P/1 - Para começar, vou pedir para você falar seu nome completo, a data e o local do seu nascimento. R - Julieta de Campos Pereira nasci em sete de novembro de 1957 na cidade de São Paulo. P/1 - E você conheceu seus avós? R - Conheci minha avó materna. P/1 - E você chegou a conviver com ela na infância? R - Muito pouco tempo. P/1 - Muito pouco tempo? R - Uns três anos mais ou menos. P/1 - Entendi. E os seus pais? Eles faziam o quê? R - Ah, os meus pais...batalhadores . Meu pai era motorista duma empresa e minha mãe trabalhava como doméstica. P/1 - E que lembranças que você tem marcantes do seu pai, de infância, de criança? R - Todas. Ele foi um grande companheiro durante toda a minha infância e adolescência, ele era um pai muito presente. Como ele casou velho, casou com quarenta e seis anos, ele esperava muito ter uma filha. Ele era boêmio e resolveu casar com quarenta e seis anos, quando eu nasci fui muito comemorada, principalmente por ele. Durante a vida ele sempre me paparicou bastante a minha mãe também. Minha mãe batalhadora, matriarca daquelas, trazia tudo ali na mão, todo mundo tinha que estudar muito, corresponder todo o sacrifício que eles faziam e a gente conseguiu absorver tudo o que eles conseguiram passar para nós. P/1 - E vocês eram em quantos filhos? R - Nós do segundo casamento da minha mãe, éramos quatro. Como ela teve dois casamentos, eu tenho mais duas irmãs que são bem mais velhas do que nós quatro. P/1 - E você lembra da casa em que você nasceu? Como era a casa? R – Sim Porque nós, ali na região do Campo Limpo, no bairro especificamente onde eu moro, os meus pais quase foram os desbravadores dali. Então era assim, como um sítio. Tinha tudo de frente, um quintal grande. Então minha mãe conservou todas as características que ela trouxe do interior, de ter uma horta, de ter um galinheiro a gente cresceu com essa, até os doze anos a gente cresceu com essa característica interiorana,...
Continuar leituraP/1 - Para começar, vou pedir para você falar seu nome completo, a data e o local do seu nascimento. R - Julieta de Campos Pereira nasci em sete de novembro de 1957 na cidade de São Paulo. P/1 - E você conheceu seus avós? R - Conheci minha avó materna. P/1 - E você chegou a conviver com ela na infância? R - Muito pouco tempo. P/1 - Muito pouco tempo? R - Uns três anos mais ou menos. P/1 - Entendi. E os seus pais? Eles faziam o quê? R - Ah, os meus pais...batalhadores . Meu pai era motorista duma empresa e minha mãe trabalhava como doméstica. P/1 - E que lembranças que você tem marcantes do seu pai, de infância, de criança? R - Todas. Ele foi um grande companheiro durante toda a minha infância e adolescência, ele era um pai muito presente. Como ele casou velho, casou com quarenta e seis anos, ele esperava muito ter uma filha. Ele era boêmio e resolveu casar com quarenta e seis anos, quando eu nasci fui muito comemorada, principalmente por ele. Durante a vida ele sempre me paparicou bastante a minha mãe também. Minha mãe batalhadora, matriarca daquelas, trazia tudo ali na mão, todo mundo tinha que estudar muito, corresponder todo o sacrifício que eles faziam e a gente conseguiu absorver tudo o que eles conseguiram passar para nós. P/1 - E vocês eram em quantos filhos? R - Nós do segundo casamento da minha mãe, éramos quatro. Como ela teve dois casamentos, eu tenho mais duas irmãs que são bem mais velhas do que nós quatro. P/1 - E você lembra da casa em que você nasceu? Como era a casa? R – Sim Porque nós, ali na região do Campo Limpo, no bairro especificamente onde eu moro, os meus pais quase foram os desbravadores dali. Então era assim, como um sítio. Tinha tudo de frente, um quintal grande. Então minha mãe conservou todas as características que ela trouxe do interior, de ter uma horta, de ter um galinheiro a gente cresceu com essa, até os doze anos a gente cresceu com essa característica interiorana, assim, de cidadezinha da roça. Todo mundo ali no meu bairro tinha uma área grande de quintal, então tinha plantação e criação. P/1 - Você começou a falar um pouco do Campo Limpo. Conta um pouco mais para gente como é que era o Campo Limpo naquela época. Que lembranças você tem? R - Olha. Porque, assim, meu pai era a única pessoa naquela região, quando eu era criança meu pai era um dos únicos, como ele era motorista duma empresa, então ele tinha carro, então era praticamente a única pessoa que tinha carro. Aí, quando nós saíamos do nosso reduto ali, que para nós aquilo era um reduto, era para ir ao médico, para ir à escola próxima de casa. E o Campo Limpo todo, assim, como ele é hoje, nossa, não tinha nada. A gente saia muito pouco de casa, quando saía de lá, era para vir para cá para Pinheiros, pro Centro, que era onde meu pai tinha, fazia, os trabalhos dele. P/1 - E você falou dessa casa grande, você lembra das sua brincadeira de infância? R - Todas que hoje em dia as crianças não brincam mais. A minha filha, eu tenho uma filha de quatorze anos, esses dias eu tava ensinado ela pular amarelinha, que ela não sabia. Por aí você vê, ela sabe jogar o Dragonball Z no videogame, mas não sabe pular amarelinha. Então a gente tinha a liberdade de fazer todo o tipo de brincadeira, brincava de casinha e inventava, né? A televisão não era um artifício que todo mundo tinha, na minha casa não tinha. Minha casa foi a primeira ali do bairro a ter, mas a gente, um bom pedaço da infância, não tinha. Então a imaginação era a nossa grande arma. Acho que foi isso que fez a gente curtir muito a infância. P/1 - E como era a relação com os seus irmão? Você era a mais nova? R - Não, eu era a mais velha. P/1 - A mais velha? R - Eu era o líder do bem e do mal. Quando a brincadeira dava errada, todo mundo apanhava e eu tinha que apanhar também porque eu dei o mau exemplo, mas a diferença entre nós, os quatro, era pouca, dois anos de um para o outro. Então tem dois meninos e duas meninas. Eu a mais velha, menina. A caçula das minhas irmãs menina e dois meninos no meio. P/1 - E fora da sua casa, ainda ali no Campo Limpo que mais tinha? Você falou da escola. A escola era ali também? R - É, a escola, porque assim, a nossa a gente tinha três pontos, né: a casa, a escola e a Igreja. Então a gente ia à igreja a minha, minha irmã era filha de Maria. Era essas moças que orientavam as crianças na igreja lá naquele tempo. E a gente nos finais de semana a nossa “balada” era ir à igreja. Quando podia, quando ficou maiorzinho ia às quermesses à noite e tal. Elas faziam reza nas casas. Era diferente, assim, as pessoas eram poucas e todo mundo se conhecia. Então, assim, tinha uma união maior, né? Porque a região era só mato com uma meia dúzia de louco morando lá só selva. Porque na verdade, a condução que saia daqui de Pinheiros chegava só até o Taboão da Serra, que faz divisa, né, com Campo Limpo. Dali para lá era só caminhada. Meu pai tinha um carro daí a gente ia de carro. Eu fui andar de ônibus eu tinha doze anos. Até então nunca tinha andado de ônibus. Achei, assim, fiquei deslumbrada. Achando que era melhor, né. P/1 - Que carro que era? Você faziam passeio de carro? R - Sim. Como a gente tinha o lance da igreja, então todos os passeios eram em torno desse assunto, da Igreja. A gente ia a romaria para Pirapora do Bom Jesus, para Aparecida do Norte, ia para Cambraú. Era uma caminhonetinha Studebaker 1957, verde. Nunca mais eu, hoje em dia eu já batalhei, já procurei, queria comprar aquele foi o carro da minha infância. Nossa, era... quando tava assim, a gente ia para praia, aí ela tinha um capota, meu pai tirava a capota, ficava uma caminhonete, mas como as caminhonete...nossa Não tinha lá os negócios de ecovias, e radar e nada. As crianças iam tudo na carroceria. Era muito bom. P/1 - Existia uma vida relativamente agitada, né, de ir para os lugares. R – É meu pai propiciava isso