P/1 – Seu Batista, fala pra mim, só para ficar registrado, o seu nome completo.
R – Batista Theophilo.
P/1 – O senhor nasceu em que dia?
R – Dia cinco de maio de 1925.
P/1 – E foi em que cidade que o senhor nasceu?
R – Na cidade de São Paulo, rua Benjamim de Oliveira.
P/1 – O senhor nasceu na sua casa, então?
R – Nasci em casa. Naquele tempo, não tinha… tinha enfermeira nossa lá.
P/1 – Onde da Benjamim de Oliveira o senhor nasceu?
R – Na Benjamim de Oliveira.
P/1 – Mas era mais para frente, ali perto da…
R – Não te falei que era perto da Monsenhor de Andrade?
P/1 – Sim.
R – Você conhece a Monsenhor de Andrade?
P/1 – Acho que eu conheço.
R – Aquele paredão da Matarazzo? Aqui é Santa Rosa, aqui é Benjamim de Oliveira, ela corta tudo e vai até a Monsenhor de Andrade.
P/1 – Entendi. Então é mais para a Monsenhor de Andrade, sua casa?
R – Sim. Deixa eu lembrar, acho que umas três ou quatro casas, antes de chegar na Monsenhor de Andrade.
P/1 – E qual que é o nome do seu pai?
R – João Theophilo.
P/1 – Ele nasceu no Brasil também?
R – Não. Meu pai, não. Meu pai era italiano.
P/1 – Italiano?
R – Acho que era italiano, eu não lembro. Minha patroa lembra, eu não lembro.
P/1 – Você se lembra a cidade onde ele nasceu ou não?
R – Meu pai? Ah, em Mare, Polignano a Mare. Agora eu lembrei.
P/1 – Você sabe que dia que ele nasceu, seu Batista?
R – Não.
P/1 – Não tem problema. Ele veio para o Brasil por quê? Você sabe?
R – Ver se vencia na vida. Já tinha mudado meus avós, já tinham mudado, então aí veio o meu pai. Meu pai, meu tio.
P/1 – Ele falou como que era lá na Itália?
R – Meu pai?
P/1 – É.
R – Era pobre, né, tudo pescador.
P/1 – Ah é?
R – É, todos pescadores. Meu pai sabe como é que é, ele veio vencer aqui na vida e ele venceu, mesmo, falava o brasileiro corretamente. Ele, meus tios, minha tia.
P/1 – Ele veio de navio para cá?
R – Veio de navio, terceira categoria, lá embaixo (risos). Mas chegaram.
P/1 – Ele falou como é que foi essa viagem?
R – Não lembro, mas não deve ser boa, não, para vir na terceira categoria, é quase que no porão, não, é um porão. E o que você quer saber mais?
P/1 – Quando ele chegou aqui, ele foi morar no Brás, direto?
R – No Brás direto, porque já estavam minhas tias aqui, minhas primas. Meu avô também tava aqui. Meu avô também chamava Batista Theophilo, por parte do meu pai, entendeu?
P/1 – Ele veio antes do seu pai, então?
R – Quem? Meu avô?
P/1 – É.
R – Eu não sei se o meu avô veio junto, acho que não veio, não. Eu não lembro.
P/1 – Tudo bem, mas eles trabalhavam… quando o seu pai chegou aqui…
R – Não, eles eram pescadores lá. Quando chegaram aqui, vieram procurar serviços, trabalhar com qualquer coisa. Aí, ele entrou numa oficina mecânica, consertar carro, fazer carroceria muito bem feita. Ele queria tudo legal, não queria nada atravessado, coitado, morreu cedo, viu? Morreu muito cedo.
P/1 – Seu pai?
R – Meu pai morreu muito cedo.
P/1 – Com quantos anos ele morreu, seu Batista?
R – Eu não sei, tinha 59 ou 60 anos. Isso já são aguas passadas, né? Você vê eu, 91, eu falei para os meus netos e bisnetos, que eu tenho dois bisnetos já grandes, tenho quatro já menores, eu falei para eles sentado nessa mesa, antes de ter a primeira Copa agora, eu falei para eles: “Vocês vão me ver ainda mais três Copas”, uma eles já viram, eles eram meninos ainda, já assistiram, agora se Deus quiser, eu vou ver a segunda, entendeu?
P/1 – Mas o seu pai trabalhou aqui no Brasil só com a mecânica?
R – Fazedor de carroceria, carroceria de caminhão de peixes, ele sabia muito bem fazer e era analfabeto, não sabia ler, nem assinar o nome, ele assinava o nome tudo errado.
P/1 – E a sua mãe, qual que é o nome dela?
R – Minha mãe? Maria Torres Theophilo.
P/1 – Ela nasceu na Itália, também?
R – Nasceu na Itália.
P/1 – Em Polignano também? E ela veio para o Brasil que nem o seu pai?
R – Junto com o meu pai.
P/1 – Eles já eram casados lá?
R – Já. Eu não tinha nascido ainda, eu não sei se casaram aqui ou casaram lá, sei lá eu. Eu não lembro.
P/1 – Eles vieram com quantos anos para cá, mais ou menos, você sabe?
R – Não. é muito difícil saber isso.
P/1 – Não tem problema, não. Mas a sua mãe fazia o quê? Ela era dona de casa?
R – Minha mãe trabalhou em tecelagem, na Matarazzo. Você conheceu a Matarazzo?
P/1 – Não.
R – É na Fernandes Silva, conhece a Fernandes Silva, né?
P/1 – Conheço.
R – Então, a Matarazzo era na Fernandes Silva. Minha mãe trabalhou na Matarazzo. Minha mãe, minhas tias.
P/1 – E como é que era isso aí? Como é que foi para ela trabalhar lá?
R – Eles precisavam de gente para fazer empacotamento de macarrão, de farinha e ela se arriscou e foi. Minha mãe era inteligente.
P/1 – Por quê que ela era inteligente?
R – Porque ela sabia fazer as coisas. Ela não se esquecia das coisas, até agora, diante do falecimento dela, ela era muito boa dona de casa, muito boa para os filhos, sabia criar os filhos e o que mais você quer saber?
P/1 – O senhor tem irmãos, seu Batista?
R – Eu tenho um irmão.
P/1 – Um irmão, só. Qual que é o nome dele?
R – Modesto Theophilo.
P/1 – Ele é mais novo ou mais velho?
R – Ele é o último da prole. Tem mais quatro… agora, só tem uma viva. Você quer a viva só? Ou não precisa?
P/1 – Você tem mais irmãos e irmãos?
R – Hein?
P/1 – Você tem um irmão só, é isso?
R – Um irmão.
P/1 – Mas você tem irmãs?
R – Homem, eu tenho um… eram mais cinco.
P/1 – Mais cinco irmãos?
R – Cinco. Quatro irmãs e um irmão, e dois irmãos.
P/1 – E você tá onde nessa escadinha? É o mais velho? O primeiro?
R – O primeiro. Eu tenho um que faleceu, logo que ele nasceu e faleceu, esse daí eu não sei, você quer o nome dele? Modesto Theophilo, também. Irmão, esse daí é irmão, né?
P/1 – Mas o senhor é o mais velho, então, é isso?
