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Por: Museu da Pessoa, 26 de setembro de 2007

A tal de Neidinha

Esta história contém:

Sabe qual é o maior perigo de morar na floresta? O homem. Tem quem diga que é pegar malária, mas na verdade é o homem. É ele que ataca os animais. Os animais não atacam você. Veja só… Há mais de 30 anos que eu trabalho com índio, só fui atacada por uma onça pintada uma vez! Por isso que eu digo: o maior perigo da floresta é o madeireiro e o garimpeiro. São eles que destroem a floresta.

Rondônia não era como tá hoje, tudo destruído. Era mata virgem. Os animais vinham no quintal de casa, eles não tinham medo de gente. Eles eram nossos brinquedos! Paca, cotia, macaco. Criança da cidade não cria as bonecas? É a mesma coisa, só que a gente cria bicho. A gente cuida dos macacos como se fossem uma criança, cuida de gavião, de arara. Tinha macaco-prego, macaco-barrigudo, tinha macaco-cuatá, tinha maracanã, tinha periquito, tinha veado. Ah, tinha muito bicho! Os mais fáceis de brincar eram o veado e o macaco. O veado é mais mansinho e o macaco se parece com a gente, ele é muito amoroso!

A gente passou a infância com meus pais nos ensinando a andar no mato. Como meus pais ensinaram a gente a caçar, a pescar, eu aprendi a me virar, a me proteger. Se eu ando no mato hoje e um bicho me pica, sei exatamente qual é a folha que eu vou pegar e passar em cima pra me livrar da picada. Nós aprendemos muito com eles. Minha mãe aprendeu a caçar por uma questão de sobrevivência. Lá só era mata virgem e a gente precisava comer. Então as únicas coisas que tinha pra comer eram frutos e raízes do mato e caças. Como meu pai tinha cartucho e espingarda, ele ensinou minha mãe a atirar. Era ela que caçava e trazia a comida pra casa. Ah, a gente falava raiz da cotia, raiz de paca. Comida era nome de bicho. A gente era meio bicho também.

Sabe outra coisa que a gente fazia no meio do mato quando criança? Por incrível que pareça, e tu não vai acreditar nisso, a gente lia revista. Minha mãe gostava de ler. Quando o avião ia...

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Dados de acervo

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P/1 – Então vamos lá. Eu queria pedir pra você dizer o seu nome, local de nascimento e a data.

R – O meu nome?

P/1 – Nome inteiro, o lugar onde você nasceu e a data de nascimento.

R – Ivaneide Bandeira Cardoso. Nasci em Plácido de Castro, no Acre. Nasci no dia 17 de junho de 1959.

P/1 – E qual que era o nome dos seus pais?

R – O meu pai (Aldenor?) Macedo Bandeira e minha mãe (Noêmia?) Cardoso Bandeira.

P/1 – E o que eles faziam?

R – Bom, meu pai veio do Ceará com 18 anos, fugindo da seca, e veio pra trabalhar nos seringais, no Acre. Minha mãe morava no Acre. O meu pai chegou, morava em Plácido de Castro, o papai se apaixonou por ela, pegou, casou. Ela tinha 14 anos e ele levou ela pro meio do mato com um filho na barriga, que neste caso era eu.

P/1 – E quando vocês chegaram em Rondônia?

R – Então, aí quando eu tinha seis meses, o meu pai saiu do Acre, de Plácido de Castro, comprou um barco, que aqui chamava batelão, e foi vender mercadorias no Rio Jaci, subindo o Rio Jaci pra vender mercadoria pro ribeirinho e pros seringueiros. Aí o barco pegou fogo com a gente dentro. Queimou todo o barco, queimou tudo. A gente escapou dentro de uma canoa, eu, minha mãe e minha irmã, e meu pai nadando dentro do rio. E aí meu pai foi trabalhar no seringal, cortar seringa.

P/1 – Onde que era esse seringal?

R – No Rio Jaci, na beira do Rio Jaci. E depois a gente foi, o que hoje já é marcado como Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, fomos morar dentro da terra indígena. Ficamos lá até eu completar 12 anos, quando vim pra cidade.

P/1 – Conta um pouco como é que foi, quando vocês chegaram nessa terra, como é que foi. Era em Rondônia ou era Acre?

R – Em Rondônia. Quando a gente foi... Bom, o barco pegou fogo e o meu pai foi com toda a família lá pra dentro dessas terras, marcando a terra e tal. Até aí eles não sabiam que era terra indígena porque ainda não era demarcado. E aí o meu pai ficava no mato cuidando...

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