porque nós morávamos no mato, né. Não tinha nada lá, então podia virar índio. Então ele, de repente ele proporcionava umas coisas na civilização até para gente...ficar, assim, mais inteirado com o mudo. P/1 - Entendi. E aí você acompanhou toda uma modernização do Campo Limpo, né? De chegar energia de... R - É o crescimento, isso. O primeiro banco, o primeiro posto de gasolina... era assim, tudo... A escola. E nós estudávamos numa escola que era de madeira. Aquela construção estilo americana, que o nome da escola era Presidente Kennedy,né, então correspondia a construção. Aí depois, ela, cresceu um prédio enorme de alvenaria. Quer dizer que...essa evolução já foi bem mais adiante. P/1 - E da escola, você começou a falar uma pouco da escola. Como que era a escola? O que você lembra da escola? R - A diversão, era ótimo ir para escola porque era outro mundo, outras crianças. Então, assim, nós tínhamos em casa um reduto de irmãos e ir pra escola tinha uma legião de gente diferente, então, nossa, era muito bom Era uma época de repressão tal, que a gente não entendia muito porque ninguém falava nisso naquele tempo, né. As crianças... imagine, não tinha nem televisão, ia saber que é repressão? A gente sempre ouvia os pais reclamar “ai a vida tá cara Num sei o quê”. Mas isso eu vi, cresci ouvindo eles reclamarem e estou reclamando, quer dizer, então acho que é uma coisa meio por osmose. P/1 – E da escola tem lembrança marcante? Algum professor, alguma brincadeira? R - Ah não, tinha uma professora, eu tinha uma professora da segunda série. E minhas irmãs elas trabalhavam, né, e fora de casa. Minhas irmãs mais velhas, do primeiro casamento da minha mãe. E elas compravam um gibi para a gente ler era coisa de..imagina, quando a gente ia ler, elas compravam em sebo aqui em Pinheiros, tal. E o primeiro gibi que eu li foi o Tio patinhas. Aí tinha uma professora minha na segunda série, ela parecia à vovó Donalda. Nunca mais eu esqueci, mas era igualzinha a patinha, assim, tinha aqueles óculos, falei “Gente do céu" eu chegava à sala e ficava olhando a mulher. Aí no final do ano eu falei para ela: professora posso te falar uma coisa? Você gosta do gibi do Tio patinhas? Ela falou: eu gosto por quê? Eu falei assim: Tem um personagem lá que parece com a senhora. Aí ela achou que era a Margarida. Aí eu fiquei, quando ela achou que era a Margarida eu já fiquei meio assim, né, mas como toda a vida eu fui muito direta, eu falei: Não professora, não é a Margarida. A senhora é baixinha e a senhora é gordinha A senhora parece a vovó Donalda. Ela falou: Aí você acha? Porque ela tinha um coquinho, sabe? daí eu falei: Ah, parece. E você gosta da Vovó Donalda?Eu falei: Eu gosto, ela é bonitinha, Por isso que eu associei a senhora a ela. Aí tinha passado de ano, no ano seguinte já não era ela. Eu falei "tô livre". Só no fim do ano eu falei porque eu já, também já tem que pensar pra fala, né. P/1 - E aí você continuou nessa mesma escola durante todo tempo escolar? R - É porque, porque, é assim, na minha época se fazia a quarta série, depois tinha o quinto ano que era o científico que daí já era em outra escola, né. Era sempre particular. Daí depois voltava para fazer o ginásio em escola pública, se conseguisse. P/1 - E você cursou o quinto em outra, em escola? R - Isso, tinha o curso de admissão que chamava. Lá era particular, era perto mesmo da escola, né. E depois de lá eu fui para fazer o ginásio. P/1 - E aí você começou a sair do Campo Limpo, você falou, com doze anos? R – É daí já era outro universo. Até a admissão ainda é no Campo Limpo. Depois já, assim, o upgrade foi fazer o Ginásio. Daí tinha que tomar o ônibus, tinha carteirinha de passe, uniforme, todo tinha todo um ritual, assim, para ir para escola que era legal. Estudava em um bairro já mais evoluído, né, com relação ao Campo Limpo. Tinha um colégio grande, aí eu fiz ali até terminar. P/1 - E você estava falando da primeira vez que você andou de ônibus, que foi marcante para você... R - É assim, porque sempre andei de ônibus com a minha mãe,né. A primeira vez que andei, com a minha mãe, mas aí era assim, como a gente vivia no mato e daí de repente no mato tinha um ônibus de manhã e um à tarde. Aí foi um evento parta chegar lá nesse ponto de ônibus para pegar esse ônibus que sairia de manhã, nós íamos lá no Darci Vargas, no hospital. Aí, todo mundo sentadinho, nossa, a gente passava via o mato passar rápido, assim era uma coisa nossa, foi show Depois é assim, a rotina de andar de ônibus foi para ir para a escola. Que daí já, já estava mais uma coisa assim, que a gente já conseguia definir onde era o que. Era mais fácil. P/1 - E aí no ginásio, como que era o ginásio? Foi muito diferente as experiências do ginásio? R - Ah sim, foi diferente porque, assim, crianças de um outro bairro, com uma outra realidade, assim, eles tinham muito mais informação, né. Que eles já tinham energia elétrica... E a gente tinha acabado de chegar energia elétrica, então tudo para a gente era novidade. E a gente chegou em um lugar que tinha luz na rua...asfalto, lá não tinha. É, então, a gente, nossa, saía da escola assim, meio de noitinha, ficava olhando se tinha aqueles bichinhos na luz, falava "Nossa olha que coisa, quando será que vai chega lá no Campo Limpo?" Num demorou muito, chegou, mas a novidade sempre é bom, né? Sempre, assim, um primeiro impacto sempre é bom. P/1 - E do ginásio você lembra dos amigos? Das brincadeiras? R - Todos eles, todos eles. Tem uns que já morreram né, porque ali no ginásio tinha, assim, começado a entrar uns vícios que hoje a molecada tem com muito mais facilidade. E, mas não é tão comum as drogas, vamos dizer assim, na minha época. Mas já tinha os usuários, né. Então, assim, muitos da turminha que, depois de certo tempo, resolveram enveredar por esse caminho morreram já. Mas a grande maioria, de vez em quando, a gente se reúne, almoça. Tem uma das amigas que ela tem um sítio aqui em Juquitiba, aí a gente faz assim o encontro do pessoal de Mil, novecentos e três pontinhos, aí vai todo mundo, passa o dia. Mas foi bom. Foi bom. Depois saí dali. Estudei ali mesmo no Ensino Médio, aí a faculdade foi lá no mato, láaaa, lá na OSESP em Santo Amaro. Na universidade de Santo Amaro, lá... P/1 – E a rotina continuava sempre ligada a igreja, escola e casa? R - É igreja, escola e casa. É igreja, escola e casa. É claro que a escola começou a proporcionar umas atividades a mais, né. Tinha que fazer pesquisa na biblioteca porque não tinha internet no meu tempo. Você tinha que vir aqui nessa biblioteca na Rua do Sumidouro. Ali perto da Igreja da, da Cruz torta. Todo mundo, todas as escola da região iam para lá era cheio. Tanto é que todas as escolas, as crianças usavam uniforme completo, então a bibliotecária conseguia definir bem para quem ela emprestou o livro, que escola que levou o livro, entendeu. Que a gente ia uniformizada, trazia a carteirinha, era um evento. Então já saiu daquela rotina da igreja, que daí a igreja passou a ser só final de semana. As rezas que tinham durante a noite na casa das pessoas e tudo e eu já não podia ir porque eu tinha que ir no outro dia para a escola. Então já ia, minha vida era cheia. Tinha papel almaço, tinha canetinha, uma porção de coisa que eu adorava. P/1 - Mas você sempre tinha uma participação na igreja? R - Sim, porque tinha o catecismo, então tinha que ir para fazer a primeira comunhão, fazer o crisma. Ficava a vida inteira lá no cursinho. A primeira comunhão, só no fim do ano o Bispo vinha lá para consagrar as crianças. Então você ficava o ano inteiro, tinha lição do catecismo, lição da escola, era um pouco, começou a ficar um pouco puxado . P/1- Me conta um pouco do Ensino Médio. Você fez ensino Médio na mesma escola, na mesma região? R - Mas uma outra escola, tá. Aí já era diferente. Aí