu peguei muito ouro lá, aí eu peguei uma malaria lá, porque lá é uma área de índio, índio. E lá o cara me ensinou lá: “Olha, no garimpo, não olhe para as índias, ninguém pode olhar não” Eu digo: “Muito bem, pode deixar.” Meu patrão falava: “Não pode falar nada para as índias não, eles amarram você e olha –...” Aí, eu sempre velhaco, aí eu peguei essa malharia, e um índio lá foi e me botou no avião para Tucumã, aí eu cheguei no garimpo aqui, que eu já morava aqui mesmo, sozinho, nesse tempo eu não tinha mulher. Aí peguei essa malaria, deu trabalho para eu ficar bom. Aí um velhinho me ensinou, eu estava na frente do Fogoió lá, fui indo lá, e aí um velho me falou: “ O que você está tendo? É malaria?” eu digo: “É rapaz, eu não fico bom não.” “Vou lhe ensinar o remédio, você pega pimentas do reino, e dente de alho, e esprema dois limões dentro, e misture bem, nunca mais ela vai vir, fca bebendo”. Rapaz, até hoje, nunca mais eu peguei malharia na minha vida, o velho me ensinou, já morreu ele.
P/1 - E no garimpo Ceará, no garimpo de Serra Pelada,o senhor frequentava festas? Existiam festas nessa época?
R - Era, antigamente, aí, inventaram outro local aqui na época… 86 entrou as mulheres para cá, aí inventaram outras primas para cá, que desse entorno ali, mais ou menos aqui, era um, tipo um cabaré da mulheres, né? Aí pronto, eu fiquei aí, gastava o dinheiro para lá, tinha bar, tinha tudo, muita mulher, aí fiquei por aí. Aí eu só vinha de manhã, que eu tinha medo de vir de noite aqui, era longe, que era por ali, “brega, brega” Era para esse lado aí, e aí assim eu fui levando. Aí em 86 entraram as mulheres para Serra Pelada, e aí eu consegui arrumar uma mulher, em 86, nós nos conhecemos trabalhando.
P/2 - Você conheceu ela em que lugar aqui da Serra? Ela trabalhava em que aqui?
R - Quando eu conheci ela, aí quando teve uma data aí, que o garimpo fechou, aí eu fui trabalhar no carro do lixo, dos comerciantes da Serra Pelada. Aí nesse, eu trabalhando, no carro do lixo, ela se separou do marido, mas ela já estava separada, eu não conhecia ela antes dela largar o marido não. Ela largou o marido dela, e aí tinha um forró da velha, né? Aqui que era o armazém do Piauí era o forró da velha, a nossa, liberado tudo, era tudo liberado, nós não pagávamos não, eles liberavam para nós, que nós pegávamos o lixo, tudo bem. Aí nós chegamos e se conhecer, eu conheci essa mulher, e nós fomos indo, e até hoje, graças a Deus, eu sou casado com ela.
P/1 - E qual é o nome dela?
R - Rauzilda.
P/1 - O senhor tem filhos com ela?
R - Tenho, 4 filhos, moram dois em Imperatriz, e tem um rapaz aqui, e o outro aqui. Aí a outra, tem dois netinhos aí, que eu que crio, está comigo aí, aí nós temos uma, quando eu peguei minha mulher, ela já tinha uma mocinha lá, ela mora em Jacundá, eu que criei.
P/2 - Qual o nome dos seus filhos?
R - Alguns nomes, se chamam Jaise, Jael, Felipe, esses aí.
P/1 - E o senhor falou que trabalhou no garimpo, foi tranquilo, trabalhou no carro do lixo.
R - Foi, tudo eu já fiz.
P/1 - E o senhor fazia mais outra função aqui? O senhor trabalhava de outra coisa aqui na comunidade?
R - Não, aí era o seguinte, quando eu fui, foi fechando o garimpo, eu fui levando, e aí foi fechando o garimpo, e aí eu comecei a inventar outro meio de vida. Sempre trabalhando de lavrador de roça, e aí eu fui puxar, trabalhando levando as frutas para fora, né?
P/1 - O senhor falou, em questão de fechar o garimpo, como que é esse “fechar o garimpo”?
