Projeto Memória da Petrobras
Depoimento de Gilda Maria Rolim
Entrevistado por Heloísa Gesteira
Gravação realizada em Rio de Janeiro, em 26/04/2005
Realização Museu da Pessoa
Entrevista PETRO_CB694
Transcrito por Anabela Almeida Costa e Santos
P/1- Boa tarde.
R- Boa tarde.
P/1- Queria começar com você falando seu nome completo, local e data de nascimento.
R- Meu nome completo é Gilda Maria Pinto Rolim, eu sou carioca, a data de nascimento eu já esqueci.
P/1- (riso) Então, está ótimo.
R- Está bom?
P/1- Está ótimo. Não tem problema nenhum. E queria que falasse um pouquinho do seu trabalho na Petrobras, desde o ingresso, como é que se deu o ingresso, quando. Um pouquinho da sua trajetória.
R- OK. Vou fazer bem resumidinho. Eu entrei pra Petrobras holding em 65. E trabalhei 7 anos na Petrobras como bibliotecária. E organizei uma biblioteca, especializada em engenharia de segurança em assuntos correlatos, que era na época a única biblioteca no Brasil sobre esse assunto. A Petrobras, como sempre, é pioneira, né? E foi, realmente, mais uma das atividades do pioneirismo da Petrobras foi organizar uma biblioteca sobre esse tema. E, quando a Braspetro foi criada, o vice-presidente da Braspetro, que era o Doutor Geonísio Barroso, queria uma bibliotecária, eu fui então, indicada, por muitos motivos, e fiquei lá desde a criação da Braspetro até me aposentar. Então fiquei 20 anos na Braspetro, que é a Petrobras internacional e 7 anos, antes, na Petrobras holding.
P/1- Hoje você é aposentada?
R- Hoje eu sou aposentada, mas eu gosto muito de trabalhar. O pouco que eu sei é petróleo. Além de gostar de trabalhar para o meu país, que eu tive convite pra trabalhar em multinacional, pra ganhar em dólar. Mas não, não me interessa. Eu acho bacana a gente poder trabalhar no nosso país. Eu trabalhei também na Agência Nacional do Petróleo. Então, hoje eu trabalho, novamente, na área internacional da Petrobras.
P/1- Da...
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Depoimento de Gilda Maria Rolim
Entrevistado por Heloísa Gesteira
Gravação realizada em Rio de Janeiro, em 26/04/2005
Realização Museu da Pessoa
Entrevista PETRO_CB694
Transcrito por Anabela Almeida Costa e Santos
P/1- Boa tarde.
R- Boa tarde.
P/1- Queria começar com você falando seu nome completo, local e data de nascimento.
R- Meu nome completo é Gilda Maria Pinto Rolim, eu sou carioca, a data de nascimento eu já esqueci.
P/1- (riso) Então, está ótimo.
R- Está bom?
P/1- Está ótimo. Não tem problema nenhum. E queria que falasse um pouquinho do seu trabalho na Petrobras, desde o ingresso, como é que se deu o ingresso, quando. Um pouquinho da sua trajetória.
R- OK. Vou fazer bem resumidinho. Eu entrei pra Petrobras holding em 65. E trabalhei 7 anos na Petrobras como bibliotecária. E organizei uma biblioteca, especializada em engenharia de segurança em assuntos correlatos, que era na época a única biblioteca no Brasil sobre esse assunto. A Petrobras, como sempre, é pioneira, né? E foi, realmente, mais uma das atividades do pioneirismo da Petrobras foi organizar uma biblioteca sobre esse tema. E, quando a Braspetro foi criada, o vice-presidente da Braspetro, que era o Doutor Geonísio Barroso, queria uma bibliotecária, eu fui então, indicada, por muitos motivos, e fiquei lá desde a criação da Braspetro até me aposentar. Então fiquei 20 anos na Braspetro, que é a Petrobras internacional e 7 anos, antes, na Petrobras holding.
P/1- Hoje você é aposentada?