R – Sempre fui o mais velho. Sempre fui o primeiro da família. Lutei que nem um cachorro, andava de tênis, ia a escola muitas vezes com tênis sim e outro, não, amarrava o dedão para dizer que estava machucado e não podia colocar, é mentira, porque eu gastava um, jogava futebol na rua, moleque, né? E gastava, jogava fora um e ficava com o outro. Nós fomos muito pobres, não fomos família rica. Navio em terceira categoria, morava a minha avó morava na rua do Luca, eu não lembro o número. Minha avó, minhas tias, minha outra tia, não lembro.
P/1 – Mas morava todo mundo na região?
R – Tudo na região da Fernandes Silva, Benjamim de Oliveira e Fernandes Silva.
P/1 – E como é que era essa casa em que o senhor nasceu na Benjamim de Oliveira?
R – Casa simples.
P/1 – Mas descreve para mim como é que ela era.
R – Casa de gente pobre, dormia em casa em colchão de espiga de milho, tirava as espigas, fazia o colchão e dormia. Eu, meus dois tios, eu morava junto com o meu tio, né? É isso aí. Eu só lembro isso.
P/1 – Morava quem na sua casa? Você…
R – Na minha casa?
P/1 – É.
R – Eu, minha mãe, minhas irmãs, meu pai antes dele falecer, né? Só. Não tinha comunidade com as outras tias, era cada um na sua casa. Só que o meu tio… eu tinha um tio e ele morava com nós, irmão de minha mãe, Modesto Torres o nome dele e o outro era João Torres e mais as primas que eu não lembro o nome delas direito.
P/1 – Morava todo esse pessoal na sua casa?
R – Não, na minha casa, não. Cada um na sua casa. Minha casa era só eu, meu tio, minha mãe e minhas irmãs. Só.
P/1 – Entendi. Me diz, então, como é que era na sua infância? O senhor brincava muito na rua? Como é que era?
R – Eu jogava futebol na rua, aquelas bolas de borracha, conhece aquelas bolas de borracha? Bola de borracha. Jogava na rua e quebrava vidraça, meu pai tinha que ir lá para fazer, mandar fazer outra. Ele mesmo fazia, cortava, ele tinha o diamante dele que ele cortava. Cortava os quadrados de espelho, de espelho, não, de vidros.
P/1 – Que mais que o senhor brincava na infância?
R – De tudo. Brincava com as meninas, com os meninos, com a rua, corria pra cá e corria para lá, apanhava do meu avô por causa do meu primo.
P/1 – O quê que o seu primo fazia?
R – O meu primo é o Vicente La Pastina.
P/1 – Ah é?
R – Você conhece o Vicente La Pastina?
P/1 – Falaram já dele para mim.
R – Mas quem que você conhece?
P/1 – Não, que falaram que ele morreu recentemente, né?
R – É, ele morreu recentemente. Ele tinha a mesma idade que eu. Só que o meu… de nascimento, ele tinham, mas de registro, o meu tio registrou ele três anos depois e o meu avô… eu vivia na casa do Vicente, né, que ele era quase como um irmão para mim, eu não tinha com quem brincar, não me deixavam brincar com as meninas, então eu ia para casa dele. A minha tia tinha uma mesa redonda e eu brincava lá na mesa redonda, eu corria em volta da mesa redonda para não apanhar, porque o Vicente que era meu primo era um chorão. Eu corria pra cá, corria para lá, ele falava: “O Batista me bateu”, e eu não batia em ninguém. E o que mais você quer saber?
P/1 – Só me conta isso aí…
R – Isso de menino, né, eu tô contando de menino.
P/1 – Sim, sim. Então, você apanhava por causa dele, então?
R – Apanhava, não. Ele veio da Itália com um negócio, que ele cultivava uva também na Itália, né, tinha um negocinho que nem um chicote e ele trouxe umas mudas lá e vez a parreira de uva no corredor da casa de minha tia lá na Benjamim. Eu via as uvas lá, eu roubava para pegar e o Vicente contava para ele e para ele não apanhar também, ele comia as uvas, ele para não apanhar também…
P/1 – Contava?
R – É. Essa minha infância foi essa.
P/1 – E você… me diz como é que era…
R – Eu vou contar pra você, deixa eu ver se eu lembro, eu fui jornaleiro… não, primeiro… é, jornaleiro, engraxate…
P/1 – Isso é trabalho que o senhor tá falando, né?
R – Trabalho, para ganhar um tostão.
P/1 – Mas o senhor começou a trabalhar quando?
R – Quando eu comecei a trabalhar eu tinha 12 anos, dez, 12 anos, mais ou menos. Trabalhava sem registro, sem nada, fiscal vinham, a gente saía fora. Isso tudo na cidade, né? Aí na Praça Antônio Prado, na XV de Novembro, rua Boa Vista, avenida Santa Efigênia.
P/1 – O senhor me conta como é que era o Brás nessa época?
R – O Brás era pobre, tinha festa de São Vito. Te contaram já dessa festa?
P/1 – Ainda não muito. Como é que era?
R – Começava na rua do Gasômetro, entrava na Mercúrio, depois entrava na Santa Rosa e vinha, até o Largo do rio Pari. Conhece o Largo do Pari, né? Tudo enfeitado, era assim, aqui vinha uns arcos, era fornecido pela… pode falar o nome da firma?
P/1 – Pode.
R – Era fornecido pela Antártica naquela época. Acho que era quem fornecia a iluminação. Por si só, muito boa, pagava para carregar o santo, o santo era São Vito e tem lá a igreja, você foi na igreja, né?
P/1 – Fui.
R – E eu trabalhei de frente a igreja. Trabalhava lá, na… primeiro, era no Largo da… aquele Largo que tinha o viaduto, tem o Largo aqui, né, a igreja era aqui, na Alvares de Azevedo e eu trabalhava…
P/1 – Mas como é que era a festa? O senhor se lembra de alguma festa que lhe marcou? Uma festa de São Vito?
R – Eu me lembro de uma porção de festas de São Vito. Festa, rojão, de tudo.
P/1 – O quê que o senhor mais gosta dessa festa?
R – O santo que eu gosto?
P/1 – Não, não. O quê que você gosta mais dentro dessa festa? O que você gosta mais de fazer?
R – Tudo. Eu ajudava tudo lá. Comia fogazza, aqueles pasteis que eles faziam lá, eles davam pra gente, e trabalhava em frente. Você quer que eu dê o nome das firmas agora?
P/1 – Sim, o que o senhor lembrar.
R – Na Santa Filomena, cerealista Santa Filomena, em frente a igreja. Aqui era a igreja, onde eu trabalhava, aqui era a Alvares de Azevedo.
P/1 – E o que mais que tinha no Brás nessa época? Você falou que era muito pobre, mas como é que era?
R – Tinha a rua Santa Rosa, tinha… estava construindo a ponte lá para… já tinha uma ponte, mas era uma ponte muito mixuruca lá, sabe? Fizeram uma ponte, tem uma ponte agora nova, nova, é mais velha do que eu, quase. Subi muito em pau de sebo na festa de São Vito.
P/1 – Ah é? Você subiu lá?