R - Fechar o garimpo foi o seguinte, porque quando fechou o garimpo, nós não tínhamos mais direito de trabalhar, assim, alguém foi lá dentro do garimpo, o britador que secava a água para nós trabalharmos, que era para nós ficarmos sequinhos, alguém foi lá nas dragas e botaram açúcar e sal, os cabos… Para nós não trabalharmos mais, aí nunca mais nós conseguimos trabalhar.
P/1 - E como é que era esse trabalho aqui no garimpo? Era só vocês garimpeiros? Tinha polícia na época?
R - Tinha a federal, chegou a ter a federal, e aí era a receita federal que comandava. Aí com o tempo, chegou o Major Curió, né? Major Curió, e o Major Curió, ele veio com uma, lá do governo federal, para ficar no meio dos garimpeiros, que disseram que só ele fazia parte dos garimpeiros, e aí ele veio e fez mesmo a parte dos garimpeiros. Só que nós, aqui na Serra, nós eramos todos armados, sabe? No começo do garimpo todos eram armados. Eu mesmo tinha dois revólveres, um na cintura e um de trás. Você embarcava os barrancos aí, era grota, achando outro nas grotas, jogava o ouro no mato, ninguém mexia com a gente, todos armados, cada um tinha suas armas. E com o tempo, o Major Curió, inventou uma ideia, recolhendo as armas lá para a receita federal, para registrar essas armas para nós, e aí todo mundo entregou as armas, entregamos as armas, eu sei que deu sacos e sacos de armas. E aí nesse negócio aí, foi que aconteceu, que ele nunca mais, ele entregou as nossas armas.
P/1 - O senhor entregou a suas duas armas?
R - Entreguei, todo mundo, não fui só eu não, todos os garimpeiros entregaram as armas na receita federal.
P/1 - Por quê?
R - Porque o Major Curió pediu, dizendo que ia registrar as nossas armas, e aí nós confiamos. Todos os garimpeiros, entregamos as armas, ele levou lá para a receita federal, que tinha a receita federal que comandava, mas o resto da área se chama Major Curió.
P/1 - Quem era Major Curió?
R - O Major Curió, ele foi presidente da cooperativa, e depois ele saiu, nos abandonou, e foi para deputado federal. Nós votamos nele, que eu também votei nele, né? Aí quando ele venceu o mandato, ele correu de novo para cá, para ser o presidente da COOMIGASP, e aí vai indo, vai indo, e vai indo, ele chegou a ser o prefeito de Curionópolis, por dois mandatos. Aí, antes de vencer os mandatos ele foi cassado por 7 meses.
P/1 - E o senhor tinha alguma intimidade com o Curió?
R - É, com o tempo eu virei do lado do Curió, na realidade não era só eu, vários amigos, e aí o Major Curió, que era o presidente da COOMIGASP, ele, a casa dele, que era lá onde é a dona Márcia, né? Lá tinha uma água limpinha. Na realidade eu era segurança dele, eu era segurança do Major Curió, era eu, o finado Maranhão, Chico da Telepará, né? E aí tinha um rapaz que chamava Goiano também, que ele já faleceu, lá para,negócio de um mato aí, não sei qual foi o lugar, já faleceu, né? E aí é o seguinte, o Major Curió, chegou aqui na Serra e disse para nós, nós não aceitávamos a Vale do Rio doce aqui dentro do garimpo, não aceitávamos, os garimpeiros não aceitavam. Aí o Major Curió falou: “Olha, quando a gente não pode com o inimigo se aliar” Aí: “Nós não aceitamos, nós não aceitamos” Aí: “Pois, se vocês não aceitarem eu vou renunciar o cargo de presidente”. Aí nós começamos a chorar - “Nós não podemos fazer isso, Major Curió.” Todo mundo chorando: “Nós não podemos fazer isso, Major Curió, e nós queremos o senhor, não —- não.“ Aí deixava… “Não, nós vamos aceitar.” Aí até hoje, né? Nós estamos aí, isso aí eu estou ligado, nos assuntos, quando a gente não vence um inimigo, tem que se aliar a ele.
P/1 - O senhor falou que era segurança do Curió…
R - Era, na realidade eu era…
P/1 - Era segurança dele somente na cooperativa ou o senhor acompanhava ele para onde ele ia?