R- Hoje eu sou aposentada, mas eu gosto muito de trabalhar. O pouco que eu sei é petróleo. Além de gostar de trabalhar para o meu país, que eu tive convite pra trabalhar em multinacional, pra ganhar em dólar. Mas não, não me interessa. Eu acho bacana a gente poder trabalhar no nosso país. Eu trabalhei também na Agência Nacional do Petróleo. Então, hoje eu trabalho, novamente, na área internacional da Petrobras.
P/1- Da Petrobras?
R- Isso.
P/1- E me diz uma coisa, Gilda, mudou muito de quando era Braspetro pra agora? E se mudou, assim, quais são os principais pontos que você destacaria?
R- Olha, naturalmente que mudou, porque a vida é dinâmica, a empresa é altamente dinâmica, a indústria do petróleo é altamente dinâmica. Então isso, esse dinamismo, é alguma coisa que a gente, uma coisa com que nós sempre convivemos. Eu estou há poucos meses, então seria, assim, leviano ainda dizer que eu reparo esses dois aspectos, tá? Mas, a empresa como um todo, está diferente, mas no bom sentido. E eu acredito que tenha sido muito estudado e muito pensada e amadurecida a decisão da extinção da Braspetro, e as atividades passarem a ser de exclusiva responsabilidade da Petrobras. Acredito que tenha sido uma decisão amadurecida, no sentido de imprimir mais força à própria Petrobras, se é que ela precisa, mas enfim, no cenário internacional, naturalmente. E acredito que tenham sido estudados os comportamentos, os perfis das grandes companhias de petróleo. Nesse conjunto a Petrobras está inserida. E eu acho que ainda seria prematuro eu apontar alguns pontos de grande diferença, tá? Mesmo porque a Braspetro foi extinta há 2 anos, e enfim... Mas, ela, inegavelmente, ela agregou valor a Petrobras.
P/1- Tá.
R- Isso é inegável. Até porque o corpo técnico era da Petrobras, então o mais natural é que...
P/1- Verdade.
R- ...agregasse valor.
P/1- E só pra gente dar continuidade, você falou que entrou como bibliotecária e trabalhou sempre como bibliotecária.
R- É, eu sou bibliotecária e sempre trabalhei como bibliotecária. Eu gosto muito da minha profissão.
P/1- Não, ham ham. Não, e é super importante numa empresa você conseguir disponibilizar exatamente.
R- Naturalmente, a informação.
P/1- A informação. Agora, me diz uma coisa, como é que você vê essa presença internacional da Petrobras? Já que você, né, tem uma trajetória aí, longa, dentro dessa área internacional.
R- Eu vou fazer alguns registros que talvez as pessoas não saibam. E nem têm a obrigação, mas eu pela minha profissão e por ter sido envolvida com pesquisa, e de estar sempre muito enfronhada com toda a indústria internacional do petróleo né? É interessante que na lei 2004, que foi a lei que criou a Petrobras, digamos assim, já existia um artigo onde estava prevista a ida da Petrobras para o exterior, ok? Por uma série de motivos que não vêm ao caso agora, num determinado momento, eu tive que estudar isto, porque já na lei 2004 estava contemplada a possibilidade da Petrobras ir para o exterior. Estudei muito, pesquisei, li. Vocês nem podem imaginar. Até que eu consegui concluir que foi porque, em 54, já existia uma empresa, tipo Brasil-Bolívia. Uma empresa, que eu não lembro mais onde era a sede. Fiz a pesquisa há muitos anos e...
P/1- Só um minutinho, desculpe.
R- Ah é, percebi, faz parte da vida, ué. Brasil- Bolívia?
P/1- É. Dessa empresa que você não...