já era uma turma mais madura, já conhecia, já conseguia tomar ônibus sozinha, já conseguia ir até o centro e eu vinha pra cá para Pinheiros onde tinha os cinemas ali na Santa Franco. E andava pelo Itaim, então a gente conseguia se movimentar dentro da cidade. Então já era mais independentes. P/1 - Você falou um pouco do cinema. O que mais vocês faziam para se distrair. E mesmo do cinema, que filmes você lembra? R - Ah, eu me lembro, nossa, eu ia, eu gostava de desenho animado. Então o Walt Disney sempre, sempre fui fã do Walt Disney. Aí todos os filmes de Walt Disney que passava me lembro que eu assisti Bernardo e Bianca. Um filme dos ratinhos que voavam. No cinema passou uma primeira versão, eu era adolescente. Aí eu tinha arrumado um namorado, aí o rapaz achou que ia assistir um filme. Falei “ai, eu quero assistir aquele", " ai, mas desenho animado.." Falei "ai, então eu não quero mais namorar com você e porque eu quero assistir o desenho. Tem que escolher: ou o desenho ou eu estou fora". Aí ele foi assistir o desenho (risos). Eu digo, eu gostava de desenho. Todos os desenhos que passavam no cinema eu ia assisti. Depois eu comecei a assistir os filmes do 007 Sean Connery. Nossa Até hoje eu gosto do velho. É meu ator predileto. P/1 - Você falou um pouco agora do primeiro namorado. R - Chato o menino. Nossa Era burro. Na verdade quis ele porque, assim, eu nunca fui estudiosa, mas eu nunca tive muita dificuldade. É, poque se tem que aprender tem que aprender, se tem que ler tem que ler. E ele não queria ler, daí ele falou "ai vou namorar com aquela ali poque ela tem umas nota boa" daí queria que eu fizesse as lições. Aí eu falei "olha. não quero namorar pra eu fazer a lição". Aí coisas de pré-adolescência. Nossa, enjoei rapidinho Eu tinha que fazer a lição do cara Falei "que isso? Nossa Não cada um faz a sua lição. Você não vai passar de ano, Você vai ficar para segunda época" que tinha um negócio de segunda época. E tanto é que ele ficou, repetiu três vezes. Falei "nossa” Todo mundo: Olha, fulano, ó lá,depois que parou de namorar a Julieta ficou mais burro ainda, repetiu duas vezes" Falei “pois é, num quer estudar não vou carregar ninguém nas costas não". P/1 - Julieta, fora o cinema, quando vocês vinham aqui ou pro centro, para Pinheiros, para o Itaim, vocês iam fazer o que? Vocês iam aonde? R - Olha, no Centro a gente ia no Mappin. O Mappin tinha uma casa de chá ali do lado mas lá no Mappin tinha um departamento de, de coisas, assim, modernas, né, as novidades de roupas e tudo, perfumes...e tava tudo ali. Então a gente ia e ficava deslumbrado porque dava para entrar, olhar as roupas, assim, pegar nas araras, olhar. Então, nossa, era um show Muitas vezes matava aula pra ir no Mappin ver a novidades. E olha que lá no Centro, enh? Atravessava, nossa, a praça do Patriarca. Lá a gente se achava porque era adolescente,né. P/1 - Conta um pouco mais dessa coisa do (Mappin?). O que que vocês viam? O que que era Legal? R - A gente ia no Mappin, depois a gente saia e ia na...ali na rua direita...Tinha um lugar onde vendia uns Favos Holandês. Nossa Era assim, tinha o dia de ir na cidade. Então hoje a gente vai para a cidade. Aí ia no Mappin, ia comer o Favo Holandês lá na Rua Direita, ali na General Osório. Andava tudo ali no Largo do café, tudo Que era tudo muito diferente da nossa região, ainda, né. Porque já aqueles prédios, né, o teatro municipal, aquela coisa audaciosa ali no meio daquela cidade louca E para cá tinha gente, mas era meio espalhadinho assim, poque era um pouquinho ali, outro pouquinha lá. E lá não, né, lá tudo concentrado. Então muitas vezes ficava em cima do viaduto vendo o povo passar até enjoar, depois vamos pro Mappin. Aí “vamo tomar sorvete”. Então andava por aí, né. Não era nada assim, mas era bom Falava "olha, a gente foi lá no Centro comprar pulseirinha”. Tinha umas lojinhas de umas pulseirinhas, assim, penduradas. Então o que tinha de lançamento, tinha lá. E menina sempre gosta muito de penduricalho, né. Aí eu, eu mesma tinha meio braço de pulseira. Cada vez que ia comprava mais. Cada vez que ia comprava uma porque o dinheiro era escasso. Minha mãe dava pro mínimo, assim, o sorvete, a condução e vem embora Mas a gente economizava, muitas vezes dava para comprar um papel almaço... Aí a gente rateava. A gente usava passe, que era um trocinho, assim, de papel. E o de estudante a gente ia comprar na garagem do ônibus. Daí a gente vendia para os outros que não tinham, né. Falava “ah mas é a metade do preço." "Não tem que pagar inteira, se não não vou vender, se não depois eu vou ficar sem" É mais a gente sempre tinha, assim, não tinha uma cota como é hoje. Você podia comprar quantos você pudesse. Meu pai sempre comprava um tanto para não precisar se preocupar. Daí eu comercializava os meus passes, para mim poder ter sempre um dinheirinho pra comprar meus penduricalhos. E... Assim eu fui.... P/1 - Julieta, me conta um pouco mais do Centro. Você falou, você falou, fez uma descrição legal do Teatro, do Mappin. Que mais que você lembra do centro que te impactava? R - Olha, o Teatro Municipal para mim era, assim, a oitava maravilha do mundo. Aquela escadaria... Aí demorou acho que uns três meses teve uma promoção, lá, não sei do que da secretaria de Cultura de alguma coisa, de levar, né, os alunos. Nossa A primeira vez que eu entrei no Teatro achei que ia desmaiar Falei "gente o que quê isso?" Parecia um castelo mesmo, né. Que lia muita coisa, baboseira dessas coisas. Falava "nossa", assim, o Teatro era... E o Mappin. Aquele elevador gigante com aquele monte de gente Era uma coisa assim, "ai, vamos de elevador?", "vamos". Aí lá no oitavo andar eram as roupas de jovem, certo porque tinha senhora, cama, mesa e banho, era uma loja de departamento gigante E os uniformes da escola onde a gente estudava comprava lá. Então era lá pra Conselheiro Crispiniano, mas era do lado do Mappin. Então você saia sempre que a gente precisava comprar uma camiseta que era branca, "ai preciso ir lá na Conselheiro compra uma camiseta". Já aproveitava entrava no Mappin. Olhava os perfumes. Primeiro andar tinha um balcão, assim, bonito de vidro, era só perfume Como hoje tem as lojas de perfumes importados, e lá era só importado que tinha, né. Tinha uma outra loja bem bonita que minha mãe ia de vez em quando comprar lá umas bolsas e as bolsas vinham custu, acompanhadas sempre com uma luva assim. Nossa, que chique que era aquela loja. Só assim, uma vez por ano minha mãe comprava uma bolsa. Mas quando ela ia a gente ia também e curtia muito. Eu gosto muito de São Paulo. Gosto muito do centro de São Paulo. Tanto é que depois,...que eu cresci mais, aí eu comecei a me enfiar nos lugares para conhecer mais, né. Igreja sempre foi o meu hobby, né. Até achei a igreja de Santo Expedito encravada do lado da Polícia lá, sei lá o que é aquilo, é Batalhão da Polícia. Até achei a igreja lá sozinha. Aí eu falei para minha mãe “eu sei onde é a Igreja de Santo Expedito" " Como menina?". Sei eu fui lá no Centro, depois eu andei, andei, andei, cheguei lá. Daí minha mãe" mas você andou muito" "É pois é, tinha que achar, achei” P/1 - E isso já ainda no ensino médio? R - É, não. No Ensino Médio daí eu já cuidava das coisas, das contas da casa, tal. Aí saía, podia ir no banco, né. P/1 – Você disse que terminou o ensino médio foi para o (OSESP?), né? R - É. Daí...nossa E daí ,assim, o Ensino Médio eu fiz Magistério. Aí eu fui trabalhar, né. Na escola pública e fazia a faculdade de pedagogia lá nesse lugar, lá nesse buraco. Nossa Primeiro eu já fiquei traumatizada. É diferente você estar do outro lado, né. Sempre tinha aquela visão do professor, aquela coisa. Nossa os alunos nunca, nunca tinha tido a visão dos alunos. Mas assim você cresce com aquele campo, passam vários professores, vem a maturidade, mas