P/1 – Vou perguntar para você o seu nome, local e data de nascimento.
R – Janete Gomes de Sá. Nasci em Ferraz de Vasconcelos em 18 de agosto de 1954.
P/1 – Ferraz de Vasconcelos é São Paulo, né?
R – É, município, né, São Paulo.
P/1 – E qual é o nome inteiro da sua mãe, onde ela nasceu e quando, você sabe?
R – A minha mãe, Francisca Gomes de Sá, é cearense.
P/1 – É?
R – É (risos).
P/1 – De que cidade ela é, você sabe?
R – Pecém o nome do lugar. Agora...
P/1 – Se não se lembrar do dia não tem problema.
R – Eu já não sei, ela é falecida. E o meu pai é da Paraíba, também não sei mais, porque os dois já são falecidos também.
P/1 – E a sua mãe nasceu em Pecém e ela fazia o quê?
R – Dona de casa. E o meu pai era mestre de obras. Aí eles casaram lá no Ceará e vieram pra cá.
P/1 – Entendi.
R – Minha irmã ainda nasceu lá. Aí veio pra cá, eles ficaram por aqui, depois eu nasci. Tenho mais um irmão, somos em três, tudo nascido aqui em São Paulo, só ela que nasceu lá, mas veio com um mês de vida pra cá.
P/1 – Qual o nome inteiro do seu pai?
R – José Mariano de Sá.
P/1 – José Mariano de Sá. Ele era mestre de obras, é isso?
R – É. Aqui em São Paulo.
P/1 – Mas ele já trabalhava lá como mestre de obras ou não?
R – Não. Ele não trabalhava como mestre de obras lá. Mas devia ser pedreiro, alguma coisa que foi aprendendo o serviço, né? Ele veio muito novinho pra cá.
P/1 – Eles não falaram muito como era lá não, pra você?
R – Não, algumas coisas só, muito pouca coisa.
P/1 – Eles falaram pra você como eles se conheceram?
R – Falaram. A minha mãe também era muito jovem quando eles se conheceram em uma viagem que ele fez da Paraíba pro Ceará a trabalho. Aí ele conheceu a minha mãe. A minha mãe era novinha, acho que devia ter 13 anos, coisa assim. Logo se casaram, meu avô tinha muita terra, tinha casa de farinha, tinha umas coisas lá, era até razoável praquela época, sabe? E eu sei que aí depois vieram pra cá. Casaram lá. Mas não falavam muita coisa. O povo de antigamente era diferente de agora, que detalha, registra as coisas mais, né?
P/1 – Mas eles se casaram bem novinhos e vieram pra São Paulo.
R – Vieram pra São Paulo.
P/1 – Vieram como que foi? Você sabe?
R – Ele veio na frente, trabalhando já numa obra. Conseguiu dinheiro, depois alugou uma casa. Esse patrão dele tinha uma chácara, aí ele já trouxe a minha mãe pra ficar nessa chácara, sabe, que cuidava da casa e ele também ajudava lá a cuidar das plantas e eles ficaram bastante tempo assim, no lugar assim que tinha um sítio, uma coisa assim mais ou menos.
P/1 – Então eles não vieram diretamente pra capital...
R – Não, não. Eles ficaram no interior. E era ali, aproximado de Ferraz de Vasconcelos. E a minha infância eu passei por ali, até acho que uns oito anos, mais ou menos.
P/1 – Por isso que você nasceu ali então.
R – É, por isso que eu nasci ali naquele pedaço. Ainda tem minha madrinha que mora lá. Agora já mudou tudo, não tem mais aquela coisa, muda muito os lugares, né? As coisas passam.
P/1 – Agora como é você na escadinha dos irmãos?
R – Eu sou a do meio. Acho que eu tinha uns oito anos, mais ou menos, o meu pai e minha mãe separaram, sabe? Eu fiquei com meu pai. Ele ficou meio perdido, aquela coisa, não sabia direito. Aí nós morávamos num lugar, imagine uma pessoa separada há mais de 50 anos, então era difícil pra ele também. Ficamos de galho em galho, saímos de lá, fomos pra Itaquaquecetuba, um lugar pequeno também. Vai para uma casa, vai para outra. Aí como era tudo muito pequeno ainda, depois viemos pra cá, pro centro.
P/1 – Mas isso você tinha quantos anos, quando você foi pro centro?
R – Eu já tinha acho que uns 11 anos mais ou menos.
P/1 – Mas antes de chegar nessa parte eu queria voltar e perguntar o nome dos seus irmãos, quem eles são.
R – A minha irmã agora é Iolanda Gomes de Paula e o meu irmão Nilo Gomes de Sá. Ele trabalhou numa vidraçaria desde menino, já se aposentou também. Casou, tem família, mora lá pro lado da Zona Leste.
P/1 – E a Iolanda?
R – A Iolanda também. A Iolanda casou com 17 anos. Agora mora pra cá também, mas morou na Zona Leste um bom tempo. E assim que meus pais se separaram ela já tinha acho que 11 pra 12 anos, aí meu pai arrumou lugar pra ela trabalhar numa casa pra olhar criança. Ela ficou por muitos anos lá, sendo babá. Ficou com meu pai eu e meu irmão. Até os 13 anos.
P/1 – Os seus 13 anos.
R – É, até os meus 13 anos.
P/1 – Então a sua mãe não ficou com nenhum de vocês.
R – Não ficou com nenhum de nós.
P/1 - Mas ela quis ou foi acordo?
R – Assim, na época ela quis. Foi viver um amor da vida dela, uma paixão alucinada, alguma coisa assim. Naquela época era uma coisa que ninguém aceitava muito, então a gente sofreu muito por aquilo, tudo. Mas depois ela apareceu, quando eu tinha já 17 anos, ela apareceu de novo.
P/1 – Como é que foi isso?
R – Olha, no começo da minha parte eu não aceitei muito, não. Porque até então eu fui uma criança triste, sabe, eu sentia muita falta dela porque eu era muito apegada com ela. Nossa, aquilo pra mim. Na escola, lugar onde eu morava, foi meio complicado. Não tinha outras amigas porque a mãe não deixava porque era pai separado. Era diferente, né? Aí quando ela voltou eu também não aceitei de boa no primeiro, não perdoava. Depois também foi passando o tempo, eu casei, quando eu tive o meu primeiro filho eu consegui perdoar ela mesmo, de coração. Aí a gente se tornou amiga, tudo, ela até tentava... ela sofreu muito. Ela separou do meu pai, tudo aquilo, aí ela estava com o mesmo companheiro e ela viveu a vida inteira com esse companheiro, até falecer, sabe?
P/1 – Então ela largou seu pai pra ficar com esse...
R – É, com esse moço. Eles sofreram muito, os dois. Porque eram novos, era uma outra época. Ele deixou a família dele também. Aí sabe aquela coisa, depois você vai ficando adulta e você vai vendo que eles não se perdoavam, entendeu? Então era difícil pra eles também.
P/1 – Eles quem, os seus pais ou ele e ela?
R – Ele e a minha mãe.
P/1 – Porque eles sofreram muito juntos, é isso?
R – É, sofreram muito juntos, se sentiam culpados. Se sabia o que aconteceu com alguém ou não sabia nada. Então é uma situação, né? (risos) Mas depois, é coisa que passou. No fim a gente acabou tudo...
P/1 – Bem.
R – É. Aí eu com meu pai, tudo, ele casou de novo, a gente morava tudo junto. Eu com 13 anos eu vim pro mercado.