R- Bem, então, o que que eu concluí? Que já existia uma empresa Brasil-Bolívia, inclusive com ações emitidas. Eu não me lembro mais onde era a sede dessa empresa, nem quando ela foi criada, mas talvez na década de 40, algo no gênero. O legislador lembrou-se, na época, nos debates do congresso, que já existia isso. E ela era envolvida com prospecção de petróleo, o legislador concluiu que tinha que aproveitar a hora de estar fazendo a, consolidando com a criação da lei, consolidação da lei 2004 e criação da Petrobras, isso tinha que ser incluído em algum lugar. E concluíram que seria mais interessante, considero até uma atitude inteligente, em vez de particular algum artigo, citando especificamente esta empresa Brasil-Bolívia, generalizou, tá? Isso, em pouquíssimas palavras, senão vou ficar 2 horas falando só sobre isso. Então, em pouquíssimas palavras, esse é o motivo de a lei 2004 já contemplar a possibilidade da Petrobras ir para o exterior, que eu acho que é interessante registrar porque as pessoas sabem etc. Nessa linha, no final da década de 60, Doutor Geonísio Barroso e mais quatro... mais três técnicos da Petrobras, um geólogo, um geofísico e uma administradora estudaram durante, tiveram a incumbência de durante cerca de 2 anos estudar à exaustão esta matéria, isto é, a ida da Petrobras para o exterior. É viável? Não é? Por que? Quando? Onde? Como? Não só estudaram, esgotaram os recursos bibliográficos, vamos chamar assim. Como também viajaram, conversaram com diplomatas que já tinham vivido muitos anos em países produtores ou potencialmente produtores etc. e tal. Um estudo magnífico que por força das circunstâncias, algum tempo depois da Braspetro criada, eu ganhei de presente para dar tratamento técnico. Por isso também e por ter interesse, naturalmente, é que eu me eu me envolvi. Dessas quatro pessoas, só uma pessoa é viva, que é o geofísico Muhamad Amin Baccar, que eu já pedi, enfaticamente, que seja localizado, mora aqui no Rio. Pensei em dar um depoimento. Porque o depoimento dele é inestimável. O meu... O dele é inestimável. Desse quarteto, só Baccar é vivo e é um homem inteligentíssimo. Inclusive ele fala árabe, com esse nome Muhamad Amin Baccar. Então, isso foi excelente para os negócios da Petrobras no mundo árabe, tá? Facilitou muito. Aliado à inteligência dele, interesse, seriedade etc. e tal. Ele é geofísico. Então, dessas quatro pessoas que estudaram durante cerca de dois anos a criação da Braspetro, ele ainda está vivo. Isso é uma decisão bastante amadurecida e teve o apoio da Diretoria e do Conselho de Administração da Petrobras da época, né? Então a empresa foi criada em abril de 72, numa atividade pioneira da Petrobras. Mais uma atividade pioneira da Petrobras, de ir para o exterior, tá? Nós não tínhamos, no Brasil, outras grandes experiências, de empresas do porte da Petrobras, se lançar no exterior. Uma empreitada difícil, de altíssimo risco sob todos os aspectos. E interessante que, quando a Braspetro foi criada, já dois contratos tinham sido assinados. Um no Iraque e outro na Colômbia. Quer dizer, as negociações feitas pelos nossos colegas foram tão bem feitas que os contratos nem esperaram ser formalizada a criação de uma nova empresa, que já foram assinados pela Petrobras. E no Iraque, onde nós fizemos uma descoberta fantástica do campo de Majnoon, na década de 70, a empresa tinha o apelido de empresa Good Luck.
P/1- Ah é?
R- É. Hoje a gente vê o que está acontecendo no Iraque, inclusive mais de 40 famílias de colegas nossos morou em Bashra. Uma cidade ao sul, ao sul do Iraque, fica quase fronteira com o Irã e hoje está sendo prejudicada, né? Mas, enfim, a gente torce para que isso não dure tanto, que volte a ser, até a prospectar no Iraque, né? Um outro aspecto que eu acho que é interessante eu registrar porque eu percebo que poucas pessoas sabem e não é registrado, e eu acho, no meu parco entender, é muito importante. Um dos motivos pelos quais o Brasil não sofreu praticamente nenhuma penalidade, durante as duas grandes crises de petróleo das últimas décadas, foi o fato da Braspetro existir. Nossos colegas muito inteligentes, advogados, economistas, engenheiros e geólogos colocavam em todas as cláusulas, em todos os contratos uma cláusula que dizia, mais ou menos, que em caso de desabastecimento internacional, o Brasil teria prioridade na importação do óleo daquele país. Há muitos motivos pelos quais o Brasil não, quase não foi penalizado nas grandes crises do petróleo. Um dos motivos é esse. E outro, é claro, é também a atuação dos nossos colegas da área de combustível, da área internacional, que muitos sumiram no mundo e ficaram três, quatro dias sem, até, ninguém saber onde eles estavam. Não existiam as facilidades de comunicação que existem hoje. E eles estavam negociando, eles estavam comprando óleo, quer dizer, claro que numa conjugação de fatores. Uma das nossas características como empregado da Petrobras é uma solidariedade bastante grande, isso é muito importante. E essa solidariedade é, no aspecto profissional, do desenvolvimento, desempenhe suas atividades também. Acho interessante isso seja, isso que eu comentei seja até, assim, mais pesquisado, mais aprofundado. OK?