R – Eu não subi, eu ajudava, ficava embaixo…
P/1 – O pessoal subia para pegar o presente que tava na…
R – O presente era bom. Aquilo era cem mil réis, parece. Aquelas moedas de prata de dois reais, você não lembra. Dois mil réis cada uma. Eu ganhei bastante dinheiro vendendo jornal, de engraxate. Pessoal do Jockey Clube ia lá, eles davam muito doce pra gente pra levar para casa, a gente comia lá com eles. O Jockey Clube, quando eles iam lá, eles chamavam a gente: “Vem cá”, chamava: “Theophilo, vem cá, olha a tua bandeja lá”.
P/1 – Depois a gente volta para quando o senhor começou a vender jornal. Mas me conta um pouquinho mais da Santa Rosa. Como que era essa rua na sua infância?
R – A mesma coisa.
P/1 – A mesma coisa?
R – A mesma coisa. Santa Rosa e a avenida Mercúrio. Mesma coisa. Era rua do Gasômetro, avenida Mercúrio, Santa Rosa. Antes do Gasômetro, tinha a rua da Figueira, onde o teu São Paulo tá lá, você viu?
P/1 – Sim.
R – Então, era o São Paulo, aquele pedaço lá é rua da Figueira e embaixo, aquela avenida é Rangel Pestana. Ainda não era pronta a avenida Rangel Pestana, aprontaram depois, puseram subida, eu vendia jornal lá na praça Antônio Prado, na XV de Novembro.
P/1 – Mas assim, a rua Santa Rosa, ela era igualzinha o que é hoje? Mesmas lojas, mesmos armazéns?
R – Não, tem loja que foi reformada, a nossa, principalmente, já foi… tinha sido três vezes, onde tá o Paulo, meu filho, já tinha sido três vezes reformada, agora que tá boa.
P/1 – E passava bonde por lá?
R – Passava, eu chocava bonde todo dia para ir até a Paula Souza, onde tinha a Light lá, você sabe onde que tinha a Light na Paula Souza?
P/1 – Não.
R – Tinha a rua Cantareira, Paula Souza, rua Cantareira, Anhangabaú, Senador Queiroz, era isso. E eu chocava os bondes lá em cima e vinha.
P/1 – E como é que era pegar bonde nessa época? Era muito lotado?
R – Não, que lotado, nada. Tinha até o cara dura.
P/1 – Cara dura?
R – Cara dura era um bonde normal, que o pessoal ia lá e… e tinha um bonde pequeno para os que não podiam pagar, então, pagavam o que tinham. Eu chocava aquele lá. Cobrador vinha aqui, a gente dava a volta para o outro lado, cobrador ia lá, a gente voltava para o mesmo lugar. A minha vida foi uma vida… tinha o bondinho de carvão que pegava no Largo do Pari, você conhece o Largo do Pari? Pegava o bonde lá no Largo do Pari, que eles paravam lá, traziam o carvão, aquele carvão para alimentar as caldeiras do gás, e vinha com ele, descarregava a mercadoria no Largo do Pari, melancia, uva, laranja, abacaxi, melancia era cada melancia desse tamanho, assim, não era dessa redonda porcaria que tem hoje, não, um tanto assim de melancia e o resto é tudo carne branca.
P/1 – Mas o senhor subia em cima do caminhão? é isso?
R – Não, chegava o trem, né, encostava lá o vagão, abria, o cara ia lá, abria, a gente tirava as melancias lá e punha no caminhão para levarem para os armazéns. Levava lá para a Santa Rosa, passava aqui, aí ele parava no Pari aqui, era só virar a esquina e tava na Santa Rosa. E eu ganhava, assim, levava melancia a vontade para casa, muito boa. Santa bárbara chamava a melancia. Isso eu nunca vou esquecer, viu? Se eu tiver morto e lembrar… vou lembrar da melancia. Eu punha ela assim, chegava… era moleque…
P/1 – Era pesada, né?
R – Dez, 12 quilos cada uma, oito. De repente, dava o que eles queriam.
P/1 – Tudo para ajudar o seu pai, sua mãe?
R – Eu era moleque, tinha aqueles encostos de bebedores de água de rolo, sabe qual é? Você não conhece,, né? Ia três, um, dois, e três. Quando era mais ou menos dez e meia, onze horas da noite, eu tirava a roupa, tudo, ficava pelado, ia tomar banho onde os burros bebiam água, era água limpa, água boa, lá no Largo do Pari. Eu, mais os meus amigos que iam com a gente, minha vida não foi ruim quando eu era moleque, não, só que eu era muito sacrificado, né?
P/1 –Ter que trabalhar, né?
R – Meu amigo, durante o dia, pegava balão, soltava balão, fazia a vontade. naquele tempo não tinha nada mais do que isso. Que mais? Você quer saber dos armazéns agora?
P/1 – Não, a gente vai chegar lá. Na verdade, eu queria saber qual que foi a sua primeira… o seu primeiro contato com os armazéns da zona cerealista, antes do senhor começar a trabalhar lá, mas quando criança, os senhor ia lá?
R – Eu não falei que eu vendia jornal e era engraxate? Engraxei sapato…
P/1 – Mas você engraxava sapato dos comerciantes, então?
R – Os que iam lá, eu tava na praça Antônio Prado. Naquele tempo, dois mil réis era dinheiro, era uma prata. Eu tinha guardado, mas meus filhos, sabe como é que é, né?
P/1 – Mas o senhor conheceu esses comerciantes bem cedo, já?
R – Conheci de moleque, eu nasci lá. Nasci na Benjamim.
P/1 – Sim, mas como é que era o contato do senhor com eles, quando criança?
R – Eu ficava nos armazéns tomando conta.
P/1 – Ah é?
R – Ganhava arroz, feijão, nunca faltou comida em casa, graças a Deus, nunca, até hoje. Os filhos que eu tenho, eles enchem aqui muitas vezes.
P/1 – Mas o senhor tomava conta como do armazém? Ficava na porta?
R – Eles iam almoçar nos restaurantes que tinham lá perto, e falava: “Você dá uma olhada lá, depois, você…” “Tá bom”, era arroz, feijão, grão de bico, lentilha, o que tinha, enchia um saquinho e me dava. Minha mãe então, já sabia o que tinha que fazer no dia seguinte, fazia uma coisa, fazia outra. Depois, eu comecei a trabalhar na praça São Vito, onde tem o viaduto, lá. Você sabe onde é a praça São Vito, né?
P/1 – Sim.
R – Tá na carteira lá o nome da firma. Eu sei, se você não quer que falar…
P/1 – Não, pode falar.
R – Era Scagliusi e Companhia. Trabalhei no Pascoal Bianco, fábrica de móveis, Scagliusi e Companhia, fábrica de forma para calcada na rua Monsenhor Anacleto, onde eu conheci minha patroa. Conhece a Monsenhor Anacleto?
P/1 – Conheço.