P/1 – Tá, mas antes de chegar aí me fala como era crescer no interior, como é que foi? Você brincava muito?
R – Olha, foi complicado.
P/1 – É?
R – Foi complicado porque você vê, não tinha ninguém pra me orientar. Aí sabe da parte que separaram, tudo e a gente morava em Ferraz, inclusive meu pai era até mais ou menos de vida, tudo, mas ele se perdeu tanto. Aí nós perdemos até a casa. Ficou aquela coisa, ia trabalhar como mestre de obras.
P/1 – Vocês ficavam em casa o dia inteiro?
R – Ficava e ia pra escola. Aí de repente ele não vinha, aí acabava a comida. Eu e meu irmão passamos até fome porque não tinha comida, tinha medo de pedir pras pessoas. Aí ia um, dois dias pra escola mas com fome. Sabe aquela coisa, até ele aparecer de novo pra trazer comida. Foi uma vida muito dura, viu? Aquelas de... bom, não tinha luz onde a gente morava, tinha que lavar a roupa no rio, era tudo assim muito... pegar água na bica, lavar louça no rio. Imagina duas crianças porque olha as idades.
P/1 – Vocês se criaram praticamente sozinhos.
R – Sozinhos.
P/1 – Mas era você e seu irmão, não tinha sua irmã também?
R – Não, a minha irmã ele tinha arrumado serviço pra ela, lembra que eu te falei?
P/1 – Ah, é verdade! Sim, verdade.
R – Aí ficou só eu e....
P/1 – Seu irmão mais novo.
R – Meu irmão mais novo (risos). Foi uma época difícil, viu?
P/1 – Mas vocês tentavam brincar pelo menos?
R – É, a gente brincava, ia pra escola, fazia as coisas. Eu lembro que a gente lia muito. Meu pai sempre tinha muito livro, não tinha estante, nada, em casa, era uma casa simples e os livros ficavam todos em cima de uma cadeira e a gente lia aqueles livros dele. Lia escondido porque ele não gostava, eu lia aquelas revistas Capricho, sabe, que conseguia das colegas emprestado. E o meu irmão lia aqueles almanaques. Antes tinha muito esses almanaques do Tio Patinhas, essas coisas, era o que a gente fazia, não tinha outra coisa pra fazer, não podia brincar com as outras crianças, ele não deixava. Eu apanhava porque parecia com minha mãe, olha a situação! (risos)
P/1 – Só por parecer?
R – Só por parecer (risos). Eu sofri um pouco por causa disso. Mas depois também veio a hora do perdão, que depois ele apareceu e ainda falou, e é verdade, uma mãe cria dez filhos, agora um pai pra criar três filhos é difícil, se perde. Talvez hoje nem tanto, mas depois você vai entendendo que foi o modo que ele foi criado, sabe? Aquelas coisas. Então é tudo mesmo meio rude, né?
P/1 – Ele não era muito carinhoso então, é isso?
R – Olha, ele era assim, sabe aquela coisa de disciplina? Mas era diferente. Ele mesmo olhava, você já sabia que era pra sair de perto que ele não gostou, não era muito de falar, muito de conversar, muito amigável. Era aquela relação muito de, sei lá, medo. A gente tinha medo. Mas desde pequeno era aquela coisa, por exemplo, entrou na escola, sabia escrever nome, já sabia um monte de coisas que ele mesmo ensinava, que passava lição. Nós não fomos de ter muito brinquedo, era o lápis, o caderno, era já entrar na escola alfabetizado. Antigamente tinha aquela notas, que agora é nove e meio, sete, sete e meio. Era 95, era cem. Se fosse 95 ele não perdoava de jeito nenhum (risos).
P/1 – Ah, é? E como era a escola, você se lembra o nome dela, como é que era?
R – Ah, eu não me lembro como era a escola. Era o respeito com a professora, era uma segunda mãe pra gente, né? Os professores.
P/1 – Eles sabiam como é que era, que vocês passavam o dia, você falava pra eles?
R – Os professores?
P/1 – É.
R – Olha, era tudo sigiloso, nada de falar como que era em casa, como era ele, nada de falar nada. A gente era muito retraído, muito calado. Nunca ninguém falava nada. Até eu lembro nas épocas das festinhas da mãe, isso ou aquilo que aparecia, às vezes eu chorava, não aguentava. E todo mundo pensava que a mãe tinha morrido, mas tinha vergonha de falar: “A minha mãe não está aqui, mas ela é viva”. Então deixava o dito pelo não dito. Horrível isso. Passei minha infância assim. E hoje é tão simples, você vê?
P/1 – Mas você se lembra de alguma coisa que você passou na escola que te marcou, algum professor, alguma coisa assim?
R – De professor, de bravo, coisa assim? Não. Não lembro de nada assim não.
P/1 – Tinha alguma coisa na escola que você gostava mais de fazer? Ou uma matéria?
R – Alguma matéria? Gostava mais de Português.
P/1 – É?
R – É. Eu gostava muito mais de Português. Das redações, sabe dessas coisas? Talvez porque lia também, né? Então coisa assim, eu acho que eu gostava mais.
P/1 – Você falou dos livros. Você se lembra de alguma coisa que você leu e que você carrega com você até hoje? Que você gostou?
R – Ah, eu lembro! Eu lembro de um romance que eu li. E eu ainda tinha essa fase da idade. Até, às vezes conversando com minha irmã eu falo assim: “Se eu achasse aquele livro, se eu tivesse um jeito de achar eu ia comprar para eu ler de novo pra ver o que eu sinto agora”. Pedra que deu Pedras era o nome do livro. Eu não lembro muito da história como é que foi. Mas talvez devia ter alguma coisa com a gente, alguma separação ou alguma coisa, talvez tivesse. Eu não lembro muito da história, eu lembro do nome do livro (risos).
P/1 – Do autor também ou não?
R – Do autor eu não lembro.
P/1 – Mas é Pedra?
R – Pedra que deu Pedras.
P/1 – Entendi. E como era a família? Vocês tinham alguma família além do seu pai por ali ou era só vocês mesmo?
R – Era só a gente mesmo. Meus tios eram tudo da Paraíba. Tinha um que estava na polícia, estava aqui no, como é que chama? No Dops, antigo Dops. Eu sei que ele trabalhava ali, aí de vez em quando aparecia em casa. Ah, quando ele aparecia era aquele carinho, aquela coisa de tio, sabe? Diferente do meu pai. E depois também tinha outro, tio Paulo, que era tudo do lado do meu pai. Mas não iam muito em casa, não. Ele veio da Paraíba pra cá, casou, ficou um pouco em casa, uns meses até se ajeitar e cada um foi viver sua vida, fazer suas coisas. De vez em quando aparecia em casa. Ficava triste às vezes do jeito que meu pai cuidava da gente, que era completamente diferente deles, então eles ficavam meio chateados.
P/1 – Mas depois seu pai encontrou uma outra esposa? Foi quando, mais pra frente?
R – Mais pra frente ele arrumou mesmo outra companheira, ficou um tempo com ela. Teve um filho com ela até. Mas aí já estava aqui pra cá.
P/1 – Já estava trabalhando.
R – É, já estava pra cá, eu já estava trabalhando. Ela não gostava de mim, não gostava. Eu acho que de ciúmes, sabe aquele ciúmes, aquela coisa. Aí ele também ficava naquela coisa, meio perdidão. Aquele problema, ele achava que eu era muito parecida com a minha mãe. Não sei se aquilo incomodava ele também, né?
