No sacudir de minhas memórias, poucas permanecem frescas e vívidas. Rememoro certos lapsos temporais e, às vezes, me recordo de doces e amargas reminiscências. Por que não nos lembramos de nós mesmos? Esse questionamento deveria ser mais mencionado. Por que nos esquecemos de tanto? Por que sempre pensamos sermos apenas quem respira no instante atual no corpo em que habitamos? E quem fomos um dia? E a criança que fomos? E todo o caminho de pedras, curvas, abismos percorridos para chegarmos na atual personalidade que temos? Por que memórias parecem a nós tão macilentas, pálidas, ansiando a morte? Estão vivas moldando nossos desejos, impasses e reações ao mundo. Somos nossos traumas, carinhos, amores, laços, momentos. Não nascemos hoje para sermos apenas o agora.
Conhecer minha história é saber quem sou e porquê sou. Mas a história de cada um começa muito antes de seu nascimento. Quero conhecer minha história. Minha história completa. A histórias daqueles que tornaram a minha possível. Esse desejo é constante e espero um dia realizá-lo. Mas minha história, o parágrafo do texto que ensejou minha vida, pretendo contar. Até onde sei. Até onde posso. Até onde devo.
Nasci por acaso, sim, nada planejado. Cresci com uma avó e um pai-avô e uma mãe, nos fins de semana. Sem pai biológico na tenra infância, apenas com sete anos, creio eu, tivemos um encontro que pude guardar fragmentos. Nosso primeiro encontro em que estava ciente de que aquele era meu pai. Pai biológico. Lembro-me de ouvir essa expressão, pela primeira vez, dita por minha avó, para explicar o porquê dele ele ser pai, mesmo tão ausente. Era pai, biológico.
Mas minha vida rumei sem a presença biológica constante. Até os 11 anos. Duas férias de fim de ano passei com ele. Foram tempos intensos. Eu gostava de ir a capital, passear, me divertir, ter uma rotina caótica e pouco saudável. Tinha em um mês o que não tinha há anos. Era pouco tempo, era intenso. E...
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No sacudir de minhas memórias, poucas permanecem frescas e vívidas. Rememoro certos lapsos temporais e, às vezes, me recordo de doces e amargas reminiscências. Por que não nos lembramos de nós mesmos? Esse questionamento deveria ser mais mencionado. Por que nos esquecemos de tanto? Por que sempre pensamos sermos apenas quem respira no instante atual no corpo em que habitamos? E quem fomos um dia? E a criança que fomos? E todo o caminho de pedras, curvas, abismos percorridos para chegarmos na atual personalidade que temos? Por que memórias parecem a nós tão macilentas, pálidas, ansiando a morte? Estão vivas moldando nossos desejos, impasses e reações ao mundo. Somos nossos traumas, carinhos, amores, laços, momentos. Não nascemos hoje para sermos apenas o agora.
Conhecer minha história é saber quem sou e porquê sou. Mas a história de cada um começa muito antes de seu nascimento. Quero conhecer minha história. Minha história completa. A histórias daqueles que tornaram a minha possível. Esse desejo é constante e espero um dia realizá-lo. Mas minha história, o parágrafo do texto que ensejou minha vida, pretendo contar. Até onde sei. Até onde posso. Até onde devo.
Nasci por acaso, sim, nada planejado. Cresci com uma avó e um pai-avô e uma mãe, nos fins de semana. Sem pai biológico na tenra infância, apenas com sete anos, creio eu, tivemos um encontro que pude guardar fragmentos. Nosso primeiro encontro em que estava ciente de que aquele era meu pai. Pai biológico. Lembro-me de ouvir essa expressão, pela primeira vez, dita por minha avó, para explicar o porquê dele ele ser pai, mesmo tão ausente. Era pai, biológico.
Mas minha vida rumei sem a presença biológica constante. Até os 11 anos. Duas férias de fim de ano passei com ele. Foram tempos intensos. Eu gostava de ir a capital, passear, me divertir, ter uma rotina caótica e pouco saudável. Tinha em um mês o que não tinha há anos. Era pouco tempo, era intenso. E real? Era real? Nessas oportunidades pude conhecê-lo no dia a dia. Percebi certos traços de personalidade, mas gostava da diversão. Hoje vejo que a diversão era uma distração exitosa.