R – Uma travessa da Gasômetro, né, minhas irmãs trabalhavam no Saccomani, fábrica de balas, balas futebol, joguei futebol, treinei no Corinthians, treinei no clube alemão, de lá, eu fui para o lusitano, do lusitano, eu já tava dando os meus passos maiores, do lusitano, eu passei para a Portuguesa. A Portuguesa era aqui na Vinte e Três de Maio. não tem a Vinte e Três de Maio? Não existia essa Vinte e Três de Maio, era avenida não sei o que lá, não lembro. E tinham cinco campos de futebol lá, tinha também o campo do Morro do Piolho, eu não me lembro muita coisa, viu, eu tô falando, e me atrapalho.
P/1 – Mas vamos dar uma organizada nisso, então. Você começou a trabalhar…
PAUSA
P/1 – Vamos falar… queria que o senhor falasse de futebol agora. O senhor sempre torceu para algum…
R – Eu joguei com os irmãos Piga na Vinte e Três de Maio, treinei no São Paulo, fiquei dois, três meses no São Paulo. Que mais eu fiz? Deixa eu lembrar…
P/1 – Mas o senhor torcia para que time?
R – Que eu torcia? Eu sempre fui corintiano. Falando em corintiano, o campo do Corinthians, você sabe onde é?
P/1 – Hoje?
R – É.
P/1 – Hoje é em Itaquera.
R – Você sabe onde era a fazendinha? Também não sabe. Eu jogava lá na fazendinha. Ruim, barrenta, tinha barro para todo lado, mas eu ia pra treinar.
P/1 – Onde que era?
R – E o meu pai ia comigo muitas vezes. Assisti muito jogo do São Paulo. São Paulo tinha um __00:34:07___ de ouro. Eu lembro do quadro do Corinthians naquela época, eu não esqueci.
P/1 – Como é que era?
R – Marca aí num papel.
P/1 – Pode falar que a gente vai gravar.
R – José, Jau e Jarbas. Jango, Brandão e Dino. Lopes, Sevílio, Teleco, Joani e Carlinhos e tinha os aspirantes. E pagava, não recebiam para poder jogar, senão, não jogavam. Tá bom? E hoje estão ganhando milhões.
P/1 – Mas o senhor jogava em que posição, mais ou menos?
R – Eu tenho as fotografias aí.
P/1 – Mas em que posição o senhor jogava?
R – Eu jogava de centroavante, de meia direita, meia esquerda, na linha, só linha eu sabia jogar…
P/1 – E lá na frente?
R – Sempre na frente. Eram cinco na frente.
P/1 – Cinco na frente?
R – Era cinco, três, dois e um.
P/1 – Nossa!
R – Cinco, três, dois e um. Então, era o goleiro, dois back, Brandão era um negrão que era um espetáculo, rapaz. Todo mundo queria ver ele jogar e a linha também, a linha tinha o Sevílio, Sevillio bailarino, o Teleco, que jogava um bolão, irmão do King do São Paulo, eu não lembro de mais nada.
P/1 – E o senhor se lembra de alguma partida que marcou o senhor quando o senhor estava jogando bola?
R – Teve. São Paulo e Corinthians no campo do Corinthians na fazendinha, Corinthians ganhou de dois a um. Teleco fez dois gols de cabeça. Isso eu lembro. Não sei se foi o Sevíllio ou se foi o Joani, eu não me lembro bem.
P/1 – Mas o senhor começou a jogar futebol quando? Foi no Brás, mesmo?
R – Eu joguei no Guarani do Brás. Aí, eu jogava no primeira e eu queria que eu jogasse. Vi goleiro quebrar perna, outro machucou o braço, outro quebrou o braço, eu vi tanta coisa, eu fiquei três meses, eu não vou tirar a calça, senão eu ia te mostrar as marcas que eu tenho.
P/1 – Mas ficou três meses o quê? Ficou três meses machucado?
R – Três meses com a perna fazendo curativo. Eu fui jogar num campo da rua Miller, machucou, era Guarani e Feirantes, o cara entrou com tudo, eles estavam perdendo o jogo de um a zero e entrou comigo com tudo, me pegou, eu fiquei três meses com o joelho desse tamanho. Eu não vou tirar a calça, senão eu ia te mostrar.
P/1 – O senhor fazia muito gol?
R – Eu fiz. Alguns eu fiz. Fui jogar no campo do Flamengo, no Rio. Joguei… eu tinha uma camisa do Flamengo, aí, se eu vou pegar o álbum lá, tá uma bagunça que não se entende nada. Joguei para o Clube Militar, fomos vice-campeão no Clube Militar.
P/1 – E o senhor se lembra como que foi a guerra, Segunda Guerra Mundial, o senhor tinha 20 anos, né?
R – Como é que é?
P/1 – Na Segunda Guerra Mundial…
R – Eu fui para o Exercito.
P/1 – Você foi para a FEB?
R – Fui. Eu tenho as fotografias, eu tenho também no álbum. Tenho, que nós fizemos 25 ou 30 marchas a pé, eu tenho fotografia lá, tenho da hora que ficamos todo mundo dormindo nas tendas. Chovendo, era mês de novembro, chovia, mas graças a Deus, deu tudo certo.
P/1 – O senhor não teve que ir para a Itália, então?
R – Não, eu estava estudando, por pouco eu não fui. Eu já tava com a mala toda pronta, minha mãe chorando, já tava com a mala toda pronta, meu primo era para ir primeiro, mas como ele tinha três anos a menos, ele não foi. Eu falei: “Epa, eu vou”, e se tivesse ido, eu tava bem hoje, viu?
P/1 – Ah é?
R – Eu conheço dois que recebem, recebem bem. E ninguém amola eles. Força Expedicionária Brasileira. Boa, boa. Sargento bom. Sargento, quando a gente fazia as marchas: “Theophilo, canta”, e eu cantava. Eu cantava. O hino nacional brasileiro eu sei inteirinho. Avante camarada também eu sei muito bem.
P/1 – Você se lembra de alguma canção dessa época?
R – Canção? Avante Camaradas. Eu não vou cantar agora porque eu não me lembro a música: [cantando] “Avante Camaradas, ergue o teu fuzil…”, como é que era? “Olha o inimigo…”, é isso aí que eu lembro só.
P/1 – Vocês cantavam enquanto marchavam, é isso?
R – Enquanto marchava. Enquanto estava fazendo a marcha. Estudei, fiz o curso de contador, direto, fiz seis meses de Economia em Finanças, precisei sair porque não tinha mais dinheiro, acabou. A escola era na…
PAUSA
P/1 – Estávamos falando da FEB…
R – Mas eu não fui.
P/1 – Não foi, né?
R – Eles fizeram o exercício lá e eu fiquei aqui.
P/1 – Agora, o senhor começou a trabalhar como jornaleiro, foi isso?
R – Jornaleiro. Jornaleiro, engraxate… engraxate primeiro, né?
P/1 – Engraxate. Como é que era esse trabalho?
R – Engraxate. Meu pai me fez uma caixinha de engraxate pequena e eu punha lá uma lata de marrom, uma lata de preto, escova muito boa, tinta e o pessoal queria tinta, a gente passava tinta, não queria tinta, passava graxa, bastante graxa, Jóquei principalmente, as polainas, no Jockey Clube também engraxei muito. Ganhei dinheiro, viu, eu ganhei, graças a Deus, minha mãe não pode falar que eu não ajudei, eu ajudei muito. Eu e a minha irmã mais velha.