R - Acompanhava, eu era entregador dele, ele trabalhava assim, porque o Curió é o seguinte, se ele, se apresentasse ele, e ele botasse o olho em você, podia passar 10 anos, mas ele lhe conhecia. Eu que era tipo o segurança assim, para vigiar ele “Olha Major Curió, esse homem aqui tem raiva do senhor, tem raiva de você” Aí com olho, ele nunca mais, pode passar onde passar, ele conhece, ele conhecia, o Major Curió.
P/1 - Então você era o cara que fazia o trabalho investigativo para o Curió?
R - É, na realidade, quando o Curió, o Major Curió, né? Que ele já morreu, faleceu, que Deus bote ele em um bom lugar, ele já morreu, faleceu. Eu era o segurança dele, dele tomar o banho, da água dele, lá na casa dele, tinha uma aguinha lá, onde era a casa da Márcia. Não sei se acabaram com aquela água, né? Limpinha, só que o Major Curió, como ele era do exército, ele foi estudar, não sei, ele, banhar, com as cuecas, dentro da grutinha lá, ela só molhava quando estava lá, quando saia era enxuto, mas ele nunca, ele banhava com a cabeça lá, sempre ele banhava com os olhos do lado de fora, porque ele parece que não confiava bem na gente, mas mesmo assim ele não confiava na gente não.
P/1 - E o senhor, assim, como segurança do Curió, o senhor já chegou a bater em alguém, na época?
R - Olha, isso aí a gente, sabe como é que é, acho que eu não me lembro mais não, isso é outra coisa que a gente, acho que eu… Eu era o homem da confiança dele, era eu, finado Maranhão.
P/2 - O senhor recebia para estar junto dele? Ser segurança dele?
R - Não, nós trabalhávamos de graça, nós não recebíamos nada não, aí na época os meus meninos passando necessidade, com fome, passando muita fome, viu. E aí, eu só vigiando, nem a mulher não me queria mais, porque eu estava vigiando lá, e a minha menina mais velha, que mora em Imperatriz hoje em dia, chorando com fome. Aí eu cheguei lá na casa do Major Curió, e como eu era segurança dele, aí eu falei para ele, na hora que ele foi banhar lá, porque ele banhava, mas ele não botava a cara igual a gente não, ele ficava sempre de olho na gente. Aí, eu pedi uma ajuda para ele, uma ajuda para ele, que era para eu dar de comer, ele respondeu para mim: “Garimpeiro não pede nada a ninguém”. Aí desse dia, que ele falou isso para mim, eu saquei de fora dele, aí ficou o Chico do Telepará, e quem quiser pode ir lá procurar o Chico que ele conta a mesma história. E aquele, né? Aí tem aquele rapaz que era junto com a Aracila, que eu não sei, que é o filho do Chico, eu não sei qual foi o problema que deu, que a mulher do chico caiu lá no cimento, com o menino sozinho, correu para lá, para chamar o pai dele lá, chegou lá, chamou, aí o finado Maranhão disse; “Não, não pode entrar aqui não, o que que é?” “Não, é que a mamãe adoeceu, está lá no chão lá morrendo” Aí chama… “Pois, fica aí que eu vou chamar.” Aí o Maranhão foi lá, o finado Maranhão foi lá e chamou o Chico, aí o Chico falou: “Major Curió, eu vou lá em casa, volto nesse instante, vou ver, porque disse que a minha mulher está doente, eu vou lá” Quando ele viu a condição da mulher, que ele chegou lá, o Major Curió estava na janela, eu estava de lado, aí ele correu para lá, para o rumo de onde estava o Curió, e eu estou lá, vigiando ele, aí ele foi e disse: “Major Curió, eu vim aqui, me ajude, me de um negócio para eu levar a minha mulher, minha morre…” “Cuide da sua mulher que eu cuido da minha” Pode procurar o Chico aí, ele está aí para dizer, mas assim, eu não estou falando mal dele, eu estou falando o que aconteceu. A minha mulher quase me larga, rapaz, eu não queria mais trabalhar não, aí, por isso eu sai fora, eu falei para o Chico: “Chico, eu não vou mais vigiar esse homem aqui mais não, ele é muito ruim, o coração dele”, aí o Chico: “Nós estamos aqui para vigiar o homem não é por dinheiro não, é obrigação nossa.” Aí eu sai fora e ele ficou lá, aí foi o que fez com ele. Deus que bote ele em um bom lugar, que ele era o comandante aí, né? Geral.