P/1 – Até de jeito também ou só o físico, a aparência? Achava que o seu jeito era parecido também, você acha?
R – Ele achava que meu jeito era a minha mãe toda. E aquilo, sabe quando incomoda? Acho que incomodava muito ele. Ele não gostava muito. Aí um belo dia ele virou e falou assim pra mim, acho que eu tinha uns três meses no máximo que eu estava trabalhando no mercado, era uma época de frio, sabe? Aí ele pegou e falou assim: “Você arruma suas coisas e você vai embora daqui”. Morava aqui na Senador Queirós, numa esquina. O prédio até ainda existe, era uns quartos, a cozinha era comunitária, era um cortiço, coisas assim. Ele pegou e mandou eu ir embora de casa. E eu falei: “Meu Deus, pra onde eu vou agora?”. Lembra que eu te falei: “Minha madrinha ainda está em Ferraz de Vasconcelos”? Aí peguei e pensei: “Eu vou pra lá”. Falei pro meu padrinho. Três meses só que eu trabalhava lá, então não tinha aquela coisa, era muito menina, nunca tinha trabalhado, então deixava muito... era esforçada pra querer aprender, mas... Aí eu peguei e falei pro meu patrão que eu ia pra casa da minha madrinha. Ele: “Mas por que você vai embora pra lá?” “É que meu pai não me quer mais. Ele acha que eu sou parecida com a minha mãe, ele não quer mais”. Ele pegou e falou: “Espera um pouco. Você vai arrumar suas coisas e você vem pra cá”. Era uma época de férias, acho que de julho, junho. Ele falou assim: “A minha mulher está viajando”, que era férias, “eu vou falar com ela. Não te garanto, mas se ela quiser você fica em casa e vem todo dia trabalhar comigo”. Eu: “Tá bom” “Enquanto ela não vem eu vou te levar pra casa da minha mãe”. A mãe dele era uma velhinha que era a dona, a antiga dona do boxe, o Frigor Eder ela era dona, aquelas coisas. Ela já estava muito velhinha, passou a banca pra ele e ficou em casa. E na casa dela, como era muito grande, eles alugavam pra alemães que vinham da Alemanha estudar aqui, coisa assim, ali alugava os quartos. Aí eu fiquei lá com a velhinha até a mulher dele chegar. Aí fui parar na casa dele. Fiquei lá até completar 18 anos.
P/1 – Ah, é? Você ficou quantos anos então?
PAUSA
R – Fiquei lá de quatro a cinco anos com eles.
P/1 – Na casa dele.
R – É, na casa deles. Aí vinha com eles, ia com eles. Tinha um quarto lá nos fundos e eu ficava lá, no domingo podia sair. O patrão velho, né? Aí fiquei lá um monte de tempo. Depois ele passou pro filho mais novo o boxe, que ele se aposentou e eles foram morar no Guarujá. Aí eu: “Meu Deus, pra onde eu vou?”. Eles me ajudaram a alugar um apartamento aqui na Paula Souza, eu fiquei aqui. Aí a minha irmã que já era casada na época morava com a sogra, chamei ela pra morar comigo, aí eu fiquei até casar.
P/1 – Na Paula Souza.
R – É. Quando eu casei eu fui morar em Artur Alvim, sem trabalhar no mercado. Depois quando meu filho nasceu, acho que quando ele tinha um ano mais ou menos eu voltei pra morar pra cá de novo, pra ficar mais perto do bebê (risos).
P/1 – Mais perto de quem?
R – Do bebê, do meu filho, daquele que você viu lá.
P/1 – Sei. Agora vamos voltar bastante, me fala como é que foi vir pra São Paulo. Você estava no interior, qual foi sua primeira impressão dessa cidade, você se lembra?
R – Daqui do centro?
P/1 – É.
R – Horrível.
P/1 – Ah, é?
R – Nossa, eu achava muito ruim. Porque era diferente, você mora num lugarzinho no interior tudo calmo, todo mundo se conhece, sem barulho. De repente você vem e vê aquela barulheira toda de carro, de muita gente. Aí pra depois já trabalhar assim. Nossa e eu era uma pessoa tímida, muito tímida, muito calada, pra trabalhar no comércio? (risos) Era difícil, viu, foi horrível! A primeira sensação assim, sabe, até eu acostumar foi difícil (risos), não foi fácil, não.
P/1 – Vocês estavam morando na Senador Queirós já.
R – Era.
P/1 – E como era esse cortiço? Como era morar ali?
R – Ah, pra mim era horrível, pra mim era muito ruim. Porque você mora numa casa tem seu banheiro, tem seu quarto, tem suas coisas simples, mas tem. Agora ali dividir com todo mundo, cada um é de um jeito, porta com porta. Nossa, eu estranhava muito. Pra lavar louça todo mundo junto. Roupa, os tanques tudo assim. Eu estranhava muito. Muito, muito mesmo, nossa!
P/1 – E o seu pai trabalhava em obra aqui no centro?
R – Em obra no centro. Nessa época ele trabalhava numa obra, eu acho que era na Roberto Simonsen, Pires da Mota, aqueles pedaços ali, sabe?
P/1 – Sei. E como é que você conheceu o Mercadão? Quando foi a primeira vez que você entrou aqui?
R – A primeira vez que eu vim no Mercadão foi tão engraçado. Tinha uma vizinha que morava em um daqueles quartos, a filha dela chamava Magda e ela já estava trabalhando no Mercado. E o Mercado era outro horário, você entrava quatro horas da manhã e saía às seis da tarde, não era como agora, mudou muita coisa, hora de almoço, agora você tem hora de almoço, tem tudo, é diferente, não era assim.
P/1 – Como é que era? Vai falando pra mim então.
R – Você entrava três e meia, quatro horas da manhã e saía seis horas da tarde. E almoçava lá mesmo, almoçava e já ia trabalhar, não tinha aquelas coisas. Aí ela tinha começado a trabalhar lá. Essa família era de Pirajuí. Um dia ela falou pra mim: “Vamos conhecer o Mercado onde eu trabalho?” “Vamos”. Eu lembro que eu fui com ela, ali tinha três boxes de fatiados e os fatiados ficavam tudo expostos, só um vidro tampando na frente. Aí tinha uma mortadela, aquela mortadela com aquela fatia bem grande. Eu olhei praquela mortadela e falei: “Meu Deus, olha que delícia!”. E eu tinha acabado de sair de uma padaria e o que dava pra comprar acho que era pra seis, porque tinha os filhos da mulher, eu, meu pai e a mulher. Aí acho que tinha uns dez pães, um saco assim grande e um pacote de margarina, aquelas Claybom, era o que dava pra comprar. E passando no Mercado eu vi: “Ah, queria tanto trabalhar aí só para eu comer essa mortadela!” (risos). Aí andamos por ali, vi, tal, tudo. Ela falou: ‘Você não quer trabalhar?”, era na hora do almoço dela: “Você não quer trabalhar aqui comigo? Eu falo com o patrão”. Eu falei: “Ah, eu quero”. Aí ela falou: “Ele não está aí agora, mas depois eu falo pra ele”. Eu: “Tá bom”, aí eu vim embora, ela voltou lá pra dentro e ela falou mesmo pra ele, para eu trabalhar lá.
P/1 – Na banca.