P/1- Tá. Estou vendo, como você tem muita coisa pra falar, então vou fazer uma pergunta bastante abrangente, que você pode falar, né? Como que é, assim, do seu ponto de vista, como é que você vê esse processo de internacionalização da Petrobras, que vem, aí, desde o início dos anos 70, e agora, né, atuando já em treze países? Queria que você contasse um pouco a história...
R- È uma campanha de sucesso. Agora, é obvio que eu não tenho autoridade pra dar uma opinião a esse respeito. É claro. Mas, por ter vivenciado ao longo de tanto tempo, e com uma efetivíssima participação na consecução dos negócios, no acompanhamento, porque, como bibliotecária, eu implantei, também, um arquivo técnico. Essa documentação, inclusive, é confidencial, secreta etc. e tal, era toda lida e indexada pelas bibliotecárias. Então nós acompanhávamos porque não havia arquivos setoriais. Era um arquivo técnico único. Então, nós respondíamos a toda a diretoria, todo o corpo gerencial da Braspetro. E, assim como nós respondíamos em relação aos documentos produzidos, nós respondíamos também em relação a toda a informação que estava sendo produzida sobre a indústria do petróleo no mundo. E nós, que a Braspetro foi criada em 72, a informática, em termos brasileiros, estava engatinhando. Nós não tínhamos recursos fantásticos que nós temos hoje, tá? De bancos de dados maravilhosos, que nós conhecemos, todos serem em papel. As informações nos chegavam aqui num abrir e fechar de olhos. Claro que pelo fato da Petrobras ter escritórios no exterior e, depois, a Braspetro ter suas sucursais, facilitava muito a chegada antecipada dessas informações ao Brasil porque a gente ficava ligada, no sentido de explorar, no bom sentido, essas oportunidades. Então, explicações editadas nos Estados Unidos eram assinadas através do escritório de Nova York da Petrobras. As publicações editadas na Europa, eu fazia com que as assinaturas dos periódicos fossem feitas através do escritório de Paris ou de Londres. Tudo isso visando à gente ter aqui informação o mais rápido possível. Essa informação também era toda lida por nós, pelas bibliotecárias. De modo que a gente acompanhava o dia a dia do mundo do petróleo, sem as facilidades que se tem hoje de acesso, né? Assim como acompanhava toda a produção gerencial dos nossos colegas. Desde o primeiro momento até... Que que a gente tem de geologia da Argélia? Qual é a legislação da Argélia? A gente se envolvia com isso tudo. Então eu posso ter uma opinião ou outra, mas eu não tenho capacidade, não tenho autoridade pra emitir uma opinião dessa. Sempre quero crer que a Empresa tomou a melhor decisão, sempre quero crer porque testemunhei a seriedade com que as decisões são tomadas, como se estudam os assuntos, como se procura cercar de todos os aspectos daquele assunto principal. Então sempre quero crer que ela... Não é _______, não. É constatação, né? A maioria dos colegas é muito séria, tem muita responsabilidade. Então sempre quero crer que ela não tomou uma, uma atitude, assim, ao sabor das ondas, tá? Tomou uma atitude estudada, pensada e amadurecida. Nós temos colegas muito inteligentes que, nesse particular eu vou fazer um registro, porque eu acho interessante sobre a Braspetro. A Braspetro, quando foi criada, ia trabalhar na Braspetro o crème de la crème da Petrobras. Esse senhor, que foi o vice, primeiro vice-presidente que criou a Braspetro, Doutor Geonísio Barroso, era uma pessoa muito respeitada, tinha sido presidente da Petrobras, diretor da Petrobras, muito respeitado, e ele pinçava as pessoas para ir para a Braspetro. Houve um momento em que toda a diretoria da Petrobras era de ex-Braspetro. Então eu ria muito e dizia: “Braspetro virou o celeiro da diretoria da Petrobras.” E claro que esse grupo de gente, assim, tão inteligente e tão boa, né, fez um bom trabalho inegavelmente. Essa descoberta de óleo no Iraque, que eu quero que vocês conversem bastante com o Baccar e também com o Kachan, que é o engenheiro de perfuração primeiro, assim, da primeira hora da perfuração no Iraque, que eu dei o nome dele ontem, e acho que já passei o telefone. São pessoas pra vocês dedicarem horas de gravação, tentar dar corda neles, tá? Porque eles têm muito a contar. Não é a falar, é a dizer. Muito, mesmo. Muitos colegas nossos passaram por situações dificílimas no exterior. Mas, eu estava comentando, ainda por conta do que você perguntou, comentando que então ia pra Braspetro o crème de la crème.