Mas, as viagens de retorno valeram. Estórias ou histórias? Eram todas sobre nós e o passado da família. Recordo-me de uma dessas, no ônibus, ele me contando sobre a sua versão dos fatos desencadeadores do meu parágrafo na nossa história, que não era só minha, nem dele, mas da minha mãe, dos meus avós e de todos os que cruzaram nossos caminhos.
Gostei de ouvir a riqueza de detalhes e a novidade sobre uma história conhecida em parte. Minha avó me contou e minha mãe um pouco. Mas eu acreditava? Não sei. Acreditava em parte.
Mas se há algo inegável é ausência. Ele era ausente. História ou estória nenhuma supria a verdade constante e incorrupta da sua falta.
Por que começar essa história da história com faltas? Faltas são lacunas não contadas em uma história, mas são eloquentemente impactantes. As faltas que tive são presenças marcantes. Por que não olhamos para as faltas? O que falta também faz memória. Memória carregada. Sufocada. O vazio pesa. A falta faz história. Lição de vida: Falta faz sim morada. Falemos mais de nossas faltas.
Mas e o que tive? Tive e tenho uma família complexa. Somos bons em amar, cuidar. Mas sabemos mais e mais e, tudo de mais, faz mal. Meu relacionamento com minha avó foi sempre conturbado. Na minha pior fase, mudou. E agora tento entende-lo. Quero consertá-lo. Mas só eu quero? Não sei. Com minha mãe também. Mas com ela sinto que é possível melhorar, apesar de não ser boa em confissões. Confesso. Meu avô é um ser extraordinário. Amoroso. Complicado. Mas me ama. Isso sempre foi o mais importante para mim.
De amigos tenho poucos, mas agradeço por tê-los. Posso dizer que são pessoas Ímpares. Sem exageros. Nunca conheci pessoas assim. Reconheço. Mas conhecer de fato, não. Me ensinaram muito, mais que demais. Posso dizer que a amizade foi minha professora mais presente na minha infância e adolescência. Enquanto muitos pensavam quais os passos tomar para encarar algum relance do amor juvenil e da paixão adolescente, eu aprendia o poder e os conflitos de uma amizade. A necessidade de uma amizade e quão genuína e conveniente pode ser. O quão duradora e efêmera pode ser. O quão abusiva pode ser. O quão complexa sempre é. A amizade me ensinou muito mais do que o amor. Ao menos o amor ensaiado por tantos por aí. Esse amor caricato. Isso que dizem ser amor.
O amor nunca me faltou, porque nunca flertei com ele. Nunca quis amar, ser amada sim. Mas só por quem importa, ou seja, só por quem já amava. Não precisei me iludir com a ficção amorosa. Não precisei conhecer o amor. Nasci sabendo. Pela ausência dele e por sua presença. Olha a falta me ensinando mais uma vez.
Sou tanto e tenho tanto a viver. O mundo perde em não reconhecer o que importa e eu me perdi e me perco por não me reconhecer as vezes. Lição de vida: O mundo deveria reconhecer mais o que somos, o que podemos ser, só não somos porque não nos veem. Poderia ser mais, mas já sou muito. E sou tudo que é possível e talvez ainda possa ser o impossível. Era só um nome importante e aquela chance inusitada que pregam por aí. Mas não espero sentada, espero vivendo e procurando. Uma brecha e, alguma dia, hei de achar e nem que passe espremida e se espantem pela falha na matrix, ainda poderei passar. Promessa: Quando passar, abrirei o caminho. Prometo.
E o que sou? As memóras entregam nas entrelinhas. Mas eu digo, gosto de escrever. Desde quando? Não me lembro. Eu disse que minhas memórias não são precisas. Mas escrevo há tempos. Há tempos. Tempo, sabe tanto e não me diz, por que?
Gosto de ver o que pensei ao reler o que escrevi. Ver como penso e notar meu amadurecimento. Escrevo hoje, mas amanhã não escreveria mais do mesmo jeito. Aprendo uma palavra nova, uma nova regra de português despercebida, ou uma arte nova. Aprendo e aprender muda tudo e a escrita prova com as palavras da mudança e dela faz prova. Amo escrever. Escrever e escrever.
Espero ser conhecida por isso. Escrever sou eu na mais estranha, crua e verdadeira essência.
E o futuro? Veremos. Virveremos e escreveremos.
Ass. Hanna de 27 de novembro de 2024.
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