você não consegue ainda incorporar que o professor é uma vítima daquela galera. Quando eu pulei para o outro lado, nossa Não agüentei muito. Fiquei nove anos. P/1 - Nove? R - Só nove, nossa Ninguém merece aquilo. Não consegui ficar. Falei "se eu ficar vou surtar". Daí me mandaram para um região, que eu prestei concurso, que meu pai, né, já viu. Prestei concurso, era professora concursada do estado. Aí eles me puseram numa região que nossa Aí por ter passado num concurso, ter formado, aí meu pai me deu um carro. Nossa Aí foi a glória Daí eu fui lá nesse mato de carro. Que é onde me designaram. Nossa Ali as crianças já eram, assim, já meio barra pesada, né. Eu já falei "ixi Eu não vou agüentar isso". Aí chegava falava pro meu pai "Ai eu vou desistir Eu não tenho dom para a coisa" Aí meu pai "Não, professara é professora”. Falei "ai meu Deus do céu Vou ter que agüentar essa cruz só por causa desse pai?" Que ele apostava as fichas, ele achava...Imagina, ele casou com quarenta e seis anos achou que nunca ia ter um filho. Ter uma filha professora Quer melhor? Eu falei: "Ai meu Deus Ninguém merece". Aí fui, fiquei dois anos lá, aí deu um bicho lá me mordeu na hora do recreio, deu uma alergia... já tive que tratar, falei "é agora, é a hora de eu escapar desse negócio”. Aí fui para a escola particular. Perto da minha casa tinha um...um colégio grande, né. Aí eu lecionei lá nove anos. P/1 - Voltando à OSESP como foi a faculdade mesmo? R - Ah Era ruim. Era num lugar à noite. Eu sempre fui toda vida uma pessoa muito dorminhoca. Eu não sei como eu passei lá naquele lugar É porque assim, eu sempre falei pro meu filho, nunca fui muito estudiosa, mas o conteúdo eu sempre conseguia absorve mais ou menos. Nossa, mas que sono que eu tinha naquela aula E era, ó, pra você imaginar como era mato, nós os alunos o que nós fizemos? Nós contratamos, sabe essas peruas escolares que tem? Tinha um ônibus escolar para levar a gente até lá e buscar. Porque quem tinha carro tinha medo do carro quebrar e ficar naquele mato, né. E quem não tinha, assim, não tinha, o último ônibus descia em não sei aonde depois. Daí nós fizemos um grupo e arrumamos um louco. Aí eles iam buscar a gente e deixavam na porta. Eu saía, tinha última aula, saía, entrava no ônibus, dormia e acordava na porta da minha casa. Nossa Foram penoso pra mim os quatro anos. Falei "nossa". Acho que por isso que eu não fiz pós, porque fiquei tão preguiçosa... daí casei também já...bagunçou tudo. P/1 - Mas na faculdade ainda você lembra de amigos ou de algum professor? R - Ah sim, professor, ainda tem até uns que vem, um que resolveu me visitar. E as amigas estão bem. As amigas na verdade nós saímos do Ensino Médio, rumamos todas para a faculdade era uma quadrilha Por isso que a gente até hoje vai comer o churrasquinho. Porque desde o ginasial a mesma, as oito. Tinha um rapaz, ele faleceu esses dias é mas éramos nove. Era uma turminha da mesma escola todos os anos. Um tinha dificuldade o outro ia lá "olha, eu vou para tal escola, lá tem que prestar exame. Será que você vai passar?" "ai, to ruim em matemática". Então vamos estudar matemática todo mundo Aí, assim, para ter o grupo sempre ali Virou uma irmandade. P/1 - E esse era o grupo que ia para o Centro junto? Para todos os lugares... R - Isso A mesma turma. Festa de aniversário na casa de um, na casa de outro. Era assim, ficou e permaneceu. P/1 - Você fala que tinha festas de aniversário. Tinha outras festas, bailes? Vocês saiam para dançar? R - Tinha, tinha. Depois que eu já estava na faculdade aí é, aí começou o Clube Holms. É São Paulo chique Um monte, mas o meu pai, eu não podia sair sozinha. Aí tinha uma amiga minha, o pai dela era Sargento da Polícia Militar. Ele ia também dançar, né. Aí ficou sopa no mel, deu certinho Ia para a casa dela todo mundo. Ele ficava responsável por sete meninas, oito meninas e um rapaz. E assim nós passamos a nossa infância, adolescência e chegou na idade adulta. P/1 - Julieta, para quem nunca foi, como que era o baile? Como que eram os bailes antigamente? R - Não, era, nossa Era o máximo A gente tinha que se produzir, sempre tinha que ter uma roupinha nova, na moda. Por isso que ia lá no Mappin, e nem sempre dava para comprar, entendeu? Aí ia copiava...eu eu sempre tive o dom de copiar, né de desenhar...tsu-tsu-tsu...desenhava daí todo mundo, cada uma comprava um tecido diferente para não ficar igual a um exército e mandava fazer nos lugares de direito. Quando era um baile precisava...diferenciar a roupa. Mas... P/1 - E aí nos bailes como é que era? tocava o que? R -Ah, samba-rock, né. Tocava...esses.... Nossa, tocava de tudo. Não tinha muito, muito entrada de música...de fora, né. Então a gente ouviu muito...Rock Nacional, essa galera que está tudo com setenta anos hoje, era tudo hit da minha época. E o pessoal do samba-rock, né . São Paulo chique era o pessoal fazia a linha do Benjor e tal e a gente tinha que nossa Hoje em dia eu tenho um problema no pé, que eu vou operar daqui a pouco, de tanto dançar. P/1 - Você falou um pouco do samba-rock e todo mundo falava muito dessa época é, de dançar samba rock... R -Isso, aprendia um ia na casa do outro. Então, assim, tinha um que aprendia que tinha mais facilidade. Sempre no grupo tinha um que tinha uma habilidade mais aflorada. Aí aprendia. Graças a Deus que para dança o menino era um bicho, né Aí ele aprendeu todos os passos. Ele ia nos lugares porque tinha uns lugares onde só os rapazes podiam ficar, assim, depois das dez da noite e tal, que dançavam, elas saim ,né. Os homens eram mais soltos, as meninas onze horas tinha que estar em casa. Aí ele aprendia e depois ensinava todas nós. Aí a gente chegava num lugar ele ia tirando uma de cada vez para dançar. Aí as pessoas sabiam que a gente sabia dançar e vinham chamar . Ah Comédia Eu falei "gente". Era uma sociedade de poucos, mas assim, com muitas qualidades. Todo mundo sabia fazer alguma coisa. Quando tinha que copiar os modelitos, eu ia. Aí eu ia, sempre ia uma junto comigo. Andava sempre com a pranchetinha, copiava "A eu gostei desse" "escolhe logo" A gente né, ficava "escolhe logo o que você quer que daqui a pouco a vendedora vai perguntar o que a gente vai levar". Aí TIC_TIC_TIC_TIC... desenhava, fazia um truquezinho, assim, depois em casa dava uma melhorada. Daí cada uma, as vezes cada uma tinha um modelo. Ou se todo mundo gostava variava, uma saia mais curta...de acordo, né, com a vontade do pai. Daí uma saia mais curta, uma blusa mais decotada, daí se permitia fazer um...Aí era a critério da costureira. P/1 - Julieta, conta para mim um pouco dos nove, dos anos que você ficou na escola particular. R -Nove anos. Nossa Difícil também, viu. Porque assim, era uma escola Luterana. Então eles tinham todos os os rituais lá da Igreja a escola tinha. A única coisa que eles não obrigavam os alunos era se converter, mas assim, tinha um momento de devoção. Eu dava aula de manhã, das sete ao meio-dia. Daí todos os dias ás dez horas para tudo para fazer oração. E como era uma escola com uma infra-estrutura boa, tinha um auditório para 400 pessoas, enfiava toda a molecada lá dentro, para rezar. Daí ensinava, lá ensinava a Bíblia, tal. Todo mundo não precisava ter a Bíblia. Tinha que ter porque tinha aula de religião, mas assim, muito superficial, então para aqueles que não eram Luteranos tinha a Bíblia lá nos bancos para acompanhar. Na devoção todo mundo tinha que estar com a Bíblia na mão. Nossa... Tinha umas crianças, tinha uns embates com os pais. Falava "eu não quero que o meu filho vá na devoção". Falava "Não, a senhora não está entendendo para o mundo nesse horário. Então a senhora vai lá falar com o diretor”. E o diretor era um reverendo lá, não sei das contas, graduado dentro da Igreja. "A senhora vai lá falar com ele. Isso são ordens: desliga a luz, fecha a sala. Eu não sou luterana e eu vou, entendeu? Eu não vou virar Luterana, mas tem que ir porque faz parte do negócio aqui". Mas foi bom, foi um período bom. Nossa, tem muitos alunos meus andando por aí por São Paulo. Dava aula de segunda série, mas hoje eles estão homens já. P/1 - Mas da experiência dentro de sala de aula você lembra de algum caso marcante? De algum aluno? R -Sim, eu me lembro de dois casos. Um foi que, assim, a menina, eu nem sabia, nem a mãe, ninguém sabia que ela era doente. Aí de repente ela teve uma convulsão na sala e eu fiquei sem saber o que fazer. O pessoal falava "professora". E eu tava paralisada. E ela convulsionando e eu paralisada, em estado de choque. Voltei a recobrar tudo depois de quarenta minutos que já tinham prestado socorro à menina. Esse foi um fato que me apavorou muito, que eu falei "agora eu desisto dessa droga”. Aí o outro foi quando meu filho estudava lá na escola, né. Daí ele era insuportavelmente levado, aí ele caiu, quebrou a clavícula. Daí eu estava na sala de aula, mandaram me chamar que ele tinha caído no pátio, eu falei "Putz". Nossa, perdi a cabeça Falei " Nossa, vocês mataram meu filho Que que vocês fizeram?" "Não, ele caiu dali,não sei o quê. Ah,mas o médico" que tinha tudo na escola, tinha uma super estrutura..."ele tá descendo, tal". Nossa Fiquei muito nervosa. Acho que assim, de impacto ruim foi isso. Mas , agora, bom tinha bastante. No final do ano eles sempre escolhiam um professor da escola para fazer uma homenagem de dedicação e tal os alunos que escolhiam. Eu fique durante seis anos consecutivos. O pessoal falava "marmelada em Juju, você tá comprando os.. "Eu falei "como que eu vou comprar crianças de sete anos? Cê ta louca?" É que todos elegiam, né, e eu tinha os meus filhos e tal. Então foi muito bom, mas eu vi, ali eu tive segurança que eu não era do ramo. Fiz como tinha que fazer. Como assim, né, tem que ensinar, eu ensino, mas não tenho, diferente da minha irmã que também é professora e tem aquela coisa fala com a paixão, sabe aquela paixão? Agora eu não. Fazia porque tinha que ganhar o dinheiro, tinha que pagar a faculdade. Na primeira oportunidade que apareceu eu ó P/1 - E Julieta, você falou agora do seu filho e você, e falou do seu marido. Você chegou a casar, né? Você casou.. R -Casei. Eu tive cinco filhos. P/1 - E como você conheceu o seu marido? Como é que foi? R -Ah, era lá do bairro, assim, porque depois de um certo tempo eu não...eu não tinha mais aquela ligação com o bairro, né. Aí eu já passei a freqüentar outros bairros que tinha minhas amigas que não eram dali, então a gente não ficava muito ali. E ele era dali, quer dizer, ele é da primeira parte da minha vida, lá na minha infância, lá na escola do mato. Porque assim, era a minha mãe, a mãe dele mais outro lá, então sabe, assim, eram bem esporádicos os lugares. Era uma dessas famílias lá do mato. P/1 - Julieta, você fala do seu marido que era lá daquela época do começo, né? R -Isso. É, eram de lá. Só que ele já tinha uma realidade diferente, né. Eles eram assim, todo mundo era pobre. Morava lá naquele mato era pobre, mas eles ainda tinham menos condições que eu , por exemplo. Assim, tinham menos oportunidade de estudar, até o primário todo mundo fazia porque a escola era ali também dentro do mato. Depois saindo dali já foi mais difícil. Daí ele num andou muito. Foi, fez acho que ele estudou lá mesmo nessa escola que teve. Fez admissão num outro lugar, depois estudou ali no Campo Limpo mesmo. Aí não foi muito longe. P/1 - Mas quando que foi que aconteceu de vocês resolverem se casar? Vocês começaram a namorar? Quando... R – Ai, olha. Na verdade foi assim, eu tinha saído né, tinha ido comprar um sapato lá no Centro, né. Aí voltando, falei “Ai tinha que dançar lá no Clube Holms”. A gente ia para uma baladinha lá. Não era balada que se falava naquele tempo, mas a gente ia num baile. Aí eu fiquei tão cansada que eu andei lá na cidade, bastante, que eu falei “não vou não”. Tinha uma vizinha minha, falou assim:“Você não que vir aqui na minha casa? Porque eu vou fazer um bailinho aqui”. Que tinha essa negócio das famílias fazerem baile em casa. Meu pai não gostava muito porque ele não gostava de bagunça. Aí eu falei pro meu pai, meu pai falou “Ah, já que você não quer ir pra lá fica aí mesmo, né? Perto de casa, a hora que você se encher é só atravessar a rua...” Aí eu fui. Aí tava lá o infeliz. Isso nem sei quando era, já era década de 70 é meados da década de 70, 1972 por aí. Aí tava lá. Daí virou e falou "Ah que casa que você mora”? Falei “moro aqui, mas todo mundo me conhece, cê não me conhece?” Que eu sempre fui muito... Daí ele falou assim: Ah, eu moro lá. Eu falei “Ah, conheço a sua mãe”. Que a mãe dele era do grupo de reza lá da minha irmã. Aí a gente ficou conversando e tal: Cê estuda e tal? Aí falou “não”. Quando falou “não” já me deu um arrepio. Falou Ah, não, mas eu vou voltar a estudar...não sei o quê”. Falei “ah tá. Então tá”. Daí, meu pai tinha...nessa época meu pai tinha um...uma Kombi e um Ford 46 azul prata. Que era o carro meio playboy, né. Então era assim, cabeçote rebaixado, sabe? Umas coisas meio que ninguém entendia muito aquele cara, aquele velho com aquele carro, com aquele ronco. Sabe? Assim, tinha uns pneus grandes, assim, falava “o que que é? É louco?”, né. Aí todo mundo gostava de ver os carros do meu pai. Aí dia de sábado, tava saindo, tava lá no portão, né. Aí meu pai: Ai, você conhece minha filha?"Eu conheci ali na casa da Nilmara, tal" "ah, que bom", começou a conversar. Aí meu pai chamou ele pra ir tomar um café E mandou eu fazer um café Falei "eu não vou fazer café, já tava pronta pra sair. Falei “não vou fazer café pra ninguém Uma que não sei fazer café. Duas já estou de saída”. E fui embora. Aí... meu pai falou “então você volta amanhã que ela vai te fazer um café". Falei “quê isso?”, falei “a troco do que isso agora?” Aí ele voltou, cara-de-pau Aí já veio a mãe, sabe? Daí ficou aquele negócio. Ah, lembra, pequeninha? Né porque eu tinha um cabelão, né, usava umas tranças..quando eu era pequenininha. Daí começou, veio a mãe, conversou com a minha mãe. Com aquela coisa de visitar e visitar, quando eu vi eu já tava namorando com o cara, Falei “nossa num me lembro desse cara ter me pedido para namorar, ficou vindo, vindo, vindo e agora.... que isso?” Daí eu falei um dia pro meu pai: o senhor ta pensando o que? Dama antiga? Não existe mais Hoje a gente escolhe Quem falou que eu que eu quero com esse cara"? Falou: Ah, é um rapaz bom. Falei “Ah” tava sem namorado mesmo, precisava. Pra sair com namorado já deixava. Então já pensei na conveniência. Daí, fui ficando...vivi com o cara durante trinta anos. Aí na hora que eu enjoei, abri a porta, falei “oh, se vai embora que eu não to podendo”. Eu sempre fui muito determinada na minha vida falei “ah, não íxi Ai meu deus do céu to ficando velha, o cara já... preguiçoso”, que ele era preguiçoso. Falei “nossa, meu Deus Será que eu vou ter que ficar velhinha e ainda ter que trabalhar para sustentar esse cara velho?” Aí fui e falei, nossa, chamei meus filhos e falei “olha, o seguinte, se seu pai não procurar uma atividade forte, assim, de homem da casa, tá fora, ehn?” Aí eles foram vendo, falaram “é mãe, tá difícil aí para você, ein?” E eu “falta quatro anos pra eu me aposentar” Falei “já pensou, ainda ter que rachar a aposentadoria?” Poque quando a gente fica velho, cê precisa tomar remédio, né, que agora que tomo muito. Magine, nunca tomei remédio na minha vida, hoje eu tomo remédio de pressão. Agora começou o negócio no pé, tomo remédio tudo pra operar o pé, pra num sei o quê. Falei :”nossa Tudo agora depois de uma certa idade tem que tomar remédio e esse cara não que trabalhar?” Falei “não filho, ó, a porta da rua é a serventia da casa”. Aí, meus filhos também não tavam precisando me amolar... P/1 - Julieta me fala uma....