Memória da Petrobras
Depoimento de José Samuel Magalhães
Entrevistado por Márcia de Paiva e Eliana Santos
Rio de Janeiro 06/12/2004
Realização Museu da Pessoa
Entrevista HV/2004-01
Transcrito por: Maria Luiza Pereira
P/2 – Boa tarde.
R – Boa tarde.
P/2 – Gostaria de começar pedindo que o senhor nos falasse o seu nome completo, local e a data de nascimento.
R – Bem., meu nome de batismo é José Samuel Magalhães, nasci em 6/6/1951, na cidade de Tupã, São Paulo.
P/2 – Como o senhor prefere ser chamado?
R – Olha... (riso) a questão do apelido já está incorporado a gente, então eu acho que não tem problema chamar de “Jacaré”.
P/2 – Tem alguma história assim...
R – Ah, história?
P/2 – Desse apelido.(riso)
R – Essa história é... como se diz, é... todo mundo quer saber porque de Jacaré. Bem, posso até explicar um pouquinho que que foi a história do “Jacaré”.
Quando eu entrei na Petrobras, 1978, e sempre aconteceu isso na Petrobras, todos novatos passam por um processo de adaptação, processo de conhecimento dos demais lá. E as brincadeiras. Como se fosse uma espécie de “bicho” na universidade. E, novato na Petrobras, eu entrei na Replan, lá em Campinas e período de agosto, chovendo bastante, né, muito lá na região e os mais velhos pediram para mim subir num tanque com tudo né... com proteção, tudo, né, com capa, para ver se tinha um jacaré dentro do tanque. Eu estranhei, né, como é que vai... (riso) o processo de você ver um jacaré dentro de um tanque? Mas de qualquer forma, você está novo, você vai fazer o que os mais velhos falaram, né? Aí subi o tanque, né, para ver o que era, de fato o tanque, um tanque de teto flutuante e estava chovendo muito e eu vi, verifiquei que embaixo, dentro do tanque, tinha uma peça, que a gente faz um processo de arraste de água que acumula dentro do tanque, né, observei aquilo, mas não vi nenhum jacaré.(riso) Aí eu desci, fiz a verificação todinha lá, vi os mangotes ligados no hidrante todinho lá, falei: “- Ó, está entrando água por um lado e saindo pelo outro.” E voltei para dentro da casa de operação, lá na Replan. Quando eu falei, cheguei para esse pessoal e falei: “- É, não tem nenhum jacaré lá dentro.” Ele falou: “- Como não tem nenhum jacaré, não está funcionando?” Eu falei:”- Não, não tem. Tem uma peça que se faz o arraste da água lá, né... – a gente aprende no curso – e estava tirando a água do tanque.” Aí ficou... “- Mas você é um jacaré!” Aí, pronto, aí o apelido pegou de “jacaré” e “jacaré”, aí ficou. Na Replan, né? Isso, depois... aí, depois, eu vim para São Paulo, né, tinha até um pouco, como é que se diz... Falaram meu nome mesmo, Samuel, né, meu nome que está no crachá, mas não teve como fugir. Os outros companheiros de Campinas ligaram para o terminal de que eu fui transferido e queriam falar com o “jacaré”. Aí ninguém sabia quem que era o “jacaré”, aí... (riso) “- Não, mas ele chama Samuel.” Aí pronto, aí se alastrou também em São Paulo. E depois da... que eu sou do movimento sindical também, né, eu também... logo que iniciou-se assim, aí eu peguei também o apelido e ficou. E hoje, nacionalmente, né, não só na Petrobras, mas em todo o setor que eu.... que a gente milita no movimento sindical, todo mundo me conhece por “Jacaré”. Então é igual a história do Lula.(riso) Você acaba... daqui a pouco vai ter que incorporar jacaré no sobrenome. Mas, eu espero que não.
P/1 –José Samuel “Jacaré”?
R – É... (riso)
P/1 – Ou José “Jacaré”.(riso)
R- É, José Samuel “Jacaré” Magalhães.(riso) é meio difícil, né, mas não tem problema, qualquer atividade que se vai, as pessoas procuram saber... mas eu não vejo nenhum problema de chamar de “jacaré”, né, já está incorporado assim.
P/2 – Bom, retomando um pouquinho, queria que o senhor falasse para gente o nome dos seus pais e qual era as atividades deles.
R – Bem, meus pais são nordestinos, vieram para São Paulo, meu pai é Paulo Magalhães, ele é reformado, é militar reformado, aposentou como Coronel... não, Major, major do Exército, né, como do Exército... da Polícia Militar que depois se transformou uma coisa assim, de Exército, né, fazer isso também uma comparação. E a minha mãe é doméstica, né, Justa Barros Magalhães, também nordestina, vieram para São Paulo no ano de 1950, meu pai começou as estudar aqui em São Paulo, era o casamento do meus pais, como eu nasci em 1951, meu pai veio para o interior primeiro...
P/1 – Ele veio transferido pelo Exército, não?
R – Não, não, ele não veio transferido, ele veio para São Paulo como... trabalhar na agricultura. Comprou uma pequena máquina de beneficiar arroz, na onde que eu nasci, em Tupã, depois vendeu e veio para a capital. Aí na capital que ele começou a estudar. Entrou na Guarda Civil, depois transformou-se em Polícia Militar, né, e ele foi seguindo, foi... começou estudar e aí chegou ao posto de... aposentou como Major. Foi isso que aconteceu com ele. A minha mãe não, a minha mãe sempre foi doméstica, né, porque a nossa família é muito numerosa, nós somos em nove irmãos. Na realidade, hoje, estamos sete vivos, eu sou o mais velho, né, e a minha irmã mais nova tem, acho que 30 anos, por aí. Então, isso é um pouco da história nossa, né, de nove irmãos, sete vivos, todos que já... minha mãe já é... meus pais já são... como é que se diz, é... (pausa) Avó, depois?
P/1 – Bisavó?
R – Bisavó (riso), isso, bisavó. Minha mãe já é bisavó já, né, com os últimos netinhos dela aí já, bisnetos, né?
P/1 – Tem muito bisneto?
R – Tem três, três bisnetos, três bisnetos.
P/1 – E neto um monte.
R – Ah, neto tem bastante. Neto, se fossem contarmos nós temos, mais ou menos, acho que dá uns 18, mais ou menos. De filhos nove, né? Tudo... a tendência nossa foi não ter grandes é... a não ser meus pais, mas todos tiveram bastante filho, né, três, quatro, por aí. Então... Minhas irmãs também. Então nós temos bastante... uma prole muito grande.
P/2 – Você teve contato com seus avós?
R – Sim, com... não, só com os dois materno e paterno, só. O meu avô não conheci. O meu avô, quando eu nasci ele tinha falecido, né, a minha avó faleceu está com três anos, faleceu mais ou menos, com quase 100 anos. E por parte dos meus pais, é... também foi nessa idade, 80, 85 anos. A minha avó por parte de pai morava aqui em São Paulo e meus avós por parte de mãe, moravam no nordeste.
P/1 – Nordeste aonde?
R – Em Alagoas, Estado de Alagoas, né, todos dois, lá em... na terra de Graciliano Ramos, lá em Quebrangulo (riso). Aí eu, eu conheci eles até 1997, 98, por aí. E minha avó faleceu eu acho que no ano de 2001, por aí. Minha avó por parte de pai. Minha avó... parece que, né, o pessoal também fala que eu tenho um traço de índio, é por parte da minha avó.
P/2 – De quem.
R – Mãe do meu pai. Meu avô era português e minha avó índia, né, descendente de índia. Então por isso que eu tenho uns traços... também por parte do meu pai. Já por parte da minha mãe não. São portugueses e holandeses, uma coisa assim, uma mistura assim.
P/1 – Lá do nordeste mesmo.
R – Lá do nordeste, é, lá do nordeste, é.
P/2 – E você iam lá visitá-los?
R – Ah, os meus vós? Sim, de vez em quando nós, é... principalmente eu conheci bastante, né, fui bastante vezes lá no nordeste, eles vinham a São Paulo. A minha avó por parte de pai, morava aqui em São Paulo, né? Aqui não, desculpe, lá em São Paulo. E ela eu conheci bastante. Agora, minhas avós... minha avó e meu avô, de ano em ano a gente visitava. Agora, minha avó não, minha avó sempre, constantemente.
P/2 – Você tem alguma recordação desse período que o Senhor...?
R – Olha, eu tenho assim, do nordeste nem tanto, porque as visitas eram mais esporádicas, mas da minha infância aqui, com a minha avó, eu tenho bastante. Porque, nas férias escolares, nós íamos passar férias na casa dela, era a alegria da gente passar na casa da avó. Juntavam os outros sobrinhos, os outros netos dela e nós íamos passar lá a temporada de férias lá, na casa dela. Então eu tenho essa memória dela bastante viva, de passar as férias com ela lá.
P/2 – E é distante o lugar aonde vocês moravam?
R – Não, não. Nós morávamos é... vamos dizer assim, nós morávamos numa zona leste e ela morava na zona norte. Uma distância razoável, né, mas não longe, não distante assim, né? Mas dentro da capital mesmo.
P/2 – Qual foi o bairro que o senhor nasceu?
R – Não, eu nasci na cidade de Tupã, eu nasci em uma aldeia indígena, né, lá em Tupã. E quando eu vim para São Paulo...
P/1 – Tupã é São Paulo mesmo.
R – Tupã é São Paulo, e... tinha a cidade de Tupã, eu nasci afastado, né, que era próximo de uma... dentro de uma aldeia indígena. Meu pai tinha uma máquina de beneficiar arroz próximo dessa aldeia aí. E quando eu vim para São Paulo, eu fui morar na Penha e minha avó morava na Freguesia do Ó, tem aquela famosa música do Gilberto Gil lá. (riso) Então ela morava lá e a gente se socava... era o Penha-Lapa, o ônibus Penha-Lapa a gente ia fazer esse trajeto aí.
P/1 – E a sua casa mesmo, Jacaré, como é que era essa casa com nove irmãos, conta pra gente, a sua infância com essa criançada toda?
R – Como você vê, o tempo passado não era fácil, né? O meu pai veio para São Paulo, saiu do interior, vendeu sua máquina de beneficiar, veio para cá arriscar. E entrou na Guarda Civil já... não para ficar num cargo, ele veio para estudar mesmo. E era dificultoso, porque criar nove irmãos, alimentar e roupa e escola, nós todos estudamos em escola pública. Depois, que aí, depois do ensino superior, embora não tinha concluído e nem começado o ensino superior, por relaxo, né, eu considero um relaxo, uma perda de tempo, mas todos nós estudamos em escola pública, né, todos os meus irmãos. Minhas irmãs também. Depois, estudei em escola pública, minhas irmãs também estudaram em escola federal, né, no Liceu, mas procuramos sempre estar encaminhados. A maioria dos meus irmãos, nós todos encaminhamos, tenho uns irmãos formados hoje, né, estão tudo encaminhados. E com dificuldade, nove irmãos... num período daqui de São Paulo, vindo do... meu pai não era um retirante, né, na verdade não era isso. Ele veio, né, com um pouco de... que os pais dele tinham deixado, principalmente o pai dele tinha deixado o nordeste, aí veio para cá. E aí, foi para o interior, naquela febre de pós-guerra, né, interior da... 1950, é... no final da década de 40, para lavoura, no beneficio daqui, mas não se adaptou. Aí veio para a Capital e foi nossa vida. Aí nós mudamos para o bairro, fomos estudando até um período. Quanto a educação, nós tivemos uma boa educação, né, como todas as dificuldades, sempre minha mãe e meu pai procuraram nos encaminhar para a escola. Então isso foi importante para a nossa formação, foi muito bom isto. Aí depois, é claro, com todo esse envolvimento nesse período, você vai... cada um encaminhando para um lado, mas na minha casa nunca houve um processo de... embora meu pai seja um militar, né, ele nunca houve um processo de que tivesse é... como é que eu posso dizer... fazendo bloqueio, né, não, se tem, ele sempre orientando, né, botando... mas cada um seguiu o seu caminho.
P/1 –Não escolhendo, né?
R – Não escolhendo, é. Na verdade, você sabe, os pais da gente sempre têm uma opção. Tanto é verdade, que hoje o meu irmão mais velho - oh, desculpa – o meu irmão a baixo de mim e meu sobrinho, são formados em advocacia, que era o sonho do meu pai, achava que nós deveríamos ser advogados, mas achava, não que ele falasse que nós tínhamos que ser advogados. Depois meus irmãos... meu outro irmão se formou em economia, parecesse que é, e acabou fazendo um curso de advocacia. E meu sobrinho encaminhou para fazer um curso de advocacia e minha outra sobrinha também fazendo um curso de advocacia. Quer dizer, o pai, de um certa forma está, nos netos, realizando um desejo, sei lá, um sonho que ele queria, na questão dos filhos. Então, nesse aspecto, nenhum se formou de momento, de imediato, nem eu, nem minhas irmãs, mas depois aconteceu esse fato aí, né, de está fazendo isso.
P/1 – Mas me conta assim, como é que era a sua casa mesmo, as brincadeiras entre vocês, como é que era a infância mesmo?
P/2 – Essa relação com os irmãos.
P/1 – Que lembranças você tem da sua infância?
R – Olha, é difícil você trazer, depois de tempo, né, você passar por momentos... morar na Capital, né, de uma mudança constante, mas eu me lembro bem que a gente tinha em casa, como sendo o mais velho, nós brincávamos na rua, sabe, tínhamos uma liberdade, o campinho, pipa, árvore, tudo isso nós tínhamos, né? E isso depois foi faltando para os nosso filhos, isso aconteceu. Mas a relação era isso, é aquela vida. Se tinha o dever escolar, ia para a escola, voltava e ia brincar na rua. Claro, também tinha o processo, nós estávamos...
P/1 – Era um bairro calmo, como é que era a rua?
R – Era um bairro calmo, tranqüilo na Penha, ali não é afastado do centro, mas era um bairro tranqüilo. É claro que depois vai entrando a adolescência, o bairro vai crescendo, aí você começa a ter os conflitos, né, os conflitos de geração, as posições... a gente vêm... nós passamos, principalmente... eu passei toda a fase dos anos 70, final do... não, nem isso, anos 70 já estava na pós-adolescência. Mas, nos demais anos não, tranqüilo, sabe? Dos anos 60, 64 já estava mais ou menos aí, eu já estava com a idade de quase 14 anos, já vendo o processo do país, né, estava na escola, terminando o ginásio... não, primeiro era aquela época... hoje está tão modificado. Que antes era o primário, depois tinha que fazer uma admissão para entrar para o ginásio, depois tinha que fazer... para entrar para o colégio. Hoje não, hoje é um processo direto. Então, naquele tempo; inclusive eu até estudei num... quando eu terminei o... eu e meu outro irmão, terminamos o primário, nós fomos estudar, fazer uma espécie de um vestibular, um cursinho, para entrar no ginásio. E fizemos com um padre, que foi muito importante também um pouco na abertura assim, dos horizontes, para haver um processo político.