P/1 – E o seu pai morreu, o senhor tinha quantos anos?
R – Eu? Eu não sei se ele morreu com 59, eu não lembro.
P/1 – O senhor era muito pequeno?
R – Eu era pequeno. Ele teve tipo, né? Naquela época lá, minha mãe ia lá visitar ele, mas eu tinha que ficar fora porque eu não podia entrar.
P/1 – Tinha muito dessa doença na época?
R – Não curava, viu! Era difícil, era muito difícil.
P/1 – E como é que foi trabalhar como jornaleiro?
R – O meu tio trabalhava na Gazeta e ele que me arrumava lá os jornais, então Gazeta, eu limpava na hora, porque era o primeiro a sair, né, e depois eu pegava o Estadinho. O Estadinho era o jornal que dava mais dinheiro, eu entrava no Fasano, lá no Fasano, eu vendia uma média de 30, 40 jornais no Jockey Clube, dois mil réis cada prata e eu pagava 20 centavos, 25, 30. E ajudava também os outros, né, que tinha encalhado lá, a gente ajudava, ia lá, vendia, tal. Eles me davam sempre mais 50… como é que era? Cinco mil réis, né? Dois mil réis, cinco mil réis. Não, não era cinco mil réis, era cinco réis. Eu não lembro.
P/1 – E para andar pela cidade, como é que o senhor fazia?
R – Tinha o bonde, né, pegava o bonde, vinha nos bondes, jornal também, pessoal chamava nos bondes, eu corria, pulava, eu sabia subir descer nos bondes, andando na rua Boa Vista, rua Libero Badaró, avenida São João e ia embora. Você vê como eu lembro do caminho? Não tinha Banco do Brasil, não tinha bando de estado, não tinha banco Itamarati, não tinha Banco do Estado do Rio Grande do Sul. Aí que eu comecei a entrar no comércio.
P/1 – Sendo jornaleiro? Agora, como é que foi a escola? A primeira escola?
R – Eu passava… todo ano eu passava. Você quer saber a escola?
P/1 – É.
R – Era Escola Comércio Trinta de Outubro, rua Oiapoque, acho que era número 80, se eu não me engano, Doutor Osmar Alegretti, aliás, Osvaldo Alegretti, Doutor Osmar Pimentel, primeiro escritor, um dos maiores escritores que tinha no Brasil.
P/1 – O senhor queria ser professor?
R – Fui professor de Historia. Osvaldo Alegeretti, João Alegretti, dona Aurora Alegretti, eu não lembro da irmã dela, nunca lembro. O quê que você quer mais?
P/1 – O senhor gostava da escola?
R – Se eu gostava? Oh! Eu não via a hora que chegava em casa para tomar banho, muitas vezes, tomava banho de bacia porque minhas irmãs estavam no chuveiro, eu tomava banho de bacia só para adiantar para poder ir a escola de noite. E o que mais?
P/1 – Tinha alguma matéria que o senhor gostava mais na escola?
R – Sim.
P/1 – Quais que eram?
R – Era Aritmética.
P/1 – Você acha que foi por isso que o senhor quis virar contador?
R – Fui para contadoria porque eu já estava trabalhando com livros, né, e só ajudava os outros e eu peguei e falei: “Não, vou fazer isso mesmo”, e eu fui estudar, estudar a contadoria, me formei depois de dois anos de casado, eu já era casado. Que mais?
P/1 – O senhor falou que começou a trabalhar com livro, é isso?
R – Sim, eu fazia a contabilidade de noite.
P/1 – Entendi. Mas como é que era? Você estudava à tarde… eu não entendi…
R – Eu não estudava à tarde, eu trabalhava.
P/1 – Trabalhava no jornal?
R – Estudava à noite.
P/1 – Trabalhava fazendo o quê?
R – Trabalhava, pagava a escola e estudava à noite.
P/1 – Tá, mas o senhor trabalhava com o que à tarde? Com os jornais, é isso?
R – Não, aí já não tava mais no jornal. Aí, já tinha subido muito, já tinha deixado a rua XV, praça Antônio Prado, Jockey Clube, o Fasano também já tinha… tava mudando de lá, entendeu?
P/1 – E aí, o senhor foi fazer o que, então?
R – Eu fui trabalhar.
P/1 – Trabalhar do quê?
R – O quê que eu te falei agora pouco? Antes do…
P/1 – O senhor trabalhou em frente a igreja São Vito, né, o senhor falou também.
R – Sim, aí já era a cerealista Santa Filomena.
P/1 – Tá.
R – Agora você quer que entre no setor de cereais?
P/1 – Não, queria entender como que o senhor passou da contabilidade para o comércio. Foi…
R – Pois é, eu tava fazendo contabilidade no comércio.
P/1 – Já trabalhava em firma, já?
R – Já trabalhava em contabilidade.
P/1 – Enquanto estudava?
R – Estudava também.
P/1 – E o senhor se lembra o primeiro lugar do comércio que o senhor trabalhou enquanto contador?
R – Como o primeiro?
P/1 –A primeira firma que o senhor trabalhou na contabilidade?
R – A contabilidade eu trabalhei no primeiro caixa no Scagliusi e Companhia, o que tá registrado no primeiro… eu não sei se… depois, eu trabalhei…
P/1 – Em 43, né?
R – Eu não sei. Quer pegar a carteira para ver?
P/1 – Não precisa. Mas foi em 43.
R – Deixa eu lembrar. Primeiro eu trabalhei no Scagliusi e Companhia, era caixa lá, ficava lá como caixa, armazém de cereais, ele me dava dez quilos de arroz e dez quilos de feijão todo mês e mais o salário. Eles ganhavam também bem, né? Nesse tempo tinha a penitenciaria, eu fiz muita cobrança na penitenciaria, entrava lá de peito aberto e a minha vida foi uma vida sacrificada, viu? Mas graças a Deus, deu certo, tenho uma boa família, mais de 20 na família, e tem neto, bisneto, filho, filha.
P/1 – Mas seu Batista, como é que era o comércio nessa época? Quem que eram as maiores firmas, o quê que elas vendiam? Como É que era? Fala pra mim.
R – Do jeito que é hoje.
P/1 – É?
R – Você tá vendo o jogo de hoje?
P/1 – Sim.
R – Só que naquele tempo, você vendia mercadoria em saco de 50 quilos, 60 quilos nas costas, aberto, um quilo, dois quilos. Hoje não, tá tudo empacotado, né? Naquela época não, naquela época, você vendia a granel, até meio quilo, até 200 gramas e a gente comprava, pegava 200 gramas e dava. Também ajudei, viu? Ajudei. Trabalhando com oi meu primo, lá. Quer o nome da firma do meu primo?
P/1 – Sim.
R – Era Importadora e Exportadora La Pastina S.A. Eu trabalhei com ele, também.
P/1 – Com o Vicente, né?
R – Com o Vicente. Já falei o nome dele, né?
P/1 – Sim. E como é que era a firma do Scagliusi?
R – O Scagliusi era cereais, tô falando…
P/1 – Só cereais?
R – Não, vendia alho, feijão, arroz, batata, deixa eu lembrar, tem mais um artigo que eu não lembro o quê que é. Rato (risos), tinha cada rato! Vinham aquelas caixas de alho da Argentina, vinha aquela… quando eles descarregavam lá no armazém, vinha junto.