P/1- Está certo. Adianta uma curiosidade, você falou que recebia famílias, também, pra falar um pouco...
R- Não chegava a ser, eu gostaria.
P/1- Não, não famílias. Mulher e filhos...
R- Uma vez eu fui ao meu gerente e disse a ele: “Eu fiz aqui um rápido esboço, essa empresa tem que ter uma área, um departamento, um grupo de pessoas que, não só dê suporte à turma que está indo, como, na volta, colha esses depoimentos. Eu não posso ter mais frentes do que eu tenho. Então, está aqui; eu fiz aqui um esboço, vocês passem isso pra área que for, porque... Mas é um absurdo isso não estar sendo registrado, essa experiência não estar sendo transferida para os outros colegas. Claro que, na medida do possível, nós da biblioteca fazemos isso. Incentivamos que eles estejam sempre na biblioteca” É claro que estavam, isso não há a menor dúvida, mesmo porque nós empreendemos um estilo de, na medida do possível, dar assessoramento documentário a eles, no exterior.
P/1- Lá também?
R- No Iraque, no Egito, na Argélia, na Líbia, tá? Na medida do possível por causa dos problemas desses países, tá? Porque era mandado, era aberto, nem tudo eles recebiam. Não era todas as publicações que eu podia mandar, pela origem da publicação, tudo isso eu tinha que estar ligada e atenta. Então, a gente também fez isso. Como eu te falei, tudo que eu estou falando é um briefing. Bom, então, um dia, eu cheguei pro meu gerente e disse a ele: “Olha, ontem eu não trabalhei no que eu tenho que trabalhar porque Fulano trouxe a mulher dele aqui. E eu, claro, pois eu disse: ‘uma horinha traga pra almoçar comigo’. Não veio almoçar comigo. Porque eu resolvia no almoço. Então, eu tive que dar atenção e falar sobre um pouco que eu sei do país. Ela lê um pouco de inglês, então já pude emprestar para ela levar pra casa, mas ela quis ficar lendo aqui. Depois Fulano e Beltrano chegaram da Colômbia e vieram, me trouxeram material e me vieram dar depoimentos etc. e tal, tá? Isso é fundamental, mas eu não posso ter mais essa frente.” Mas nunca houve tempo de se fazer isso. Então, realmente, essa iniciativa de vocês agora... É bom que assim fica bem natural, tá?
P/1- (riso)
R- Essa iniciativa de vocês, agora, é bem interessante porque está resgatando, literalmente. Não estou jogando confetinho, não. Nem na Petrobras, na equipe que teve essa iniciativa. Porque não houve isso.
P/1- O Gilda, me diz uma coisa, tinha algum país, alguma região que causava mais medo nas pessoas e elas te procuravam mais, assim, pra saber, ou...?
R- Não, não. Claro que ninguém ia trabalhar em Paris ou em Londres, não é verdade? Todos eram países mais longe e mais de difícil acesso, mas é quase inerente...
P/1- O Saara, por exemplo?