P/1 – Isso em que escola?
R – É, não era bem numa escola. Eu tinha terminado o colégio público, desculpa, escola pública e tinha que ter uma preparação para você fazer um vestibular, para entrar para o ginásio. E aí meu pai... meus pais pegaram e botaram para fazer um ano... há um processo de estudo para você prestar concurso para entrar no colégio, no ginásio. E aí foi um pouco que eu aprendi, aí abri um pouco, porque lá, nesse processo de admissão, eu comecei a estudar política, sociologia, não estudar sociologia, mas um introdutório da sociologia, estudei latim, francês, sabe, nesse vestibular, nesse...
P/1 – Mas isso era um cursinho?
R – Era um cursinho, né, nesse cursinho. E isso abriu um pouco também a gente depois ir para o ginásio um pouquinho mais preparado, né? Eu também fiz ginásio na escola pública também...
P/1 – Qual era o nome da escola pública?
R – É... deixa eu lembrar, era... Ginásio Estadual Castro Alves, Castro Alves. Esse foi o ginásio que nós fizemos. Primeira Escola Estadual Professor... hum... não tenho a memória. Eu sei que eu ainda passo na escola lá, eu vejo lá, mas não tenho assim... eu lembro da fase, porque foi o seguinte: enquanto estava no primário... depois eu lembro que até o governo; eu acho que foi o governo Laudo Natel, uma coisa assim, criou o ginásio, depois o colégio, naquele edifício. Então, eu lembro só dessas passagens assim. E na juventude também foi um pouco dos anos 70.
P/1 – Então me conta da sua juventude.
R – (riso) A minha juventude...
P/2 – O senhor acha que o senhor teve uma educação mais política, ou mais religiosa?
P/1 – É!
P/2 – Só para a gente fechar aí...
P/1 – Fechar um pouco essa parte de...
R – Olha, embora minha mãe seja religiosa, também ela não influenciou... claro que ela caminhou a gente para uma questão religiosa, mas nós não fomos tanto influenciados assim. Tivemos uma...
P/1 – Religiosa católica?
R – Não.
P/1 – Qual?
R – Minha mãe é protestante. Mas isso a gente.... não veio, no caso, e falou assim: “- Você vai ser protestante, vai estar indo para a igreja...” Nós acompanhávamos, mas... temos todos os ensinamentos, mas não foi assim, um processo que veio como calhar como uma educação religiosa. Eu freqüento, não tenho... não vou dizer se sou agnóstico, né, eu respeito todas as religiões, mas não tenho freqüência nenhuma. Isso foi até por pouco. Se eu tivesse a influência da minha mãe talvez eu teria seguido sim, mas não houve isso aí. Meu pai também não era assim, vamos dizer assim, religioso, né, não tinha preferência e aí só por parte da mãe. Sempre respeitamos isso. Tanto é verdade, que hoje os meus irmãos, minhas irmãs freqüentam também, mas também nenhum seguiu assim, dizer que era da igreja da minha mãe, entende, da mesma religião seguida. Respeitamos tudo, mas não fazemos isso, então... Então, veja bem, no aspecto político, o que me trouxe um pouco também, foi essa questão dessa escola; embora seja uma escola de um padre, era um padre italiano, mas nós estávamos naquele processo dos anos 70 e uma influência muito grande do movimento e eu era novo ainda. Mas trouxe bastante informação, que depois pode trazer para o ginásio e para o colégio e depois também até quando eu comecei a militar também, no movimento, nos movimentos sociais. Porque a minha militância não vem só do movimento sindical, eu tenho participação também nos movimentos sociais.
P/1 – E em movimento estudantil?
R – É estudantil. Aí sim, aí...
P/1 – Fala um pouco da sua juventude então. Vamos lá para... você teve esse período do cursinho preparatório de admissão, aí você...
R – Sim, aí nós fomos para o ginásio, né, que era todo aquele processo de você estar fazendo... não era automático. Você tinha que fazer uma seleção para entrar no ginásio. E aí começamos. Nós estávamos nos anos 70, as discussões políticas aflorando, né, não estava... já não era 78, mas antes já, ela já tinha as discussões dentro da escola e tinham os movimentos e também tinha todo tipo de situação. Do movimento da repressão e do movimento que estava por dentro do mundo. Eu sou fã dos Rolling Stones, gosto dos Beatles, mas eu gosto mais, sou mais fã dos Rolling Stones. Por quê? Porque os Rolling Stones eram mais rebeldes.(riso)
P/1 – Era a tua trilha sonora da juventude?
R – Era a minha trilha sonora.(riso) Então eu sou mais, né... Então... Você vê, sempre tinha um processo de contestação. Enquanto os Beatles, na política mesmo era maneiro, que agradava mais a juventude, né, enquanto os Rolling Stones falavam... quem era fã dos Rollings Stones sempre tinha aquela história. Isso vem no aspecto também político. Porque você sempre estava contestando, né, a política, os métodos, escola. Eu lembro até hoje que, quando eu... no primeiro ano no ginásio, eu fiquei de castigo, para mim foi um absurdo.
P/1 – Por quê?
R – Porque nós estávamos discutindo política na escola, sabe, dentro da escola.
P/1 – E já tinha um grupo seu na escola assim, com essas mesmas idéias?
R – É, já tínhamos umas discussões, sabe, o que passava, o que que fazia, o que que estava pensando, o que que podia fazer, tinham aquelas manifestações já mais avançada, os outros estudantes estavam em nível superior, né, as manifestações que estavam lá na... já acontecendo, no... é... da, como é que fala? Posso falar da... aquelas manifestações, um pouco mais daquela faculdade de filosofia do Mackenzie. E aquilo trouxe bastante coisa para a gente, sabe, trazia, embora era distante o bairro, mas trazia um monte de informação e os professores, né?
P/1 – Da UNE.
R – Isso, da UNE, tudo, de Ibiúna, né? Embora Ibiúna foi um pouco mais para frente, mas das repressões que eu via, das manifestações que aconteciam em São Paulo. E trazia aquelas discussões para nós. Então a gente tinha um pouco disso aí, já no grupo. Depois foi aprofundando. Aí, tentaram me convencer a entrar na JOC, que é a Juventude Operária Católica (pausa) É JOC, ou Jec... Juventude Estudantil, Estudantil...
P/1 – Tinha JEC...
R – É, tinha uma até....
P/1 – JEC - Juventude Estudantil Católica.
R – É, Juventude Estudantil Católica, né, entre nós, eu nunca me... sabe, eu nunca fui preso à buscar isso, eu sempre... até diziam que eu era... não sabiam o que era anarquista, falava que eu era anarquista, né, porque tinha as idéias, todas as discussões, discutimos lá, mas nunca tem uma tendência pelo... por estar preso a um processo assim. Sempre participei e tudo. Até que entrei no colégio... aí já uma transformação, porque aí precisava... até o ginásio é... eu não trabalhava, nem eu nem nenhum dos nossos irmãos trabalhamos até concluirmos o ginásio. Claro que depois que foi para o colégio, aí sim precisávamos, porque tinha mais outros que estavam vindo, irmãos, para entrar na escola. Aí nós começamos a trabalhar. Aí já mudou um pouco o cenário de ginásio para colégio, porque você já tinha que está já batalhando e o processo já era outro, já estava mais evoluído a questão política.
P/2 – Como que era trabalhar e estudar?
R – Dificuldade, é muita dificuldade. Eu comecei a trabalhar, eu trabalhava no Centro, em São Paulo, e tinha que estudar no bairro. Então saía do Centro, pegava ônibus lotado. Todos nós, não era só o meu caso. Mas todo o colégio, o pessoal... precisava sair, precisava ajudar, né? Então eu ia trabalhar no Centro e voltava à noite para a escola e chegávamos em casa por volta de meia-noite, né, às vezes sem jantar, ou um lanchinho, ou um... o que fosse, então isso aí, sabe, foi uma fase que marcou muito. Eu acredito que marcou muito nós não, mas eu acho que até hoje acontece muito isso com o estudante que mora na periferia e precisa trabalhar e tem que estudar, não tem essa facilidade. Então, eu acho que não mudou muito.
P/1 – E aí esse período de estudo e trabalho começou então... junto com o trabalho começou em que época? Você estava em que período da escola?
R – Ah, mas teve uma fase também, que eu também fui para servir o Exército também, né? Até servir o Exército, que foi para entrar no colégio, eu não trabalhei. Depois que eu fiz um período no Exército, eu não servi o Exército, eu pedi para sair, que eu tinha o argumento que estudava, né, tudo lá e depois... aí fiquei uns três meses indo ao Exército constantemente. Lá em Ibiúna; não sei se vocês se lembram, se recordam, quando houve o atentado, até o quartel do Ibirapuera, que morreu o soldado Mario Kosel Filho, que o jipe bateu no...um jipe com explosivo bateu no Quartel, eu estava me preparando para entrar na... estava para servir o Quartel, sabe, esse período aí. Então aquilo dali me trouxe muito trauma, sabe? E eu não queria servir. Todos os meus argumentos foi... naquela período tinha uma leva que queria servir, então... que era, como é que diz, era uma vontade da juventude entre aspas, servir o Exército. Porque, de fato, dava um caráter disciplinador, não sei se era isso, bem isso, né, mas uma espécie de uma honra servir o Exército, né, para o pessoal da periferia: “Ó, tá no Exército.”. Então, era um motivo de orgulho.
P/1 – Era uma segurança.
R – Motivo de orgulho. E aí a gente já tinha esse contraste de não servir. Por causa da questão que estava passando pelo país, né?
P/1 – Você já tinha noção do que que estava acontecendo?
R – Já, já tinha. Nós já discutíamos bastante já. Já discutíamos muito.
P/1 – Isso já era então 70?
R – Já, já... depois, já era 70... 75, por aí. Então eu tenho toda essa fase aí então, que já discutíamos, já víamos tudo isso. Das manifestações de rua também, na Praça da Sé também, na Praça da República, as cavalarias, lembro muito bem desse daí da... pegava... a gente ia para lá com os estudantes... não nós, né, que organizava, mas nós íamos não era por farra também, mas também iam para acompanhar, porque o pessoal chamava: “ Aí ó, vamos lá e tal...” Aí a gente saía e ia para lá. Mas é claro que tinha a Une que estava buscando se organizar. Até, quando foi o Congresso em Ibiúna ia os universitários também, né, e nós da periferia íamos. E, podia ser que seria uma farra para uns, mas para outros já começava a ter um processo de compreensão mais do que estava passando. E o interessante era quando a gente levava bolinha de gude, quando a cavalaria vinha, nós jogávamos as bolinhas de gude (riso), depois saíamos correndo, né? Porque os cavalos caíam, né?(riso)
P/1 – Patinavam nas bolinhas.
R – Tudo isso foi uma fase, né, da nossa juventude. Depois até acompanhei bastante a questão do... depois já nos anos 70, 75, do processo de perseguição política, sabe, dos, dos... tudo isso a gente acompanhava mais de perto. Embora eu não estava envolvido diretamente com eles, com o pessoal que estava mais na frente, na linha de frente, mas nós já tínhamos conhecimento, já estávamos nessa situação já posta aí. E depois, a você como eu falei, nós precisávamos trabalhar. Aí eu entrei... o meu primeiro emprego com carteira assinada foi num banco. Estava acabando o segundo...
P/1 – Mas você teve outro antes?
R – Oi?
P/1 – Você teve outro emprego sem ser de carteira assinada?
R – Não, não tive.
P/1 – Esse banco foi primeiro?
R – O banco foi o primeiro. O banco foi o primeiro, foi o primeiro que eu entrei, trabalhei no banco... Aí no banco também, tinha o movimento já. O movimento operário, movimento bancário, eu vou dizer o movimento operário, porque tinha já... já estava já a discussão dos bancários, já tinham caçado, ou tinha até um assassinado, parece que um dirigente sindical. Eu não lembro bem, sabe, isso aí, essa fase, mas a gente já estava envolvendo já, já estava se envolvendo com isso aí. E aí, depois eu passei quatro anos no banco...
P/1- Aí qual era o banco?
R – Banco Comércio Indústria de São Paulo, lembro até hoje. Hoje é a Bolsa de Valores, é o prédio da Bolsa... Banco Comércio Indústria de São Paulo, isso, Comind. Hoje é a Bolsa de Valores lá. Então eu trabalhei lá quatro anos... e também foi importante essa fase também de entrar no colégio e ir trabalhar no banco, porque, a maioria do pessoal que trabalhava no banco, era estudante, que precisava trabalhar, estavam fazendo vestibular e a gente discutia muito. Tinha muito pessoal do interior e nós discutíamos muito a política do país, o que estava acontecendo. Então isso também trouxe bastante informação para a gente, melhorou o quadro, melhorou, sabe, as informações, tudo para a gente lá. E o contato foi diferente da escola, embora você tenha na escola, mas você tinha, né, no colégio, você tinha também o pessoal já trabalhando com o movimento operário. Isso foi muito importante para mim.
P/1 – Ah, eram dois grupos para você, como é que você se organizava, você tinha o grupo do trabalho e o grupo da escola, como é que você fazia com os seus amigos?
R – Porque veja bem: quando você está na escola é... quando você está na escola o processo do estudante era de uma formação em que você não tem a responsabilidade do trabalho. Não vou dizer que o estudante não seja responsável, mas é uma formação. E quando você está num movimento já do operário, você já vê a diferença. Porque você tem que dar uma resposta para a sua sustentação. Eu precisava daquele emprego para poder ajudar no meu estudo. Então já é diferente, então você já começa a ter uma responsabilidade. Não vou dizer também que os estudantes não são responsáveis, né, são muito responsáveis, mas quando você parte, quando você... há necessidade fazer isso, você já começa ter uma modificação. Então você já começa a separar as coisas, você já vê que: “Olha, as coisas começam a endurecer para sua vida, né, já começa a ter outro rumo.” E foi isso que aconteceu. Eu trabalhei quatro anos no banco, participei também da também... não fui da direção do Sindicato, mas participava de base, discutíamos bastante a organização, quem ia para o Sindicato, quem não ia para o Sindicato, como que fazia as campanhas, como é que foi tomado, como é que não foi tomado, a gente fazia toda essa discussão. Não tinha o processo de repressão dentro do banco, porque nós não estávamos ligados diretamente ao Sindicato, nós discutíamos entre trabalhadores ali, que estavam necessitando da...