é, antes de toda essa história você teve todos os seus filhos, né? Como é que foi ser mãe? Primeiro filho... R - Nossa, era difícil. Porque assim, eu tive...um, dois, um atrás do outro. Aí, nossa Aí tinha que conciliar trabalho, filho, aí foi over Ai meu pai 77 meu pai me deu um carro zero que eu tinha que trabalhar e estudar, né. Aí já tava querendo casar. Eu casei em 79. Daí meu carro já não era tão zero, mas era zero ainda, né. Aí meus filhos começaram a nascer... Como é que eu ia carregar criança, mamadeira tudo, tudo, é, que ia tinha que levar, não tinha negócio de creche, né? Aí depois eu arrumei uma pessoa que ficou na minha casa cuidando dos meninos até aí tinha dois. Então eu já tive dois depois de doze anos tive mais três. Daí parei. P/1 - E como é que era o cotidiano com os filhos? Tinha vários pra cima e pra baixo até conseguir a pessoa pra cuidar... R - É, até eles ficarem, assim, um pouquinho maior que pudesse se virar sozinho, né. Porque pequenininho tinha que ter alguém pra levar para escola, tal. Depois que ficaram maiorzinho eu já deixava as coisas tudo... aí eles se viravam sozinhos. P/1 - E você continuou morando no campo Limpo, mas aí numa casa sua? R - Sim, daí era minha casa. Meu pai me deu a casa, não foi meu marido não. Meu pai me deu uma casa, daí depois eu fui melhorando à medida que foram nascendo às crianças. P/1 - Julieta, depois que você ficou nove anos lá na escola, você foi fazer o que? R - Aí um dia eu fui, eu saí ali no shopping Iguatemi, passear. Aí tinha uma ação educativa no Museu da Casa Brasileira. Uma exposição...”Casa, café e cortesia”. Aí eu falei “nossa, mas que lugar é esse aqui, eu não sei. Igreja não, né, que todas as igrejas quase de São Paulo eu conheço” Aí eu cheguei na portaria, eu falei “ô moço, pode entrar?” Falou “pode”. Falei “que que é aqui?” “É um Museu”. Falei “museu?”. Falei “ah, deixa eu entrar”. Aí eu entrei...tinha lá essa palestra, né, dos educadores. Aí eu falei “eu posso participar?” “Ah, pode, por favor”, tal. Aí sentei lá, assisti a palestra. Curti. Nossa, falei “nossa, aqui é o meu lugar. Aqui gostei, ein Eu não me lembro desse lugar aqui, olha” Daí conversei com a coordenadora do educativo na época, né. Eu falei par ela “olha, qualquer coia, viu? Num vem já querendo ser educadora, que tem que ter um olhar geral, aí, de estudar a história do Museu aí tudo, se inteirar do assunto da casa, mas qualquer coisa que estiver dentro do museu que esteja dentro da minha competência, eu tô dentro”. Aí, deu...tinha uma exposição, essa mesmo, “Casa, café e cortesia”, que ia acontecer a exposição e ela pegava o museu inteiro. Aí eles tinham vigias de sala gente que ficava numa das salas para cuidar do acervo. Aí não tinha o suficiente poque eles nunca tinham tido uma exposição tão grande. Falei “nossa” Aí elas ligaram no serviço do meu pai e falaram se eu podia passar. Nossa, antes de acabar de falar “passar”, eu já tava lá. E aí nunca mais saí. . P/1 - E aí você foi vigia dessa primeira exposição... R - Fui, fui vigia e fiquei. Depois eu fui pro serviço educativo. Daí fui pro administrativo até a Produção hoje. Né, hoje eu tenho uma coordenadoria, lá dentro, né, de produção e montagem de tudo e manutenção. P/1 - Vamos falar um pouco de cada etapa. Da época de vigia, você lembra da exposição em si? R - Nossa Como se fosse hoje Eu ficava nas salas dos moinhos de café. Então, assim, mostrava a evolução dos moinhos de café que o Museu tinha outra configuração de espaço,né, e a casa ainda era dividida, assim, como os quartos que tinha na verdade. E hoje se tiraram as paredes dos quartos, então ficou um, um espaço amplo, mas era dividido como casa mesmo. Então, a cada sala tinha uma ambientação de uma sala, a minha era dos moinhos de café. Desde o que a minha mãe tinha lá no Campo Limpo (risos) até os modernos, aqueles da padaria que descia, assim, o café, assim, da cafeteira. P/1 - E você comentou que quando você foi à ação educativa, você falou “ó, aqui é meu número". Mas no que você se identificou lá com o museu? R - Não, porque tinha todo um material. Elas prepararam todo um material para receber os visitantes, né. E elas estavam orientando porque eles contrataram, aquela exposição grande, e eles contrataram monitores que não eram do Museu então pra fazer parte, então estavam preparando,né, esse pessoal. Daí eles estavam explicando que o nome da exposição era "Casa, café e cortesia". E a evolução de toda a região cafeeira de São Paulo. Aí eu achei, assim, fiquei, nossa Assisti inteirinho, tinha saído para ir ao shopping, nem entrei no shopping. Falei “Ah, vou andar mais um pouco”. E a Faria Lima era estreitinha, né. Então o Museu ficava bem, assim, em destaque. Hoje ele sumiu no meio dos prédios, mas antes ele se destacava bem. E "Nossa, que lugar é esse?” Então cheguei em casa, falei pra minha mãe “nossa Você num sabe. hoje eu fui num lugar,assim, ótimo" Daí minha mãe já tinha ido lá. Ela falou “Ah, não, mas eu conheço ali na Faria Lima”. Falei “ah, e a senhora não me falou?" Aí ela falou “ah, não sabia que você tinha tanto interesse”. “A menina me deu uma monitoria do museu e tava em fase de montagem, mas tinha uma parte do acervo, todo o acervo do museu, todo o acervo do Museu foi inserido na exposição, então foi muito bom. P/1 - Aí depois de vigia qual foi a sua outra função e como é que foi para continuar? Você já foi chamada para continuar? R - É, daí eles me convidaram, era o um freela, vamos dizer assim, era um contrato lá, que a secretaria fazia. Aí eles precisavam de alguém na recepção. Não, tinha na recepção a Dona Ana maria. Aí, ela ficou com hepatite e eu tava lá, né. Trabalhava de terça a domingo, aí... P/1 - Como vigia de terça a domingo? R – Isso. Aí a Dona Ana Maria ficou com hepatite, aí a diretora saiu de lá ensandecida "Eu preciso de alguém para cuidar daquele telefone e não sei o quê" Aí, eu tava bem sossegada poque cada um ficava na sua sala, assim, na porta da sua sala. Aí ela “menina que se tem gente aí na sua sala?” "Não.” “Que você ta fazendo aí?” "Ah, aqui é minha sala, né". Daí ela “vem aqui senta ai você sabe atender o telefone?" falei “Lógico Num tem segredo Aqui é diferente dos outros lugares? Na minha casa eu falo “alô” Aqui tem que falar o quê?" Ela falou: Não Aqui não pode falar “alô". Falei “ah, então aqui é diferente Se alguém me explicar, não tem segredo”. Daí ela falou “então vamos pra lá. Nossa, mas você é um pouco atrevida, né?" Falei “não, mas a senhora perguntou, eu respondi”. Aí ela falou “então vamos pra lá”. Aí... ligou, o telefone, tocou o telefone, lá. Aí ela falou “atende”. Eu falei “tem que falar o que? “Alô”, não pode. Tem que falar o que nesse lugar?” Falou “Museu da Casa Brasileira, boa tarde" Falei “ah, deixa comigo". Aí, "Museu da Casa Brasileira, boa tarde" E não tinha ramais, assim, era meio mesozóico ainda o negócio. Umas campainhas pra tocar na sala, assim, tinham várias botoeiras, assim com interruptor se tocava na sala, nossa Daí dava um toque, da outra dois toques, então era assim.... daí eu...deu outro dia, eu cheguei, tava na minha salinha. Falou “não, você não é mais dali, agora você vai ficar lá dentro da diretoria pra atender o telefone, poque a Dona Maria tá com hepatite e é mais fácil achar alguém para por lá lado que alguém aqui na recepção porque lá pode ser estudante e aqui eu preciso de alguém que pelo menos saiba falar, tenha uma comunicação. Falei “Ah, então eu já tô”. Aí, bom, como eu não queria ir pra a sala de aula, falei “qualquer negócio” Aí fui, pelo telefone conheci um monte de gente .. Foi muito bom P/1 - E aí você começou a conhecer as pessoas e ter contato. Como é que foi isso? R - Tinha, né, porque atendia o telefone, então assim, ficou