Minha infância querida
Essas palavras fazem parte de um verso do famoso poema Meus oito anos, de Casimiro de Abreu. Ele que me perdoe, mas ouso dar esse título para minhas memórias.
Passei a infância e grande parte da adolescência em Campo Belo. Naquele tempo, o bairro não era como hoje, as ruas eram de terra, inclusive a Vieira de Moraes, onde eu morava com meus pais, irmãs e avô materno. Não havia ônibus, somente o bonde que trafegava na atual Avenida Vereador José Dinis.
Ao completar 6 anos, entrei na 1ª série, na classe de uma professora, a inesquecível Dona Olandia, que dava aulas em uma classe improvisada na garagem de sua casa, enquanto não se concluía, na rua Vieira de Moraes, a montagem de um galpão de madeira da Prefeitura. Uma de minhas irmãs, com 12 anos na época, buscava-me na garupa da bicicleta.
Ao iniciar a 2ª série, mudamos para a nova escola, assim como alunos de outras professoras que também aguardavam a conclusão das obras. Recordo-me de algumas, além, é claro, da Dona Olandia de quem fui aluna até a 3ª série: Dona Leonor, Dona Sumaia, Dona Cacilda, Dona Alzires e a Diretora Dona Yvone. O pátio não era coberto nem calçado, era de terra, por isso em dias chuvosos tomávamos lanche na classe.
Lembro-me bem do uniforme obrigatório mesmo: meninas com saia de sarja toda pregueada de cor cáqui, blusa branca com gola esporte, abotoada na frente, meias brancas e sapatos pretos. Os meninos usavam calça curta até os joelhos. Anos mais tarde, a escola foi construída em alvenaria e passou a chamar-se EMEF Chiquinha Rodrigues.
Aos domingos, meu pai nos levava ao Aeroporto de Congonhas para passear. Era lá que ele trabalhava, na REAL, companhia aérea que mais tarde uniu-se a VARIG. Minhas irmãs e eu nos divertíamos vendo os “moderníssimos” Douglas DC3 decolando e aterrissando, ou como dizíamos, subindo e descendo numa linguagem mais própria de crianças. Não havia ônibus para o transporte dos passageiros, que...
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Minha infância querida
Essas palavras fazem parte de um verso do famoso poema Meus oito anos, de Casimiro de Abreu. Ele que me perdoe, mas ouso dar esse título para minhas memórias.
Passei a infância e grande parte da adolescência em Campo Belo. Naquele tempo, o bairro não era como hoje, as ruas eram de terra, inclusive a Vieira de Moraes, onde eu morava com meus pais, irmãs e avô materno. Não havia ônibus, somente o bonde que trafegava na atual Avenida Vereador José Dinis.
Ao completar 6 anos, entrei na 1ª série, na classe de uma professora, a inesquecível Dona Olandia, que dava aulas em uma classe improvisada na garagem de sua casa, enquanto não se concluía, na rua Vieira de Moraes, a montagem de um galpão de madeira da Prefeitura. Uma de minhas irmãs, com 12 anos na época, buscava-me na garupa da bicicleta.
Ao iniciar a 2ª série, mudamos para a nova escola, assim como alunos de outras professoras que também aguardavam a conclusão das obras. Recordo-me de algumas, além, é claro, da Dona Olandia de quem fui aluna até a 3ª série: Dona Leonor, Dona Sumaia, Dona Cacilda, Dona Alzires e a Diretora Dona Yvone. O pátio não era coberto nem calçado, era de terra, por isso em dias chuvosos tomávamos lanche na classe.
Lembro-me bem do uniforme obrigatório mesmo: meninas com saia de sarja toda pregueada de cor cáqui, blusa branca com gola esporte, abotoada na frente, meias brancas e sapatos pretos. Os meninos usavam calça curta até os joelhos. Anos mais tarde, a escola foi construída em alvenaria e passou a chamar-se EMEF Chiquinha Rodrigues.
Aos domingos, meu pai nos levava ao Aeroporto de Congonhas para passear. Era lá que ele trabalhava, na REAL, companhia aérea que mais tarde uniu-se a VARIG. Minhas irmãs e eu nos divertíamos vendo os “moderníssimos” Douglas DC3 decolando e aterrissando, ou como dizíamos, subindo e descendo numa linguagem mais própria de crianças. Não havia ônibus para o transporte dos passageiros, que caminhavam pela pista bem mais reduzida que hoje. Também não havia escadas nos próprios aviões, elas eram móveis, por isso funcionários as levavam até as aeronaves para os passageiros embarcarem ou desembarcarem. As aeronaves possuíam uma hélice em cada lateral que precisavam ser impulsionadas por mãos humanas para entrar em funcionamento. Maravilhados, apreciávamos tudo de um terraço ao ar livre, que hoje não existe mais, no andar superior do Saguão principal.
Anos mais tarde, na adolescência, o Salão do Aeroporto era o local onde íamos dançar nos bailes de formatura muito comuns na época, animados por famosos maestros como Sílvio Mazuca ou Élcio Álvares. Terminado o baile, voltávamos em grupo para casa a pé e descalços depois de uma noite de muita animação. Ainda o Aeroporto servia para os encontros, o cafezinho de máquina e vermos “ao vivo e em cores” artistas da TV que se utilizavam da recém-inaugurada Ponte Aérea Rio-São Paulo. Congonhas foi palco também da chegada ao Brasil da Seleção Campeã Mundial de Futebol de 1958 e Bi em 1962. Quem diria que um dia também seria pentacampeão?
São muitas as lembranças, muitos os momentos felizes inesquecíveis e cada vez que deles me recordo, vivo outra vez minha infância querida.
Meus oito anos
Oh que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais
Como são belos os dias
Do despontar da existência
— Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino damor
Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar
O céu bordado destrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar
Oh dias da minha infância
Oh meu céu de primavera
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minhã irmã
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus —
Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar
Oh que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais
— Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
A sombra das bananeiras
Debaixo dos laranjais
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