P/1 – Com seus colegas do banco?
R – Do banco, isso. Já era uma... tinha uma outra visão. Tínhamos até pessoas que já estavam até fazendo curso superior. Eu lembro de dois companheiros nossos que estudavam... um estudava na USP e outro estudava na Getúlio Vargas. Era o contraste, né, um falando uma coisa, outro falando outra, sobre o momento que, pô, um momento político que estava passando sobre a economia. E nós, como estudantes ... todos trabalhando, dali que fazia a nossa formação. Então foi muito importante aquilo, né, para a gente entender o que estava se passando. E também por outro lado, estava um momento político que tinha Arena e MDB. Então também tinha essa situação posta no país. São muitas fases, sabe, que a gente, nos anos 70 que nós passamos, que contribuíram. Mas o quê... aí depois...
P/1 – Deixa eu também te perguntar uma coisa: você está falando desse lado todo político...
R – Você vê...
P/1 – Tinha espaço para o Jacaré dos Rolling Stones? como é que era também, só para a gente ter um pouquinho de você como um todo. Como é que o Jacaré que...
R – Olha, tinha sim...
P/1 – Tinha festa? Vocês também saíam para tomar um chope?
R – Tinha, tinha porque veja bem, é... na colégio você também... tinha um processo que nós fazíamos o seguinte, ó: fazia o colégio e fazia o cursinho, para ajudar, para tentar na faculdade e ajudar no colégio, porque era muito... sabe, então você tinha que fazer isso: ou cursinho, ou colégio. E aí você tinha o tempo de, ó: de sábado você ia para o colégio é... fazia o colégio à noite e no sábado ia para o cursinho. E também tinha outros contatos. E isso aí fez também.. Claro, não foi só militância, também tivemos muita turma de acamparmos, né, curtirmos moto...
P/1 – Conta um pouquinho um pouquinho desse lado, Jacaré, também.
R – Ah...! (riso) Isso foi muito bom, sabe? Olha, na verdade, no colégio, a gente sempre teve assim, os grupos, né, que discutíamos, depois dispersa um pouco. Depois, nos anos... depois de 17, 18 anos, quando eu trabalhei no banco também, ou até antes, era só turma de colégio, né, aí era bailinho, tinha o bailinho, fazíamos no colégio...
P/1 – Você foi meio hippie?
R – Olha... sim.
P/1 – Tinha cabelão, como é que eram as roupas?
R – Tinha, tinha que... Ah! Ó, lembrar um fato: essa punição que nós tivemos no ginásio, era porque eu estava com cabelo grande. Eu lembro até hoje que o professor chegou, falou que eu estava com o cabelo grande, precisava cortar. Eu falei que não ia cortar. Era um... processo de rebeldia, né, e aí fica...(riso)
P/2 – E os amigos eram assim também, não?
R – Não, tinha um grupo, tinha um grupo que contestava isso, né, mas aí foi uma penalização foi essa, de... Aí fiquei suspenso, mas mesmo assim, depois eu tive que cortar o cabelo, que era xodó.(riso) Tanto é verdade, que hoje eu não... eu não corto cabelo até hoje. Não porque, sabe, que eu acho que marcou, mas porque foi um processo que ficou. E a não ser que quando eu fui para o Exército, que aí eu tive que cortar. Não, nem isso eu não fiz, eu não cortei o cabelo. Para tirar a fotografia para você entrar para o Exército, eu peguei – olha só os truques que nós tínhamos na juventude – eu fiz todo um processo de puxar o cabelo para trás, botar grampo, tudo, sabe,(riso) para dar para o Exército, para entregar a fotografia para o Exército. Mas depois, aí quando eu tive que me apresentar para ir lá, para ver se ia servir ou não, aí eu cortei o cabelo. Eu tenho até hoje, na minha reservista, com o cabelo cortado, né, foi só um _____. Agora, na juventude... os anos 70 foi aquela turbulência. Movimento hippie, muita “droga”, muitos amigos se perderam naquele processo, depois se recuperaram, mas foi um momento muito, muito dramático, sabe, para mim, de você conviver com situações bastante duras.
P/1 – Você sentia isso muito pesado, esse clima todo?
R – Olha, sentia. Via, vi muitos amigos é... não sei se vocês... a gente pode estar comentando isso um pouco, a questão do LSD. Eu vi muitos amigos entrarem nessa “droga” e depois ficaram “pirados”, sabe, “pirados” que não retornaram.
P/1 – De não voltar?
R - De não voltar. Isso foi um “baque”, né? Dizer... seria até ingênuo, ou até – não vou dizer que nem o Fernando Henrique – só não fumei maconha...(riso)
P/1 – Todo mundo, né, naquela época.
R – É, eu acho que, né, deu, mas não fiquei, não fui uma pessoa viciada, nem nada. Experimentei sim, né, outras coisas, mas...
P/1 – Tinha medo, como é que você via essas coisas todas?
R – Olha, era um processo que tudo que vinha... é o seguinte: como que era, você no meio da turbulência, né, no meio de todo mundo, naquela lá, você experimentava. Aí, de repente, você... ainda bem que a minha... aí eu falo, influenciou bastante a nossa educação, você separar. É tentador você buscar...né, fazer isso, está no meio, né, mas isso não estou (supondo essas coisas?), que eu viciasse nisso. Mas eu vi muitos amigos e amigas também, que se perderam nesses processo, pessoas que estavam estudando comigo, que se perderam.
P/1 – E isso te assustava, como é que você,,,?
R – Olha, é... falar uma coisa: assustar, não assustava, porque não sei se trazia para a gente... se aquilo dali era normal, naquele processo, as coisas que estavam acontecendo, não era assim tão grave que nem a Aids, mas a gente via que de repente você via uma pessoa que estava naquele processo, depois, mais para frente, voltava e se acalmava. Agora, era um processo da juventude. Eu vi muito disto. Em São Paulo; eu estou falando disto dos anos 70, esse processo, tudo isso aí eu vi bastante.
P/2 – Os seus irmãos participavam do mesmo grupo que o Senhor, não?
R – Não, não, não. Minhas irmãs, entrando no processo de adolescência; claro que a gente... é... estudávamos quase no mesmo colégio, mas cada um tinha o seu grupo. Não éramos um grupo só. Meu irmão tinha o grupo dele, né, porque nós temos diferença e tinha diferença também na escola. E cada um tinha o seu grupo. Tanto é verdade, que meu irmão hoje, ele tem... a parte dele é um pouquinho mais conservadora (riso), a gente tinha uma parte mais, né, mais à esquerda. Mas, mas também num... assim, não posso dizer, num era igual, não foi igual não.
P/2 – E como que a sua família via a sua militância...?
P/1 – É, seu pai mesmo, seu pai, um major do Exército...
R – Não, nunca foi...
P/1 – Você conversava com ele?
R – Conversávamos em casa, conversávamos, tínhamos discussões, porque tinha o processo e eu sempre gostei de política, né? E estudava um pouco. Estudei o período de Getúlio Vargas todinho, para estar... na escola fazia pesquisa, também em casa discutíamos tudo isso aí, mas não tive nenhum assim, nenhuma censura por parte dos meus pais em relação a política. Não, nunca tive isso, sabe, isso foi sempre... claro que eles sempre colocavam algumas recomendações: “cuidado com isso, cuidado com aquilo”, mas não que chegar e falar assim: “- Ó, não quero que vocês façam isso.”, nunca aconteceu isso não, sempre foi um processo de... Tanto é verdade, que aos 16 anos... ah não, minto, aos 13 anos eu já viajava com conhecido ou não. Eu conheci... a primeira vez que eu conheci o mar... foi com... acho que 12 anos e conheci aqui no Rio de Janeiro. Eu peguei carona...
P/1 – Veio sozinho?
R – Eu peguei carona com caminhoneiro, conhecido assim, dos meus pais, né, até ia sozinho e aí viemos para o Rio de Janeiro. Volta tranqüilo. Depois, aí andou, aí... Fui morar.... Depois, um pouco mais para frente, andava para tudo quanto era lugares, eu saía sem... mas sem isso. Os meus irmãos também e minhas irmãs também. Nunca houve um processo em casa, “tem que ficar assim.”, “não, tem que ter...” não, não, sempre saindo assim.
P/1 – Vocês sempre tiveram essa liberdade?
R – Sempre tivemos essa liberdade. Isso não quer dizer que... Foi bom para nós, no aspecto da educação nossa.
P/2 – E como eram as paqueras naquela época, assim, esses grupos de amigos?
R – Olha, é... as paqueras eu acho que não modificam. Hoje, é claro, eu deixei de freqüentar um pouco a... como se diz hoje, a balada, quando entrou o processo de “discoteca”, sabe? Eu gostava muito de baile que o colégio fazia, ou outras equipes. Tinha as equipes que faziam bailes, a gente freqüentava muito, mas era baile que... como eu posso dizer, tinha igualzinho. Tinha as luzes estroboscópica, né, que as mães diziam que aquelas luzes faziam mal para a gente, que poderia dar câncer (riso) e toda aquela história, né, que não tinha nada haver.
P/1 – Mas Jacaré, e as suas namorada eram militantes? Conta para gente um pouquinho desse lado.(riso)
R – Olha, teve algumas companheiras... eu falo companheiras está vendo, já estou tão acostumado(riso)... teve algumas namoradas que tinha o processo de discussão sim, mas outras não, outras queriam... tinha o processo de juventude mesmo, de embalo, de viagem, de acampar e curtir.
P/1 – Você achava chato namorar uma militante, ou você... tinha isso, não? Era dependendo da menina.
R – Não, não, porque acontece o seguinte: nós fazíamos reuniões e acho que deixava claro uma coisa para nós e respeitávamos, sabe, as discussões das pessoas, das meninas também, às vezes vocês via que elas queriam estar junto, né, aí você trazia aquilo dali. E tinha as meninas que achavam que era chato, não queria participar. E a gente tinha essa liberdade. A partir do momento que eu fui aí para o trabalho mesmo, aí modificou, aí começou a modificação, né, aí você tinha discussões mais diferenciadas, isso aí aconteceu bastante.
P/1 – E você foi um namorador, namorou muito...?
R – Ah, não sei não, sabe?(riso) Não posso dizer que sou um namorador. Não, não fui assim tão namorador não. Num sei, né?(riso) Eu falando isso, hoje assim, não sei, né?(riso) Mais pra frente eu posso dizer....(riso)
P/1 –Mais para a frente?(riso)Então vamos voltar lá. Você, então, estava lá no seu primeiro trabalho, trabalhou quatro anos no banco...
R – Sim.
P/1 – E aí foi fazer faculdade, como é que foi o seu processo?
R – Não, eu não fiz faculdade, sabe? O que aconteceu? Eu fui um... não sei o que aconteceu, sabe, se foi uma desilusão, não sei o que foi. Eu fiz duas vezes o vestibular e minha vontade era entrar na medicina. Eu tinha... eu sou do tempo do (Cesem?), do (Ceseia?), do Mapofei, que era concorrido. Não sei se vocês... até hoje lembram disso, sabe, tem um pouco a noção do que que foi isso, né? Não era...
P/1 –Não, conta para a gente.
R – Não era esse hoje, Fuvest. Hoje tem Fuvesp que você vai lá, faz...Não, lá, antigamente era: se você queria fazer exame para medicina, para engenharia e para as áreas de exata, era o Cesem e se você quisesse fazer áreas para humanas, era... não, era... desculpa, Cesem, (Ceseia?) e Mapofei. Cesem era para medicina, para biologia, para área de exatas. O (Ceseia?) era para área de humanas: jornalismo, sociologia, tudo isso aí. E tinha o Mapofei, que era para engenharia. Então eram três áreas do vestibular, tudo junto. E você optava para aquilo ali, você fazia essa, ou essa, ou essa. E eu tentei fazer para medicina então passei. Aí já foi já foi uma fase mais para frente, né, porque eu...
P/2 – Por quê medicina? Por quê que o senhor quis medicina naquele momento?
R – Olha, você vê, na juventude é... quando eu estava no colégio, a gente discutia muito o que que ia fazer. E naquela fase do colégio, que eu estava até fazendo o colégio, discutia muito a medicina. Não sei se foi um processo de que na minha cabeça, que deveria estar fazendo medicina. Hoje talvez eu... hoje na minha avaliação talvez teria sido uma opção errada. Até por um pouco de falta de orientação, mas eu gostava. O meu irmão também fez... o meu irmão hoje é advogado e administrador. E queria fazer biologia. Começou a fazer biologia, largou, porque foi fazer outro campo. Então, são coisas da juventude, mas que eu tive dois anos tentando fazer medicina. Eu lembro até hoje que eu fui fazer, quando eu estava fazendo colégio, eu fiquei um pouco é... você repetia, você não tinha aquele processo de recuperação como tem hoje, né? Não, você não passava, você tinha que fazer tudo de novo. E eu fiquei em inglês, eu tive que fazer prova de inglês no final do ano, eu estudei tanto inglês que...(riso) que me deu um pouco de noção de inglês aí, que eu fui até bem no inglês no vestibular, mas eu não consegui passar, não consegui atingir a média. Mas foi um pouco mais para frente. Aí eu também até parei um pouco, depois, nisso aí, depois eu voltei, aí eu mudei de serviço.
P/1 – Saiu do banco.
R – Sai do banco.
P/1 – Porque quis, o que que...?
R – Não, sabe o que foi, aí que está a discussão, ficou um pouco difícil no colégio para mim, muito pesado, cansaço também.
P/1 – Era muito longe.
R – Era muito longe, né, e eu dei um tempo. Querendo fazer, fazer e aí larguei. Aí eu peguei; por uma opção de salário, de melhorar a remuneração, eu fui trabalhar com administração de hotel. Que para mim foi, sabe... enquanto salário foi bem, mas enquanto processo de vida não foi bom, sabe, me deu uma...
P/1 – Era um hotel específico ou como é que era?