R – Lá no Mercado. Aí eu fui lá pra falar com ele pra trabalhar. Ele perguntou se eu já tinha trabalhado, se eu sabia. Eu falei que não, mas que eu aprendia, que eu tentaria aprender, que eu tinha vontade. Ele falou: “Então vamos fazer uma experiência”. Eu lembro que eu fiquei lá, tudo. Meu primeiro salário foi 60, não sei o quê, 60 cruzeiros, cruzados, não lembro. Aí o meu segundo salário foi 130. Nossa, eu fiquei maravilhada, era muito dinheiro. Eu não sei assim quanto significaria hoje, mas era muito dinheiro. Assim que eu comecei a trabalhar (risos).
P/1 – O que você fez com seu primeiro salário, você lembra?
R – O que eu fiz?
P/1 – É.
R – Ah... o primeiro salário eu lembro, tinha que dar em casa, né? Mas eu comprei uma coisa pra mim. Eu comprei um relógio, que o meu sonho era ter um relógio, sabe? Um relógio que era quadradinho, que tinha uma esteirinha. E também comer umas coisas que eu tinha vontade. Eu tinha vontade comer maçã, uma coisa ou outra também que eu olho hoje e falo: “Meu Deus do céu”. Goiabada e queijo eu tinha vontade de comer (risos). Bolacha recheada. Sabe, eu fui comprando e comendo todas essas coisas que eu tinha vontade que até então não podia. Eu lembro que na escola eu olhava as crianças comerem aqueles lanches, aquelas coisas, mas não tinha (risos).
P/1 – E tem tanta comida no Mercado também, né?
R – Nossa senhora! Hoje você vê assim tudo (risos).
P/1 – Você gastou com comida, praticamente.
R – Gastei em comida praticamente. Porque antes era uma coisa muito assim, uma pessoa rica era que comia uma maçã, comia um bife, que tomava um Guaraná, uma Coca-Cola, que ninguém, eram outros tempos, que não é o seu tempo (risos).
P/1 – Mas dá para imaginar como é que era.
R – Era difícil, viu? Nossa, muito difícil. Às vezes as pessoas falam de hoje, mas hoje em dia qualquer pessoa pode ir qualquer lugar comer qualquer coisa, vestir qualquer roupa. De uma maneira ou de outra você aperta ali, faz uma coisa aqui, mas pelo menos um dia você pode ir num restaurante bom se você tem vontade, tem aquele sonho de consumo de alguma coisa e antes não era assim, às vezes a pessoa passava a vida inteira pra calçar um sapato, uma coisa, um vestido, era muito difícil (risos).
P/1 – Como era o Mercadão quando você começou? Vendia as mesmas coisas, era do mesmo jeito ou não?
R – Não. Era completamente diferente. Eram famílias. E era mais simples, não tinha tanto importado. Ali mesmo, onde eu trabalho, nós trabalhávamos com o quê? Que tinha linguiça, salsichas, é mais os embutidos. Salame, paio, essas coisas. A mortadela, os frios já tinha. Mas só essas coisas. E tinha uma, quem vendia queijo não podia ficar vendendo salsicha, essas coisas. Azeitona, por exemplo, quem vendia era quem vendia arroz, feijão, azeitona. Queijo era só queijo, salgado era só salgado. Não tinha tanta lanchonete. As pessoas iam mesmo pra comprar. Agora ficou meio diferente isso, porque por exemplo você vai sentar com amigos, tomar um chope, beliscar. Você vai lá pra comprar, pegava um carrinho, ia comprar, o máximo que você fazia era tomar um cafezinho ali, por isso que tem essa confusão de tempo, sabe? Às vezes a pessoa demora muito lá no Mercado e está consumindo mas não está comprando pra casa, né? Entendeu?
P/1 – Entendi. E por que tinha essa separação, quem vendia queijo só vendia queijo?
R – Era assim a separação.
P/1 – O cara não podia vender queijo e linguiça.
R – Não. Era tudo separado. Outra coisa também, os balconistas não ficavam do lado de fora, como ficam agora, às vezes até abordando e tal. Os balconistas ficavam pro lado de dentro do balcão, não ficavam do lado de fora, era diferente mesmo.
P/1 – Você imagina por que separava desse jeito quem vendia o quê? Queijo só queijo ou só cereal?
R – Então, você sabe que era tudo mesmo separado. Eu acho que já era assim um acordo feito, talvez com a prefeitura de não misturar muito as coisas. Como agora, por exemplo, lá nós vendemos bacalhau, vendemos grãos, as castanhas, vendemos laticínios, vendemos tudo. Pode vender tudo, lá é um empório, então pode vender tudo. E antes não era assim.
P/1 – E como é que funcionava esses vendedores dentro da banca? O cara tinha que ir até lá na frente pedir para ele?
R – É, até lá. E nunca o funcionário saía pra fora pra atender, as coisas ficavam tudo dentro, guardadas, refrigeradas, exposto de maneira, não assim pra fora. Que hoje em dia um mete a mão, outro mete, acha que tem que ser assim mesmo. Sei lá, tem umas pessoas que nem educação tem, vai lá, pega, não pede. E também acha que porque está exposto pode pegar, tem dois lados da situação.
P/1 – Então o pessoal ficava mais pro lado de dentro mesmo. Agora, como é que eram os boxes, as bancas? Como era montada?
R – Hoje você demora mais tempo montando, organizando, do que atendendo. Antigamente você atendia mais e arrumava menos, eu chego a essa conclusão. Hoje tem muito acrílico, tem muito jeito, muita coisa e antes não tinha isso, era mais no improviso, não era tão organizado. Talvez porque tivesse menos coisas também. Você vê? É que você vai passando, você lá dentro esquece, mas olhe, não tinha um durex, a balança pesava mas a balança só pesava, hoje em dia você aperta o preço já sai a conta, já sai a etiqueta, já sai tudo, você não precisa nem se preocupar com essas coisas. Agora por exemplo lá você põe o negócio lá da tarja e pronto, já sai lá no caixa o valor. E antes não. Então você tinha que contar as 20 gramas na balança, as dez gramas na balança. Aí multiplicar o peso por preço. Hoje não tem mais necessidade disso.
P/1 – Como é que você fazia então? Você pegava um produto, me fala como era, você pesava.
R – É, você pegava um produto, pesava, contava na balança – a balança é de cinco em cinco gramas, né? Quinhentos e dez gramas. Então 510 gramas, 18 reais o quilo? Vezes 18, aí vem o total, aí você colocava lá. Aí o cliente vinha, pedia mais outra coisa, você multiplicava o preço pelo peso, aí colocava lá. Já imaginou? Hoje não tem mais isso, hoje você só aperta lá o preço, nem o preço, o código só (risos), que antes era o preço, agora você apertando o código já sai o total. E ainda escrito na balança o que é (risos).
P/1 – E o pessoal pagava como? Tinha uma caixa?
R – É, tinha um caixa, mais dinheiro, alguns cheques, alguma coisa assim, mas mais dinheiro mesmo.
P/1 – E você se lembra quando você entrou em 69. Em 69 você entrou lá, né? Quais eram as famílias que trabalhavam lá, as maiores ou as mais conhecidas?
R – Bom, tinha lá o...
P/1 – Se você puder falar o nome deles.
R – O Santander. Tinha o Mané que o filho dele está lá até hoje, o Bar do Mané. Tinha o nosso, que é os Pantel. Deixa eu ver mais quem. Nossa, está tudo tão diferente que não dá nem pra você lembrar. O Zucchini que está lá até hoje, que é o salgado. Que está lá até hoje...