P/1 - E assim Ceará, você falou que ele era o presidente da cooperativa?
R - Era.
P/1 - Houve alguma tentativa de invasão da cooperativa, para alguém tomar a cooperativa na época que ele era presidente?
R - Nós não entregávamos não, nós não entregávamos, era. Na época era o Pedro Conceição, era o Lotero, era Joaquim, tudo éramos nós, e aí chegou uma ordem aí, o Curió estava em Brasília, o Curió estava lá em Brasília, o mais valente era eu. Nós não entregávamos a cooperativa, porque nós éramos do lado do Curió, e nós não abrimos. Aí chegou um cabra aí com, parece receber a cooperativa, que chamava Pedro Bernardino, nós não entregamos, cada um com um pau, tudo, e fomos. Aí chegou um judicial, com uma liminar para nós entregarmos, e nós falamos: “Você cai fora daqui, que você entra no pau, aqui nós não entregamos a cooperativa para ninguém não, pode cair fora daqui” Aí eles ficaram com medo, e tinha um advogado também no meio, aí eles ficaram com medo, aí, nós cada um com um cacete, ficaram com medo. E o que aconteceu, que o judicial foi embora para Curionópolis, você está entendo? E aí nós ficamos, todos valentes, nós não entregamos mesmo não. Aí rapaz, você me acredita, que quando foi de tarde, de manhã cedo, de manhã cedo, do outro dia, meu amigo, chegou um monte de polícia, aí nós com pau fechamos, cada um com um pedaço de pau. E aí, meu amigo, podia dar o que quisesse que nós não entregaremos, muito bem, era o Camelo, Camelinho, já morreu também, que Deus bote ele em um bom lugar, né? Era meu amigo também, nosso companheiro, já morreu, Pedra Preta, eram todos meus amigos, garimpeiros sofredores, todos já… O Chico —, era amigo da gente também, já morreu, que Deus bote ele em um bom lugar, né? E aí é o seguinte, e aí foi o que aconteceu, tudo isso aí. Aí o homem chegou, desceu um comandante sozinho, estrela aqui, estrela aqui, aí desceu, olhou para nós todinhos, olhou, todinhos, aí foi lá, e disse para a negada, acho que ele disse assim: “Deixa que eu tiro os homens sozinho”. Rapaz, meu amigo, quando esse homem desceu, quando esse homem desceu: “Quem é o valentão daqui?” Pa, pa… Meu amigo, não ficou um para remédio, eu fui escapar, o Camelinho caiu dentro de uma lama, de um buraco, dentro de uma lama, não ficou um para remédio, Verardino tomou conta da cooperativa, você está entendendo? Tomou conta, rapaz, aí nós ficamos aí, rapaz, foi gente demais. Nós tínhamos mais de 500, 600 garimpeiros correndo, só um soldado, os outros não desceram não, só um, botou nós para corrermos, foi.
P/1 - Ceará, por que o Curió, figura do Curió, era tão importante para o garimpeiro?
R - É, porque é o seguinte, ele era,ele era, ele foi tipo um interventor do governo federal, decretou a lei, para ele vir tomar, escolheram ele, porque só ele que poderia desarmar os garimpeiros, outros não desarmavam, e ele disse lá, lá para o governo federal que ele desarmava os garimpeiros, e desarmou. Aí pegou nossas armas todinhas, ninguém roubava nada de ninguém aqui não, para arrancar ali na —, nós baixavámos na Grota. E aí eu mesmo tinha dois revólveres, um na cintura e outro por de trás, quando era de noite a bala comia.
P/1 - E Ceará, você falou que o Curió veio aqui, colocou ordem no lugar…
R - Foi…
P/1 - Mas, eu gostaria de saber quais os benefícios que ele trouxe para Serra Pelada, para o garimpeiro?