R – Era um hotel específico. Tem até hoje. E eu lembro que hoje em São Paulo, se vocês vêm que hoje fala muito do Hotel Cambridge, que hoje, na verdade, é um bar, estão tentando até fazer um ponto de São Paulo, foi um hotel muito bom lá em São Paulo. Eu trabalhei, acho que três anos lá. E aí nessa fase também eu presenciei uma das coisas trágicas da minha vida., né? Que foi, nesse, né, que eu trabalhava lá, aí eu parei, parece que eu parei de estudar. Aí depois eu voltei para tentar fazer publicidade, olha só. Aí teve um momento trágico da minha vida lá. Eu presenciei o acidente que aconteceu no Joelma. Todinho, sabe, todo.
P/1 – Era perto?
R – Em frente, em frente ao hotel. Eu vi, que na hora que estourou a caixa do ar condicionado, 9:00 horas da manhã, lembro até hoje, tenho na memória isso aí, uma sexta-feira próxima do carnaval, garoando em São Paulo, nós fomos trabalhar naquela expectativa do carnaval chegar, né, aí aconteceu o acidente da caixa e o prédio pegou fogo. E, de frente, aonde que eu trabalhava assim, eu via toda a cena, né, e eu passei, a gente querendo, tentando ajudar, nós passamos praticamente o dia todo vendo aquela cena lá. Buscando no começo, colocando para avisar que estava pegando e o hotel fornecendo leite, roupa, sabe, e vi muitas mortes também. E aquilo, em certo aspecto, me trouxe um trauma. Não sei se eu me conformei com a morte a partir daquilo. Dizer que conformar com a morte, é difícil, sabe? Mas você vê muitas pessoas morrerem ao mesmo tempo e você não poder fazer nada?
P/1 – Isso e ser muito moço, né, também.
R – Ah, novo, né? Então aquilo dali, sabe, você ver as pessoas pedir por socorro e você não poder fazer nada e depois, de repente, você vê a pessoa se jogar e estar lá no chão estendida, sabe? Aquilo dali foi um trauma muito grande para mim, até se recuperar daquilo ali, foi... foi forte, né? E tinha visto da... tinha visto não, tinha acompanhado, eu trabalhava no banco, aliás, trabalhei no banco, aconteceu do Itaú... estou falando só de tragédia, hem gente... aconteceu do Itaú, daquele da... onde tinha a Casas Pirani, que era na São João... o Andraus... o Andraus que depois, né, que aí foi uma seqüência de incêndios em São Paulo. E depois foi o Joelma. Aí, o que eu fiz? Eu trabalhei mais dois anos no hotel, aí fiquei meio... aí parei. Que eu queria ver o que eu queria fazer na vida.
P/1 – E aí no hotel você achou um outro ambiente também, de trabalho.
R – Aí era outro ambiente. Embora tenha as pessoas que estudavam lá, mas não tinha assim, o caráter mais de discussão política. Tinha um, ou outro, mas era mais trabalho.
P/1 – Que bancário é mais politizado.
R – Ah, sim. Era muito mais trabalho, né, muito mais... o pessoal estudava, já fazia uma faculdade, mas era mais trabalho. E aí, eu peguei, saí... olha só, aí estava em voga, muito, fazer a discussão de computação. E eu pensei em fazer computação. Olha, pô, mas aí eu não me dava bem com computação, né, não tinha nenhuma noção, mas vamos fazer computação, porque a influência, tal, vamos fazer computação, vamos fazer computação, é... porque é a bola da vez, do futuro, né? Faz aí, acabei não fazendo. Aí eu me escrevi na publicidade, passei na publicidade, mas também não me dei bem. Aí, o que eu fiz, aí parei.
P/1 – Você passou na publicidade...
R – É.
P/1 - Começou a fazer...
R – E parei. Não fiz nem dois meses. Não gostei e parei. Aí, o que aconteceu? Aí, eu fiquei um período sem trabalhar. Isso foi em 77 já. Eu fiquei um período sem trabalhar, um ano, mais ou menos, acho que foi um ano, né, tentando me organizar, já estava com... já estava com idade já. Já estava com vinte e... uns 25, por aí... 25, 26 anos, ou um pouquinho mais, estava... não lembro bem assim. Aí eu... eu vi na folha, tenho até hoje guardado, aí foi o ano que eu fui para a Petrobras.
P/1 – Peraí, antes de você entrar então na Petrobras, que aí a gente começa também num outro período, deixa eu só te perguntar também. Nesse um ano que você fica parado, o que que você fazia, você ficou...
R - Olha, eu acompanhei muito...
P/1 – Acompanhando o movimento?
R - Sim, eu acompanhávamos os movimentos...
P/1 – Como é que era, conta um pouquinho disso
R – Ah, sim. Olha, nos bancários, eu acompanhei do setor bancário e acompanhei também um pouco quando na questão do hotel, mas não com tanta intensidade... depois que eu saí, que eu voltei a fazer, porque você tinha um processo mais de trabalho no hotel, então... Aí, período eu acompanhei muito a evolução do movimento sindical lá em São Paulo, que nós tínhamos as discussões dos bancários e tínhamos também a questão do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, “Joaquinzão”. E aí já tinha um processo de oposição, eu já vinha de uma formação operária já, não vou dizer do operário que não, mas do banco, do... embora seja administrativo, mas já tinha a (formação?) já. E eu acompanhava, ajudava.
P/1 – Você ia até lá ao Sindicato?
R – É, mas não como dirigente sindical, mas acompanhava todo o processo. E aí foi, ajudava o pessoal lá também dos bancários, ajudei também a oposição no processo do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo; nós não ganhamos a eleição, né? Mas foi isso. Depois aí, você parava, se tinha os movimentos, você parava. ia para os movimentos, depois dava uma recuada, parava. Não conseguiu, “pá”, você... mas você ia nas reuniões, tudo isso aí. E eu não estava trabalhando esse período. Aí, o que aconteceu? Aí, nesse período, eu... 77, isso foi em 76, 77, uma coisa assim. Aí em 77... aí que eu falo da Petrobras. Eu estava parado, sem trabalhar, aí vi na Folha de São Paulo um artigo... não, eu fui ver na página de emprego aí lá que precisava de operadores para a Petrobras. Não sabia o que era Petrobras, né, nunca tinha visto uma refinaria. Na Capital você não... falava de Petrobras, é muito distante, né, lá nos outros locais, não conhecia Petrobras a fundo. Se sabia da história, do que tinha acontecido, mas eu não conhecia nenhuma refinaria, não sabia o que era uma refinaria. E eu vi o processo na Folha, que precisava de operadores lá na refinaria de Paulínia. Aí eu peguei, falei: “Pô, legal, né? Operadores... vou aprender operação, não vou aprender computação lá.”
P/1 – Você estava com o jornal procurando ver o que que você queria fazer dali.
R – É, eu vou ver o que que tinha... tinha que fazer algumas coisa, porque... ou se voltava a estudar, né, mas para eu voltar a estudar eu tinha que trabalhar , para sustentar isso aí. Aí eu vi isso aí, para operadores, aí fui para Campinas. Quando eu cheguei lá,, vi aquelas torres lá, eu falei: “Nossa Senhora! Que que é isso aqui?”(riso) Aí cheguei lá à tarde para me inscrever, eu vim aqui... “- Ah, eu vim fazer o concurso para operador de computador aqui.” Aí eles explicaram que não era para computador e tudo, né? Aí eu falei: “- Ah, tudo bem! E como é que trabalha?” , “- Ah, trabalha em turno.”, “- Ah, tá bom, então vamos trabalhar, né?” Aí peguei e me inscrevi. Fiz a ficha, mas não sabia, olhei a refinaria assim, à tardezinha, sabe, aquele monstrão lá, eu falei: “- Nossa! Que que é isso aqui?” Aí fiz o concurso, aí passei para a Petrobras. Eu fiz o concurso em 77 e fui chamado em maio de 78. Em 77 eu fiz o curso da Petrobras, em maio de 78 eu entrei na Petrobras. Aí que já começa a história da Petrobras.
P/1 – Então vamos esperar um pouquinho que a gente já tem quase um... mas deixa eu só te perguntar: quando você olhou aquela refinaria assim, que você não tinha nem idéia, na hora que você estava indo para lá procurar um curso, fazer um trabalho com computador, você falou “tudo bem”, foi assim?
R – Foi, foi. Olha, você sabe...
P/1 – Você achou que o trabalho poderia ser legal?
R – É, você sabe... Porque, você sabe o que foi interessante? Você não ter o conhecimento do que você ia fazer , eu, para mim, eu não sabia o que era, isso eu tenho claro, eu não sabia o que era, o que fazia na refinaria. E depois, eu conversando com as pessoas, o que eu percebi é que era um... quando falou que trabalhava em turno, que trabalhava na refinaria, mas eu pensei que era computação, né, mas não era, era dentro da refinaria. Eu falei: “- Pôxa, nunca trabalhei numa fábrica.” Sempre trabalhei em escritório, trabalhava com escritório, com máquina de calcular, com máquina de datilografar, estava entrando o computador ainda; não tinha computador ainda, era tudo... né? E aí eu falei: “- Pô, trabalhar numa fábrica, numa...” Eu gostei da idéia.
P/1 – Gostou da idéia.
R – Gostei da idéia e fui. Aí...
P/1 – Você fez um concurso...
R – Fiz o concurso...
P/1 - O concurso foi difícil, como é que foi o concurso?
R – Olha, foi. Tinha bastante gente, viu. Tinha... eu não lembro de tinha... eu sei que tinha, mais ou menos, acho que umas 500 a 600 pessoas.
P/2 – Só tinha para a área de operação, não?
R – Tinha só para operação.
P/2 – Só para operação.
R –Para operação, é. Tinha para operação, aí eu fiz o concurso, né, eu passei no concurso, aí depois me chamaram para fazer o curso de operação, aí falaram que era de turno, aí eu fui me adaptando. Aí eu gostei. Aí depois, entrei em maio de 78, fiz todos aqueles processos que faz na Petrobras, depois o Sindicato...
P/1 – Quais são os processos?
R – Ah... de você ter integração, depois teve a carteira, disse dos direitos, de Petros, né, e eu fui assinando.
P/2 – Como é que foi esse curso que o senhor fez ?
R – Olha, o curso foi interessante, porque também, quando nós passamos no curso, também eu não conhecia ninguém. Tinha pessoas do Estado inteirinho, quer dizer, de diversos locais do estado. Nós éramos em duas turmas... é, duas turmas, duas turmas de operadores e nós fomos fazendo um colégio e nós não conhecíamos um ao outro e fomos para lá, né, e também não tínhamos noção de quem que era as pessoas, eram tudo pessoas que estavam o seguinte: estavam estudando, ou tinham estudado e estavam procurando emprego. Eu lembro que eu fiz o curso no Colégio São José, lá em... no Taquaral. Primeiro foi assim, eu morava em São Paulo, fui a Campinas, não conhecia Campinas também. Fui para Campinas, aí depois eu passei, voltei para São Paulo e me chamaram. Aí nós nos organizamos. Nós aí fomos morar é... posso falar? (riso)
P/1 – É claro! Mas nós nos organizamos, nós quem?
R – O pessoal que passou... aí, quando a Petrobras chamou, nós não tínhamos onde morar em Campinas, aí nós morar...
P/1 – Pois é, isso que eu queria saber.
R – Então, aí nós fomos morar num “puteiro”. (riso)
P/1 – Com os outros colegas?
R – É, com os outros colegas, é verdade! Nós não sabíamos, entre aspas, dizia que era uma pensão, mas na verdade...
P/1 – Ah, vocês não sabiam?
R – É, mais ou menos, né? Mas daí o que acontece? Nós pegamos e alugamos um quarto... foi quatro?... eu Júlio, o Nelson, o Nereu, o... cinco ou seis pessoas. Juntamos no curso e falamos: “- Ah, vamos alugar num “tal” lugar.” Aí, alguém conhecia melhor Campinas, falou:”- Vamos lá nessa pensão que a gente aluga um quarto e tal, tal, tal e vamos lá.”, “ – É, vamos né?” No embalo, não tinha onde morar, eu não podia estar indo e voltando para São Paulo, vamos lá. Aí nós fomos morar lá. Aí era tudo lá, né? Aí, né, tinha umas meninas que moravam, faziam os seus programas até lá e a gente morava lá, estudava lá. E convivíamos pacificamente, sabe?
P/1 – A convivência era boa, vocês...
R – Era tudo tranqüilo, sabe? Vivíamos lá, até que depois nós.... aí, durante o curso, né, durante esse processo do curso, aí depois quando nós entramos na Petrobras de fato, que aí depois começou a remuneração, aí nós montamos... nós fomos para uma república.
P/2 – Quando tempo durou o curso?
R – Olha, foram... o curso foi de... um curso normal da Petrobras, quatro meses, quatro ou cinco meses, né, eu acho que é isso mesmo, que nós... quatro ou cinco meses. Eu sei que nós entramos no curso, nós saímos em dezembro. Porque foi chamando uma turma que tinha passado, nós terminamos em dezembro, é isso mesmo. Porque o Júlio entrou... o pessoal entrou em janeiro e foi chamando. Aí nós saímos da pensão. Aí voltamos para casa. Quem a Petrobras chamou primeiro já foi trabalhar e quem foi chamando voltou para casa e ficou aguardando que a Petrobras chamasse. Aí esse pessoal que foi para a Petrobras, também não tinha onde morar. Aí, quando nós todos entramos na Petrobras, o que aconteceu? Aí nós fomos... aí já tinham as repúblicas dos petroleiros também. Tinham diversas repúblicas lá em Campinas, porque estava formando também a Revap e tinha pessoal da Revap, que é a refinaria de São José, a do Paraná e o pessoal tinha montado república. E aí, o que que estava acontecendo? Então quem estava entrando na Replan, que era de fora, ia para essas repúblicas.
P/1 – Vocês já foram para uma dessas repúblicas?
R – É, aí nós já fomos para uma república que o pessoal estava saindo e nós fomos para a república. Os seis foram para aquela república lá. E vivemos lá um bom período. Até praticamente a gente se casar.
P/1 – Agora a gente vai fazer uma pausinha que a gente já está a uma hora...
R – Eu acho que eu já contei bastante, hem? Caramba!
(Fim da fita HV01)
P/1 – Então vamos retomar, Jacaré, aí você, enfim, passou no concurso, fez o seu curso lá para operador, arrumou seu local para...
R – De trabalho.
P/1 – Se instalar, de trabalho e para se instalar, então conta esse início na Petrobras. Conta para a gente um pouco, então. Como é que foi o início?