R- É uma atração fatal. Nós tivemos colega que foi perdido no deserto, nós tivemos situações muito tristes, difíceis. Posso dizer que faz parte do negócio, mas aí foi um pouco além do faz parte do negócio. Mas isso eu deduzo que meus colegas que viveram anos no exterior vão dar esse depoimento verdadeiramente sentido, porque o meu depoimento não é sentido. Agora, deixa eu falar uma coisa que isso eu acho, assim, interessante, uma idéia que eu tive que foge aos padrões. Eu gosto um pouquinho de fugir aos padrões. Eu acho bonito uma biblioteca bonita, que as pessoas gostem e inclusive bem decorada. Mas eu detesto pôsteres, figurinhas, furinhos, nem pensar. E um quadro é uma coisa cara, não é verdade? Gravura é uma coisa cara. Então, eu tive a seguinte idéia: cada colega que viajava eu chamava para um outro papo. O papo é o seguinte: “como você sabe, a biblioteca da sua empresa está bonita, eficiente” “Claro” “Pois é, tudo bem, então por conta disso, você faz favor de quando voltar trazer alguma coisa para decorar a biblioteca, do seu bolso, que a Braspetro não vai lhe reembolsar. Também não quero qualquer coisa, por favor. Traga, pode trazer um tapete, pode trazer um quadro, uma gravura, uma peça, um prato, por favor, ok?” “Claro.” Todos traziam alguma coisa. Alguns não esqueciam e a cada missão voltavam me dando explicações, até: “não pude trazer uma coisa melhor.” Eu chegava a rir. Bom, nós tínhamos um escritório em Paris. Então, claro que a nossa colega Simone, queridíssima, não podia sair dessa. Então, comuniquei-me com ela. Não vou dizer qual foi o meio de comunicação, né, porque é terrível. Comuniquei-me com ela, contei a ela essa minha idéia, queria que ela participasse, se ela pudesse mandar umas gravuras, que ela sabia onde é que comprava. Ela sabe que eu gosto. Eu já estive lá etc. e tal, aquelas gravuras assim, assim, eu quero que você mande umas cinco. Passado um mês, ela telefonou, ela era uma pessoa muito fina, um pouco constrangida em me perguntar se eu tinha gostado, mas eu: “gostado de quê?” As gravuras nunca chegaram, foram extraviadas. Mandou tudo outra vez. Bom, nisso, houve, assim, cenas engraçadíssimas. Primeiro, às vezes o inusitado da lembrança. Tipo, assim: “foi o que deu pra eu trazer, mas eu não esqueci, eu queria que você soubesse que eu me lembrei.” Então, tinham coisas assim inúteis e inusitadas. Mas, tinham cenas muito interessantes. Eu não posso dizer o nome do colega, se pudesse dizer, seria interessantíssimo. Mas você não conhece. Mas eu vou dar o perfil pra você poder entender quão interessante. O colega não só tem um nome inglês, como ele é descendente de ingleses, ele é absolutamente formal. E ele morou muitos anos no Egito, eu tenho que dizer o país, senão não tem graça a peça que ele trouxe. Passado 2 anos, alto, ele entrou na biblioteca: “O Fulano, como vai? Quanto tempo.” “Tempo, a senhora tem passado bem?” “Bem, obrigada.” “Não esqueci o seu pedido.” Na hora eu nem me lembrava que pedido, se eu pedi um periódico, algum mapa, né? Mas nem lembrava. “Não esqueci o seu pedido, trouxe uma peça para a senhora.” Aí, eu me lembrei o que era. “Pra mim não, pra documentação da Braspetro.” “Sim, sim, como a senhora disse.” Todo formal, entregou uma caixa, eu abri. Era um colar lindíssimo, de banho de ouro, com turquesas. Eu falei: “que lindo.” Ele, então, me disse, com toda a seriedade, note que o país era o Egito: “Dona Gilda, não pude trazer uma peça antiga, mas também não é uma peça nova.” Tive que segurar uma gargalhada porque eu não tinha noção, eu não queria que o senhor fosse violar um sarcófago pra trazer uma peça antiga. Se fosse uma Colômbia ali da esquina, mas o Egito, dizer que não é uma peça antiga, é uma peça nova, olha. Então, nessa linha, também, tinha umas coisas bem interessantes, bem interessantes. Mas tivemos peças tão bonitas, que uma vez uma vez um gerente me disse: “escuta, daqui a pouco vai ser uma biblioteca dentro de um museu?” Eu falei: “não.”