P/1 – Ou os maiores que já foram embora que você se lembra mais dessa época.
R – Esse que é o Rei do Bacalhau era Milani, que agora é Rei do Bacalhau já faz um tempo. Depois tinha o que é o do Levi era outra família, era uma família de italianos que trabalhava ali.
P/1 – E o que se vendia mais lá? Você falou que também vendia arroz, essas coisas, né?
R – No Mercado?
P/1 – É. Nessa época o que se vendia no geral?
R – No Mercado? No Mercado o que vendia muito era os laticínios, as azeitonas. As bancas de empório tinha arroz, feijão, essas coisas. As frutas, não tinha tantas frutas exóticas como agora tem naqueles meios. Tinha mais atacado de fruta dentro do Mercado porque não tinha tanta lanchonete, né? Tinha mais açougue, tinha mais frango. É, tinha mais salgado. E não tinha tanto importado, esses queijos importados. Uma coisa que eu vendia bastante lá, que depois tiramos de lá e foi para os outros boxes, era tempero. A gente vendia muito tempero. Só que o tempero que a gente vendia não é como agora que vende o saquinho tudo fechado, vendia ele pra você pesar na hora, sabe? Ficava tudo nos vidros, você pesava na hora.
P/1 – Pegava como do vidro?
R – Com uma canequinha.
P/1 – E agora na sua banca você vendia o quê mais? Tempero.
R – É, vendia tempero, vendia linguiça, salsichas, os frios, essas coisas assim.
P/1 – E qual o nome da banca?
R – Alfredo Pantel.
P/1 – E o dono lá era o Alfredo Pantel?
R – É.
P/1 – Entendi. Agora, você sabe de onde é que vinham esses alimentos, onde que o seu patrão comprava, onde o pessoal comprava pra vender ali?
R – Os nossos vinham o frigorífico Eder, Santo Amaro, que esse frigorífico era da mãe do Alberto Pantel, que o Alfredo Pantel era filho do Alberto Pantel. E eles vinham desse frigorífico que a mãe dele era dona e depois ela vendeu pro seu João Eder. A maioria vinha tudo desse frigorífico.
P/1 – E os temperos?
R – Agora, os temperos não. Os temperos vinham, tinha um distribuidor na Paula Souza. Não tinha tanto tempero como tem agora ali na Santa Rosa. Ali na Santa Rosa era só atacado, sabe, de arroz, de feijão, de batata, de cebola. Não era varejo dessas coisas.
P/1 – Você chegava a ir na Santa Rosa bastante nessa época?
R – Se eu cheguei a ir?
P/1 – É.
R – Eu morei um tempo ali na Benjamim de Oliveira.
P/1 – Ah, é?
R – Morei ali um tempo. Quando eu vim pra cá eu casei, fui pra lá, depois quando meu filho fez um ano eu vim pra cá e morei na Benjamim de Oliveira. Na época das enchentes, daquelas coisas.
P/1 – Você viu enchente lá?
R – Acho que foi em 68, 72, umas enchentes horríveis.
P/1 – Sério?
R – Sério.
P/1 – Como é que foi?
R – Nossa, horrível. Teve muita gente que perdeu tudo. Aqui mesmo onde eu trabalhava a água subiu até assim, sabe? Cheio de lama. Aí a gente teve que limpar tudo, jogar tudo fora, estragou todas as mercadorias que estavam na geladeira, estragou geladeira. Aí entravam os caminhões da prefeitura, iam entrando dentro das bancas e jogando tudo fora, porque não tinha como. Lama, já pensou? O rio enchia, enchia sempre e vinha água pra cá. Acho que foi em 68, 72, eu acho que peguei umas três enchentes feias aí, bem feia mesmo.
P/1 – Você já ficou ilhada?
R – Já. Ih, nossa senhora, já andei com água até aqui assim, pra passar do Mercado pra Benjamim. Meu Deus (risos).
P/1 – Entrava muita água no Mercadão também.
R – Entrava. Até eles fazerem esse trabalho no rio, acho que foi o Maluf que fez isso aí. Até ele fazer, nossa! Era aqui, o Mercadão, e a Santa Rosa.
P/1 – A Paula Souza não entrava muita água?
R – Não, não. Era mais esse pedaço de baixo. Porque na verdade esse rio aí era um rio grande, aí foi tampando, tampando, tampando (risos).
P/1 – E como era morar aqui na Zona Cerealista?
R – Olha, nessa época eu já estava acostumada com aquela coisa. Ah, era aquela rua suja, aquela coisa, mas no fim pra mim era bom porque estava perto do meu filho, qualquer coisa eu estava mais perto. Então, pra mim foi bom. Aí eu não saí mais daquele pedaço, morei muitos anos ali, depois morei aqui na rua da igreja, sabe?
P/1 – Na Polignano?
R – É. Na Polignano a Mare.
P/1 – E o que tem no bairro pra fazer?
R – Aqui no bairro, assim, no domingo você fala?
P/1 – É, no fim de semana.
R – Fim de semana. Bom, tinha as quermesses, a missa e estava sempre mais perto de tudo. Perto do metrô, você vai até a Liberdade, vai até a Praça da República. Vai para um shopping, vai para um lugar assim, então sai. Porque na rua mesmo não tem nada. E pras crianças ainda tem, eles fecham a ruinha lá, fazem uma ruinha de lazer, joga bola, coisas assim (risos).
P/1 – Agora vamos voltar pra falar do Mercadão. Você falou que era de um jeito no Mercadão e foi mudando, né? Você acha que mudou, como foi mudando?
R – Olha, como? Na verdade mudou por que? Sei lá, eu fico imaginando assim, que o mundo mudou, as famílias mudaram, as famílias diminuíram, você não armazena as coisas pra você comprar, não tem mais reunião familiar, é muito pouca. Quando tem a mulher foi pra fora trabalhar, então faz a reunião fora, em outro lugar. Antigamente eu lembro até o Mercado era cheio de carrinho, as compras eram feitas com carrinho. Agora eu nem sei se vê mais.
P/1 – Carrinho, né?
R – O povo compra praquele consumo lá e é tudo muito no picadinho, 100, 200 gramas de cada. Porque é isso, é tudo pouco mesmo, não é mais como a pessoa levava, eram famílias grandes, era pra guardar, era pra não sei o quê. Hoje não tem mais isso. As reuniões são pequenas. E também tem muita variedade. Não tinha tanta como tem, agora tem muito mais variedade de coisas, eu acho.
P/1 – Então a clientela mudou.
R – Mudou. O perfil da clientela mudou muito, muito mesmo. Pessoa já quer as coisas prontas pra comer na hora, quando não vem comer aqui no mercado. É aquilo muito de pouquinho. Por exemplo, vai lá nos frios comigo, ela pode levar cinco itens, ela leva cinco tipos de produtos, mas cem gramas de cada um. Se estão em dois, três, como é que vai levar mais? Não tem como. Então é assim. E antes não era, cem gramas, 200 gramas não existia, era meio quilo, um quilo, um quilo e meio, era muito. Agora não. E como eu te falei também, não tinha mercados então cinco horas da manhã era todo mundo com a sacolinha ali no Mercado, fazia até barulho o povo entrando. Agora não, demora muito, é pouquinho, pouquinho.
P/1 – O pessoal fazia fila na porta?
R – Fazia.
PAUSA
P/1 – Você estava falando que fazia fila na porta pra entrar.
R – Fazia fila na porta do Mercado. Cinco horas da manhã já tinha muita gente esperando pra entrar.