R – Olha, o início na Petrobras, é claro que você vem de uma situação de ver... isso eu gosto de falar sempre, até para os mais novos e até para os nossos trabalhadores também da Petrobras, não fazemos diferenciação, mas quando eu entrei na Petrobras a gente via uma diferença do operariado da Petrobras e o operário lá fora. Isso deu um... marcou bastante para mim.
P/1 – Como assim, essa diferenciação?
R – Como? A diferença que tinha na questão... primeiro: da situação da qualificação, isso uma coisa e também do padrão de vida. A diferença que tinha.
P/1 - Uma diferença positiva.
R – Positiva. Notei muito isto, né, porque, claro; não dizendo que isso era ruim, isso era bom, porque você tinha uma situação porta fora de dificuldade dos trabalhadores... lá dentro era até melhor isso aí. Porque, veja bem, quando eu te falei assim: “- Quando eu estudava em São Paulo, os trabalhadores que estudavam junto comigo né, os estudantes também, o que que era? Pegar um ônibus, saía do seu serviço, pegava um ônibus lotado para voltar para a escola, para fazer a escola, sair meia-noite, depois, no outro dia, às 6:00 horas voltar para o serviço, né, da manhã.” O que que acontece? na Petrobras, eu vi, falei: “- Pôxa, mas tem transporte aqui.” O pessoal pegava o ônibus em casa, próximo da sua casa, ia para a refinaria lá no administrativo, né, e mesmo o pessoal do turno, que tinha uma condução. Isso para mim, eu não tinha aquilo na minha vida, né, não tinha aquilo, não tinha aquilo no movimento aqui, daqui dos trabalhadores. A gente viu o pessoal daqui de... mesmo do metalúrgico do ABC, a gente viu o pessoal passar a cidade, pegava os trens, os ônibus, para ir trabalhar lá. E já na Petrobras, já tinha isso, era um avanço, era uma diferenciação, já que tinha isso. Então aquilo ali para mim, sabe, começou a mexer: pô, porque os demais não podem ter? Então... mas já era importante que a Petrobras já fazia aquilo, já praticava aquilo. Então aquilo trouxe uma diferenciação. E também a gente via um pouco da facilidade dos trabalhadores da Petrobras. Foi muito importante aquilo para mim, falar: “pô, é possível modificar não só aqui dentro, mas é possível você ter outra forma de ver... como é, melhorar a vida dos trabalhadores lá fora.” E não era porque nós estávamos numa estatal, mas que era possível aquilo dali. Não fazer uma situação do que, é... “ah, eles são melhores”, não era isso, mas, de uma certa forma, aquilo dali mostrou para mim, que era de fora. E eu acho que mostrou até para outras pessoas também que não tinha aquilo. E para todo mundo que, de uma certa forma, que entrou na Petrobras, né, ver esses avanços, principalmente esses benefícios que se tinham. Esses benefícios, é claro, ele veio no período da ditadura, né, transporte e tudo aí, mas a gente via, observava também que já movimento sindical também já fazia a sua reivindicação também em relação à isso, né? Ou pouco, ou bem ou mau, mas já fazia algumas reivindicações nesse sentido aí, em ter esses avanços, né? Então isso foi importante para mim, no meu ver, meu ponto de vista como operário, que era possível que dali . Aí eu vi também, quando entrei na Petrobras, que além, do trabalho... para mim foi bom o trabalho...
P/1 – Conta um pouco como é que era o trabalho, como é que você chega num universo que era completamente diferente...
R – Completamente diferente, justamente! É.
P/1 – O que você achou da refinaria, como é que era estar lá dentro, para que canto você foi? Me conta o que era o teu trabalho.
R – Então, o que que fez a diferença para mim em relação a Petrobras, né, do trabalho de fora e o trabalho dentro da Petrobras? Você tinha o controle; não vou dizer do controle do trabalho, mas você sabia, você tinha decisões sobre o trabalho, você discutia o trabalho todo ali. Era diferente do banco e da própria administração do ano que eu trabalhei no hotel, que você chegava lá e ia fazer as coisas, cumprir uma tarefa. Embora na Petrobras você também tinha que fazer trabalho, mas era um processo contínuo em que você tem o coletivo discutindo a forma de trabalho. E aquilo ali também... foi muito bom aquilo ali, no meu processo também de formação. E também a formação na Petrobras para mim também foi muito importante na formação técnica. Porque, veja bem, quando você pensa que você sai de um escritório para trabalhar numa produção e que você está lá e você é responsável, você tem que... fazer isso, faz aquilo, discutir ações, tudo aquilo ali, você muda completamente. Então, isso aí fez com que eu... “- olha... - eu falei - é o meu serviço.” Gostei daquilo, né?
P/1 – Como é que era o seu serviço na prática?
R – Antes da Petrobras?
P/1 – Não, na Petrobras.
R – Na prática?
P/1 – É, o que é...
R – Olha, eu sou operador.
P/1 – Conta para a gente o que que é um trabalho do operador.
R – Olha, numa refinaria antigamente, você tinha o operador de processo, o operador de utilidade, o operador de transferência e estocagem. São três áreas que se tinha... embora hoje está automatizado, está fazendo tudo numa sala de controle, mas ainda tem o pessoal que fica na área, mas você tinha o controle com as áreas. O pessoal das unidades eles ficavam lá na destilação, no painel de controle e acompanhava o processo. O pessoal da utilidade que trabalha com a geração de energia também. E fazia... fazia uma leitura, tinha o conhecimento, mexia com as caldeiras e saía nas áreas. E o pessoal do Cetrae é o pessoal que mexe com a... desde quando o petróleo entra dos terminais daqui, dos terminais... dos navios que vêm para os terminais, dos terminais irem para refinaria e do que sai do tanque para ir para o processo e depois do processo para a área final, da onde sai a gasolina. Então eu sou desse setor.
P/1 – Cetrae quer dizer o quê?
R – Transferência e Estocagem. Então você prepara o petróleo para entrar na torre, você prepara, né, fazia todo o processo quando ele chega, a leitura do petróleo, fazia o bombeio para a torre e depois tinha os produtos acabados: a gasolina, o diesel, o GLP, isso passava pela gente, passava por nós, as correções, tudo isso aí nós tínhamos esse papel; tínhamos não, temos esse papel de está acompanhando o produto final da refinaria. E depois a distribuição, os bombeios para o público externo, né, para o consumo. Então isso aí foi muito bom, que você passa a entender toda a refinaria.
P/1 – Você circulava, então, nesse trabalho?
R – É, você sabia desde quando entrava o processo, como é que entrava o petróleo, porque destilava e como ele saía. Então isso foi muito importante para mim, sabe? Então você tinha o processo todo. Não que eu não trabalhava na destilação para está lá acompanhando o processo de destilação, mas você sabia todo o processo... eu tive conhecimento, né, teórico e prático de todo o processo da refinaria. Então isso era bom, foi importante para mim, né, porque você saía de um processo de papel e entrava para um processo de ver o produto e ver o seu produto final lá acabado, lá, né? Então isso foi muito importante na minha formação e por isso acho que eu acho que eu me adaptei bem; eu trabalhava só na parte administrativa, que eu meu adaptei bem ao turno.
P/1 – O seu turno era qual?
R – Era quatro grupos de oito horas. Ainda não era quinto grupo, eram quatro grupos de oito horas. Eu trabalhei no grupo quatro, na refinaria...
P/1 – Era de que hora a que hora?
R – Olha, turno ininterrupto de revezamento. Trabalhávamos das 8:00 às 16:00, 16:00/24:00 e das 0:00 às 8:00 da manhã. E as folgas. Depois tinha as folgas.
P/2 – Foi sempre assim ou mudou ao longo dos anos?
R – É, mudou porque... quando eu estava na refinaria e até no terminal, antes de eu vim para o Sindicato, eram quatro grupos de oito horas, hoje é cinco grupos de oito horas, mas o processo é o mesmo, né, só que melhorou a questão da jornada de trabalho. Isso foi até discussão que o movimento sindical fez... aí, depois é outra história, né, é isso aí. Mas dentro da refinaria eu participei desse processo de trabalhar quatro grupos de oito horas. Aí depois veio o histórico do movimento sindical para mudar esse horário. Mas aí é outra fase, como se diz.
P/1 – E lá da Replan, você falou que gostou de ter todo esse apoio ao trabalhador e tudo. O que que você não gostava, tinha alguma coisa, ou não?
R – Olha, é... de uma certa forma é... claro que você fora... no banco, no... mesmo... eu que trabalhei na área administrativa, você tinha um cerceamento né, é... político. Mas não tão assim declarado. A gente na refinaria, tinha aquele processo: “- Eu vou... não...”, você não podia, entre aspas, né, podia falar de política, mas a gente falava de política. Tinha aquele discussão que era “Lei de Segurança Nacional”. Então tinha todo aquele clima dentro da Petrobras, depois isso caiu, né, mas tudo tinha aquele clima que o pessoal tinha essa...
P/1 – Era o clima da ditadura.
R – Isso...
P/1 – Da própria ditadura.
R – Mas era a ditadura né, era a ditadura, porque só em... em 89, não, quando é que foi isso... só, não, antes; é porque eu entrei em 78, estava no governo... Figueiredo?
P/1 – Figueiredo.
R – Figueiredo, é, no governo Figueiredo. Aí depois ainda tem a história da greve, né, então. Então você tinha todo um processo que era o setor estratégico, o setor de Segurança Nacional, então você tinha... você observava lá dentro, que ainda tinha um processo de controle. Embora hoje está mais democrático, tudo mais, você tinha esse processo ainda lá, sabe? Isso eu também senti um pouco, bastante, né, assim, de ver isso, ter um certo cuidado com isso, né? Você fazia... discutia, mas... discutimos principalmente nós os operadores, falávamos sobre política, mas, né, ali. Depois que foi melhorando, mas você sabia que tinha aquele processo lá dentro. Então isso também foi um pouco que eu estranhei. Porque lá fora você, embora falasse, mas você não estava envolvido, lá dentro você... não... lá dentro você tinha a Lei de Segurança Nacional e isso...
P/1 – O que que significava mais ou menos, essa lei?
R – Ah, porque você não podia falar de política...
P/1 – Tinha um regulamento?
R – Ah, você não podia falar de política, você não podia falar de partido, você não tinha, sabe... você tinha todo esse processo que a ditadura fez, né, você ia lá para trabalhar, né, e aí obedecer, embora não acontecesse isso na... um pouco na Replan, porque na Replan, quando eu entrei já tinha havido... já estava mais arejado, já estava até num processo de.... a Replan foi fundada em 71, né, na época do... eu nem lembro qual é que foi o presidente, se foi o Geisel, o Ernesto, um assim, né, mas estava na ditadura. Então você já vem, com as outras que vieram de fora também, já estavam discutindo também um processo da democracia no país, então isso contribuiu bastante na Replan. Então já não tinha tanto aquele negócio fechado, não, porque de fato era isso. Lá, eu lembro até hoje que... eu acho que eu até... se você visse um avião passar em cima da refinaria, você já ficava preocupado, porque o pessoal falava: “- Oh, Lei de Segurança Nacional, já estão fotografando ...”, você já ficava meio assim, né? E isso era pela questão da ditadura, então isso a gente tinha lá dentro, mas, depois, aí têm as fases, os anos 80, aí depois vem o processo da discussão da redemocratização do país, das greves, tudinho. Aí depois vai mudando um pouco na refinaria, mas, mesmo assim, depois, em 83, ainda mesmo assim, houve uma mão pesada da ditadura, dentro da refinaria.
P/1 – Uma mão pesada assim, como?
R – Bem, aí eu tenho que contar a história um pouco anterior, né?
P/1 – Do movimento sindical?
R – É, do movimento sindical.
P/1 – Vamos só esperar então um pouquinho. Você tinha dito que morou lá na república até você casar. Aí, nesse meio tempo você mudou, casou, quanto tempo você trabalhou lá na Replan?
R –Olha, é... na...
P/1 – Como é que você foi organizando a sua vida?
R – Então, a partir do momento que nós entramos na Replan, aí, é claro, depois de um ano você já se sente é... posso dizer, bem estabilizado, né? Você fala: “- Pô, legal, passei!” Aqui você não tem que se queixar do trabalho, da remuneração, você não tinha que se queixar, estava lá, estava bem. Embora você trabalhasse em turno interrupto e fosse diferente da vida que eu levava em São Paulo, né, mas mesmo assim eu... você vivia. Aí depois com o tempo, claro, eu namorava, né, aí vê: (riso) “- E aí, vai ou não vai casar?” Aí quando eu falo daquela história: entrou para a Petrobras, logo em seguida casa, né, então... Eu, depois de um ano, eu casei, aí eu saí da República.
P/1 – Casou com uma moça lá de Campinas?
R – Não, não, de São Paulo.
P/1 – De São Paulo?
R - Casei com a ...minha ex-esposa é de São Paulo, aí casei com ela lá, ela foi morar em Campinas, aí nós levamos a vida em Campinas. Casei...ih, nem sei agora, 78, 79, não... acho que 79, 23 de dezembro de 79, uma coisa assim.(riso)
P/1 – E continuou lá... aí arranjou a sua casa...
R – É, aí nós fizemos a nossa vida em Campinas, né, isso nos anos 80, ela foi para Campinas, moramos em Campinas. Aí, depois... aí, claro, trabalhava, vinha para São Paulo, não parava uma folga lá em Santos e em Campinas. Era vir para São Paulo direto, né? Eu vinha aqui para São Paulo porque ainda tinha a turma daqui, né, então eu vinha para São Paulo direto. Tinha a turma de Campinas, do pessoal de Campinas, mas era para durante as folguinhas se jogava bola, né, aí participava das reuniões do sindicato, ia nas reuniões, nas assembléias. Aí sim, tu ocupava enquanto não estava de folga, mas a folga era sagrada, saída de 0:00 hora, eu saía da folga grande, corria para São Paulo, vinha para São Paulo.
P/1 – E o seu grupo de São Paulo era qual, era ainda pessoal do banco...?
R – Não, era um pessoal que eu tinha, sabe, de estudante, mas passado já, não era do banco. Do branco ficou. Do banco depois encontramos para frente, né, alguns companheiros... alguns amigos que eu encontrei para frente. Do hotel nem tanto, né, mas, do banco, mais anos de vida, eu encontrei uns, ou outros que já estavam formados, tudo aí, né, estavam na vida já trabalhando. Agora, eu tinha uma turma que a gente fez, até antes de entrar na Petrobras, que gostava também de moto e também era estudante, que era... tinha uns japoneses, tínhamos os “jovens amigos da Penha” e que nos reuníamos todo sábado, sábado, Domingo é... para ouvir música, fazer bailinho, viajar, tudinho né? E eu voltava... e gostava de moto.