R - O que o Curió trouxe para os garimpeiros, nós, eu analisando, o que ele trouxe aqui para nós. Na realidade ele não trouxe nada, aqui para os garimpeiros, ele veio como um gestor, para fazer essa dimensão, nos desarmar,e desarmou, todo mundo, dizendo que ia levar para registar nossas armas, e nunca entregou. Só que os garimpeiros gostavam dele demais, está entendendo, né? Tinha ordem, no tempo dele tinha ordem, mas mesmo assim, se a gente for analisar, o Major Curió, com todo respeito a ele, não trouxe nada para garimpeiro. A única coisa que ele trouxe, que brigou, conseguiu, um documento. O governo federal deu um documento para cooperativa, que todo mundo sabe, aí negociaram com uma empresa aí, o garimpo, né? Dizendo para nós ficarmos com 25%. O documento veio, pagar para nós, o governo federal deu o documento, lá no escritório da Colossus lá, entregou para quem era o presidente da COOMIGASP. E aí depois inventaram uma assembleia, nos deixando com 25%, mas passaram o documento para a empresa, e aí enquanto não derrubar esse documento, não…
P/1 - Mas nessa época, que o Curió estava aqui, tinha banco aqui? Algo do tipo…
R - Tinha banco, tinha um banco, tinha a Caixa Econômica, tudo tinha, aliás o banco Bamerindus, era o banco que tinha aqui, não sei nem falar direito, mas tinha um banco Bamerindus. O pacote aí, era os garimpeiros, que eram os pacotes aí, eu mesmo conheci um amigo meu que chamava Simão, ele comprou uma f1000 zerada logo no ínicio, o barranco dele deu muito ouro, aí um dia eu estou lá no, ele saiu foi com uns bolos de dinheiro na camisa, não é todo mundo que conhece o Simão, mas eu conheci ele. Ele até morreu ali encostado em um cavalheiro ali, aquele ali, não tinha nada, enricou dentro de um segundo, quando ele chegou lá no Maranhão rico a negadinha: “Onde esse homem arranjou dinheiro”. Garimpo, aí ficou rico, mas ele já morreu.
P/1 -E vocês pegavam ouro, vocês vendiam esse ouro onde?
R - Olha, na época, eu não tinha a carteira para vender o ouro, os garimpeiros que vendiam para mim, está entendendo? Na Caixa Econômica, trocava o dinheiro. Na realidade, tem muitos garimpeiros que deixou conta na Caixa Econômica, e não apresenta mais esse dinheiro, igual o meu que eu deixei lá em São Paulo, setecentos mil, né? Que até um dia desses eu tinha esse documento, eu procurei, aí disseram que não existe mais lá esse dinheiro, mas um dia eu vou lá atrás desse dinheiro, porque esse dinheiro tem que existir. Está com 40, quase 35 anos, esse dinheiro que eu deixei lá. Se eu fosse, o governo me pagasse meu dinheiro que eu botei lá no banco Itaú, lá em São Paulo, eu era um homem tranquilo, deixei esse dinheiro lá. Aí entrou aquele outro presidente, aquele, foi o presidente que comeu, Collor de Mello, não sei, comeu meu dinheiro, Collor de Mello, ele era o presidente na época, né?
P/1 - Assim, outra pergunta, quando foi que fechou o garimpo aqui, definitivamente?
R - Ele foi fechando em 86, não, 86 não, aí foi fechando, de 86, nós ainda trabalhávamos bem, para frente que começou a fechar. Aí fechou o garimpo, né? Aí voltou essa empresa, Colossus, depois que fechou o garimpo, a Colossus, veio aí, veio um gestor do governo federal, acho que na época era o presidente Lula, que era o presidente, e deu o documento para a cooperativa, e aí negociaram com a cooperativa, deixando 25% para os garimpeiros. A presidência fez uma assembleia, os garimpeiros assinaram, na lei hoje, continua os 25%, só que o documento não está com a COOMIGASP, está com a Colossus, a empresa que ele passou, nós sabemos de tudo. Agora tem garimpeiro que quando a gente fala a verdade, fica zangado com a gente, todo mundo sabe, que a COOMIGASP passou um documento para uma empresa, que eu nem sei como que é o nome, SSTM, sei lá, ela que temo documento. Que a mulher que estava no cargo aí, eu ouvi ela dizendo que este documento estava dando trabalho para derrubar, aí eu não sei.
P/1 - No caso, o senhor fala a Colossus? Era essa empresa que o senhor fala?
R - Eu não sei, a Colossus era a que estava fazendo o túnel, né? E quando chegava o ouro ela botava o concreto lá, lá ela fez 8 frentes de ouro lá, mas ela botava o concreto. Aí eu acredito que o que ela ia achando no bolo ela levava, né? Acredito que ela levava, mas ela não tirou o ouro da Serra Não, o ouro está todinho com concreto lá, o ouro né?