P/1 – Tinha muito rato, é?
R – Puxa vida! Uma ocasião, nós pegamos 35 ratos.
P/1 – Nossa.
R – Eu peguei com peneira, cada peneira que eu dava eram três, quatro que eu pegava. Eu ficava com pena de matar. Uma ocasião, eu estava no Scagliusi ainda, não tinha ido ainda para o centro. Eu estava no Scagliusi, chegou uma remessa de alho, 200 e poucas caixas, chegou de madrugada e eles queriam que eu fosse lá para descarregar, disse: “Não, não vou descarregar, não” “Precisa mandar 100 caixas para a penitenciaria”, eu falei: “Vai de manhã”. Estou de manhã descarregando tudo, pusemos lá na pilha, saíram as 100 caixas. não demorou muito, saiu mais 30, depois saiu mais 20, eu sei que tinham sobrado umas dez ou 15 caixas lá num canto, num vão assim, numa quina, né, sabe aquelas quinas que a gente põe as caixas? E tinha ninho de rato lá, eu vou te contar, viu? Tiramos todas as caixas, faltavam três ou quatro caixas para tirar, tiramos, encontramos uma rata, tinham cinco ou seis filhotes atrás dela, eu fiquei com tanta dó que eu quase chorei aquele dia, mas não matamos ela, não. Eu não falei nada para ninguém. Eu pulei as caixas lá, e falei: “Aquelas caixas não podem sair de lá porque estão molhadas” “Então, deixa secar”, no dia seguinte, fui cedo para o armazém, eu tirei as caixas de lá, ela já não tava mais lá, nem ela e nem os filhotes. Isso eu lembro, tá vendo como a gente lembra das coisas ruins? E lá na Santa Filomena, nós matávamos no vitrô, eles entravam pelo vitrô e pronto, eu não fazia isso, não. Eu não faziam, eles faziam lá, mas eu não.
P/1 – O senhor tinha dó?
R – Eu sempre tive dó. Até uma mosca para matar, eu tenho dó. Não faz mal para ninguém. Eu sempre fui um cara legal, não fui um cara… pergunta para os meus filhos, eles judiam até de mim por causa disso. Fazer o que, né? Depois que o meu primo abriu, eu fiquei trabalhando com ele, depois da Santa Filomena, eu fui trabalhar com ele, né, trabalhei quase… 78, 80 anos com ele.
P/1 – Sério?
R – Abrimos uma firma na Santa Rosa, um armazém que tinha lá, Nerusco Silvestre.
P/1 – Nerusco Silvestre.
R – É, Nerusco Silvestre era fubá, Fubá Mimoso, Moinho Fubá Mimoso. Eu me dava muito com o filho dele, eu, meu primo, a gente se dava muito bem.
P/1 – E vendia o que, o La Pastina?
R – O que tá vendendo hoje.
P/1 – O quê que era?
R – Você diz assim, bebida, tudo importado, arroz, feijão, milho, alpiste, cânhamo, sabe o que é cânhamo? Você não conhece cânhamo?
P/1 – Acho que sim, o quê que é?
R – É maconha.
P/1 – Ah é?
R – Eu vendia, mas eu vendia para o pessoal lá do Paço das Industrias, onde eu tirei a carteira. Era um delegado lá de policia, ele era da pesada, viu? Ele falava: “Vai lá no Theophilo e me arruma lá umas 200 gramas daquele cânhamo verde”, eu falava para os caras lá: ‘Você não fala que pegou de mim” “Como não vou falar? Ele mandou vir aqui”. Ele tinha criação de curió, naquela época, era 300 e não sei quantos cruzeiros que ele vendia cada um, mas como cantava, ele me deu dois. Ele falou: “Se não me arrumar cânhamo até eu sair daqui, você vai ter que se virar”.
P/1 – Mas o senhor vendia cânhamo para todo mundo?
R – Eu vendia, era cânhamo desidratado.
P/1 – Mas para quê que as pessoas usavam?
R – Para canto. Cânhamo desidratado podia dar para canto que era a mesma coisa.
P/1 – Para canto?
R – Cânhamo.
P/1 – Não, mas para quê que as pessoas…
R – Para desidratar o cânhamo, desidratava o cânhamo e dava para os curiós.
P/1 – Entendi.
R – Curió, canário da terra.
P/1 – Alimento para passarinho? Entendi. Mas a loja, essa loja do senhor com o seu primo…
R – Essa aí do Nerusco Silvestre, do fubá.
P/1 – Mas tinham muitas como ela na época ou ela era diferente, assim?
R – Não, fubá era quase só ela, não, tinham mais duas. Tinha Uva Santa Rosa, Nerusco Silvestre que era o Fubá Mimoso… deixa eu lembrar… só essas duas acho que eu me lembro. Santa Rosa e…
P/1 – Essa coisa de importar…
R – Importado era tudo do meu primo, lá, do La Pastina. Eu tava lá na loja, ele mandava tudo lá na loja e eu preparava lá, deixava… eu tenho… ele tinha uma exposição lá de coisas, eu não sei se ele tá vendendo vinho ainda. Era só vinho importado, uma prateleira, mas grande, do tamanho daquela sala, lá, era três ou quatro andares, tinha tudo que era tipo de coisa, bebida…
P/1 – E o senhor se lembra em que ano que abriu essa loja?
R – Whisky, vinho, conhaque… tinha um conhaque que naquela época se vendia a 100 mil réis cada um, era dinheiro, viu! Era WO, não era bem um litro, era menos de um litro, acho que 700 gramas, mas bom rapaz.
P/1 – E vinho, o senhor toma?
R – Se eu tomo vinho? Tenho um armário daquele lá só de vinho e pinga. Eu gosto mais de uma caipirinha, viu. Vinho eu tomo, vinho o Paulo traz aí, e só vinho italiano.
P/1 – E me diz, o senhor se lembra em que ano você abriu essa loja com o seu primo?
R – Quando eu abri?
P/1 – É, em que ano que foi.
R – Não me lembro… vê lá na carteira, tem.
P/1 – Depois eu dou uma olhada. Mas o senhor tinha quantos anos, o senhor tinha?
R – Ah, eu já tinha filhos, eu já tinha parece que… acho que três filhos. Tinha três homens.
P/1 – O senhor acha que tinha uns 30 anos quando abriu essa…?
R – Já, O Paulo tá com 60 anos, o mais velho tá com 67, o outro tá com 64, se eu não me engano.
P/1 – Então, o senhor abriu há 60 anos atrás, mais ou menos?
R – Mais ou menos.
P/1 – Foi nos anos 50, então, talvez?
R – Eu não tinha outra coisa que fazer, eu vinha em casa… tratava da minha vida, tomava banho todo dia, almoço e janta sempre pronto. Ela trabalhou essa minha mulher, puta vida! Eu prometi uma viagem para ela e dava pra ir, para Bariloche, que ela queria ver a neve lá, mas eu não levei, não. Eu quando tinha um dinheiro bom, bom mesmo, adivinha o que eu fiz?
P/1 – O quê?