P/1 – Você já tinha a sua moto?
R – Quando eu entrei na Petrobras... antes eu tinha moto, mas quando eu entrei na Petrobras aí eu comprei outra moto. Comprei outra moto...
P/1 – Uma mais possante.
R – É, aí eu vinha correndo para São Paulo, pegava a moto e vupt... vinha para São Paulo.(riso) Ainda bem que na República que eu morava, tinha outros japoneses, dois japoneses que gostavam também de moto, né, então...
P/1 – Vocês viajavam?
R – Aí viajávamos de moto, eu vinha para São Paulo de moto, é, aí eu encontrava com o grupo aqui de São Paulo, porque nós fomos trabalhar em grupos diferentes, que eu morava na República. Enquanto um estava dormindo, o outro estava trabalhando, enquanto outro estava trabalhando, outro estava dormindo e assim ia a vida. Ou numa folga que combinava, ou não dava mais para sair, viajar junto. Os três trabalhavam... quatro trabalhavam... cinco que ficou na República, dois ficaram num grupo, cada um ficou em um grupo, então era difícil de se encontrar. Mas aí ficou um tempo até... aí cada um saiu para um lado, foi casando, tudo, né?
P/1- E na Replan você ficou quanto, oh Jacaré?
R - Na Replan eu fiquei de 78 até 85.
P/1 – E aí você quis mudar...?
R –É, aí tem fases, aí houve bastante processo lá também, né? Teve também um acidente, também...
P/1 – Pode comentar?
R – Mas... é...eu queria falar um pouco também... até antes de chegar no acidente...
P/1 – Então vamos falar do movimento sindical, tá?
R – Isso! É, porque aí...
P/1 – Você entrou e você se sindicalizou logo?
R – Sim, logo de imediato nós sindicalizamos ao Sindicato.
P/1 – E qual era o sindicato, era o sindicato já de...?
R – De Campinas.
P/1 – De Campinas.
R – É, tinha sede lá no Jardim Guanabara, aí tinha o Jacob Bitar, tinha Demetrio, (Caravanti?) e outros companheiros que estavam lá e que tinha, já vinha... o Jacob Bitar parece que tinha vindo de Santos, já tinha uma... já estavam já formando lá o movimento sindical, e o pessoal que estava na Replan. Então eu já fui para o sindicato. Fui para o Sindicato não, já me filiei ao Sindicato e dentro, lá dentro, estava fervendo a questão da política, né, e nós discutimos bastante. E aí tinha o movimento dos metalúrgicos do ABC também que da greve de (71?), 78 e também que trouxe um pouco para dentro da Replan e a gente discutia. E eu voltava para São Paulo e participava de discussão em São Paulo também. Então, dentro da Replan, você tinha pessoas discutindo já política, bastante grupo, bastante... era bem politizado nisso aí, foi importante isso aí. Me ajudou bastante. E aí que... e foi o seguinte: aí depois o sindicato... eu lembro que o sindicato... a direção até chamou para... fez um processo lá para ir para direção, mas como tinha bastante gente do... eu era novo na Replan e como tinha gente mais antiga no setor, é... não vou dizer que eles deram preferência, era justo que aquelas pessoas fossem, né, porque tinha... nós temos mais gente no setor, aí foi o Batista, o Armando “Cebola”, que a gente fala, né, e foram para a direção do Sindicato. Até o Spis, que era o tempo do Spis, né, que foram uma ... que era para estar naquela direção. Mas o Sindicato já...
P/1 – Era o quê, perdão, era para estar o quê? Você falou “estava nos Spis”, era para estar o quê?
R – É que... é... para estar na direção.
P/1 – Ah, na direção, tá!
R – Então, mas o sindicato já vinha se organizando, né, já vinha se organizando e estava já no processo da discussão da democratização do país. E aí estava crescendo em 78, 79, 80, os anos duros, né, da repressão e tudo, né? Aí em 83 que teve a greve; aí que eu te falo que a “mão pesada” da ditadura foi forte. Por quê? Porque nós já vínhamos num processo já de... a greve surgiu na Replan, mas já tínhamos movimento antes, já tínhamos movimento antes, fazíamos movimento antes. Era o movimento de vigília, era o movimento de não almoçar, de devolver as quentinhas, né, de uma passeata, manifestação, nós já estávamos fazendo isso lá dentro, fazíamos isso sempre lá dentro da Replan. O Sindicato já discutia, já se organizava lá dentro. E aí, em 83, o Governo, o Governo junto com FMI... é bem a história é assim, é... baixou um pacote tirando os direitos dos trabalhadores nas estatais, e o Sindicato, vendo isso, discutiu com os trabalhadores. Eu lembro até hoje, uma assembléia lotada lá no Sindicato dos bancários, de Campinas...
P/1 – Então vamos retomar, Jacaré, a gente tinha parado na greve de 83, você estava falando da “mão pesada” da ditadura. Conta um pouquinho então como é que foi.
R – Então... nós, petroleiros, decidimos fazer assembléia, como eu estava falando, no Sindicato dos bancários e a maioria da categoria na assembléia decidiu pela greve. Por quê estava decidindo pela greve? Pela questão de que o Governo já estava com aquela intenção de, junto com o FMI, de tirar os direitos dos trabalhadores, tinha aquela compreensão. Todos os trabalhadores, os petroleiros tinham aquela compreensão, e nós decidimos pela greve. Usamos uma estratégia da greve e procuramos também buscar com as demais refinarias, com os outros petroleiros, a informação do que estava passando e envolver todos os petroleiros em nível nacional. Nós iniciamos a greve com a Replan e Mataripe e as outras unidades não entraram na greve. Na Revap eu me lembro bem que houve uma intervenção policial, né, na Revap, não deixou terminar a assembléia, em Cubatão houve uma discussão lá, os companheiros ficaram naquela preparação se aderiam à greve, ou não, e depois, por outro lado, a greve nossa, ela começou... a Petrobras tinha uma estratégia, pensava que a greve começaria... a direção da Petrobras, né, pensaria que a greve começaria às 8:00 horas, porque nós tínhamos... até a direção sindical e o comando tinham uma estratégia e a greve antecipou, começou a 0:00 hora. O grupo que ficou lá dentro, né, ficou na refinaria, o grupo que ia sair a 0:00 hora não saiu e a greve começou nesse período aí. Dali para lá... que aí que eu falo para falar para vocês aí: aí sim nós sentimos o que é o “peso do poder”. Já a partir do primeiro dia as demissões começaram a acontecer. Mas mesmo assim os trabalhadores, sentindo as demissões, a cassação da direção sindical, permaneceram na greve por seis dias.
P/2 – Quais foram as principais reivindicações?
R – Olha, tinha colocado a questão de... eu não lembro bem os pontos, mas eram os direitos que... para os novos, né, questão de férias, um pouco que passou no governo de Fernando Henrique, também, na mesma situação. E lá trás tinha o imposto do FMI para arrochar os salários das estatais, depois passar para o setor privado e tinha essa compreensão já nas direções. Mas então, voltando, é... aconteceu a greve, né, a cada dia... depois, logo em seguida, também a Bahia entrou na greve, né, quase os cinco dias, os seis dias, e nós passamos seis dias fazendo o movimento. E cada dia tinha uma demissão, tinha demissão. No primeiro momento no Sindicato de Campinas sofreu o processo de intervenção, fechou, cassou os dirigentes e nós fazíamos assembléias no Teatro de Arena, que é uma praça que tem em Campinas, toda vez nós fazíamos lá e ficamos praticamente quase 24 horas no ar. Eu não fazia parte da direção, mas discutimos lá e eu fazia parte de um comando da direção, um comando paralelo, que, se a direção fosse presa, tinha um comando para atuar e fazer... ter alguns trabalhos, E eu fiz parte desse comando. Eu, hoje deputado Luciano Zica e mais outros companheiros, Santa Rosa e mais outros companheiros aí, né, que fizemos parte desse comando. Nós não se conhecíamos, mas sabíamos que tinha um comando, para justamente para evitar que a Polícia Federal e o próprio governo viesse em cima da gente e fizesse também o processo de desmantelar, para a gente ter uma organização. E a greve passou durante seis dias. Foi uma decisão muito difícil, a questão da greve, de nós retornarmos ou não; eu lembro até hoje, no ginásio Taquaral, metade queria que a greve continuasse e metade não queria. A direção sindical, né, para uma orientação, que nós encerrássemos a greve. E acabou passando por encerramento da greve, mas com muitas feridas, a direção cassada, é... eu não lembro se foi 135 ou 125, não lembro, não tenho mais memória assim, dos companheiros que foram demitidos em São Paulo e na Bahia. E a partir disso aí, é... uma das coisas que eu tenho guardado até hoje dentro da Petrobras e até do movimento sindical e como trabalhador, foi a questão da humilhação que nós passamos na Replan. Nós voltarmos; claro, foi um processo de derrota, né, da greve, tudo lá e nós fizemos um fila indiana na entrada da portaria da Replan e entramos revistados um por um. E depois entramos numa sala para que o superintendente chegasse e passasse um sermão na gente, como nós tivéssemos fazendo alguma coisa errada, né, no sentido, é claro, contra o processo que estava imposto lá. Eu senti muita humilhação naquilo. Porque era um direito, nós estávamos fazendo a greve, era justo e passar por aquele vexame lá. Então, foi uma das coisas que me marcaram bastante na greve. Depois da greve de 83, o clima na refinaria, é claro, não foi o mesmo.
R – Começou uns processos, deu tudo lá e nesse período depois, em 83, isso foi em junho... julho... julho, 6 de julho e aí passou aquele processo, a gente tentando se reerguer, o boletim do Sindicato já não circulava normalmente no Sindicato, a gente tinha que fazer um processo de levar o boletim, tudo aquilo dali, né, a segurança, por orientação lá da direção da Petrobras, investigava o ônibus, tudo lá, aí a gente dava um jeito de levar o boletim para distribuir para a categoria como é que estava o processo, como é que estava andando, né? Para a gente manter o pessoal... né? E, nesse período, a gente sentiu um pouco esse “baque”. Mas o Sindicato, os outros companheiros e nós também do comando, estávamos buscando retomar o sindicato, né, esse período aí. Inclusive os companheiros me chamaram para fazer parte da direção, eu não quis fazer... numa próxima, que ele retomasse, eu podia estar na chapa. Eu não quis, né, fazer parte da direção, eu achava que o meu papel era de militante mesmo, estar lá dentro, lá, organizado. Nesse período, em agosto de 83, aí eu tive um acidente na Petrobras, eu sofri um acidente. Foi num sábado, lá na região costuma dar muito vendaval também, foi a mesma coisa do apelido de “Jacaré”.(riso) Entrou no mês de agosto... foi no mês de agosto, deu um vendaval na refinaria e apagou o fler; o fler é a chaminé, a torre. Então, e eu trabalhava num setor, eu estava numa C.O., que eu estava em operação, na C.O.-5...
P/1 – C.O é o que, perdão?
R – Casa de Operação. E tinha trabalhado na C.O.-2, que é uma área intermediária, né? E durante a noite apagou o fler da refinaria. E nós tínhamos chegado de 8 e 16, aí o operador três pediu para ajudar os demais companheiros na outra C.O., que estava com problema. Como eu conhecia lá, eu peguei e fui para lá. E tinha problema de H2S, que é o gás sulfídrico, gás sulfídrico é, que estava saindo; que é um cheiro de ovo podre, assim, né? E aí eu fui para dentro da C.º e senti o cheiro do “ovo podre”, do gás, que é um cheiro de ovo podre. E senti, comuniquei à C.O., comuniquei à torre de... a casa de controle da destilação e continuei fazendo o trabalho lá. Mas eu não tinha... não percebia mais. Mas acabamos controlando o processo lá e eu pedi uma viatura para vim me buscar. Quando a viatura veio me buscar eu desmaiei e só acordei depois, tempo mais tarde, não sei se foi 1 hora, 1 hora e meia, todo entubado, né, por causa do problema do gás. E a partir daquilo dali me deixou meio, sabe, meio caído. Eu tive uma recuperação, o médico me atendeu bem, tudo, fizeram inalação toda, fizeram lavagem, mas depois eu retornei ao trabalho. E o médico tinha avisado à operação para tomar um pouco um certo cuidado comigo, né, porque eu estava meio fraquejado assim...
P/1 – Fragilizado.
R – Fragilizado, isso, fragilizado em relação a... e fomos tocando a vida, né? Mas quando foi... agosto, setembro... mês de outubro, novembro, eu comecei a sentir uma febre num horário, num horário certinho dava aquela febre e ninguém achava o que que era. Aí me atacou os pulmões, me deu um problema de uma tuberculose, minha resistência foi quase a zero, foi praticamente a zero, aí depois de tanta investigação aí eu fui num pneumologista, aí constatou que eu estava com problemas nos pulmões. Conseqüência... diz que não foi conseqüência e disso. Mas eu acho que, né, pelo abalo que aconteceu...
P/1 – Fragilização toda.
R – É, levou a isso. E daí eu passei um ano, depois, afastado da Replan, eu fiz o tratamento fora da Replan e voltei em 80... final de 84, começo de 85. Voltei e estava todo aquele processo da greve, desse processo que passou comigo, eu voltei, sabe, com um “pique” para dentro da refinaria. Porque eu gostava da refinaria. Tinha todo o conhecimento, todo o estudo, todo que... né, eu aprendi na refinaria, ___ _____ do que é do petróleo. E tinha um... tinha não, tenho um grande amor pela minha profissão. Mas só que, por outro lado, eu estava meio , sabe, um pouco meio desorientado, né, pelo processo que eu tinha passado, pelo clima que estava lá, pelo acidente, aí eu resolvi mudar para São Paulo. Aí tinha um companheiro que queria fazer a transferência, eu acabei vindo para um terminal, de São Paulo. Aí eu fiquei no terminal. Vim para o terminal, um terminal que a Petrobras encampou, era um terminal da Rede Ferroviária, conheci novas pessoas; tinha pessoal da Petrobras mesmo e tinha pessoal que a Petrobras tinha, é... vamos dizer, assumido, da rede. E foi uma cultura diferente entre o pessoal que estava chegando de uma refinaria; eu estava chegando de uma refinaria, alguns companheiro dos terminais e o pessoal que já trabalhava no terminal. Então culturas completamente diferentes. Mas a gente foi aos poucos se entendendo muito bem no trabalho, né? Eu com a experiência da refinaria, eles com a experiência deles, mas a gente conseguiu depois tocar o terminal tranqüilo, nós tocávamos o terminal tranqüilo...