aquela diretora, atendia, marcava reunião dos conselho, do tudo...fazia ali por telefone. Conheci todos os conselheiros. Mandava coisa na casa dos conselheiros, na casa da diretora. Aí sai aquela direto e vem uma outra. Era outra estrutura e eu continuei ali Daí E aí ficou perpétua minha cadeira ali. A Dona Maria, Ana Maria falou assim "ai eu não quero ficar no telefone. Eu quero ficar lá dentro do museu”. Aí ela foi pra dentro do museu e eu fiquei ali na diretoria. P/1 - E você ficou na recepção até quando? R - Na recepção eu fique de 88 até 92. Que daí eu já conhecia todo o Museu, né, toda a estrutura do Museu. Daí 92, mudou de novo o diretor. Aí veio o Bratke que era um arquiteto que não conhecia nada de museu, caiu de para-quedas ali. Não sabia o que tava fazendo lá. E todo aquele pessoal de infra que tinha de educativo foi tudo embora, foi renovando, então era tudo gente que tava há menos tempo que eu. Aí eu era a grande peça de museu, ali. Aí ele trouxe uma equipe, né, pra trabalhar com ele pra desenvolver os projetos, conteúdo e tal. “Olha Juju, agora você vai ajudar a gente.” Poque era ainda da secretaria, é, da secretaria que dominava, né, assim, tinha ele que foi indicado pelo secretário todo, todas as nossas coisas, verba, tudo vinha via secretaria. Então tinha uma burocracia imensa aí, foi explicando passo a passo, aprendi tudo rapidinho. E daí, assim, eu nunca fui funcionária pública. Que daí eu pedi demissão lá daquele colégio, lá. Quando eu fui pra escola particular, já pedi demissão do Estado, pra não ficar pra não dar a ousadia de algum dia alguém querer chamar. E lá nesse, nesse museu tudo era público, mas os funcionários não, porque assim, daí começou: como que eu podia ficar lá na secretaria? Não podia ficar fazendo contratinho freela. Aí tinham as empresas terceirizadas, que prestavam serviço pro museu: a empresa de segurança e a empresa de limpeza. Aí, os diretores foram fazendo acordos com as empresas de segurança. Então as empresas de segurança absorviam out, é outros funcionários fora a segurança de dentro do museu e de fora. E esses outros, estava eu lá no meio. Eu era uma apêndice. Aí, e assim foi... P/1 - Aí em 92 você fez funções administrativas? Todos os fluxos? R - Tudo. Só não o financeiro que nunca foi a minha praia e por isso eu já não, não fiz isso. Exato pra não dar ousadia, né, fiz humanas, que tudo que eu conseguia fazer mas eu consegui ser uma burocrata mais ou menos, que eu odeio burocracia, né, mas seguir o padrão da secretaria era fácil. Porque era aquela coisa, assim, igual formiguinha em procissão,né. Daí foi muito fácil. Depois o Museu tinha uma coisa que era assim, o que diferencia ele de uma museu convencional? Porque museu sempre tem aquela cara, assim, engessada. Como o nosso que tem acervo: cômodas gigantes, num sei o quê. Aí tinha o lance do design. Que design é uma palavra hoje que tá muito na moda eu entrei no Museu, o museu tava fazendo o terceiro prêmio de design. O Museu tava um ano, dois, no terceiro eu cheguei. Então eu participei de todo aquele burburinho. Era outra vibe. Todo aquele pessoal bem legal, assim, que desenhava mobília, tal. Daí eu conheci eles todos Porque daí eles passavam ali por mim, faziam a triagem, faziam a inscrição, num sei o quê nossa, foi muito bom P/1 - E aí você ficou no administrativo durante toda a diretoria do Bratke? R - Aí, mas daí, assim, no administrativo inteiro. E daí sempre tinha o cenógrafo, tal. Daí dava o suporte pro cenógrafo, assim, mais á distância, nunca de fazer o orçamento da madeira e da tinta. Era mais o suporte, a “infra” da Casa, o que ela precisava eu tinha que me organizar de providenciar. E nem se a gente não fazia compras diretas, sempre era via secretaria. P/1 - Depois você falou que aí assumiu a coordenação da... R - É daí veio depois do Bratke veio o João Marinho veio antes depois veio o Bratke, depois ficou uma menina que era funcionária lá, que tinha esse negócio, né, a diretoria ia embora, ficava. Daí em 95 veio a Marlene. Aí sim, aí ela criou uma estrutura. Quem vai cuidar de quê, né. Daí ela me pôs na responsabilidade de tudo que tivesse que produzir no museu, podia alguém conceitualizar, né. Tem um conteúdo, lá e a produção é a minha parte. Executiva, né. Providenciar pro sonho de alguém, se torne realidade P/1 - E aí desde então, você passou, hoje em dia você ainda tá nessa coordenação dessa parte de produção? R - É, hoje em dia eu já ganho uma extensão maior, né. É que cresceu, assim, a, aí mudou a característica e a forma de expor, então hoje exige muito mais cenografia e projetos expográfico grande...então assim, você tem uma demanda muito maior, hoje, né. Na época da Adélia segunda a domingo. Segunda a domingo que a Adélia era uma pessoa muito ativa e ela tem o conteúdo todo na cabeça. Aí ela senta e em cinco minutos ela monta uma exposição assim, que tem que mandar buscar na Bahia. Aí você já tem que tá com a pranchetinha do lado faz o orçamento, "ó você só tem isso de dinheiro hein?" "Olha o dinheiro já foi à metade “Aí tentava, falar "ai, não, porque agora tenho que viabilizar" Era muito legal. P/1 - E teve alguma exposição que te marcou, assim de um jeito que você fala "aí essa exposição..." ou um determinado momento no Museu que você fala que foi muito legal? R - Olha, eu acho que eu consegui porque eu sou uma pessoa que não sou muito de ficar, num sei como vocês tão conseguindo me deixar sentada nessa cadeira tanto tempo, que eu não sou muito de ficar sentada embora eu tenha uma mesa gigante. Mas um momento é diferente do outro. Porque assim, a cada conceito desse ou daquele diretor é diferente, porque são cabeças diferente, né. Então com outras informações. Uma galera que eu não conhecia muito e hoje eu tô assim, era os arquitetos, né, porque assim, conhecia os designs...que criavam os produtos. Agora os arquitetos já não tinham,assim, daí quando o Bratke veio, por ele ser um grande arquiteto, aí ele colocou no perfil do museu a arquitetura e o design. Aí começou a aproximar essa gente. Esses arquitetos que era uma coisa que eu não conhecia e foi muito legal essa chegada. E teve um evento um encontro das Américas, que ele fez. Com todos os arquitetos da América do Latina. Foi muito bom Gente que famosa hoje em dia aí. P/1 - E você trazia os seus filhos? Você trouxe a sua família para o museu? R - Tudo, sempre. Todas as atividades que o Museu desenvolvia com criança, tal. Desde exposição das mais condenáveis, né, mas que tinham haver com crianças, até uma atividade que...né. Porque, assim, condenáveis, porque assim, no conceito de alguns diretores nós fizemos uma exposição da Barbie. Eu sempre gostei da Barbie, mas eles, nossa Eles "Imagina, americano. Desenho americano Nada a ver E o Museu da Casa Brasileira tudo." Várias rejeitaram, mas eu nem aí, trouxe minha galera toda As meninas tiraram fotos que tinha umas bonecas da Barbie e as crianças punham a carinha lá, sai com o corpo da Barbie. Tinha brinquedo que interagia para elas pintarem. Sem problemas. Os meninos também, mas os meninos menos, né. Os meninos gostavam de ir no museu porque o Museu tem uma área verde grande, gostavam de jogar bola então assim, era uma jardim não muito freqüentado, assim, como hoje. Não tinha restaurante, nada então as crianças podiam vir e ficava solto, jogando bola mas hoje até, até isso tem que controlar. P/1 - Julieta,você de alguma forma você falou que viabilizava as exposições por que você cuidava da verba e tal. Teve alguma exposição que você disse "acho que essa não vai dar" e aí quando você viu pronta você falou assim “nossa, eu não acredito que deu certo”? R - Nossa, várias. A maioria porque assim, o dinheiro é assim, e o sonho é do tamanho dessa sala. E assim, o sonho cai na mesa e fala "olha, é isso e tal dia a gente vai abrir". Ainda