P/1 - Aí o garimpo fechou, e o senhor, como é que o senhor fez para sobreviver?
R - Aí foi o que eu fiz, aí eu peguei, carregar abacate, limão, jaca, tudo por 100. Graças a deus hoje eu trabalho lá no 100, agradeço muito lá no 100, todos os moradores do 100, graças a Deus, eu saio daí, saio empurrando o carrinho de mão, boto jaca, corante, limão, abacate, as coisas assim, eu passando, tranquilidade, graças a Deus, é um lugar muito bom.
P/1 - Então, o senhor passou a sobreviver da agricultura?
R - É verdade.
P/1 - E assim, seu Ceará, sabemos que nós passamos aí, dois anos muito difíceis, né? De pandemia, e o senhor, pelo que o senhor está falando, o senhor levava esse produto para feira, né? E como que era, vender esse produto na feira, em um local que não podia ter aglomeração de pessoas?
R - Pois é, lá é o seguinte, a feira lá, eu fui para a feira lá, aí hoje lá tem mesa, tem carrinho de mão, tenho tudo lá. aí olha, eu estou indo dois domingos, porque eu estou pondo Urucui aí, e não estou podendo ir, mas graças a Deus quando eu vou, logo eu chego lá eu vendo tudo, tudo que eu levo, graças ao bom Deus eu vendo tudinho lá no Eldorado — para lugar nenhum.
P/2 - Durante esses dois anos de pandemia que a gente viveu, foi decretado que a gente não poderia sair de casa, como foi isso para o senhor? Saber que não poderia sair de dentro de casa?
R - Lá nós usamos máscaras, na época desse negócio aí, nós usamos máscara.
P/2 - Aí não ´podia trabalhar, o senhor ficou como?
R - É, aí eu peguei ela, mas tinha gente, olha, quando eu peguei ela, tinha gente… Os meus amigos afastaram da minha casa, passavam por longe, pelo pé da cerca para não passar na minha casa. Tiveram umas pessoas que disseram para a minha mulher, para tirar eu de dentro da casa e botar em outra casa, e a minha velha respondeu para mulher: “Não, meu velho, se ele morrer eu morro junto com ele, mas vou ficar com meu velho olhando ele.” Só teve uma pessoa que teve coragem de ir lá olhar eu, com a com a —, duas pessoas, só tiveram essas duas pessoas, que tiveram coragem de ir, um foi o Neguinho das meninas, um que faz jogo do bicho, e o outro foi a mulher do seu New aqui, ela foi lá, e me deu remédio. Só que é o seguinte, eu consegui o remédio com o dr, eu não fiquei bom com o remédio do doutor, eu consegui com o remédio que uma mulher me ensinou, que era a mulher do seu Carlinho, melhor remédio, como é o nome da sua mulher? Regina, ela me ensinou, e eu fiquei bom, e eu curei foi muita gente aí ó, aí pronto, escapei.
P/1 - O senhor pode falar para nós qual é esse remédio?
R - O remédio é o seguinte, o remédio é 51, né? E a castanha do caju, é a que dá conta. Eu larguei de tomar o remédio do doutor que eu estava para morrer, fiquei bonzinho e ainda curei muita gente, chegou foi gente lá em casa morrendo a míngua, e eu dei o remédio e ficou bom, levantou. E a negada não ia mais na minha casa não, com medo de morrer. E outra coisa, nenhum dos meus filhos, e minha mulher pegaram
P/2 - Nesse tempo a gente usa muita tecnologia, o senhor teve contato com celular, alguma coisa do tipo? Ou ficava só…
R - Não, eu não sei mexer com celular não, a minha velha que mexe para mim, eu não sei mexer não, eu não tenho, nem celular eu não tenho.
P/1 - E o senhor tem casa própria, seu Ceará?
R - Tenho, graças a Deus, tenho a minha casa, na realidade eu tenho duas casas, né? Eu tenho uma que está alugada, para uma senhora lá direita. todo mês ela paga, e eu falei para ela: “Dona, é o seguinte, quando eu alugo a minha casa nem aqui eu não venho, você que toma conta, você que é a dona, no dia que a senhora não quiser a senhora chega e fala”. Graças a Deus todos os mesinho ela paga, é pouquinho, mas dá para eu e a velha irmos levando
P/1 - O senhor sobrevive da agricultura até hoje?