P/1- Virar museu.
R- Tinham peças muito interessantes, muito. E como são muitos geólogos, né? Então, eu dizia: “traz umas pedrinhas.” Eles traziam, teve um, tinha duas, na Argélia, uma formação rochosa chamada rose de sable, rosa de areia em francês, que parece, mesmo, uma rosa, mas é areia, né? O deserto da Argélia tem, no deserto, aquelas dunas fazem assim. Rose de sable, ele trouxe, todo embalado, parecia uma criança. Ele não esperou nem eu abrir. “Abre, ai meu Deus, pra você ver.” Ele mesmo foi abrir, parecia criança, um homem mais velho que eu, pra assim, sabe? Eles ficavam assim, todos, assim, super alegres por estarem colaborando. Tinha peças muito lindas, muito lindas. Isso é uma coisa, assim, que foge um pouco de uma documentação, mas por aí você pega, você percebe, assim, a nossa dinâmica, a nossa participação nos negócios da companhia que se refletem até nisso, né?
P/1- O Gilda, a gente já está se aproximando do final, eu queria que você falasse o que você achou de ter dado esse depoimento e o que você acha da Petrobras investir em um projeto como esse, o Projeto Memória.
R- Eu acho interessante prestar o depoimento, especialmente, como eu disse a você, os colegas que fizeram a Braspetro. É claro, eu participei, mas seria uma veleidade dizer que uma bibliotecária fez, também, a empresa.
P/1- Não, mas pelo que você está falando...
R- Eu acho que cada um tem a sua participação. Mas os geólogos, os geofísicos, engenheiros, advogados, é muito importante que o depoimento deles seja registrado e que isso seja aproveitado pelas outras pessoas. Que se for pra ficar numa prateleira, não adianta nada, então. Então um negócio que não tem dinamismo, ele virou museu. No sentido de que de alguma maneira, que não vem ao caso agora, que isso seja aproveitado, esses depoimentos sejam aproveitados pela turma que está aí agora etc. e tal. Então, isso é muito importante. A iniciativa, essa eu acho que é, assim, cumprimentável, pela Petrobras. E no caso específico da atuação da Braspetro, ou melhor, a internacionalização da Petrobras, não há registro, ok? Como eu disse a você, eu comecei, mas era humanamente impossível, não existiam as facilidades, digamos, que existem hoje, não só de comunicação, como não existia nem a figura do estagiário. Então, hoje, a gente diria assim “contrata uma equipe”, como vocês estão contratados, tá? Contrata uma equipe, eu dou as linhas, e é por aí etc. e tal, e eles vão tocar, eu só dou uma coordenada, pra isso eu daria. Não existia essa facilidade, não existia essa figura, tá? Eram tempos, eram tempos diferentes etc. e tal. Então, se na Petrobras já existia essa preocupação, eu não sei, porque eu fiquei 20 anos na Braspetro e não posso ser enciclopédia. Mas, se na Petrobras já existia esse cuidado, eu não sei. O fato é que na área internacional não existia. Então, em boa hora e antes tarde do que nunca. Mas, especialmente, que esses depoimentos se tornem matéria viva, que seja explorado, no bom sentido, pela turma que está aí agora. Não só a turma jovem, mas a turma não tão jovem, mas que está ativa ainda, ainda vai trabalhar na Petrobras muitos anos. É porque há uma transferência de know how, que tem que existir, é obvio. E há muita experiência a ser passada, muita vivência a ser passada, há muitos depoimentos. E tudo isso, em última análise, fará com que não se invente a roda, com que não se trilhe os mesmos caminhos desordenadamente, porque já foi pago o preço do pioneirismo.
P/1- Bom, tem alguma coisa ainda que você gostaria, ainda, de registrar?
R- Não, obrigada.
P/1- Não. A gente que agradece.
R- Obrigada. Boa sorte pra você. Já pode cobrar, mesmo, isso aí é maldade, eu deveria ter virado as costas pra ser coerente com o que eu disse. Cadê meu cigarro?
(Cachan?)
(Mohamed Abi Bakar?)
(Bakar?)
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