quer festa com vinho, com Uísque 12 anos. Falei "Nossa gente o que é isso?" A pior coisa que aconteceu, foi aquele presidente Collor a gente tinha uma grana pra fazer uma exposição da China...aí os caras também iam trazer lá, umas coisas. Porque a China faz um, meio um, um pacotinho de coisas que pode viajar pelo mundo. Porque o acervo fica lá, ninguém vê. Eles têm umas réplicas milenares, mas isso custa, né. Porque é alfândega, tinha uma porção de coisa. Aí o cara pegou lá o dinheiro e o governador uma página de decreto. Quem tivesse coisa de fora do país.Nós falamos "E agora? Gente” Falei “E agora?" Daí a diretora falou “Deus, é a minha ruína, é a minha ruína, é a minha ruína” Falei “é a nossa, né Você vai ser demitida e nós todos também” Porque já tinha material publicado assim a papelaria, a divulgação se faz antes, né. Aí o cara pega o dinheiro? Aí graças a Deus tinha a Pinacoteca do Estado tinha alguns soldados de terracota da China.. Ah, sei que a gente fez, virou a exposição da China. É porque você não pode ficar mal na foto Já pensou você anunciar uma coisa, nossa E foi visitada Falei aí, falei pro Manuel "nossa, ainda bem, enh? Que tinha uma porção de coisas que não conseguiu sair porque ficou sem dinheiro. Que era assim, um recorte, né. Então a China pegou os museus todos e fez um... fragmentou e teve coisa que num cabia lá, porque os espaço dele era menor, que ele tinha pra dispor, né. Daí aquele espaço é maior. Então, assim, a gente teve aquele, teve lá, mas o que eles não conseguiram mostrar virou a nossa. Foi assim, aquela tinha certeza, isso vai sair da onde? A gente vai achar bonequinho chinês a essa hora? né? E de repente, ele ligou falando "Gente, vocês não sabem, to com um abacaxiTenho...todas as esculturas chinesas, louça e pano e tudo pra mandar fora. Olha, e o dinheiro acabou" Falei “nossa, mandar pra onde?” " De volta porque terminou.” Falei “nossa, não". Só foi o custo da Metropolitam da Tiradentes pra Faria Lima . E assim salvou a pátria. Nossa, e o povo achou: olha, nossa, eu vi isso na pinacoteca, mas isso eu não vi. Falei “é, pois é Tava guardado lá. Pensava comigo: Tava guardado lá, mas aqui é novidade, Graças a Deus P/1 - E julieta, você já tá há bastante tempo, já no Museu. Pra você, qual a importância do Museu da Casa Brasileira na sua vida pessoal, assim? R - Olha, eu consegui a melhor coisa, que dinheiro eu não ganhei não. Porque do jeito que eu, ganhei experiência, bastante. O que eu acho o melhor de tudo: que eu sempre fui muito falante, sempre gostei de fazer muita amizade, eu fiz mulita amizade no museu. Muita gente boa eu conheci. De todos os gêneros. Dê Anthony Quinn. Eu fiz uma monitoria pra ele quando ele veio pra São Paulo. Até o Oscar Niemeyer. Então muito legal que eu assim, eu consegui ficar no Museu e me reciclar. Porque veio uma meninada, veio e eu fui ficando e eu tenho a mesma cabeça da meninada hoje que esta lá comigo. Isso é ótimo Tem uma estagiária da FAU, que já tá indo agora pra Alemanha. O meu coordenador, que tem um coordenador do núcleo que um arquiteto, ele é moço também, ta saindo agora. Então eu sou a tia que tá ali coma aquela coordenação, mas que todo mundo tem a mesma cabeça deles, entendeu? Não é aquela tia rabugenta É uma tia igual. P/1 - E você ainda se vê no Museu daqui pra frente? Você quer continuar? R - É, agora, assim, a gente tem que ter semancol, né? Afinal de contas trabalhei minha vida inteira. Faltam cinco anos pra eu me aposentar. Aí eu comprei uma casinha lá na praia, eu vou virar caiçara, que daí fica uma molecada pra trabalhar também, né. Por que só eu? Porque lá eu vou precisar do que? Minha aposentadoria me basta. Eu falei “se eu não tiver hóspedes pra comer...” Que quem for comer na minha casa tem que levar. Porque eu vou morar lá na praia, vou pagar o IPTU lá que é mais caro do que aqui. Vou deixar uma casa aqui pronta, pros caras. Ah, não Se for pra lá tem que levar cesta básica. Eu vou passar meus fim de dias lá . P/1 - E sues filhos, todos encaminhados hoje em dia? R - É, eu tenho as três meninas ainda começando, né. Então eu tenho que ter esses seis anos, assim pra dar um upgrade nas vidas delas. Os rapazes sim, tem um músico, tem um que trabalha no hospital. E agora minha filha vai entrar na faculdade agora no meio do ano. A outra vai no final do ano pra Londres fazer um intercâmbio de inglês, né. Que diz que precisa, se não não consegue. Eu não sei falar nada e consegui sobreviver. Ela diz que se ela não falar ela não consegue. Enfim, já é outra geração, tá vendo? As necessidades são outras. E tem a pequeninha que tem 15 anos e tá no Ensino Médio ainda. Terminando, cai no mundo, vai trabalhar. Deu meu dia de aposentadoria, no outro dia... Esses dias eu tava conversando com a minha irmã, minha irmã falou assim "eu acho que eu ainda vou trabalhar mais uns anos porque o dinheiro é tão pequeno” Eu falei "Neta, mas as suas forças já são pequenas. você já tá velha,né, vamos dar a César o que é de césar. A gente dá uma recauchutada assim, mas a adrenalina não é a mesma de vinte anos" Falei “vai querer ganhar mais pra quê? Você tem que pensar assim: o remédio, a comida e as contas. Já era E viva o resto" ela falou “é mesmo”. Eu no outro dia que saí a minha, não trabalho mais. Eu falei “nossa, eu naquela semana que eu tiver tratando dos papéis, já não tô trabalhando mais, pra já ir treinando alguém pra ficar no lugar pra não deixar a peteca cair” P/1 – Queria te perguntar como é que foi pra você revisitar toda a sua história? R - Bom, bom. Eu tava muito, eu tava com muito medo, né, que assim, eu não sou muito de, eu sou de falar muito Mas assim, vigiada num.... Mas como eu entrei no site de vocês, li legal. Eu falei “Ah". Aí eu vim já fazendo, treinando "ó, Julieta, relaxa, relaxa" Só tô, eu tô admirada de ter ficado tanto tempo sentada. Num fico só quando eu já tô cansada P/1 - Certo. E pra finalizar, eu queria saber qual a importância para você do trabalho com história e memória? R - Foi engraçado, né. Quando eu recebi a carta convite. Eu falei "olha, chegou minha carta convite lá do Museu da Pessoa" O pessoal falou: até que enfim a Juju vai virar peça de museu Porque ainda hoje lá no Museu eu sou a funcionária mais velha. Então, assim, eu acho que a gente contribui com aquilo que a gente quer fazer, de acordo com aquilo que as pessoas querem, né. Então, assim, aprendi muito, mas eu acho que eu dei a minha contribuição também. Eu sempre fui assim, muito caxias, muito coronel, né. Então eu acho que quem passou por mim não tem queixas . E não tenho queixas não Mas foi assim, pra começar, aí eu seria mais inteligente, teria vindo passear antes no Iguatemi conhecer o Museu antes, nem ter entrado na sala de aula. Já vir direto da faculdade pro Museu. Eu acho que, que eu teria aproveitado melhor, entendeu. Porque teve uma época de criação, assim, que veio, que tinha um pessoal legal mesmo, assim, gente peso pesado que eu não conheci. Quando eu cheguei eles já tinham ido. Se eu tivesse entrado antes eu podia conhecer fiquei perdendo tempo lá, mas tudo tem seu tempo certo. P/1 - Tá certo. Tá bom Julieta a gente agradece a sua entrevista. R - Magina Eu também... Ah, eu fiquei muito feliz, falei "nossa gente que coisa é essa?” Não faltava fazer mais nada. Porque eu já não é assim: eu já tive filho, plantei árvore, só não escrevi um livro. P/1 - Só não escreveu um livro... R - É, tem umas coisas, rascunhadas lá que tenho, e tem o professor. Tem um professor que ele me persegue. Sempre que ele vai, ele pega uns...grava umas coisas, ele falou assim "eu ainda vou escrever um livro dos bastidores do Museu pelo seu olhar.” Falei “escreva Senhor escreve, eu assino em baixo” É, porque se é sobre o meu olhar eu tenho que assinar, né?
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