R - É, a de roça, e vendendo verdura.
P/1 - Certo, e a sua mulher, o que ela faz?
R - A minha mulher fica tomando conta das cozinhas dela, eu piso em um corante, ela peneira, né? E assim eu vou levando a vida com ela, mas eu sempre digo para os meus companheiros, meus amigos, se chegar hoje uma mulher bem novinha, 16 anos, para eu trocar na minha velha, e me dando voto eu ainda não quero.
P/1 - Por que?
R - Porque a minha velha é uma mulher que, mais morena, que nós gostamos, eu, para mim ela é verdadeira com o velhinho dela, e eu também. A minha mulher é uma senhora de verdade, graças a Deus. Já tem 30 anos ou é mais que eu sou casado com ela, e eu não estou arrependido, criei meus filhos sofrendo, trabalhando de roça, mas criei tudinho, está tudo criado.
P/2 - O senhor tem algum sonho para realizar ainda?
R - A história que eu tenho, é assim, porque a… O negócio da cooperativa, a cooperativa, ela, existe um documento, hoje, eles estão pelejando para ver se conseguem esse documento. Porque é o seguinte, se a cooperativa tivesse botado no caminho de resolver o problema da Serra Pelada para os garimpeiros, nós tínhamos resolvido, porque nós temos garimpeiros aqui dentro da Serra Pelada, se disser assim que é para arrebentar o garimpo, nós arrebentamos e tira o ouro. Nós não precisamos de governo não, para tirar o ouro da Serra Pelada não, aqui tem garimpeiro aqui, homens que tem condições, tem 10 máquinas, duas máquinas, nós cercamos e tiramos o ouro, mas aí os caras não dão o documento. O governo não quer aceitar nós trabalharmos, porque se o governo chegasse bem aqui e dissesse aqui hoje, para nós aqui, hoje: “Você quer ir embora da Serra ou quer o garimpo rebaixado?” Pois, eu queria o garimpo rebaixado, porque eu sei o que tem lá dentro, viu? Mas, aí, os garimpeiros, vem um grupo de garimpeiro aí para negociar, para tirar ouro e dar os 25% para nós, e a cooperativa não aceitou, não sei qual é o problema, se não tem os documentos, eu sei quem tem é uma tal de SPN, e aí eles estão pelejando para derrubar, mas que até agora não derrubou, aí enquanto não derrubar esse documento. Só que nós temos garimpeiros, dentro daqui, que tem coragem de tirar o ouro todinho e dar a nossa parte, você está entendendo? Aí os garimpeiros ficam com negócio de cooperativa, nós tínhamos é que arrumar os garimpeiros, se tem uns garimpeiros aí, aí a federal vem e queima tudo aí, mas, nós temos garimpeiros aí, tem um monte de garimpeiro agora que tem dinheiro, disse que secava isso aí dentro de dois dias, e tirava o ouro, para a cava. Mas, aí eu não sei o que é que está… Que nós não precisamos do governo não, do governo só precisa dos documentos para tirar o ouro, nós temos garimpeiros que tem condições de secar já, e tirar o dinheiro para nós, tirar o ouro para nós. Então, é isso, meio mundo de ouro enterrado no chão, que tem um pedaço de ouro lá enterrado, que quem disse foi o geógrafo, lá dentro do garimpo, é três metros, com dois de largura, viu? Só ouro, pronto.
P/1 - Ceará, o senhor tem netos?
R - Tenho, tenho um bocado já, tenho dois netinhos, eu que crio, eu tenho duas netinhas lá em Imperatriz, morando com as minhas filhas, com a mãe, cada uma, elas estão casadas lá. Só essa aqui que ainda não tem marido, mas ela já tem duas netinhas, aí eu zelo bem das minhas netinhas eu gosto delas, fico zelando, eu que dou de comer.
P/1 -E assim seu Ceará, fazendo uma comparação do passado, e do presente, atualmente em Serra Pelada, qual é o seu ponto de vista?