P/1 – Então era mais movimentado.
R – Era mais movimentado. Era bem mais movimentado.
P/1 – E como é que eram esses corredores, conseguia andar?
R – Nossa. E assim, era aquela coisa que, sabe, você não tinha tempo de ficar arrumando, que era muito, era demais, era aquela loucura direto. Não é como agora, por exemplo, um sábado, uma sexta. Nós ainda temos bastante movimento porque temos muitos itens, então tem ali, tem a banca do lado, tem aquela outra lá na ponta, então tem uma de salgado aqui, ali faz mesmo, onde tem movimento faz a diferença. Mas mesmo assim, no sábado era uma verdadeira loucura. Você parava mesmo pra comer, você tinha que abandonar ali e ir, senão.
P/1 – E você tem alguma história com cliente que você já passou, alguma passagem que você se lembra assim?
R – Ah, de cliente?
P/1 – Ou qualquer história curiosa que você passou no Mercado.
R – Ah, de curiosa, já passei tantas que eu nem me lembro mais, viu? Mas uma assim que valha a pena mesmo (silêncio). Ah, vamos conversando aí que eu vou lembrar de alguma coisa. É que tem, viu, várias, deixa eu ver se alguma vale a pena (risos) porque olha. Eles são muito queridos pra mim porque não sei, mas quando eu vou atender um cliente assim eu me coloco no lugar dele, sabia? Assim, que eu fico sempre pensando. Se pergunta ou se quer saber de alguma coisa. Eu não acho que ele não vai comprar nada, nem nada, eu dou o meu cartão de visitas pra ele e assim eu penso, se ele não vai comprar agora ele vai marcar e ele volta depois. Eu faço por onde, sem ser chata, que ele volte, ou que ele indique alguém, alguma coisa, entendeu, é o meu trabalho que eu faço assim. E eu acho que sempre dá certo. Você vê, o colorido é igual, tem várias bancas iguais, então tem que ser alguma coisa que chame a atenção deles. Vem gente da Bahia, vem gente do Acre, vem gente de Minas, de Porto Alegre. “Sabe, ah, você tal”. E vem às vezes uma vez por ano, duas vezes por ano, mas vem. Tem uns que indicam: “Ah, mas é aqui. O jeito da bandeja, é o jeito que corta. Ah, é essa máquina”. Então, sabe, você tem aquele carinho. Eu acho que já foi melhor o atendimento no Mercado e eu até sempre falava isso, que é uma coisa que a gente tem que diferenciar. Sabe que você chega num mercado é tudo tão frio, não tem a quem perguntar, nem nada. Ou eu mesma vou em uns lugares assim, a pessoa não olha, nem nada, só: “Tá bom, não tá” “Pois não”, nem pergunta nada, você que tem que perguntar. Então eu acho que aqui ainda faz a diferença, sabe? Nos lugares que você vai as pessoas te dão atenção, você experimenta o produto, sabe o que você está levando, aprende. Então eu acho que é uma coisa diferenciada.
P/1 – A relação do vendedor.
R – É, com o cliente. Eu acho que é uma coisa especial aí no Mercado, ainda eu acho. Eu acho que as pessoas mais novas teriam que procurar não deixar isso morrer, porque isso é tão importante. Ainda mais hoje que as pessoas estão carentes, se ela se sente bem atendida num lugar, numa coisa é tão gostoso. Porque não vai falar aquela banca, é o Mercado, então por isso que é importante. Eu gosto do Mercado, eu acho que ali, como assim defeito, tem em todo lugar, mas eu acho que mesmo assim tem o encanto, o Mercado.
P/1 – Como assim?
R – Ah, justamente por causa desse carinho das pessoas. Por que você está me trazendo até aqui? Porque quer saber da história, entendeu? Porque tem uma história pra contar. E assim, de lá de dentro também. Sabe, tem as mudanças, tem aquelas coisas, mas não são coisas frias, vazias. Até aquela coisa dos clientes mesmo. Eu até estava lembrando que veio o pai, vem o filho, vem o filho do filho. Às vezes eu fico olhando, aqueles clientes que quando vêm agora já de cabelo branco ou sem cabelo, mas não alcançava nem no balcão, sabe? Com as mãozinhas no balcão. “Meu pai que vinha sempre aqui comigo, olha, eu vim matar a saudade”. É tão bom (risos).
P/1 – Isso que é o bom do Mercadão.
R – Também, também (risos).
P/1 – Você fez muitos amigos lá?
R – Nossa, bastante! Bastante amigos. E você vê, minha vida inteira eu praticamente passei ali, né? O tempo passou tão depressa. É que é aquela coisa, quando você trabalha num lugar você tem que ter um prazer, porque não é só pelo dinheiro, você passa a sua vida inteira ali, então você tem que gostar do que você faz. Eu acho que valeu e vale a pena (risos).
P/1 – E quem são seus melhores amigos de lá? Você teria alguma listinha de amigos pra fazer que te marcaram mais?
R – Olha, eu até teria mas muitas pessoas que trabalharam comigo já não estão mais lá, né? Umas já se foram. E agora tem os mais novos, mas uma grande maioria até se foi e outros já não estão mais lá. Uma grande maioria já se foi mesmo.
P/1 – É? E sempre foi um lugar com pouca mulher, o Mercadão, eu imagino.
R – É. Antes não tinha mesmo, agora ainda tem, tem as meninas que trabalham na lanchonete, tem mais uma outra ali, aqui, hoje tem muito mais, tinha quase nada. Porque era um lugar muito frio, o horário era muito, então era muito puxado, não tinha mesmo como ser, era muita friagem.
P/1 – Ah, é?
R – É, era muita friagem, era muita geladeira. Eu acho que era mais frio do que agora.
P/1 – Sei.
R – A época era muito mais.
P/1 – Como era na época de inverno lá?
R – Nossa, era frio, viu? Era muito frio. Era frio e dentro tinha estrados pra ver se melhorava o frio, era todo mundo muito agasalhado. Os homens bebiam muita bebida quente, principalmente aquela parte dos açougues. E antigamente, às vezes eu noto, não era cerveja que o povo consumia mais, era bebida quente.
P/1 – É?
R – É. Era bebida mais quente.
P/1 – Mas alcoólica.
R – É. Era muito chocolate quente, café, chá de gengibre pra esquentar, tudo que era coisa pra você procurar esquentar (risos).
P/1 – E no verão como é que ficava? Era melhor ficar lá dentro?
R – Ah, o verão era melhor! Era melhor, era melhor sim. Muito mais agradável (risos).
P/1 – E você me contou antes dessa entrevista que você conheceu seu marido lá também.
R – O meu marido, na verdade eu não conheci ele lá, eu conheci ele num baile no Ipiranga. Ele servia na Base e eu conheci ele no baile no Ipiranga, não lembro como chamava o salão lá. E essa Base, o Quarto Comar, era ali perto do Museu. Eu sei que eu conheci ele nesse baile. Aí passou um tempo a gente ficou se namorando, tudo e ele lá na Base.
E ele é de Barretos, né? Depois ele saiu da Base, não sabia o que fazer e nós começamos a namorar. Primeiro ele foi trabalhar de guarda numa transportadora, trabalhou um tempo. O nome da transportadora, (Trans Uto? _1:10:09_). Aí ficou um tempo lá, depois veio pra ajudar um final de ano no Mercado. Aí pronto, aí ficou no Mercado, gostou do Mercado e ficou ali também trabalhando.