P/1 – O terminal da Transpetro.
R – Não, não era Transpetro ainda, não era Transpetro. Era Tedep, né, era em São Caetano, antigo Tedep. Aí nós tocamos aí... 85, fiquei até... 89, de 85 até 89 no terminal. Aí, o que acontece? Nesse período também já tinha... como eu tinha me afastado de Campinas, dentro da Petrobras, quando eu vim para o terminal, aí é aquela história quando eu falei no início... ah, eu queria falar: o Spis, também tinha sido demitido da greve de 83, ele e o Demétrio, estava retornando para São Paulo, lá para o escritório de São Paulo. E o Spis... eu, embora eu buscava boletim lá em Campinas, para as informações para trazer para cá, porque nós não tínhamos mais sindicato em São Paulo. Fazia essa ponte. Aí o Spis soube que eu estava no terminal. Ele não me conhecia, eu não conhecia o Spis, né, mas conhecia a direção, mas não conhecia o Spis . Aí, o pessoal de Campinas falou com o Spis: “- Vai lá, fala com o ”Jacaré.” Aí foi aonde que o problema de São Caetano ficaram me conhecendo como “Jacaré”.(riso) Aí eu de Campinas, veio para São Caetano, aí pegou, né? Aí nós estávamos discutindo a questão da formação do sindicato em São Paulo, eu já estava no terminal, o terminal, é claro, num terminal se opera com mais tranqüilidade, embora o terminal de São Caetano, ele passou por um processo de mudança muito grande, mas você tem uma diferença. Mas você tendo um conhecimento da operação, você vai aos poucos vendo alinhamento e acaba pegando e tocando. Mas era muito mais tranqüilo que a refinaria, muito mais com tranqüilidade você operava o terminal. E fui tocando a vida. E aí, eu até só fazia esse trabalho, de buscar na campanhas, de estar discutindo com o sindicato de Campinas e trazendo a informação para os petroleiros aqui de São Paulo. Passava os boletins e tudo, porque não tinha sindicato aqui. A partir do momento que o Spis e Demétrio vieram para São Paulo, começaram a discutir no antigo (Spau?), que é um órgão da Petrobras lá em São Paulo, escritório, a formar um sindicato. Nós tínhamos a discussão com Mauá da extensão de base, né, um processo que tinha a refinaria de Mauá e tinha o sindicato lá. Mas o escritório de São Paulo, Barueri, Guarulhos, São Caetano, não tinha... tinha companheiro filiado, mas não tinha a organização sindical, nos quatro órgãos. E o pessoal começou discutir formação de um sindicato. Aí foi onde, em 89, eu estava de férias (riso), eu estava de férias da Petrobras, e o Spis, discutindo uma chapa com os terminais e lá com o escritório, foi no terminal, aí o pessoal... me indicaram para a direção; sem me consultar. Eu estava de férias. Quando eu voltei o Spis falou: “- Oh, você está na chapa.” Eu falei: “Mas como eu estou na chapa?” Aí eu passei a fazer parte de uma direção sindical.
P/1 – E aí era para o Sindicato de São Paulo.
R – De São Paulo, era para o sindicato de São Paulo. Aí nós formamos o sindicato, eu, o Spis, a Verinha uma companheira aqui de São Paulo, o Demétrio, diversos companheiros, Duarte, muitos companheiros, né? Aí formamos o sindicato e organizamos São Paulo. Já no primeiro mandato nosso, tivemos greve lá, também em São Paulo, a primeira greve do escritório de São Paulo e fomos trazendo a categoria de São Paulo, os trabalhadores de São Paulo, dos terminais, à discussão de participar, efetivamente, da campanha reivindicatória. Porque só ficavam esperando. O que que as refinarias estão pensando, que estão fazendo, o que estão discutindo. E depois chegava só a conclusão. E nós começamos a participar das discussões. E nós tivemos greves em 89, o (Spau?), os terminais... é... eu lembro bem, na eleição da Erundina, nós, petroleiros, estávamos em greve em São Paulo, pegando fogo lá, quando houve aquela discussão das mortes de Volta Redonda, dos três operários que o exército matou, nós estávamos lá em... né, fazendo todo esse trabalho; isso em 89, depois aí foi a seqüência, depois de 90 também. Aí nós já começamos a participar mais intensamente, né, mais intensamente como sindicato, das atividades dos demais sindicatos no país. Nós somos um dos últimos sindicatos a ser formado no país, dos petroleiros. Acho que por último foi o Espírito Santo, se não me falha a memória.
P/1 – Os petroleiros de São Paulo.
R – Os petroleiros de São Paulo.
P/1 – Deixa eu só perguntar uma coisa: aí, quando você assumiu, você assumiu com uma diretoria colegiada ou... assumiu que cargo?
R – Aí, o primeiro cargo assim, foi o seguinte: o Spis era presidente, eu fui secretário geral do sindicato do primeiro mandato, né, aí que nós tivemos aqueles processos, depois aí no segundo mandato o Spis veio para a FUP, veio para a direção da FUP e eu assumi como presidente, né, no Sindicato.
P/1 – Aí então a sua primeira presidência foi em que ano?
R – Foi 89, 90, 91, 92 ou 93, uma coisa assim, sabe?
P/1 – 92, 93?
R – Isso. Aí o Spis veio para a FUP, aí eu assumi a direção do Sindicato. Assumi a direção do Sindicato por três mandatos, eu queria voltar para a base, mas o pessoal, naquela discussão de quem... “ah, não, tem que ficar, tem que ficar” e acabei ficando até o nosso processo de unificação. Nós unificamos agora os três sindicatos de São Paulo...
P/1 – Fala um pouco do processo de unificação, como é que foi?
R – É... mas antes até do processo de unificação, nós tivemos um momento também, que aí o Sindicato de São Paulo participou junto com os demais petroleiros, em nível nacional, que foi a greve de 95.
P/1 – Que é muito famosa, né?
R – É. Que foi os 32 dias de greve. Inclusive o Spis estava na FUP, ele comandou em nível nacional a questão da greve, né, um dos primeiro a ser demitido na greve de 95, do nosso Sindicato lá, foi o companheiro Spis. E nós estávamos também com a lista... que se falava muito de uma grande de demissão de trabalhadores. Houve aquela demissão de 85 trabalhadores na greve de 95 e nós também tinha aquela sombra ou aquela situação de que os trabalhadores também dos terminais, também estavam com uma listagem com essa demissão. Acabou não acontecendo. Mas por outro lado, a gente trouxe bastante conscientização aos trabalhadores, foi uma greve longa, né, que todos os trabalhadores da Petrobras fizeram, no enfrentamento ao Fernando Henrique, nos primeiros 100 dias do Fernando Henrique e de lá para cá uma história que o movimento do petroleiro tem feito tudo isso aí. Agora, quanto ao processo de unificação, isso se deu já, é... há três anos atrás, nós estamos em 2004; nós já estávamos fazendo uma discussão de nós unificarmos os sindicatos do estado de São Paulo. Tanto como Santos, Campinas, Mauá, São José dos Campos e São Paulo, porque nós éramos cinco sindicatos. O processo ia, vinha, ia, vinha e chegou um momento em... que nós começamos a fazer uma discussão sobre uma secretaria que era a imprensa, e começamos a trabalhar com a imprensa. E nós vimos que só a imprensa já não cabia mais, que precisávamos avançar. Aí nós fizemos uma discussão com São José, Santos, São Paulo, Campinas e Mauá e acabou consolidando que os três sindicatos, São Paulo, Mauá e Campinas acabaram se unificando. E nesse processo de unificação eu deixei a presidência do Sindicato, aí passei a compor também a direção, aí fiquei na secretaria de formação. Só que também, nesse ínterim, que da unificação também eu participei da direção da FUP do período de 97 a 98; não, são dois anos de 98 a 2000, eu participei da direção da FUP. Aí nós consolidamos o processo da unificação, depois eu voltei para o sindicato já no processo da unificação, depois eu fui eleito para a CNQ, a Confederação Nacional do Ramo Químico, que eu estou até hoje.
P/1 – Confederação Nacional...
R – Do Ramo Químico.
P/1 – Do Ramo Químico.
R – É. Aí eu...
P/1 – Isso é CNQ?
R – Isso, é CNQ, isso. Aí eu participo hoje... eu participei no mandato anterior como Secretário de formação, por isso você me fez até uma pergunta sobre a OLT, que é um processo de informação dos trabalhadores, né, que a gente...
P/1 – A OLT está ligada ao Sindicato ou ao Fup?
R – Está ligada aos sindicatos. É um projeto que nós temos de organização dos trabalhadores para o local de trabalho, que é uma meta que nós temos. E que, de uma certa forma, nós entendemos que os petroleiros, embora não diretamente a organização para local de trabalho, mas tem próximo a isso, que são modelos diferenciados dos modelos que a gente vê aí fora, mas a organização se passa por isso. Não é exatamente a organização para local de trabalho, mas não pode deixar de confundir que não tem. Mas nós temos é um pouco dessa organização dentro lá. Tanto é verdade que, é claro que isso ajuda bastante, que na questão do movimento sindical nós temos uma empresa, uma data-base e você tem um comando: a FUP, que faz uma campanha unificada. Então, o petroleiro do Rio Grande do Norte, me desculpe, de Urucu, é o mesmo petroleiro do Rio Grande. Então essa é ajuda bastante a gente no trabalho. Então, a gente tem essa organização, que é um pouco até diferente dos trabalhadores de fora, que não tem isso. Então, a gente discute no movimento sindical fora da Petrobras, a OLT, que é a Organização para Local de Trabalho, que é uma das minhas funções e dentro da Petrobras também fazemos isso, né? Dentro da CNQ, na formação a gente procura... agora, claro, estar dentro do Sindicato fazendo as nossas atividades, que é as campanhas reivindicatórias, dos nossos movimentos, estar discutindo com a Petrobras, levando o posicionamento da sociedade e fazemos fora também esse papel. É, mais uma coisa também que eu queria comentar, que eu participei bastante, foi a questão do Movimento em Defesa do Sistema Petrobras. Os anos 90, 88,89, nós participamos bastante, enquanto petroleiro, para...
P/1 – Contra as privatizações?
R- Não. Para que em 89, 88, desculpe, a constituição garantisse o monopólio do petróleo. E nós tivemos essa batalha, naquele período, vencida. Nós vencemos naquele período, manteve a questão do monopólio. Mas, por outro lado, os governos vinha já num projeto liberal, neo-liberal das privatizações. E nós compomos um grupo de pessoas para trabalhar no Movimento em Defesa dos Sistema Petrobras. Não só da Petrobras, mas todo sistema da Petrobras. Mas aos poucos, no governo Collor, Sarney, governo Collor, veio com as privatizações, né, privatizou bastante empresas que a Petrobras tinha co-ligação. Setor Petroquímico, Setor Petrofértil, né, Petromisa, a extinção da Interbras, né, e foi acabando. E nós fomos nessa batalha até os anos 90. Em 90, o governo Collor, por um processo também de querer privatizar a Petrobras e querer dar uma pseudo-moralização no setor estatal no funcionalismo público, demitiu 900 e... se não me falha a memória, 928 trabalhadores da Petrobras e extinguiu a Petromisa e a Interbras. Foi uma batalha muito forte para o movimento sindical, mas com os esforços do movimento nós estamos retomando agora os companheiros e companheiras. Mas então isso fez parte da história, né. Até 94 nós trabalhamos bastante. Além de ter a intervenção em Brasília, na questão da Constituição para manter o monopólio, mas em 94...
P/1 – E esse movimento vocês se co-ligaram com outras entidades?
R – Ah, sim! Nós fazíamos o papel de agregar os movimentos sociais, OAB, CNBB, CUT, todos que tinham a visão de que... a Aepet, todo mundo que tinha uma visão que o monopólio deveria da União, né, da Petrobras. Mas, em 94, o governo, já o Fernando Henrique, 94 ele assume, né, 94, 95, o Fernando Henrique assume e já mando o projeto de quebra do monopólio. Que foi onde aconteceu a nossa greve também, de 95. E aí, em 95, 96, parece que passou o projeto na Câmara, aí quebrou o monopólio da Petrobras. O monopólio continua sendo da União, só que a Petrobras deixou de ser monopólio, né? Abriu-se, até se formou a questão da lei do petróleo. Aí entra um pouco na discussão que você falou, da Transpetro. Não. A Transpetro foi criada pós quebra do monopólio. Que... não sei se isso é verdade ou não, eu acredito que não, que tem umas... para mim foi bem claro, criar a Transpetro vinha num processo de privatização da Petrobras também. O governo Lula agora está segurando bastante, mas quando estava no Fernando Henrique, a proposta era privatizar a Petrobras e a Transpetro também. A gente mantém a nossa discussão porque a Transpetro volte para dentro da Petrobras. É um processo de luta. A gente está querendo rever até a lei do Petróleo; querendo rever não, queremos discutir, re-discutir a lei do petróleo, para que a Transpetro volte para dentro da Petrobras. Embora a Transpetro seja 100% Petrobras, mas tem essa lógica. Então para nós fica essa diferenciação. Tanto é verdade, que hoje nós temos dois acordos. Entendemos que é um acordo só para os trabalhadores, mas temos dois acordos: Transpetro e Petrobras. Então, isso vem um pouco para te explicar quando eu saí da Replan e vim para o terminal, antes era Tedep, era Petrobras, Terminais e Dutos da Petrobras. Hoje é Transpetro Transporte da Petrobras. Mas só que é uma Empresa, né, então é Transpetro, quer dizer, hoje é que existe a Transpetro. Foi por que? Por causa da quebra do monopólio, né, então aconteceu isso. Então a gente tem lutado bastante, né, o movimento sindical aí, para que retome isso. E isso foi sempre as batalhas, né, nossa. Depois de 95 para cá, constantemente acontece isso, as nossas mobilizações das campanhas, tudo aí acontecendo. Passou-se oito anos de Fernando Henrique, muito duros para os petroleiros, né, a gente com muita luta conseguimos manter os nossos direitos, alguns até com flexibilização e até que nós, a categoria petroleira, num congresso nosso, aí, tudo aí, apoiou a candidatura do Lula. E aí tá... que ajudou bastante, né, embora que já tenha concorrido a três eleições passadas, mas os petroleiros, sentiram-se... o movimento sindical petroleiro apoiou, foi para a rua e apoiou o governo Lula.