R – Eu arrecadei, peguei aquela dinheiro lá… deixa eu lembrar… comprei esse apartamento. Tava na construção ainda. E compramos. Em vez de gastar lá fora, eu gastei aqui dentro, tá aí o resultado. Se eu não tivesse feito isso, cancelado essa viagem, eu não tinha o que eu tenho hoje, o que eu tenho, não, porque eu não tenho mais nada, só tenho os filhos aí pra encher o saco (risos).
P/1 – Mas me diz uma coisa, o senhor, quando foi trabalhar com o seu primo, o senhor fazia o quê? Era só contador ou…
R – Eu trabalhava com o meu primo como contador, como…
P/1 – Vendedor?
R – Eu era tudo, no armazém era só eu que mandava lá. Era eu, eu e eu, as três coisas, fazia contadoria, eu tenho um contador que fazia fora, mas eu não gostava de mandar para ele, né, eu gostava de fazer a minha. Eu já sabia. Trabalhei com o pessoal de importação de maçã, de pera também no Mercadão e eu fazia a contadoria deles, era Buenaventura Ramos Santana.
P/1 – No Mercadão?
R – No Mercadão. Eles gostavam de mim, como eles me mandavam maçã, esses caras aí comeram maçã até não querer mais. Maçã, pera, uva argentina, até pouco tempo, o Buenaventura tava vivo, eu não sei, ele e o Herrero cunhado dele. Eu não sei, eles estavam lá na rua Cantareira.
P/1 – E como é que era o Mercadão antigamente?
R – Bom, antigamente… eu vi o Mercadão… eu nasci em 1925, em 22, o Mercadão já tava fazendo, mas teve essa politica besta aí, que teve uma revolução tremenda, parou o Mercadão. Voltou a funcionar em 1925, foi quando eu nasci. De lá para cá, depois que eu fui crescendo, o Mercadão foi crescendo comigo, era para ser estação de ônibus lá, onde tem hoje e acabou ficando o mercado. Mercado Municipal de São Paulo. Eu tinha fotografia, eu era pequeno, eu era assim, ó. Eles, numa ocasião, puseram uma bruta de uma fotografia lá e tinha um menino que tava olhando lá assim… eu falei: “Esse daqui sou eu, porque eu conheci meu terno”, eu fui perguntar lá para o cara, tudo, ele falou: “Esse menino tava passando aí, não dava para tirar, senão tinha que tirar metade”, eu falei: “Esse daí sou eu”, e adiantou? Depois de dois, três dias que fizeram a festa, aquilo lá sumiu. Você vê? Isso eu lembro.
P/1 – Onde tava esse quadro?
R – No Mercadão. Do lado direito.
P/1 – E como é que era o mercado? Era igual ao que é hoje? O Mercado Municipal, como que ele era antes?
R – Como é que ele era antes? Era um terreno da prefeitura.
P/1 – Não, mas eu digo, o comércio era a mesma coisa?
R – Agora?
P/1 – Não, antigamente, era a mesma coisa que é hoje, o comércio?
R – O comércio, é. A banca era uma, foi passada para o avô, do avô passou para o filho, o filho passou para os netos, tá lá. Mas tem muita gente que morreu lá, viu, isso eu lembro. Eu fui agora, há pouco tempo, meu filho me levou, eu conhecia o Jácomo lá, jogava palitinho, ia de manhã, quatro, cinco pessoas jogando palitinho. E essas bancas de frios que tem lá, é tudo antigo. Banca de frios, banca de frango, banca de ovo.
P/1 – Seu Batista, como é que o senhor fazia as importações?
R – Eu?
P/1 – É. Ou era mais o seu primo?
R – Não, eu não fazia importação. Quem fazia importação era o meu primo lá na La Pastina.
P/1 – Tá, como é que ele fazia? Ele conversava com o pessoal lá fora?
R – Ele tinha gente, né, ele tinha o escritório dele… ele sabia o que fazia. Ele faleceu há pouco tempo, você sabe disso, né?
P/1 – Sim.
R – Eu fiquei muito triste, viu. Ele é que nem um irmão. Eu lembro, já me vira a cabeça.
P/1 – Como é que ele era?
R – Eu briguei tanto com ele, lutei tanto, fui na escola com ele… a vida, né? Logo, vamos nós também. Eu tô agora com 91. Quem sabe a gente vai chegar no 100, né? Eu não faço extravagancia nenhuma. Não vou mais trabalhar, eles não me deixam ir, eles não querem nem que eu saia na rua, porque eu quebrei o fêmur há pouco tempo e essa quebrança do fêmur e as minhas pernas que também já não estão dando mais, depois de lutar tanto sem férias, sem tempo de comer, muitas vezes, sem tempo de dormir, dormia muitas vezes, uma, duas horas da madrugada, fazendo as escritas lá. Eu não gosto de lembrar, viu!
P/1 – O quê que o senhor gosta de lembrar da Santa Rosa?
R – Do que eu levava para casa (risos).
P/1 – O quê que é? Como é que era isso?
R – Eu ganhei muita coisa lá. Eu vi construírem o Banco do Brasil, que era no tempo, Banco do Café, onde eu vendia o jornal, vi construir o Banco do estado, vi construir o Banco de São Paulo, vi construir o Banco Comercial, vi construir o Bando Itamaraty, que mais?
P/1 – Mas o quê que o senhor levava para casa, que o senhor falou?
R – Da Santa Rosa?
P/1 – É.
R – Tudo que era comida. Eu tinha desconto em tudo que era banca lá. Tudo banca de frios, banca de miúdos, essa língua de boi, rabo de boi, pé de boi, pé de porco, fígado… isso aí eu gostava. Frutas então…
P/1 – Como é que o senhor tratava os clientes na época?
R – É do jeito que eu tratei até agora, sempre com conversa, sempre amigão, fiscal, com fiscal também, fiscal de rua, fiscal de estado.
P/1 – Você acha que tem uma forma certa de tratar o cliente? Como é que é?
R – Os clientes eram os primeiros que eu tratava bem. E assim é a vida. Você não quer ver as firmas que eu trabalhei aí?
P/1 – Não precisa por causa do vídeo, é melhor a gente só conversar mesmo, depois o senhor me mostra, pode ser? Agora, o senhor se lembra de algum produto que o senhor vendeu bastante? Que o senhor gostou de trabalhar?
R – Eu vendi alho.
P/1 – Alho, muito?
R – Chegava alho da Espanha, da Argentina, da China. Da China vinha até rato junto.
P/1 – Você falou.
R – Uruguaio. E eu vendia alho. Eu cheguei por dentro do armazém, 35 mil caixas de alho que não cabia, eu andava de costas quando eu peguei, mas pus lá, porque já tinha o freguês certo, eram 100 caixas para um, 200 caixas para o outro e eu vendia muito para fora do estado, para Petrolina, Rio de Janeiro, deixa eu lembrar, Santos, Santos não era muito. Era mais Piauí…
P/1 – Era muito alho, então?
R – Pô! Cada vez que vinha, quando vinha de carreto, era 250, 300 caixas na carreta e descarregava dia e noite. Por isso que eu cansei muito.
P/1 – E como é que era com seus funcionários?