P/1 – Trabalhava em que banca?
R – Ele trabalhava do lado da minha. Aí ficou ali um monte de tempo. Nós casamos e ele ali. E eu do lado de cá. Ficamos o tempo inteiro trabalhando assim. Faz 12 anos que ele faleceu, mas ele trabalhava ali.
P/1 – Era vendedor também?
R – Era vendedor também.
P/1 – E como era isso? Estar do seu lado assim?
R – Ah, era bom (risos).
P/1 – Vocês se conversavam sempre?
R – Não podia conversar muito, não era de ficar conversando muito, a não ser que precisasse de alguma coisa, mas não era de conversar muito lá dentro (risos).
P/1 – E me fala como é o ano no Mercadão. Tem datas que são mais corridas, tem períodos, como é isso?
R – Sempre foi o Natal, o Dia das Mães, Páscoa, Dia dos Pais, esses são os mais corridos mesmo.
P/1 – E sai mais o quê nessas datas, em cada uma delas?
R – Olha, na Páscoa o bacalhau. O que sai mais mesmo é bacalhau, azeitona e azeite, na Páscoa. Agora, no Dia das Mães é a feijoada e o bacalhau. No Natal é frutas secas, é bacalhau, é tender, é pernil, é lombo, é frios, é tudo (risos), é uma coisa de louco, viu?
P/1 – Hoje é muito mais turístico, parece, né?
R – É.
P/1 – Quando que começou essa exploração mais turística do Mercado, você viu isso acontecendo?
R – Vi. Eu acho que foi mais na reforma do Mercado, que tem o quê, uns dez anos. Acho que mais ou menos de uns dez anos pra cá. Aí que começou mais turismo, que começou mais mudar o perfil do Mercado, né? Aí começou mais lanchonete, mais turismo, mais as coisas só pra... mudou, mudou tudo, tudo, tudo, acho que de uns dez anos pra cá, mais ou menos.
P/1 – Essa reforma mudou o que no Mercadão?
R – Mudou o perfil do Mercado. É como eu falei pra você, aí logo no começo deu até aquele impacto porque, por exemplo, começou aquele confusão, o cliente que vinha comprar ficava chateado porque ele não encontrava lugar. Porque o cliente que vai comer, almoçar, tomar um lanche, tomar uma cerveja demora o dobro do tempo, entendeu, pra passear lá dentro. E aquele que vem comprar é a metade daquele tempo. Mas aí acabou não dando muito certo, começou a... E falta muita estrutura de estacionamento, eu acho. Porque tem muitos que deixaram até de vir por causa disso. Vem muitos de fora, mas os das redondezas não vêm no Mercado, é muito difícil por causa disso porque não tem lugar, não dá pra estacionar, já começa daí, o povo é estressado, não tem paciência, né?
P/1 – Tem aquele mezanino agora, né? É isso que foi feito lá.
R – É. Tanto o mezanino como embaixo também. Olha quantas lanchonetes tem a mais.
P/1 – E você sabe quando começou esse negócio de mortadela, esse sanduíche, era sempre assim?
R – Foi de uns dez anos pra cá que ficou mais.
P/1 – Mas desde os anos 70 vocês comiam o sanduíche desse jeito?
R – Ah-Ah.
P/1 – Não.
R – Antes não era assim, não. É como eu falo pra você, aquele sanduíche tem 300 gramas de mortadela. Eu acho que de uns dez, 12 anos pra cá.
P/1 – Mas você já comeu esse sanduíche antes?
R – Antes não. Nem aquele pastel de bacalhau. Aquele pastel de bacalhau, na verdade, ele nasceu numa lanchonete que é até assim bem fraquinha, ela já foi muito movimentada, que era até concorrente do Mané. O pastel de bacalhau nasceu ali. Um rapaz que era o gerente que lançou aquele pastel ali, que era o pastel mesmo, nossa, uma coisa de louco, foi lançado ali. Muito grande. Aí agora já está no Mercado inteiro, está aquela coisa.
P/1 – E esse Bar do Mané, como é que ele era?
R – Esse Bar do Mané é antigo. Eu acho que é o melhor sanduíche que tem, é ali.
P/1 – De mortadela mesmo?
R – É.
P/1 – Você comeu muito lá já?
R – Já. Muito, muito, na verdade não. Sabe por que? Porque eu não gosto desse sanduíche muito cheio de mortadela. Eu acho que é muita mortadela (risos). Eu estou sendo sincera. Mas eu acho que ali é o lugar assim que as coisas muito caprichadas.
P/1 – O seu patrão, o Pantel, como é que é a história dessa banca, como ela está hoje, ela está mudando?
R – Essa história, como eu tinha falado, era a avó, era o filho, aí depois o neto, que foi indo assim. E foi uma história bonita, eles viveram sempre com esse box aí. Aí o neto morreu e os irmãos que sobraram, que era um casal de irmãos, era de Santa Catarina e eles não tinham nada a ver. Eles até tentaram por um tempinho assim pra ver se valia a pena eles mudarem de vida pra cá, né? Mas não deu certo assim. Depois o neto morreu e os irmãos ganharam na loteria porque ele fez uma pequena fortuna ali.
P/1 – Vendendo.
R – É. E ele era solteiro, não tinha filhos, aí ficou para os dois irmãos. Eles venderam para o Cirineu.
P/1 – Quem é esse Cirineu?
R – O Cirineu, eu falo menino porque pra mim ele é um menino, é o dono lá do Pirâmide.
P/1 – É um box também.
R – É, o box do Pirâmide. Da padaria também que é dele. Então ele pegou e acabou comprando.
P/1 – Mas como ele começou?
R – Como o Cirineu começou? Ah, ele começou menino mesmo, vindo pro Mercado. Ele trabalhou com meu marido por um tempo, com meu padrasto, menininho. E com o pai dele. Disse que nem dormia de madrugada, acordando todo mundo pra ir trabalhar no Mercado. Começou no final de semana. E alegre, aquela coisa de amar os balcões e de aprender e de atender, sabe? Carinhoso, carismático. Começou assim. Aí depois trabalhou lá do lado, depois trabalhou comigo. Nossa, aquela graça de menino, sabe? E foi indo assim, trabalhando. Depois eu sei que arrumou uma banca bem pequenininha, pra arrendar, ele e o irmão dele tentaram fazer pra arrendar aquela banca lá porque tinha que pagar o aluguel, tudo. Foi, conseguiu, foi indo, foi indo, não foi assim de uma hora pra outra. Mas o tanto que ele fazia, ele pegava um irmão pra ajudar ele, pegava o outro pra ajudar ele, sabe? Aí foi indo, foi indo e o danadinho desenvolveu mesmo, viu? (risos) Não é só de querer fazer isso e aquilo, ele fica lá no meio, ele trabalha, arregaça as mangas, sabe? Precisou ele vai lá atender. Sabe aquele empreendedor? Ele é danado, viu? (risos) E foi pra frente (risos).
P/1 – Agora qual é o nome do seu marido?
R – Jackson _1:21:50_.
P/1 – Você se casou com ele e teve um filho com quanto tempo de casada?
R – Com um ano já veio o menino. E a menina veio dez anos depois.
P/1 – O menino é o Marcos.
R – É. E que trabalha ali. A menina é Marina. Ela se formou, é fisioterapeuta, trabalha ali no Sírio. Aí namorou um rapaz, casou, esse ano teve bebê, tenho um netinho. Aquele menino, meu filho, tem uma filha com 12 anos. E agora eu tenho um netinho com três meses, um menino. Tenho um casalzinho (risos).