R - Para mim hoje, é o seguinte, hoje a Serra Pelada está bom demais, porque antigamente nós vivíamos muito pegando poeira, com pneumonia, essas coisas, matando nós aí, adoecendo. Graças a Deus hoje nós estamos todos, hoje não tem mais poeira, viu? A gestão, graças a Deus, a gestão fez tudo aí para nós.
P/1 - E o senhor pretende ficar morando em Serra Pelada?
R - A vida toda, quero ficar aqui, porque eu não me acostumo, se eu fosse no Ceará ver a minha mãe, mas eu não me acostumo mais lá, aqui, eu gosto muito daqui, da Serra Pelada, que é um município de Curionópolis.
P/2 - Tem alguma coisa que marcou a sua vida?
R - É, porque é o seguinte, eu, depois eu me acostumei, morando aqui na Serra, não quero sair daqui, só quando Deus achar que… Porque aqui é um seguinte, é um lugar de tranquilidade, você deixa as portas todas abertas, ninguém mexe com você, tem lugar aí que você chega a casa é toda trancada, a minha casa eu deixei aberta e sai, ninguém, faz nada, ninguém. É um lugar lindo, e outra,é o seguinte, lá fora ninguém da nada para você, aqui o cabra chega na minha casa, come, toma café, e ninguém, damos é com gosto, assim…
P/1 - Ceará, eu queria que você falasse para mim um momento da sua vida, da sua trajetória de vida, um momento que o senhor passou, algo que você fez, que marcou a sua vida, que você tem lembrança até hoje?
R - Eu já passei coisa ruim aqui, assim, passei fome, às vezes, eu sofri mais a minha velhinha. Tinha vezes que nós, não tinha um negócio de um caldo de arroz, não tinha condições de comprar nada, e aí um dia eu cheguei em casa, minha velha chamou para eu comer, aí eu cheguei lá era um caldo de arroz, só de arroz, branquinho, e aí ele arrumou não sei aonde, eu não tava… Mas graças a Deus, certo tempos para cá eu não estou mais passando essa vida, não estou tão bem, mas estou levando a vida, mas graças a Deus eu estou comendo mais as minhas netinhas, minha velha, todo mundo. Ainda dou aos outros ainda.
P/1 - E qual foi o momento feliz?
R - Feliz foi agora que, graças a Deus, hoje eu estou na minha casa não tem poeira, de primeiro, na minha casa parecia um correria, porque era poeira demais, nas coisas, graças a Deus acabou, tudo está no asfalto, hoje é uma vida boa. Aqui é o melhor lugar que tem, pode chegar o cara do 100, ou de Curionópolis, e dar uma casa das melhor que tem na minha aqui que eu não quero de jeito nenhum, é, porque não existe lugar melhor do que esse rapaz, um lugar melhor do que aqui na Serra, aqui, tudo isso aqui. Se eu chegar e não tiver nada você me dá, se eu chegar na casa daquele outro me dá, lá fora não tem isso não, é, aqui é bom demais.
P/1 - Seu Ceará, como foi contar a sua história para nós?
R - Como é que é?
P/1 - Como que foi contar sua história para nós?
R - A história é a que eu falei, né? Sempre no meio do… É o que eu falei, né?
P/2 - O senhor gostou de contar sua história para nós?
R - Ave Maria, isso foi uma história muito, eu fiquei muito assim, emocionado, porque eu estou com 43 anos que não vejo a minha mãe, né? Mas é, como se diz? Até a gente fazer isso com a família da gente, que não pode, um dia eu vou lá, um dia eu vou chegar lá e ver a minha mãe, antes dela morrer, tenho que ir lá. Aí eu fico esperando aí, mas pode ser que resolva agora esse negócio aí, porque se não for não resolve não.
P/1 - O senhor consegue falar com sua família ainda?
R - Direto, é que está bem com uns 8 meses que eu não falo com eles, né? Mudou de celular, e aí não deu certo, roubaram o celular da minha velha, depois ela achou, aí depois o celular desfez os contatos todos, eu estou esperando eles ligarem, para ver se vai ter contato, só isso aí.
P/1 - Seu Ceará, muito obrigada pelo senhor ter contado sua história para nós, está bom?
R - O que eu falei aqui tudo foi certo, viu? A realidade é essa que eu falei, tudo é certinho, o que eu falei é real.
P/1 - Muito obrigado.
R - Obrigado vocês também.
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