R – Funcionários tudo bom, eu tinha um, dois, três. Só três, um para soltar mercadoria e dois para carregar. Faziam revezamento, um mês um, um mês, outro. Eu obriguei eles a fazerem.
P/1 – Por quê?
R – Eu obriguei porque eles achavam ruim, porque soltar mercadoria cansava menos do que carregar. E para carregar eram cinco, seis caixas cada vez, tinha um cara que carregava dez lá, um puta de um negrão, rapaz, quando ele me via… que eu tinha o registro, eu fazia todos os livros de contabilidade, fiz o registro dos empregados, ia lá no departamento do trabalho para registrar os empregados lá também, nenhum deles ficou sem aposentadoria, sem registro, sem nada. Tudo certo. Graças a Deus, até eu. Até eu que tava registrado também fiquei. Eu tava registrado como empregado.
P/1 – O senhor tem algum funcionário que lhe marcou que o senhor gosta muito?
R – Tem. Eu importei um, o Argenoro, importei ele lá de Pernambuco, eu gostava dele. Tem outro bom…
P/1 – O quê que os senhor gostava dele?
R – Porque era empregado bom, tomava conta do armazém quando eu saía para almoçar, eu não almoçava em casa, almoçava fora.
P/1 – O senhor almoçava onde?
R – Nos botecos, lá.
P/1 – E tinha alguém do bairro que era muito famosa?
R – Não, tudo igual. Lá, era tudo igual.
P/1 – Não tinha ninguém, assim, um barbeiro, um cara da farmácia…
R – Ah, tinha barbeiro lá. Se tinha barbeiro?
P/1 – Não, eu tô dizendo assim…
PAUSA
P/1 – Seu Batista, me fala, o senhor ficou quanto tempo nessa firma com o seu primo?
R – Tá aí no… eu não lembro.
P/1 – O senhor se aposentou lá?
R – Me aposentei lá.
P/1 – Em que ano o senhor se aposentou? O senhor se lembra?
R – Tá tudo aí marcado, eu não lembro, porque as datas assim pra mim, fogem. Agora foge, antes não, mas agora foge. Eu devia ter escrito. Agora, nem para assinar, eu vou assinar, muitas vezes, escapa a caneta da mão, por causa do atrito que eu tenho.
P/1 – Nesses anos todos de comércio, o senhor viu mudar bastante o comércio atacadista?
R – Ah vi!
P/1 – O quê que mudou?
R – Mudou tudo e tá mudando agora, tem mais ainda. Santa Rosa virou agora também todo coiso de enfeite, disso, daquilo. Deixa pra lá…
P/1 – Por quê que o senhor acha que mudou?
R – Porque antigamente, era quase tudo armazém, armazém de batata, armazém de cebola, armazém de alho, armazém de alho tinham umas quatro ou cinco casas, cereais que tinham antes. Agora, não tem mais. É tudo variedade, lá, é doce disso, doce daquilo… tudo… você não viu lá na Santa Rosa?
P/1 – Vi, mas eu queria saber como é que era antes, na verdade.
R – Antes era isso, era só cereais. Cereais, batata, cebola, vinho. Agora, acabou.
P/1 – Me fala um pouquinho, então, mais do seu primo. Como que ele era o seu primo, o Vicente?
R – O quê que tem?
P/1 – Como que ele era? Era um cara que pensava mais a frente, era um cara que era um bom comerciante? O que o senhor achava dele?
R – Bom, coração de ouro. Ele sabia ajudar os outros. E orientou muito ele, o Paulo. Comerciante é isso, ele gostava de… vocês já entrevistaram o Paulo, não?
P/1 – Não.
R – O Paulo também tem história para contar.
P/1 – Como é que o seu primo ajudava as pessoas? Ele dava o dinheiro para qualquer um?
R – Ele ajudava. Ele sabia fazer as coisas. Ele tinha uma firma… ele tem até hoje a firma, a firma tá com o filho dele. Com o Celso, vocês sabem, né?
P/1 – Sim.
R – Tá com o celso. Com o Celso e a filha, a Maria Lucia.
P/1 – Seu Batista, como é que o senhor conheceu a sua esposa?
R – Na rua Monsenhor Anacleto.
P/1 – O senhor estava trabalhando, né?
R – Estava trabalhando num fábrica de formas, que tá marcado aí. Foi lá que eu conheci ela. Quer dizer, eu tinha conhecido outra, era amiga dela, mas a amiga dela não me dava bola, eu larguei e fiquei com ela. Ela veio de Marilia, tava junto com a tia aí. Meu sogro, quando veio de Marilia para cá, ele veio me conhecer, ele gostou. Bom, vamos em frente.
P/1 – Vocês namoraram um pouquinho e depois casaram?
R – Sim, oito meses. Oito meses e pedi para casar: “Você casa com móveis ou sem moveis, a casa já tá pronta”.
P/1 – Vocês foram morar onde?
R – Lá mesmo. Na rua Monsenhor Anacleto.
P/1 – E o senhor tem quantos filhos?
R – Eu tenho três, quatro. Três homens e uma mulher. Inteligente a mulher. Esse pirulito que saiu daqui é filho dela. Esse gosta de mim, ele não larga, ele veio aqui, colocou um chuveiro novo, que queimou um, colocou outro. Tá bom.
P/1 – Como é que é o teu cotidiano hoje, seu Batista?
R – Aqui, nesse pedaço. Aqui em casa e lá embaixo, que eu fico atrás daquelas grades que tem lá, parece uma prisão, tem uma cadeira, um sofazinho, fumo um cigarro, dois lá… para não encher de fumaça aqui, né, e depois, quando é onze e meia, meio-dia eu subo, almoço e essa é a minha vida agora.
P/1 – O senhor gosta de música, de ver filmes?
R – Lá tem uma pilha de CD e tem de fita, tem de… o Paulo tem o tocador.
P/1 – E o senhor tem algum sonho para o seu futuro?
R – É difícil. Eu quando deito, eu durmo logo. Porque eu me canso também de ficar por aqui, viu? Tem hora que o Paulo vai lá e me acorda.
P/1 – Mas eu digo, o senhor tem algum plano para o futuro? Alguma coisa assim?
R – O plano meu é a morte (risos), não tem outro. Que plano eu vou ter com 91 anos, qual é o plano? Minha patroa tá com 87.
P/1 – Vocês estão há quanto tempo casados, já?
R – Sessenta e sete o João, 68 anos. Que eu tinha casado?
P/1 – É.
R – Sessenta e oito quando eu casei, que eu já era casado, né? O João tá com 68 anos.
P/1 – E o quê que você acha de contar a sua história um pouquinho? Como é que foi?
R – Para os meus filhos?
P/1 – Não, como é que foi contar a sua história pra gente um pouquinho?
R – Contar a história?
P/1 – É.
R – Que história?
P/1 – Sua história.
R – A minha?
P/1 – Sim.
R – Mas a minha o que, de solteiro, de casado?
P/1 – Foi bom contar a sua história, como é que foi contar a sua história?
R – Ah! Foi bom. Foi bom contar a história. É isso que você queria saber? Então, tá aí. Foi bom. Vamos pegar a carteira, vai, que já tá me doendo as costas aqui.
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