P/1 – Como é que foi o dia do nascimento do Marcos, você se lembra?
R – Nascimento dele?
P/1 – É.
R – Ah, foi assim uma coisa muito esperada, muito, sabe? Nossa, dos sobrinhos do lado da família dele, foi o primeiro neto da família do meu marido. E agora do lado da minha já tinha um monte de menina, foi ele o primeiro homem, do lado da minha família, só tinha menininha, sabe? (risos) E ele sempre, desde criança, ele gostava do Mercado.
P/1 – Ah, é?
R – É. Eu trazia ele pro Mercado e ele gostava, e ele olhava, e se encantava e olhe, não quis estudar e quis ficar no Mercado (risos).
P/1 – Ele está lá?
R – Está lá até hoje. Eu pus ele pra trabalhar cedo, ainda podia colocar pra trabalhar cedo. Eu falei: “Ah, você não quer estudar? Então você vai trabalhar”. E você sabe que ele não reclamava não, viu, ia.
P/1 – Chegava de madrugada.
R – É, de madrugada, sem reclamar, nem nada, o negócio dele era trabalhar, não queria era estudar. Às vezes eu falava: “Você vai se arrepender porque não estudou”. Poxa, ele tem uma inteligência, sabe, principalmente por lado de carro, mas... “Entra no Senac aí, faz alguma coisa” “Mãe, isso pra mim é só hobby, eu quero trabalhar no Mercado”.
P/1 – Ele gosta de comércio?
R – Gosta (risos).
P/1 – E ele está em que banca?
R – No Saporito, aquele da esquina.
P/1 – Vocês sempre se veem por ali?
R – Ah sim, toda hora ele está lá: “Oi mãe!” (risos).
P/1 – Almoçam junto?
R – Vamos. Tomar café, gostoso (risos).
P/1 – Você falou do seu marido. Ele faleceu há um tempo, foi?
R – Faleceu.
P/1 – O que aconteceu?
R – Ele ficou diabético e aquela coisa, não querer fazer os regimes. Primeiro saiu uma ferida no pé, aí aquilo inflamou. Foi, foi, aquilo não sarava de jeito nenhum. Mas o que ele morreu mesmo, infartou. E ele infartou dentro do hospital. E ele sempre falava pra mim: “Ah, eu não quero”, quando ele ficou diabético ele ficou muito ruim e ele ficou na Caixa. Aí ele ficava mais pra Barretos do que pra cá. E ele sempre falava assim, brincando com todo mundo, era alegre, bonachão, sabe? Falava sempre pra mim: “Eu não quero ser enterrado aqui em São Paulo, eu quero ficar lá em Barretos”. Todo mundo que conhecia ele, ele falava isso. E ele estava exatamente lá. Deu um, acho que o primeiro que começou a dar nele foi em casa, aí levaram ele pro hospital. E nessa semana eu ia num casamento lá em Barretos com ele, isso aconteceu na terça-feira, na sexta eu ia pra lá, que sábado era esse casamento de uns amigos da gente. Na segunda ele foi pro hospital, fez todos os exames não apareceu nada. E lá em Barretos todo mundo conhece todo mundo, conhecia ele, tudo. A enfermeira tinha estudado com ele, pegou e falou pra ele: “Como você não quer fazer regime, é muito malcriado, você vai tomar sopa”. Aí disse que ele ainda respondeu: “Põe aí que eu já tomo”, aí caiu assim pra trás e deu o infarte. Pegou todo mundo de surpresa, ninguém jamais imaginava que isso iria acontecer, sabe? Ele tinha 47 anos.
P/1 – Jovem, né?
R – Aí 20 dias depois o pai dele faleceu. Foi horrível, nossa. Assim, uma coisa, sabe? Em um ano só. Depois foi meu pai, tudo no mesmo ano.
P/1 – Há 12 anos?
R – É.
P/1 – Em 2004.
R – Aham.
P/1 – Foi difícil então.
R – Nossa senhora, Deus me livre. Foi terrível. Mas passa, tudo passa.
P/1 – Você está com quantos anos hoje?
R – Quantos anos eu estou?
P/1 – É.
R – Sessenta e um.
P/1 – E está pensando se aposentar ou não?
R – Na verdade eu já estou até aposentada. Eu me aposentei o ano retrasado, mas continuo trabalhando (risos).
P/1 – Você não quer parar não? Não pensa em parar ou vai continuar mesmo?
R – Às vezes eu penso trabalhar um pouquinho menos, fazer alguma coisa, menos horas. Mas eu não penso na verdade em parar de trabalhar, não. Porque tudo bem, vamos produzir, né? (risos) Ficar em casa em beira de sofá também (risos).
P/1 – Você não quer, né?
R – Não.
P/1 – Mas você tem algum sonho pro futuro, algum plano pro seu futuro?
R – Ah, olha, eu tenho um sonho, conhecer a Espanha e a França (risos).
P/1 – De onde surgiu esse sonho?
R – Você sabe que na verdade a França eu sempre... eu vi um quadro e não é a Ponte dos Amores, mas é uma ponte linda. Eu me vejo lá naquela ponte. E eu fico imaginando que é um lugar bonito, de pessoas elegantes, queria ver se era mesmo. E a Espanha, nossa. Quando eu vejo, porque eu vendo muito Jamón, sabe? Eu fico pensando: “Um dia eu quero ver lá, quero ir lá para eu ver se é tudo isso mesmo”. De ver aqueles Jamón curando, esses pata negra que a gente vende aqui a 600 reais o quilo, cem gramas 60 reais. Quero ver se é tudo isso mesmo. Se eles se alimentam só das Bellota de castanha, porque diz que é, então. Que lá é tão popular, que lá é tão isso, tão aquilo, eu queria ver se é tão assim mesmo, por isso (risos).
P/1 – Tem algum produtinho que você gosta de vender mais, você tem mais familiaridade?
R – Ah, que eu tenho mais afinidade de vender, que eu vendo mais?
P/1 – É.
R – É justamente os Jamón. A minha vida inteira eu vendi o Jamón e o presunto Parma, que são os importados. E é os que eu vendo mais, eu gostaria de ver como são feitos mesmo. Eu vejo na televisão uma matéria ou outra, eu queria ver como era lá, ao vivo e a cores (risos).
P/1 – Como é que foi falar um pouco com a gente?
R – Ah, foi bom, muito bom. Muito bom, você é suave, simpático (risos). Não sei se deu certo de sair a matéria.
P/1 – Deu.
R – Deu?
P/1 – E o que você acha de contar um pouco da história de vida?
R – Ah, foi bom, muito bom.
P/1 – Você acha que é importante, é legal falar?
R – Ah, eu acho legal falar. Porque você deixa assinado embaixo a sua vida aqui, né? (risos)
P/1 – Um pouquinho dela, né?
R – É, um pouquinho dela, assim, a sua história. E a minha história é aí, o meu canto é aí. Meu carinho é aí, eu adoro o que eu faço, sabe? Sei lá, pode não ser muito, mas pra mim assim. É por isso que eu falei, aqui pra mim tem um encanto, esse pedacinho. Que aí eu vivi a minha vida, eu conheci pessoas, eu aprendi. Eu também recebi carinho das pessoas. Então pra mim valeu, valeu mesmo.
P/1 – Tá certo. Obrigada, viu Janete?
R – De nada (risos).
Recolher