P/1 – E você acha que mudou alguma coisa com o governo Lula?
R - Olha, têm mudanças. É claro que nós esperávamos... a categoria e até o povo brasileiro esperava que as mudanças acontecessem de imediato. Eu tenho claro que as coisas não acontecem isso. Mas, é claro, você tem uma militância, você tem uma compreensão até... está um pouco... tem mais informações até do que os... não vamos dizer que eu sou melhor do que os trabalhadores, mas as informações são mais... chegam mais rápido para a gente, né? E o que acontece? E a gente também tinha essa ansiedade que as coisas mudassem assim, rapidamente. Mas nós sabemos que não é assim. Não quero até nem parafrasear uma frase que Celso Furtado falou a uns três ou quatro anos atrás, quando a esquerda ganhou no país: é... “o espaço de manobra da esquerda é muito pequeno” e nós sabemos disso, mas as coisas estão acontecendo. Dentro da Petrobras, quer queira ou quer não, existe, para mim existe duas Petrobras. Existe uma que quer que o governo não dê certo e existe uma que quer que o governo dê certo. Isso aí tem claro, isso aí. Isso é uma democracia, nós não podemos ser uma ditadura. Chega: “não, vai ser assim e assado”. Temos que cavar e buscar o melhor espaço ou concretizar aquilo que é democrático. E tem, é claro, tem gente contrária a isso, nós sabemos disso, o movimento sindical sabe disso. E as coisas não acontecem de uma hora para outra. Se fossemos de tirarmos todo pessoal que está assim ou botar o que nós queremos, você vê como não seria de bom-tom, né, eu tenho essa compreensão. Então você tem que fazer as mudanças, tem que estar acontecendo as mudanças, né, embora são lentas, estão sendo lentas, achávamos que seria um pouco mais ágil, mas esperamos que ainda continuem essas mudanças. Espero que até que o governo, falo popular e democrático, não vou falar que é do Lula porque eu não quero... eu tenho claro, eu não voto em pessoas, eu voto num partido, num projeto de partido, né? Tenho claro que o partido tenha um projeto e vá levar adiante, porque o Lula é uma pessoa do partido, eu tenho claro isso. E não o Lula como um mito que... é um operário, respeito como operário, né, que tem toda a sua trajetória, mas eu respeito uma discussão partidária, que tem que levar um projeto para frente. Então eu acredito que se isso está caminhando, para o próximo período a gente tenha grandes mudanças na Petrobras. A Petrobras, depois que houve a quebra do monopólio, ela mudou a sua lógica. Claro, ela estava atendo a uma questão de trabalhar com uma empresa privada, uma lógica empresarial. Em certos aspectos nós é... nós achamos que não, mas no governo Fernando Henrique foi muito disso, né, e tem um pouco disso agora também. Não queremos uma empresa que ela seja paternalista, tinha prejuízo, mas queremos uma empresa que alavanque, por outro lado, alavanque o progresso. E aí vem o quê? Como você também não vê só, ter a visão só empresarial ou só para os acionistas, tem que ter uma visão social também. E eu acredito que nesses últimos três ou quatro meses até a Petrobras tenha feito... não vou dizer nos últimos... nos últimos anos a Petrobras, no governo Lula, tem feito um pouco disso. Claro, a gente falando, chegando o que está acontecendo, teve a alta do petróleo e a Petrobras manteve o seu patamar de preços dos combustíveis, né? Então é de chegar a isso, ela teve que aumentar agora. Mas agora como é que vai fazer: “ah, caiu o preço do petróleo, nós vamos ter que abaixar os combustíveis?”, né? Então tem que ser isso feito com o governo, né, se é possível isso.
P/2 – Quais são os principais desafios que vocês sentem hoje, enquanto movimento sindical?
R – Olha, é... o movimento sindical ele não pode perder a sua característica. Nós elegemos um governo popular e democrático, mas sabemos que um governo ele é passageiro. Ele pode ter um projeto e nós contribuímos com aquele projeto como pode ser outro governo. O que eu entendo é o seguinte: que o movimento sindical não pode perder a sua característica, ele é um... é movimento sindical. Então, qual é o processo dele? É estar sempre... não só na reivindicação, mas apontando situações, intervindo na questão do país. Porque senão há mudanças no movimento sindical e esses são os nossos desafios. Por que? Porque você não pode ter uma visão do movimento sindical só, simplesmente, corporativo. O movimento sindical é corporativo, nós temos que fazer isso, nós temos que ter uma visão também de estado, de país que nós queremos. Porque, a partir do momento que nós que nós fazemos isso, nós estamos alterando o nosso país, mudando a concepção do nosso país. Então, acho que esse é o grande desafio. E está proposto, até um pouco que se vem, agora que está na voga, está nas grandes discussões, que é um pouco da reforma sindical e da reforma trabalhista. Então, essas transformações dá uma mudança para o movimento sindical. Então é um grande desafio. Nós temos um modelo de movimento sindical de 40 anos; não, muito mais...
P/1 – Vocês estão rediscutindo isso?
R – Estamos rediscutindo. Nós, enquanto filiados a CUT, Central Sindical, temos um outro pensamento. Esse modelo que esta posto em movimento sindical, ele serviu. Nós temos que repensar esse modelo, como atuar não só... é claro, veja na questão corporativa, mas por outro lado como interferir também na questão da sociedade. Esse é que é o papel do movimento sindical, como estar discutindo com a central sindical alterar os rumos, influenciar na questão política, na distribuição de renda e tudo. Então, esse é o desafio que nós temos pela frente. Isso, claro, mexe com muitos interesses, não é uma tarefa fácil, né, mas esperamos que nessa próxima década a gente consiga ter essas alterações aí.
P/1 – “Jacaré”, a gente está chegando no fim da nossa entrevista, eu vou fazer um “bate-bola” rapidinho com você, só assim: o que você gosta de fazer nas suas horas de lazer hoje?
R – Olha, tá difícil!(riso)
P/1 – Sua moto, tem a sua moto...
R – Tá difícil eu fazer a minha hora de lazer, sabe? Porque, é uma coisa que a gente luta, para que o trabalhador tenha o lazer, mas a gente não olha para nós mesmo. O dirigente sindical; não quer dizer que a gente se trabalha, se mata, mas a gente ocupa muito o nosso tempo e às vezes nós nos esquecemos de nós mesmos.
P/1 – Você viaja muito, como é que é então isso, sua agenda?
R – Ah, é muito, é muito isso aí. Olha, você está hoje aqui, né, aqui é todo um... também é um espaço de, né, estou dando uma entrevista, estou aqui pensando em outra coisa já. Como é que eu vou fazer uma reunião amanhã com a Petrobras, sobre um problema que está acontecendo em tal lugar assim. E assim vai. Então você está sempre tendo tarefa. Estou pensando também como é que eu vou fazer o projeto na CNQ, da formação. Então você está ocupado o tempo todo. O dirigente sindical; não que ele seja o supra-sumo, mas nós precisamos também um pouco repensar nessa questão, nós também temos direito ao lazer, temos direito a jogar bola; eu gosto de jogar bola. Desde quando eu saí da Petrobras para vim para o Sindicato, eu não jogo bola, desde de 89 que eu não sei o que é jogar bola.
P/1 – Você tem que reivindicar para você mesmo.(riso)
R – É. É verdade, é uma coisa que nós precisamos pensar. A minha moto, a minha moto às vezes fica 15, 20 dias parada. A não ser quando eu faço uma loucura que eu pego, faço uma viagem...
P/1 – Easy rider!
R – É, é. Gosto de moto...(riso)
P/1 – Sai por aí...
R – Saio por aí, dou uma corrida, tal, tal, mas é isso.
P/1 – Qual é a próxima viagem, qual é que você tinha contado para a gente?
R – Ah, sim. A minha viagem; sempre tive um sonho de correr a América, né? A minha vontade era; minha vontade não, o meu desejo e vou realizar, é de sair do Pólo Sul até o Pólo Norte. Não sei quando, mas vou fazer.(riso)
P/2 – De moto?
R – De moto, né, de moto.(riso)
P/1 – “Jacaré, você está casado agora?
R – (pausa) Eu estou casado. Que que você entende por casamento?
P/1 – Não, casamento, tá. Está com uma pessoa?
R – Estou, estou com uma pessoa, né, já fui casado, como se diz pela sociedade “no papel passado”, né, fui 13 anos casado, separei, estou com uma companheira, né?
P/1 – Está casado.
R – Estou casado. Mas aí eu falo assim: casamento é uma coisa; só na Igreja fala, que é eterno para sempre, né? Eu não sei se é eterno, para sempre.(riso)
P/1 – Casamento é do coração.
R – Casamento é de coração.
P/2 – Tem filhos?
R – Tenho uma filha, tenho uma filha e vou ter outra filha agora.
P/1 – Ah, é?
R – É, mas não é... olha, não é da minha esposa, não é da minha mulher não.
P/1 – A sua atual?
R – É.
P/1 – Você é um namorador e nem contou para a gente.(riso)
R – Olha, eu queria que essa parte...(riso)
P/1 – “Jacaré”, então me diz o nome da sua filha.
R – É Sara Castro Magalhães.
P/1 – “Jacaré, e me diga aqui então, quais são os seus sonhos?
R – Olha, meu sonho com a ... eu tenho uma coisa utópica. E eu acho que é até falar que é um pouco egoísmo. Eu quero viver bastante. Não importa. Parece que é, sabe, que é “ah, não, não tem um limite”. Se eu viver 100 anos, 120, eu quero viver. Essa é minha vontade, sabe? É, enquanto sonho. Agora, assim, enquanto realização e contribuo para isso, sei que não vou fazer isso, mas eu espero ter uma sociedade mais fraterna, mais digna, sabe, mais socialista, é... que os povos, né, segundo nos estamos passando um final de um século, entrando em um século muito turbulento, muitas guerras, né, juventude... embora... não quero falar que a juventude é atrapalhada, porque não é isso, mas muitas coisas acontecendo, sabe, e a tecnologia chegando aí; chegando não, estando... cada dia você tem uma... você troca de celular como se trocasse uma camisa, né? Eu estou falando um exemplo que está acontecendo, né, ou uma placa de computador como... né? Então... eu não sei, nós não podemos parar a tecnologia, mas eu espero que o homem, ele volte um pouco para a natureza também. E a gente percebe muito isso. Eu não vou falar que eu quero morar no campo ou quero morar numa praia, numa casinha na praia, eu não viveria isso, seria eu estar falando uma grande besteira. Falar “ah, quero aposentar e morar na beira da praia”, não! Não sei se eu daria para isso. Claro, que se você quer aposentar por um processo do trabalho que você faz, mas eu quero estar continuando, contribuindo com o conhecimento que eu adquiri no movimento, na minha trajetória de vida, com a sociedade, com a humanidade, um pouco disso.
P/1 - “Jacaré”, você... a iniciativa do própria Sindicato, que você participou de ter montado esse projeto Memória, eu queria saber o que que você achou de estar vendo isso realizado e de você estar participando aqui, com a gente, dessa entrevista?
R- Olha, na verdade, a questão do projeto memória, nós começamos a discutir com o Santa Rosa, começamos a discutir lá, nós tivemos um encontro lá em São Sebastião, eles já tinham a idéia e nós começamos a montar uns rabisquinhos lá, de como que era a história do petroleiro, fazendo... Eu comecei também fazer, né, junto com... não que eu fui o mentor, não é isso. E começamos a achar: “- Pô, nós precisamos fazer isso!” E eu acho de fundamental importância. O povo que não tem memória, é um povo esquecido, que não pode construir o seu futuro. Então eu entendo que o projeto ele vai dar subsídios para uma próxima geração, o que nós não fizemos eles possam estar fazendo melhor. Então eu vejo nesse sentido, eu acho que nós estamos contribuindo, né; daqui a pouco pode falar o seguinte: a juventude daqui para... a próxima geração daqui, sei lá, 50 anos, né, possa estar vendo isso aqui e falar: “- Pô, mas aquele povo lá pensava... aí nós já estamos já tão avançados, estamos andando de espaçonave, né”(riso) Que eu pensava, quando eu comecei lá, estava... pô, falava assim... só para dar um exemplo para você, quando eu entrei no movimento sindical, nossa comunicação era telex. Eu aprendia telex, sabe, aquelas maquininhas que ficavam “pa-pa-pa-pa-pa-pa!”. Depois veio o fax, né, o telex, o fax, depois veio o computador, depois a internet, não sei o que lá, não sei o que lá...aí até hoje, você tem a informação assim. Então, isso é a evolução, é a evolução que vem, você não pode negar isso. Então eu espero que até lá, nesses 50 anos futuro, alguém... um jovem veja isso e tire proveito dessa memória que está posto. Porque de fato é o seguinte: nós temos histórias das bibliotecas. É muito fácil você ir na biblioteca e ver a história de quem foi o vencedor, de quem venceu conta a sua história. E aqui eu acredito o seguinte: “olha, eu dando a entrevista e vai ser uma questão ao vivo, né, memória viva, é... alguém pode falar: “- Não, mas espera aí, eu tinha contra-ponta esse ponto de vista!” E você pode estar debatendo. Então isso é uma coisa fantástica que nós estamos fazendo, né, e vejo que é o futuro, não é? Eu até hoje, dia 6, ontem eu vi a do Roberto Marinho, né, aí eu lembrei(riso) do nosso projeto aqui, como é que está indo, eu falei: “Pôxa, o que que é você falar, né, estar participando e deixando gravado, no gravador, né?” É aquela história do homem que foi à lua... eu não sei se é bem essa história, é alguém que foi fazer uma viagem e deixou gravado o que ele estava fazendo naquele momento, para que uma geração futura pegasse e visse como é que foi aquilo dali. Então eu acho um pouco disso; eu acho não, isso... eu não gosto da palavra “acho”, porque “acho” é “achismo”, né, é um pouco a certeza de que a geração futura vai estar vendo e tomando como experiência e aprendendo, né? É isso.
P/1 – “Jacaré”, eu queria agradecer a sua participação...
P/2 – Muito obrigada, foi muito bom.
P/1 – Foi Muito bom.
R – Foi demais.(riso)
(Fim da fita HV/2004-03)
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